Entre os mais notáveis residentes dessa época estavam Sigmund Freud, Leon Trotsky, Joseph Stalin e Ludwig Wittgenstein, cada um em diferentes estágios de sua jornada pessoal, mas todos movidos por uma busca insaciável por entendimento e transformação.
Sigmund Freud, o pioneiro da psicanálise, estava em Viena há décadas. Sua prática clínica e suas teorias sobre o inconsciente desafiavam as noções tradicionais sobre a mente humana. Freud via essa cidade como o epicentro de uma revolução silenciosa na compreensão do comportamento humano, uma revolução travada nas profundezas da psique.
Leon Trotsky, na época, estava exilado da Rússia czarista e residia em Viena, onde escrevia para um jornal revolucionário. Articulava suas ideias sobre a revolução socialista e o papel da classe trabalhadora na luta contra a opressão da monarquia russa. Para Trotsky, Viena representava um lugar de relativa liberdade para organizar a oposição no exílio e planejar um futuro grandioso para sua pátria.
Joseph Stalin, ainda conhecido como Koba, estava em Viena por um breve período, também exilado e em busca de refúgio. Era um verdadeiro trabalhador em prol da revolução, profundamente envolvido com as atividades do partido. Entre os citados, era sem dúvida o nome menos conhecido, mas suas ambições já eram evidentes para aqueles que o conheciam.
Ludwig Wittgenstein, um jovem filósofo austero e introspectivo, estava na cidade durante uma pausa de seus estudos em Cambridge. Absorvido em questões de lógica e linguagem, já começava a delinear as ideias que mais tarde formariam a base de seus estudos. Para ele, Viena era um lugar onde as questões sobre o significado e a expressão podiam ser exploradas em meio ao ruído do mundo real.
O Lorde Rudolf von Lichtenberg, um aristocrata excêntrico e mecenas da intelectualidade vienense, fascinado por debates, decidiu convidar algumas mentes brilhantes para discutir e buscar influenciar o futuro da Europa e, talvez, do mundo. A reunião visava juntar esses quatro personagens. Von Lichtenberg, conhecido por suas excentricidades, estava convencido de que a força dessas ideias em ebulição poderia dar origem a uma nova era, ou ao menos lançar luz sobre os tempos conturbados que se aproximavam rapidamente.
A carta-convite enviada aos participantes era direta, mas provocativa: — Em tempos de transformação, as mentes que melhor compreendem o passado e desafiam o presente são as únicas capazes de moldar o futuro. Reúnam-se em meu salão, a história pede sua contribuição.
O salão estava repleto de livros antigos e mobília de época, com um leve aroma de tabaco impregnado no ar. Após algumas formalidades, a conversa se volta rapidamente para os tópicos que mais consumiam suas mentes: o iminente colapso do mundo como eles conheciam e as possibilidades de construir algo novo a partir das cinzas.
Antes do início dos debates, um serviçal serve bebidas, charutos e quitutes a todos, ficando à postos no canto da sala, para não deixar que nada falte aos ilustres convidados.
Freud abre o debate, visivelmente preocupado:
— Estamos diante de uma época de tensões
incontroláveis, tanto dentro do indivíduo quanto na sociedade. A guerra não é
apenas uma possibilidade, é uma consequência inevitável das repressões internas
que cada um carrega. A psique humana está em um estado de conflito perpétuo, e
a civilização não é mais do que uma camada fina que esconde nossos instintos
mais primitivos. Vejam, por exemplo, o nacionalismo crescente — é um exemplo
evidente do retorno ao instinto tribal, do desejo de destruir o “diferente”.
Trotsky, profundamente idealista, contesta:
— Camarada, a psique, como você a descreve, é
moldada pelas condições materiais da sociedade. É o sistema de opressão que
gera essas tensões internas. Liberte o homem das correntes do capitalismo e ele
florescerá em algo novo, algo melhor, um novo ser humano em todo seu potencial.
A verdadeira causa do conflito está fora, portanto, externo, não dentro. A
Revolução Francesa, por exemplo, foi impulsionada pela necessidade de
sobrevivência e justiça, não por impulsos inconscientes.
