domingo, 2 de novembro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Tempo para salvar planeta fica a cada dia mais escasso

Por O Globo

COP30 enfrenta realidade inescapável: metas de cortes de emissões têm sido insuficientes para evitar o pior cenário

A COP30 começará em Belém sob o espectro de uma realidade incontornável: o tempo passa, e as projeções feitas com base nas metas de corte das emissões de gases de efeito estufa se mostram insuficientes para conter o aquecimento global idealmente em 1,5°C, no máximo em 2°C, em relação ao início da Era Industrial, como prevê o Acordo de Paris. O limite é essencial para evitar as variações catastróficas no clima, que já começaram a acontecer. Infelizmente, a meta de 1,5°C já ficou para trás, segundo diagnóstico da própria ONU. Pior: não há sinais convincentes de que a negligência da humanidade com o futuro do planeta mudará no curto prazo. Ainda que a ciência tenha vencido o confronto com o negacionismo no plano das ideias, faltam passos concretos, planos de execução rápida. A união entre diplomacia e política é a única forma de tentar recuperar o tempo perdido até aqui.

Governos se movem sem pressa, apesar das sucessivas tragédias climáticas decorrentes da elevação da temperatura no planeta. A última foi o Furacão Melissa, na região do Caribe, de categoria 5, a mais elevada, com ventos de até 298km/h, turbinado pela anormal temperatura do Atlântico. O poder de destruição dos furacões tem crescido. Chuvas torrenciais multiplicam-se — provocando catástrofes como as enchentes no Rio Grande do Sul — e convivem com secas tórridas. Tudo tem acontecido como era previsto.

A negligência fica patente no atraso na entrega das metas de corte de emissões definidas pelos países, conhecidas como NDCs. Elas são essenciais para projetar a tendência da temperatura média global e definir os cortes necessários nas emissões, objetivo da COP em seu relatório-síntese. No vencimento do prazo, em 10 de fevereiro, apenas 13 dos 197 signatários da Convenção do Clima da ONU (UNFCCC) haviam entregado suas NDCs para o período de 2030 a 2035. Vários se justificaram alegando esperar a COP30 para cumprir o compromisso. Até o momento, o número subiu para 64, e a partir desses compromissos foi elaborado o relatório-síntese que servirá de base para discussões em Belém. A COP30, portanto, começará com um resultado incompleto e insuficiente.

Mesmo a partir de dados limitados, relativos a apenas 30% das emissões globais, os cientistas conseguiram estimar se os cortes previstos são suficientes para limitar o aquecimento às metas traçadas no Acordo de Paris. Pelas informações disponíveis, haveria um corte de 17% nas emissões de 2019, quando eles precisariam ser de 57% para alcançar as metas. A conclusão a ser apresentada em Belém constata como evidente a necessidade de “grande aceleração” nos cortes. As dificuldades para isso serão imensas.

O sistema produtivo que se consolidou a partir da Revolução Industrial é baseado em combustíveis fósseis, e não há alternativa para salvar o planeta a não ser reduzir essa dependência. A expressão “transição energética” precisa deixar de ser um chavão para se tornar realidade concreta. Uma das principais dificuldades está na governança criada pelo Acordo de Paris. Toda negociação depende de consenso unânime dos signatários, e cada país bloqueia o que não é de seu interesse. Daí a dificuldade de tomar medidas que deem maior agilidade ao afastamento dos combustíveis fósseis rumo à geração de energia limpa.

A COP30 tentará superar o impasse com uma inovação: a agenda de ação, uma espécie de conferência paralela com reuniões entre grupos menores de países, empresas e organizações da sociedade civil dedicadas a temas individuais. Serão ao todo 360 eventos oficiais envolvendo mais de 500 iniciativas em áreas como energia nuclear, combustíveis renováveis, produção de alimentos, florestas, agricultura etc. A ideia é que a sessão plenária aprove de modo permanente a estrutura criada para a agenda de ação, de modo a garantir uma governança mais eficaz.

Um dos temas mais espinhosos é o financiamento para os países pobres implementarem suas políticas de corte de emissões. No ano passado, na COP29, em Baku, no Azerbaijão, foi estabelecida uma “nova meta coletiva”: transferir dos países desenvolvidos aos menos desenvolvidos US$ 300 bilhões anuais. Ainda é uma fração da necessidade estimada para a tarefa. O Grupo de Especialistas Independentes de Alto Nível em Financiamento Climático, criado em 2021, projetou que, até 2030, esses países precisarão de US$ 2,7 trilhões por ano e que, para isso, é vital receber ao menos US$ 1,3 trilhão das economias desenvolvidas. Os últimos dados disponíveis, de 2022, mostram que os países ricos desembolsaram apenas US$ 116 bilhões.

