O Globo
Inteligência artificial é capaz de diminuir a
diferença entre o trabalhador menos e o mais qualificado
Durante o ano de 2024, segundo números da McKinsey, 78% das empresas passaram a usar inteligência artificial no trabalho cotidiano. O número vem de uma pesquisa com 1.353 companhias espalhadas por 18 setores em 26 países e faz parte da edição 2025 do Relatório Anual sobre IA da Universidade Stanford. O trabalho coleciona centenas de estudos feitos no ano anterior sobre o avanço da tecnologia no mundo, organiza os dados e os apresenta a partir de uma lógica. Em 2023, 55% das empresas usavam IA. Houve, portanto, um salto. O ano passado foi o ano em que IA virou realidade no mundo corporativo. Mas os números mais incríveis do relatório não são esses, grandes porém genéricos. O que impressiona são os detalhes mais granulares sobre o impacto no trabalho. E, neles, há uma excelente notícia para o Brasil. Uma janela que se abre na direção do futuro, se soubermos adotar as políticas públicas corretas.
De cara, existem três novas profissões já
registradas e profissionais sendo contratados. Engenheiro de prompt é a mais
óbvia. São aqueles que conhecem IAs profundamente e conseguem escrever os
pedidos mais capazes de trazer respostas com qualidade. Há também auditores de
modelo. São profissionais com formação em tecnologia que avaliam os resultados
gerados por uma IA para confirmar que dão respostas corretas, que usam dados
sigilosos de forma segura, que garantem integridade, justiça, seguem compliance
ou aquilo de que uma empresa precise ter certeza quando usa a tecnologia. E há
“eticistas” de dados. A formação vem da filosofia e do Direito, mas uma
especialização em ciência da computação é necessária. É quem cria as regras
corporativas para uso de dados e de IA, avalia se algum uso específico pela
empresa pode causar danos à própria companhia ou a terceiros.
Além das novas profissões, as pesquisas
registram aumento real de produtividade. Em levantamentos incluindo vários
setores e mais de 200 mil profissionais, aumento de produção foi registrado
entre 10% e 45%. Isso inclui profissões com nível superior das áreas técnica e
criativa, além da função de atendimento ao consumidor. No SAC, diz um dos
artigos compilados, foi detectado incremento de 14,2% nos problemas resolvidos
por hora ao telefone. Basta o atendente contar com o apoio de uma IA treinada
para a função. Na área de inovação científica, o salto é maior. A presença de
um assistente de IA leva a 44,1% mais descobertas, 39,4% mais patentes, 17,2%
mais protótipos de produtos tecnológicos. Desenvolvedores de software que
escrevem código com auxílio dos modelos trabalham em média 26,1% mais rápido.
Não é só isso — e aqui entra a boa notícia
para o Brasil. Na indústria de software, desenvolvedores de nível júnior
percebem ganhos de produtividade entre 21% e 40%. Os sêniores, entre 7% e 16%.
No estudo sobre SAC, quem viu mais ganho de produtividade foram os atendentes
com piores resultados. Mesmo na área científica, o aumento foi percebido mais
nas instituições com menos recursos técnicos e financeiros que nas maiores.
Ou seja: inteligência artificial pode
diminuir a diferença entre o trabalhador menos e o mais qualificado. E esse é o
grande dilema brasileiro.
Uma análise do Wilson Center avalia que um
governo fiscalmente responsável aliado à ampla adoção de IA pode elevar o PIB
em 5 pontos percentuais na próxima década. Segundo outro estudo publicado em
Stanford, as áreas mais promissoras são agricultura, manufatura e manutenção,
além de educação e saúde.
Só que não é garantido. Formamos pouca gente
no ensino técnico, as escolas públicas são particularmente ruins no ensino
médio. E, para operar bem modelos de IA, trazendo deles o melhor resultado, é
preciso algo básico, que não oferecemos aos jovens brasileiros. Se até 2030
formos capazes de puxar para cima, nacionalmente, a qualidade do ensino médio,
a inteligência artificial poderá auxiliar muito a nivelar o Brasil às economias
mais ricas.
Perante a novidade tecnológica, uma
oportunidade se abre. O que exige do Brasil é responsabilidade fiscal e
educação pública de qualidade. Ora, ora, quem poderia adivinhar que nosso
problema era esse?

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