Stalin, analisando de forma mais prática, interrompe:
— Libertar o homem é um conceito romântico e
muito subjetivo. O poder nas mãos dos trabalhadores isso sim é real. E quem
detém o poder hoje são as elites burguesas, e essas controlam a sociedade,
controlando assim as ideias. Portanto, até mesmo a psique humana que você tanto
fala, Freud. Com esse controle opressivo, toda essa conversa é apenas filosofia
simplista. Basta olhar para a Rússia: sem a disciplina do partido, qualquer
movimento revolucionário cairá em uma semana.
Freud, não ficando intimidado, responde:
— E é precisamente esse controle que alimenta
o conflito. O que você chama de poder, Koba, é apenas uma outra forma de opressão.
A mente humana não se submete facilmente; ela se rebela, e é isso que estamos
prestes a ver em uma escala global. Não é apenas uma revolução externa, mas
interna, uma revolta contra os limites impostos à nossa liberdade. Veja o
movimento expressionista na arte, que busca romper com as formas tradicionais —
é a psique buscando desesperadamente se libertar.
Wittgenstein, até então observando com calma, finalmente intervém com uma reflexão aparentemente mais abstrata:
— O que todos vocês parecem ignorar é que
nossas discussões são, em última análise, sobre a forma como entendemos o mundo
através da linguagem. “Revolução”, “poder”, “psique” — essas palavras moldam
nosso entendimento, mas são apenas representações figurativas. Nossa luta não é
apenas contra as estruturas do poder ou os impulsos reprimidos, mas contra as
limitações do nosso próprio pensamento. Pensem na confusão gerada por termos
vagos como “justiça” e “liberdade”; o que significam, realmente? Será que
significam o mesmo para cada um de nós aqui nessa sala? Já pensaram nisso?
Trotsky, intrigado, desafia:
— Wittgenstein, está sugerindo que nosso
maior inimigo é a semântica? Qual palavra usamos para articular nossos sonhos
de liberdade e justiça? Isso não parece uma questão prática no mundo real, para
os milhões de trabalhadores que enfrentam a opressão diariamente. A linguagem
não muda a necessidade de pão e dignidade. A linda experiência da Comuna de
Paris não foi derrotada por palavras, mas por balas e canhões.
Wittgenstein, sem se abalar, responde:
— Exatamente, o que você não percebe é que
não há discordância concreta entre nossos pensamentos. A prática e a teoria não
estão tão separadas quanto você imagina. A forma como pensamos determina a
forma como agimos. Se não compreendermos os limites de nossas próprias
concepções, estaremos destinados a repetir os mesmos erros, apenas mudando as
bandeiras e os slogans, mas cometendo os mesmíssimos erros. A guerra que parece
se aproximar é o resultado de conceitos nacionais e étnicos mal definidos, até
fundamentalmente inexistentes, usados para mobilizar massas em nome de um
“inimigo” que na verdade foi inventado por interesses inconfessáveis.
Stalin, visivelmente impaciente, retruca:
— Palavras não ganham batalhas, muito menos
derrubam governos. Apenas agitação, organização e propaganda fazem isso, e
apenas dessa forma podemos fazer a revolução, e assim levar as massas ao poder.
Você, Wittgenstein, fala de limites de pensamento, mas não vê que a história é
feita pela ação, pela força coletiva e em último caso pela aniquilação do velho
regime. Sem isso, a revolução que Trotsky tanto deseja nunca passará de uma
utopia, repleta de boas inteções mas fadada a virar literatura de ficção.
Freud, normalmente contido, deixa escapar um suspiro de exasperação e remove os óculos, esfregando os olhos com visível cansaço:
— Koba, você me faz lembrar meus pacientes mais resistentes. Quanto mais negam que há algo errado, mais evidente se ressalta o problema.
Recoloca os óculos e olha diretamente para Stalin:
— Diga-me, quando foi a última vez que você
dormiu uma noite inteira sem pesadelos?
Um silêncio desconfortável preenche o salão. Stalin congela por um momento, o cigarro suspenso entre os dedos. Seus olhos estreitam-se, mas algo na pergunta o desestabiliza.