Outro tema que certamente despertará interesse é a tentativa de criar um fundo privado para conservar as florestas. O objetivo é implantar, dentro do Banco Mundial, uma dotação com US$ 20 bilhões vindos de governos, mais US$ 100 bilhões de investimentos privados. Esse capital daria origem a uma espécie de banco de investimento florestal e, aplicado no mercado, traria lucros reinvestidos em projetos que remunerem iniciativas de conservação. É uma ideia engenhosa que deveria ser levada adiante.

A crise climática é um problema que só será resolvido com a cooperação de todo o planeta. Eventuais êxitos nas negociações da COP30 poderão transmitir a mensagem de que o multilateralismo ainda tem valor neste momento de reorganização geopolítica do planeta. A instituição da agenda de ação, lançando mão de todos os instrumentos e organizações multilaterais que funcionam, é o caminho mais promissor para transformar a realidade. As conferências do clima servem para encontrar caminhos e desenvolver tecnologias que permitam à humanidade enfrentar as ameaças trazidas pelas mudanças climáticas. Sem elas, não haverá futuro viável para o planeta Terra.

Jugo das narcomilícias agride os direitos humanos

Por Folha de S. Paulo

Endosso dos cariocas à operação que matou 121 denota repúdio a totalitarismo imposto por criminosos

Não há modo pacifista de combater narcomilícias; deve-se aferir se uso de força letal, associado a outras ações, conduzirá à sua derrota

Não se sabe o que o governador do Rio, Cláudio Castro (PL), quis dizer ao qualificar de bem-sucedida a operação policial em favelas cariocas que na terça-feira (28) causou 121 mortes. Mas a maioria da população da capital concorda com ele.

Segundo o Datafolha, que ouviu amostra representativa dos moradores da metrópole fluminense, 57% consideram a incursão ao menos parcialmente exitosa. Questionados sobre quem teria morrido na ação, 81% disseram tratar-se na maioria (50%) ou na totalidade (31%) de bandidos.

O resultado pode surpreender pelo contraste com a visão estereotipada da defesa dos direitos humanos e jamais deveria servir de pretexto para o abuso do poder de polícia. Ainda assim, ele é compreensível se for levado em conta o grau de sofrimento e insegurança que essas narcomilícias sanguinárias impõem à população que convive com elas.

Para quem está próximo, em comunidades dominadas por grupos de rapazes armados com aparato de guerra, isso implica correr risco diário de morte, de o filho ser recrutado pela jagunçagem do asfalto, de a filha ver-se obrigada a prestar favores sexuais a tiranetes, de extorsões e justiçamentos cruéis como apenas sob a lei da selva se concebe.

Para quem vive mais afastado dos centros da narcobandidagem, trata-se de adaptar a rotina aos perigos dos tiroteios constantes, dos bloqueios de vias e do encontro fortuito com pelotões atarantados de fuzileiros do crime.

Ora, é a essência mesma dos direitos humanos de maiorias maciças da população que está sendo esmagada cotidianamente pelo narcotráfico do modo como ele se instalou no Rio de Janeiro, notadamente, mas não apenas lá.

Quando a crítica responsável cobra plano, inteligência e cooperação das agências do Estado para combater esse flagelo contemporâneo, ela não prega o pacifismo nesse enfrentamento. É preciso ingenuidade e desconhecimento para achar que se poderá deixar de empregar força letal contra milícias armadas até os dentes, dispostas a matar e morrer para assegurar o território de cujo domínio tiram o sustento.

A questão, obviamente, é minimizar danos e mortes —prender os criminosos e anular as lideranças é o objetivo, não matá-los— e encaixar operações estrepitosas como a de terça numa sequência de ações de outras naturezas que, associadas, possam ensejar o desmantelamento das quadrilhas e a liberação dos

Essa deveria ser a métrica para aferir o sucesso da operação, não a politicagem dos governos. As primeiras informações —poucos mandados executados, líderes fugitivos, comandos para a reação vindos diretamente de presídios— dão margem a ceticismo sobre o saldo da ação, a mais letal do tipo já registrada.

