O Globo
Na terça-feira, depois de afirmar a aliados
que indicaria quanto antes para o Supremo Tribunal Federal (STF)
seu ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (AGU), Jorge Messias, Lula embarcou
para a Malásia sem
mover uma palha. Pródigo em falas de palanque, não deu nenhuma explicação sobre
a escolha (ou a falta dela). Nos bastidores, auxiliares disseram que ele achou
melhor, antes, ter uma conversa com o senador Rodrigo
Pacheco (PSD-MG),
candidato à vaga aberta com a aposentadoria de Luís Roberto
Barroso.
Em tese, a ideia é evitar problemas com
o Senado
Federal e seu presidente, Davi
Alcolumbre (União Brasil-AP).
Ele é contra Messias e quer Pacheco no STF. Quem conhece os envolvidos, porém,
garante que foi mais que isso. E a chave da virada estaria justamente num papo
a sós que Lula e Alcolumbre tiveram na segunda-feira à noite.
Segundo o que o próprio Alcolumbre contou a interlocutores próximos, ele fez Lula entender que, hoje, Messias não obteria os 41 votos necessários para ser aprovado no Senado. Lula não deu sinal de que vá ceder à pressão. Mas entendeu que precisará calcular com mais cuidado os próximos passos.
Da última vez que Alcolumbre resolveu
atrapalhar a vida de um indicado ao Supremo, deu trabalho. Segurou por quatro
meses a sabatina de André Mendonça na
Comissão de Constituição e Justiça porque queria no cargo o então
procurador-geral da República, Augusto Aras.
Também deixou claro a Jair
Bolsonaro que, se dependesse dele, Mendonça não passaria. Ao
final, o “terrivelmente evangélico” acabou aprovado na marra, depois de um
corpo a corpo junto aos senadores e nas redes sociais em que até Michelle
Bolsonaro se envolveu.
Na época, Bolsonaro disse que escolhia um
evangélico por compromisso de campanha, mas também pelo critério “da confiança
e da lealdade mútua” — alguém que tomasse cerveja com ele. A reação da oposição
foi uma grita contra o que se considerou vilipêndio à nobre função de proteger
a Constituição.
Veio Lula 3.0 e, por ironia, não há sequer a
preocupação com o compromisso de campanha — ampliar a diversidade e a
participação de mulheres em postos de comando. Nos primeiros mandatos, Lula
ainda nomeou um negro (Joaquim
Barbosa) e uma mulher (Cármen Lúcia).
Hoje, o critério é o mesmo de Bolsonaro —
“lealdade e confiança”. Assim foram escolhidos Cristiano
Zanin, advogado de Lula, e Flávio Dino,
ministro da Justiça que o defendia com unhas e dentes. Messias — revelado ao
público na gravação divulgada por Sergio Moro em
que Dilma
Rousseff o chamava de “Bessias” e dizia que ele entregaria a
Lula o termo de posse para assumir a Casa Civil —
se encaixa no mesmo perfil.
A diferença é que muitos dos que antes
consideravam tal critério um absurdo agora o justificam pelo trauma de Lula com
o mensalão e a Operação
Lava-Jato — como se o fato de os juízes escolhidos por ele não
terem impedido sua condenação fosse defeito e não virtude.
O próprio Messias escreveu na tese de
doutorado que apresentou à Universidade de Brasília em
2024 que a Lava-Jato foi obra de “movimentos sociais autoritários e instâncias
inferiores do Judiciário, que, em última instância, buscavam reverter a própria
ordem constitucional de 1988” — referência ao “golpe” contra Dilma.
Para o preferido de Lula, ao “estancar os
abusos da Lava-Jato, reverter decisões injustas de instâncias inferiores e
fazer frente às ameaças golpistas que ganharam ímpeto renovado com a chegada de
Bolsonaro à Presidência”, o STF se tornou “ainda mais central na arena política
brasileira, reforçando suas credenciais como defensor da democracia”. O
ativismo judicial passou a ser considerado vantagem — desde, claro, que
exercido contra os inimigos.
O problema desse tipo de argumento é que ele
equipara o Supremo a uma espécie de clube onde o que conta é ser amigo do
chefe, mais ou menos como no Íbis ou no Bangu. É mais ou menos essa a base do
argumento de Alcolumbre.
Segundo o que ele tem defendido, Lula já fez
dois ministros. Agora tem de dar a vez ao Senado em nome da governabilidade.
Como quem diz: Messias é amigo do rei, mas Pacheco é amigo da galera — aí
incluídos senadores e ministros do Supremo como Alexandre de
Moraes e Flávio Dino, que já expressaram sua preferência ao
presidente.
Nada disso significa que Lula se dobrará, ou
que Messias não será aprovado no Senado. Mas, para ficar na metáfora
futebolística, dá a sensação de que, em vez de uma final de campeonato com os
melhores em campo, assistimos a uma pelada de várzea, daquelas em que, quando
dá confusão, os torcedores descem das arquibancadas para brigar no campo
enlameado. Ao final, vence quem fala mais alto — ou é amigo do juiz.
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