Freud, tentando mediar os extremos, propõe uma síntese:
— Talvez o que precisamos seja uma
compreensão mais holística. Sim, o poder é necessário para a ação, mas sem um
entendimento profundo das motivações humanas, das forças inconscientes,
qualquer revolução está fadada a se tornar apenas mais uma forma de tirania. E,
Wittgenstein, sua ênfase na linguagem é válida, mas devemos lembrar que, por
trás das palavras, há emoções e desejos que as moldam. Aceito que a verdadeira
mudança precisa considerar tanto o interno quanto o externo. A tragédia das
guerras são a repetição dos mesmos impulsos de poder que sempre dominaram a
história.
Trotsky, aproveitando a deixa, comenta:
— Então chegamos ao acordo que qualquer
transformação verdadeira deve ser tanto interna quanto externa, mas não podemos
esquecer que há uma urgência. O mundo está à beira de um colapso, e as massas
não podem esperar por uma revolução do espírito. Elas precisam de comida,
trabalho e dignidade. E isso exige ação concreta, imediata, não apenas
reflexão.
Wittgenstein, surpreendentemente, levanta-se e caminha até a janela, observando a avenida Ringstrasse iluminada. Sem se virar, diz com uma simplicidade desconcertante:
— Vocês todos falam de “as massas” como se
fossem uma abstração. Lá fora há um vendedor de castanhas que me vendeu seu
produto ontem. Ele tem três filhos. O mais novo está doente. Esse homem não se
importa com suas teorias — ele quer saber se o filho vai sobreviver ao inverno.
Vira-se para o grupo, com intensidade incomum:
— Talvez a verdadeira questão seja: como
nossas palavras grandiosas se traduzem em uma castanha quente nas mãos de uma
criança faminta?
Trotsky olha para Wittgenstein com renovado respeito, surpreso pela guinada pragmática do filósofo.
— E talvez seja aí que resida o verdadeiro
desafio: como equilibrar as necessidades prementes do presente com a
compreensão mais profunda das raízes de nossos conflitos? Porque, sem essa
compreensão, qualquer vitória será superficial e temporária. O conflito que se
avizinha não será apenas um conflito entre nações, mas um reflexo das tensões
internas de toda nossa civilização. As armas, destruição e mortes – tudo isso
será apenas uma manifestação externa dos nossos impulsos mais primitivos
reprimidos.
Trotsky, refletindo sobre as palavras de Freud, acrescenta:
— Talvez, mas a história nos ensina que as
condições materiais moldam a consciência. A Independência Americana, Revolução
Francesa, todas foram movidas pela fome, pela opressão tangível. A teoria é
vital, Freud, mas o impulso revolucionário nasce das ruas, fábricas, do campo,
ou seja, da vida como ela se apresenta de verdade. Como eu disse lá atrás, a Comuna
de Paris caiu porque faltou uma organização centralizada e disciplinada, não
porque falharam em compreender os desejos internos dos homens.
Mas então Trotsky hesita, olhando para seu próprio reflexo no espelho veneziano da parede. Sua voz baixa levemente:
— Embora… devo confessar que às vezes, nas
noites de insônia, me pergunto se estamos preparados para o que virá. Se a
revolução triunfar, será que teremos a sabedoria necessária para não repetir os
erros dos tiranos que derrubamos?
Ele olha para Stalin, quase suplicante:
— Koba, você nunca se pergunta isso? Se
seremos capazes de comandar com poder
absoluto sem que ele nos corrompa absolutamente?
Stalin, concordando com Trotsky, complementa:
— Exatamente, isso Camarada, a história não é
feita por teóricos em salões confortáveis, mas por aqueles dispostos a sujar as
mãos e fazer o que deve ser feito. As concessões que ocasionalmente possamos
fazer podem ser necessárias para ganhar um apoio mais amplo, mas,
eventualmente, deverá ser o partido formado pelo povo, quem ditará os termos
pelo bem deste mesmo povo. A psique humana que você tanto explora, Freud, é
apenas um detalhe, não digo que menor, mas que será superado quando o povo
detiver os modos de produção, e romper os grilhões da opressão burguesa, pois
nesse momento surgirá uma nova humanidade e por conseguinte uma nova psique
humana.