Mas esse saldo poderá ser menos ruim caso as autoridades se engajem nas melhores práticas para a sequência do combate ao totalitarismo criminoso.

O preço da bagagem grátis

Por Folha de S. Paulo

Deputados insistem na ilusória proibição de cobrança pelo despacho de malas em viagens aéreas

Entendimento de que não existe gratuidade deveria ser empregado na avaliação de políticas públicas, como a meia-entrada em espetáculos

Por seu valor didático, a máxima de que "não existe almoço grátis" se tornou lugar-comum na exposição de princípios da economia. Acredita-se que ela tenha origem na prática antiga de bares dos Estados Unidos de oferecer refeições aos clientes que consumissem uma determinada quantidade de cerveja —e as iguarias sempre muito salgadas servidas os faziam beber mais.

Na política, essa tentativa de logro é costumeira, como acabam de demonstrar mais uma vez os deputados brasileiros. Na semana que passou, a Câmara aprovou o que parece ser uma bondade para os passageiros de aviões, que terão direito a despachar bagagem gratuitamente em voos domésticos ou internacionais.

Por esmagadores 426 votos a 17, os parlamentares ainda incluíram no projeto, que seguirá ao Senado, o direito de marcar sem custos o assento padrão, aquele que não tem espaço extra.

Trata-se de batalha de quase uma década desde que, em 2016, um pacote de normas da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) permitiu a cobrança pelo despacho de bagagem, conforme as práticas internacionais.

A lógica da providência não é difícil de entender: quanto mais bagagem, maiores serão o peso do avião, o consumo de combustível e o custo do voo. Logo, é justo que viajantes que levam malas paguem mais pela passagem.

Do contrário, eles estarão sendo subsidiados pelos demais, visto que os custos terão de ser repassados aos preços. Haverá, ademais, incentivo ao transporte de mais bagagem —assim como acontecia com os tomadores de cerveja dos bares americanos.

Em outros países se encontram companhias aéreas que oferecem tarifas substancialmente mais baixas, sob a condição de que todos os serviços prestados no voo, até um copo de água, sejam cobrados à parte, com transparência. Não surpreende que tais possibilidades não existam por aqui.

As normas de 2016 motivaram uma série de contestações, primeiro na Justiça, depois no Congresso Nacional. Em 2019, os parlamentares aprovaram a volta da proibição de cobrança por bagagem, vetada, sob confessa hesitação, por Jair Bolsonaro (PL). O mesmo ocorreu em 2022.

Não existe gratuidade —alguém sempre tem de arcar com os custos, não raro sem sabê-lo com clareza. Tal entendimento deveria ser mais empregado na avaliação de políticas públicas, da meia-entrada nos espetáculos culturais ao passe livre no transporte coletivo, passando pelas universidades públicas. Sempre se deve verificar quem receberá a benesse e quem pagará por ela.

A sociologia de Lula romantiza o crime

Por o Estado de S. Paulo

Quando Lula disse que traficantes são ‘vítimas’, não foi ato falho. Desde sempre, os ideólogos progressistas absolvem o criminoso e culpam a sociedade. O crime é mero subproduto do meio

Já entrou para a antologia política a declaração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de que os traficantes são “vítimas dos usuários”. Em seguida, temendo os efeitos eleitorais, tentou dizer que a frase foi “mal colocada”. Seus intelectuais de estimação – sempre prontos a traduzir toda estupidez lulista em tese sociológica – contemporizaram: o presidente só queria apontar a cumplicidade do consumo na cadeia do tráfico. Mas não foi ato falho. Para Lula e a esquerda, o crime, numa sociedade capitalista, é mero subproduto do meio, um reflexo das desigualdades. A culpa, portanto, é da sociedade.

De Marx a Foucault, a cada geração os esquerdistas conjuram a fraseologia da “violência estrutural” para dissolver responsabilidades pessoais em sociologia. O criminoso é desconstruído como sujeito ético e reduzido a objeto de forças externas. No lugar da moral, entra o diagnóstico: “contextos de vulnerabilidade”, “ressocialização em meio aberto”, “reeducação psicossocial”. Sob essa semântica profilática, a delinquência vira sintoma, e o delinquente, paciente de uma patologia coletiva diagnosticada por quem jamais esperou um ônibus à noite. E enquanto o crime avança, os criminólogos lapidam eufemismos.

