O Globo
Jair Renan deixou Balneário Camboriú para
visitar o pai na cadeia em Brasília. “Tentei levantar o ânimo do meu velho”,
declarou, ao sair da Polícia Federal. O Zero Quatro disse ter levado “alguns
livros” para o capitão. A frase despertou a curiosidade dos repórteres, que
quiseram saber os títulos escolhidos. “Trouxe um caça-palavras para ele”,
informou o vereador.
O chefe do clã nunca foi conhecido pelo hábito da leitura. Apesar disso, sempre teve opiniões fortes sobre a cena editorial. No Planalto, tentou interferir no formato dos livros didáticos. “Os livros hoje em dia, como regra, é (sic) um montão, um amontoado de muita coisa escrita. Tem que suavizar aquilo”, ordenou, em janeiro de 2020.
Jair Bolsonaro acrescentou que os livros
distribuídos nas escolas públicas passariam a estampar a letra do Hino Nacional
e a bandeira do Brasil. Para sorte dos estudantes brasileiros, a patriotada foi
esquecida. Ainda assim, o capitão fez um estrago e tanto no setor.
No último ano de mandato, enquanto raspava o
caixa para tentar se reeleger, o ex-presidente bloqueou quase R$ 800 milhões do
Programa Nacional do Livro e do Material Didático. A medida atrasou a compra de
70 milhões de livros para alunos e professores do ensino fundamental.
O obscurantismo marcou a relação do governo
Bolsonaro com a cultura em geral e a literatura em particular. Por birra
ideológica, o capitão se recusou a assinar os papéis necessários para a entrega
do Prêmio Camões a Chico Buarque. “Conforta-me lembrar que o ex-presidente teve
a rara fineza de não sujar o diploma do meu prêmio”, devolveu o autor de
“Estorvo”, ao receber o galardão com quatro anos de atraso.
O desprezo pelos livros não é só produto da
estupidez do Cavalão. O anti-intelectualismo sempre foi uma arma eleitoral
valiosa para a extrema direita. Ajuda a estigmatizar escritores, professores e
artistas que teimam em criticar governantes autoritários.
Apesar da aversão às letras, Bolsonaro ainda
pode contar com elas para sair mais cedo da cadeia. A lei brasileira garante a
remição de pena para os detentos que leem. O problema, para o ex-presidente, é
que as normas do Conselho Nacional de Justiça exigem a leitura de “obras
literárias” e a entrega de resenhas de próprio punho. Não há previsão de
benefício para quem escolhe passar o tempo fazendo cruzadinha no xadrez.

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