Stalin pausa, acende um novo cigarro com mãos que tremem quase imperceptivelmente. Por um breve momento, a máscara de ferro cai:
— Vocês falam de utopias e teorias, mas sabem
o que eu vi na Sibéria? Homens que começaram como revolucionários puros e
terminaram como monstros. O exílio… o exílio, tortura, dor, morte, tudo isso, muda
as pessoas.
Sua voz fica mais baixa, quase um sussurro:
— Às vezes me pergunto se não estamos todos
condenados a nos tornar aquilo que combatemos. Se o poder não nos devorará como
devorou todos os que vieram antes. Se a revolução devora seus filhos, será que
abusar do poder é um reflexo inexorável disso tudo?
Então, como se percebesse sua vulnerabilidade totalmente exposta, muda novamente o semblante:
— Mas não há espaço para dúvidas. A história
não perdoa os vacilantes.
Freud, claramente insatisfeito com a observação de Stalin, responde com uma intensidade renovada:
— O que você vê como um detalhe é, na
verdade, o cerne de toda a nossa civilização. Se ignorarmos a natureza humana –
os desejos, os medos, os traumas – a construção de qualquer ordem social, seja
socialista, nacionalista ou capitalista, estará sempre condenada a falhar. O
inconsciente coletivo buscará formas de expressar sua insatisfação, e se isso
não for compreendido e integrado, surgirão novos conflitos, e tudo recomeçará
novamente e novamente, seja como revolução ou mais uma guerra.
Wittgenstein, tentando aproximar os pontos de vista com uma perspectiva mais filosófica, sugere:
— E se todos nós estivermos presos a um erro
fundamental? Vocês falam de revoluções externas e internas como se fossem
processos separados, mas o verdadeiro limite pode ser a nossa incapacidade de
ver além das nossas próprias e limitadas categorias de pensamento. Tomemos o
conceito de “poder”: para Stalin, é força; para Freud, é um jogo entre
repressão e expressão; para Trotsky, é uma ferramenta de emancipação popular.
Mas, e se “poder” for apenas uma palavra vazia que muda de forma conforme a
nossa necessidade de sentido? Será que não deveríamos primeiro questionar o
próprio alicerce sobre o qual estamos construindo essas ideias?
Trotsky, movido pela provocação, rebate:
— De verdade aceito a sua premissa,
Wittgenstein. O que sugere, então? Que abandonemos a luta porque nossas
palavras são imperfeitas? E que podem não refletir em completude o conceito
individual que pensamos cada um e todos nós? A sociedade não pode esperar por
uma resolução final linguística enquanto morre hoje de fome. Sim, a linguagem
pode ser limitada, mas a necessidade de mudança é urgente e podemos
precificá-la em vidas perdidas todos os dias.
Wittgenstein, com um sorriso enigmático, retruca:
— Não sugiro inação, mas consciência.
Entender que nossas ações são moldadas pela forma como pensamos sobre elas pode
evitar que caiamos nos mesmos erros de nossos antecessores. Considere a
ascensão dos nacionalismos extremistas: elas prosperam sobre a simplificação da
linguagem – “pureza”, “ordem”, “deus”, “pátria”, “família”. A linguagem cria
realidades, mas também as distorce. Precisamos estar atentos a como definimos
nossos propósitos e a quem servem essas definições.
Stalin, impaciente com os jogos de palavras, levanta-se abruptamente:
— Enquanto vocês perdem tempo com abstrações,
toda Europa está se armando para a guerra. Cada dia de inação é um dia perdido
para resolver o conflito antes que esse comece. Eu, por exemplo, prefiro estar
no campo de batalha onde as decisões realmente são tomadas, onde a vitória não
depende de palavras, mas de ação. Se for preciso, tenho determinação para tomar
essas decisões, por mais difíceis que possam ser. Como sei também, que nenhum
de vocês teria estômago para fazer o que é preciso, fazer mesmo quando se é filosoficamente
contrário ao que deve ser feito, eu tenho essa fibra vocês claramente não.
Freud, observando Stalin, murmura com uma voz cheia de presságio:
— Essa é exatamente a antessala da tragédia:
a crença ilusória de que a força bruta e voluntarismo é a solução para os
problemas humanos. Isso historicamente é o que nos leva aos mesmos ciclos de
violência. A mente humana é um campo de batalha muito mais complexo do que
pensam, e sem uma verdadeira compreensão e integração e enfrentamento de nossos
próprios demônios, continuaremos a repetir as mesmas tragédias, apenas com
novas roupagens em um eterno círculo vicioso.