Essa subcultura humanitária não disfarça uma inversão moral: a compaixão pervertida em condescendência. A responsabilização do indivíduo é tratada como opressão burguesa, e a indulgência, como virtude. O progressismo cultiva o marginal como símbolo de “autenticidade social”, enquanto humilha o cidadão comum, que paga impostos e respeita a lei, como hipócrita e alienado. O delinquente virou personagem de “resistência”; o trabalhador, engrenagem da máquina de opressão.

A teologia da inocência universal esquerdista redime vítimas perpétuas e condena culpados abstratos: o “sistema”, o “mercado”, a “herança colonial”. Mas, mais do que um instrumento de satisfação narcísica, essa vitimologia é uma ferramenta de poder: um modo de capturar o monopólio da virtude, exigir mandatos para desconstruir “estruturas” e desmoralizar toda contestação como repressão “fascista”.

Os ideólogos que povoam o governo alternam garantismo e punitivismo ao sabor da conveniência política: rigor contra adversários, indulgência com aliados. É a ética dos “companheiros” travestida de teoria crítica. Os mesmos militantes que celebram terroristas e ditadores recriminam a punição a delinquentes como “violência estatal”. Entre o sentimentalismo e o cinismo, derramam lágrimas para bandidos e fazem selfies com tiranos.

O Comando Vermelho herdou mais que seu nome das milícias marxistas dos anos 1970. Elas lhe ensinaram não só táticas de guerrilha urbana, mas o léxico da guerra cultural. “Paz, justiça e liberdade!”, rezava o lema da facção, enquanto a contracultura glamourizava a bandidagem: “Seja marginal, seja herói!”.

Hoje a esquerda festiva celebra qualquer pichador como um Rimbaud das periferias. Mas essa farsa revolucionária se repete todos os dias como tragédia. Juízes progressistas libertam criminosos com dezenas de reincidências (alegando que o “Estado de Direito” não admite “futurologia”), desativam hospitais de custódia e despejam psicopatas em “ambientes comunitários”. ONGs financiadas por facções filmam documentários sobre “direitos humanos”. Ministros e secretários de Segurança querem enfrentar o crime com assistentes sociais e campanhas de reeducação. O resultado é um país onde o medo é rotina, e a lei, ficção.

A ideologia coitadista fabricou um paradoxo cruel: quanto mais a esquerda se compadece dos criminosos, mais abandona os pobres. O progressismo penal, que se apresenta como gesto civilizatório, é na prática um luxo ostentado por elites protegidas nas torres de marfim da academia ou em condomínios amuralhados. E quem paga a conta são os pobres. São eles que veem seus filhos aliciados, seus bairros sitiados, sua vida devorada por uma guerra estetizada pela retórica progressista.

Nenhuma sociedade pode prosperar quando transforma a justiça em “opressão” e o criminoso em “oprimido”. O Brasil já experimentou o bastante dessa moral bastarda. É tempo de descartar a mitologia de que punir o criminoso é “criminalizar o pobre”. A esquerda quis humanizar o crime. Desumanizou-se a si mesma. E os pobres são punidos todos os dias pelos tribunais da bandidagem.

A reforma subiu no telhado

Por O Estado de S. Paulo

Pressionados pelo lobby dos servidores, deputados começam a retirar assinaturas em apoio à reforma administrativa, o que indica que a proposta tem baixíssima chance de aprovação

A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da reforma administrativa demorou semanas para atingir o número mínimo de assinaturas para começar a tramitar na Câmara, mas o apoio à proposta já começou a minguar. Dos 171 deputados que haviam se comprometido com o texto, ao menos dez já pediram que seus nomes fossem retirados, pressionados por entidades de servidores públicos que divulgaram seus nomes na internet e por manifestações públicas em frente ao Congresso Nacional em que acusam o Legislativo de compactuar com a “demolição do Estado brasileiro”.

O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), tem tentado transformar a reforma administrativa numa marca de sua gestão, e foi a pedido dele que muitos parlamentares assinaram a PEC. Uma vez que o apoio mínimo foi alcançado, a retirada dos nomes não a impede de tramitar, mas indica que as chances de aprovação são baixas. Para ser aprovada, uma PEC precisa de ao menos 308 votos em plenário.

timing para a discussão da proposta, a menos de um ano das eleições, não é favorável. Historicamente, reformas são impopulares e, portanto, são mais facilmente aprovadas no início da legislatura, quando deputados e senadores acabaram de ter os mandatos renovados pelas urnas.

A atitude dúbia do governo também não ajuda. Embora não tenha se colocado frontalmente contra o texto, a ministra da Gestão e da Inovação, Esther Dweck, tampouco deu amparo a ele. O relator, deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), reconheceu que, sem apoio do governo, ela não será aprovada. Já a bancada do PT na Câmara foi taxativa e disse, em nota, que a proposta tem viés “fiscalista e punitivo” e “pouco ou nada se relaciona” com o objetivo de tornar o Estado mais eficiente.

Juízes, procuradores e defensores públicos também têm feito um corpo a corpo com os parlamentares para convencê-los a rever suas posições. A preocupação, por óbvio, é com a defesa de seus penduricalhos, que inflam suas remunerações e fazem com que seus salários superem o teto de R$ 46.366,19, pago aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), e de privilégios como verbas indenizatórias pagas com efeito retroativo, férias de 60 dias e aposentadoria compulsória como punição por faltas graves cometidas por juízes.

Uma série de reportagens e vídeos publicados pelo Estadão mostra os avanços que o texto propunha. A reforma não acaba com a estabilidade do servidor público, mas os novos funcionários públicos teriam de passar por um estágio probatório de até três anos antes de conquistá-la. Haveria limitação para contratação de comissionados e temporários pela União, Estados e municípios. A progressão da carreira seria mais longa e dependeria de avaliação de desempenho, e não somente por tempo de serviço.

A proposta não é perfeita e tem seus equívocos, mas todos eles poderiam ser aprimorados pelos deputados ao longo da tramitação. Um dos principais é o pagamento de 14.º salário para servidores que cumprirem metas de desempenho. A maioria dos municípios brasileiros não tem caixa para esse tipo de pagamento extra e quebraria se tivesse de arcar com mais esse gasto.

Mas tudo indica que a reforma administrativa subiu no telhado, o que é uma pena. O relator parece ter subestimado o poder dos lobbies ao tentar alcançar servidores do Executivo, Legislativo e Judiciário, bem como o funcionalismo público da União, de Estados e municípios. Foi uma estratégia tão ambiciosa quanto arriscada, pois acabou por facilitar a união de grupos que se opõem à proposta por razões muito diferentes.

A esta altura, não se deve esperar muito do Congresso. Os deputados acabaram de aprovar um programa que estabelece um incentivo de até R$ 15 bilhões para a indústria química e reduz as alíquotas de PIS e Cofins pagas pelo setor. Por outro lado, a Câmara rejeitou o estabelecimento de controle de fluxo para os gastos com o seguro-defeso, benefício pago a pescadores artesanais no período da piracema, o que fará com que o governo seja obrigado a pagá-lo mesmo que o valor orçado para o programa tenha sido excedido. Aprovar uma reforma administrativa, portanto, não parece crível.

Cuidar de quem cuida

Por O Estado de S. Paulo

Hospital Oswaldo Cruz leva ao SUS urgente protocolo para cuidadores de idosos com demência

Responder a uma pergunta várias vezes, lidar com uma crise de agressividade e insistir para que o ente querido se alimente ou tome banho. Esses são alguns dos desafios enfrentados por brasileiros que assumem a tarefa de cuidar de um familiar idoso com demência. Na sua maioria são mulheres, mas há também homens, filhos e filhas ou netos e netas, que se dedicam àqueles que precisam de ajuda, compreensão e afeto.

Não raro, o peso dessa rotina implica angústia, estresse e depressão, com o adoecimento de toda a família. Para atenuar esse sofrimento, o Ministério da Saúde traz a boa notícia de que está desenvolvendo um protocolo de terapia em parceria com o Hospital Alemão Oswaldo Cruz, de São Paulo. Batizado de Estratégias para Cuidadores em Demência (Escada), o projeto-piloto é uma adaptação do protocolo britânico Start. Ou seja, foi testado e aprovado.

Conforme afirmou ao Estadão a psiquiatra, epidemiologista e pesquisadora Cleusa Ferri, do Hospital Oswaldo Cruz, essa iniciativa “ressalta a importância de o cuidador também se cuidar”, porque, segundo ela, eles “esquecem de si”. É justamente por isso que o projeto Escada trabalha com princípios cognitivo-comportamentais para que os cuidadores não negligenciem a sua saúde e as suas demandas pessoais.

O Hospital Oswaldo Cruz treina agentes comunitários que replicam o protocolo junto dos cuidadores, que passam por oito sessões, com suporte psicológico e nas quais aprendem técnicas de manejo do estresse. O projeto está em andamento em Vitória (ES), Manaus (AM), Chapecó (SC), Teresina (PI), Cuiabá (MT), Guarapuava (PR) e Benevides (PA).

Os cuidadores são estimulados a refletir sobre o que é a demência e como a sobrecarga do cuidado pode impactar a sua saúde; a reconhecer os padrões de comportamento do idoso e o seu próprio comportamento para evitar gatilhos e reações negativas ou impulsivas; a fortalecer a comunicação com a pessoa com demência e com outros membros da família; a evitar a solidão; a resgatar pequenos prazeres; e a planejar o futuro. Não menos importante, há técnicas de relaxamento, com exercícios de respiração, meditação e alongamento.

O autocuidado, enfim, entrou na agenda do Sistema Único de Saúde (SUS). Já não era sem tempo, haja vista que, segundo o Relatório Nacional sobre a Demência: Epidemiologia, (Re)Conhecimento e Projeções Futuras, divulgado pelo Ministério da Saúde em setembro do ano passado, 8,5% da população com 60 anos ou mais convive com a demência. São nada menos do que 1,8 milhão de brasileiros idosos nessa condição. Para piorar, projetam-se 5,7 milhões de pessoas com demência na terceira idade até 2050.

Tais números mostram que o projeto Escada é mais do que bem-vindo. Com o avanço da expectativa de vida do brasileiro, essa é uma política pública necessária. Oxalá seu teste seja um sucesso e, em breve, essa iniciativa seja replicada por todo o SUS, em todo o País. Só assim serão garantidas saúde mental e qualidade de vida àqueles que cuidam dos seus e precisam cuidar de si mesmos.

A largada da COP30

Por Correio Braziliense

É importante frisar que, apesar de ocorrer no coração da Amazônia, a COP30 também precisa ser vista como um passo essencial para a sustentabilidade de outros biomas.

Cercada de muita expectativa e dúvidas sobre o sucesso de seu propósito, a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas entra na reta final. O presidente Lula chegou a Belém ontem para dar início ao papel de anfitrião do encontro que tem uma difícil missão: obter um entendimento entre as nações a fim de evitar o colapso ambiental em escala planetária. A começar pela escolha da sede — Belém recebeu R$ 5 bilhões em obras de infraestrutura —, o Brasil busca sensibilizar o mundo sobre o momento crítico que a humanidade enfrenta.

Ainda em fevereiro deste ano, o presidente Lula ressaltava o debate que precisa ocorrer na capital paraense. "Nós queremos discutir seriamente. Vão financiar ou não? Na COP de 2009, eu era presidente. Lá os países prometeram 100 bilhões de dólares (…). Não deram. Depois, prometeram 300 bilhões. Não deram (…). Fica cada vez mais difícil", comentou o chefe do Executivo.

Passados oito meses desde essas declarações, o desafio financeiro é patente no Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês). Destinado para remunerar países que atuam pela preservação de patrimônios ambientais como a Amazônia, o TFFF será abordado no próximo dia 6, quando o presidente Lula abrirá a plenária em Belém e dará seguimento às sessões temáticas. Para não ficar apenas no discurso, o governo brasileiro fez um gesto em setembro: durante a participação na Assembleia Geral da ONU em Nova York, Lula anunciou o aporte de US$ 1 bilhão no Fundos das Florestas. A expectativa é de que se chegue a um montante de US$ 25 bilhões até a conclusão dos debates em Belém.

Na última sexta-feira, os organizadores da COP30 anunciaram a participação de 143 delegações entre os 198 países signatários de tratados internacionais relativos à crise climática. As ausências dos Estados Unidos e da Argentina já foram devidamente informadas, em um sinal das divergências profundas que marcam o debate sobre a crise climática.

Mas, em meio a tantas discordâncias, é possível ver iniciativas promissoras. Registre-se, por exemplo, a busca pela sinergia entre meio ambiente e atividades econômicas estratégicas, como o agronegócio. Um exemplo é a mobilização da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Na sexta-feira, a empresa pública entregou ao presidente da COP30, embaixador André Corrêa do Lago, o documento "Contribuições Embrapa para o Mutirão Global contra a Mudança do Clima". Trata-se de um trabalho robusto, realizado por mais de 1.300 participantes, com propostas para a produção do baixo carbono e adaptação da agropecuária às mudanças climáticas. Eis um exemplo que reforça o princípio basilar da COP30: sustentabilidade e desenvolvimento econômico são não apenas compatíveis; são necessários.

É importante frisar que, apesar de ocorrer no coração da Amazônia, a COP30 também precisa ser vista como um passo essencial para a sustentabilidade de outros biomas. Razões científicas amparam esse alerta, como ressaltou a bióloga Mercedes Bustamante, uma das maiores especialistas no Cerrado, em entrevista ao Correio. "O Cerrado é fundamental para a estabilidade ambiental do Brasil e da América do Sul, e sua proteção deve ser uma prioridade na COP30. Estamos falando da savana tropical mais biodiversa, berço de oito das 12 regiões hidrográficas brasileiras", diagnosticou.

Na capital paraense, o Brasil espera que "a Amazônia fale para o mundo", para usar uma expressão do presidente Lula. O sucesso ou fracasso da cúpula não poderá ser creditado ao anfitrião, mas aos conjunto de atores — presentes e ausentes. Trata-se de um desafio que se impõe para as próximas gerações, a fim de interromper a espiral de agressões contra o planeta.

Desafios na mobilidade urbana de Fortaleza

Por O Povo (CE)

A existência de projetos que podem garantir 138 quilômetros de mobilidade melhor para Fortaleza, com extensão de linhas de metrô e outras ações programadas (e contratadas) é um alento para a cidade, na perspectiva de futuro. De acordo com matéria divulgada pelo O POVO, a Grande Fortaleza tem todos esses projetos de mobilidade catalogados até 2054. São previstas três frentes para expansão de metrô (49 km), uma de VLT (9 km) e sete de BRT (80 km). Além disso, o investimento estimado é de R$ 21,6 bilhões.

Os números divulgados fazem parte do Estudo Nacional de Mobilidade Urbana (ENMU), publicado na semana que passou. O levantamento feito para definir os planos de ampliação das redes de transporte público coletivo de média e alta capacidade (TPC-MAC) foi realizado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e pelo Ministério das Cidades.

Os dados mostram que a implementação dos projetos resultará, em Fortaleza, na redução estimada de cerca de 300 mortes em acidentes de trânsito até 2054. Também evitará a emissão de 163,8 mil de toneladas de CO2 por ano bem como reduzirá o custo operacional por viagem em 4%. É prevista ainda a retração no tempo médio de deslocamentos na Cidade, com um impacto previsto em R$ 12,3 bilhões.

Sabe-se que existem muitos desafios numa cidade como Fortaleza, de alta movimentação nas vias, por muitos modais, em grande parte do tempo. A densa quantidade de bairros na malha urbana e o constante deslocamento para atender às necessidades da população, comuns nas grandes cidades, contribuem para essa agitação. A fim de enfrentar essas problemáticas, torna-se fundamental investir em melhorias de infraestrutura para pedestres, motoristas e ciclistas. Dessa forma, pode-se tentar amenizar os impactos negativos. Aliar tudo isso a uma mobilidade sustentável é ainda mais desafiador, mas não impossível.

O serviço de transporte público, de uma forma geral, é essencial nesse sistema. Mesmo com melhorias consideráveis ao longo dos anos, ainda apresenta dificuldades para a população, com entraves que atrapalham o dia a dia de quem se desloca. A superlotação dos coletivos, os engarrafamentos constantes e a limitação do fluxo de algumas vias são obstáculos que fazem parte da mobilidade urbana da capital cearense. Nesse sentido, ouvir os usuários do transporte, incentivando a participação popular para a construção das políticas públicas é essencial.

Para se ter uma ideia, os projetos previstos no Estudo Nacional de Mobilidade Urbana (ENMU) incluem requalificação e extensão de linhas do metrô; implantação, extensão e requalificação de BRTs. Faz-se necessário, por ora, acompanhar o planejamento e a execução desses projetos, cobrando para que as ideias sejam concretizadas. A melhoria da qualidade de vida da população precisa ser o objetivo primeiro, e isso passa necessariamente pela mobilidade urbana cotidiana. 

 

 




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