Trotsky, pensativo, conclui com um tom de esperança cautelosa:
— Talvez, então, o verdadeiro desafio de
nossa geração seja tentar unir essas perspectivas: reconhecer que precisamos da
firmeza de propósito de Koba, da compreensão da mente humana de Freud e da
cautela filosófica de Wittgenstein. A utopia, como compreendo agora, não é um
estado estático, ou um projeto definitivo, mas um esforço contínuo para
equilibrar o poder, compreensão e a sabedoria, em um processo tanto coletivo
quanto individual de crescimento de toda humanidade.
Wittgenstein, olhando para o horizonte além das janelas do salão, murmura quase para si mesmo:
— Ou talvez a utopia seja simplesmente um
jogo de linguagem, uma meta que muda conforme tentamos defini-la, e ao chegar
ao ponto que buscávamos ela já não está mais lá e sim muito mais à frente, e
assim sucessivamente. Talvez, ao buscar respostas definitivas, estejamos
perdendo de vista a verdadeira questão: como viver com nossas incertezas, como
fazer paz com os paradoxos que somos e ainda assim aceitar nossas incertezas.
A conversa continua em uma teia complexa de ideias e confrontos intelectuais, refletindo as diversas visões e os brilhos individuais que definem cada um dos participantes. Trotsky visualiza um mundo sob a utopia proletária, Stalin vê a necessidade de fortalecer cada conquista antes de seguir adiante, Freud insiste na importância basilar de entender o inconsciente sem o qual nenhuma possibilidade de completude é possível, já Wittgenstein desafia a todos a repensar as bases de suas certezas, questionando até os fundamentos do que chamamos de realidade.
Enquanto o debate flui, de pé no fundo do salão, quase imperceptível aos olhares das grandes personalidades, estava o serviçal do Lorde. Ele está atento a cada palavra da acalorada discussão, embora sua presença fosse insignificante aos convidados. Absorvia tudo com muito interesse e um profundo silêncio.
Esse jovem, cujo destino se entrelaçaria tragicamente com o futuro da Europa, era chamado Adolf Hitler. Pintor fracassado que, sem conseguir se destacar, havia aceitado o trabalho humilde na casa de Lichtenberg. Nos intervalos entre suas tarefas, ele se dedicava a leituras ultranacionalistas, alimentando uma visão cada vez mais sectária e odiosa do mundo. Desconhecido pelos gigantes que ali debatiam o futuro do mundo, sua sombra em breve começaria a se projetar sobre o futuro.
Ao final da tarde, o anfitrião Von Lichtenberg observa atentamente seus convidados se despedirem ao final dos debates, e este reflete sobre o peso histórico daquele encontro. Embora sua tentativa de influenciar diretamente os destinos de seu tempo fosse ambiciosa, ele sabia que cada uma daquelas personalidades deixaria marcas indeléveis na história, por caminhos distintos, mas inevitavelmente marcantes.
Cada um desses homens sairia para seguir seu próprio destino, levando consigo as marcas daquele encontro: uma reunião improvável de mentes em um momento de crises e oportunidades, no futuro perceberíamos que aquele instante era um ponto de virada na trajetória dos povos.
Viena naqueles dias tornara-se um ponto de convergência para algumas das ideias mais poderosas e perigosas do século, um microcosmo das tensões que logo iriam explodir no palco da história global. A cidade, como seus célebres moradores, estava à beira de uma transformação — uma transformação que seria tanto uma promessa quanto uma ameaça, conforme o velho mundo começava a desmoronar e um novo, cheio de incertezas e esperanças, começava a emergir.
Quanto ao jovem pintor fracassado que vagueava pelas sombras, este deixaria de ser apenas uma figura marginal. Brevemente no futuro, se tornaria a figura mais trágica e destrutiva de todas, conduzindo o mundo à maior guerra que a humanidade já havia testemunhado. Como Freud previra, essa guerra seria alimentada pelas forças reprimidas do inconsciente coletivo — um conflito nascido da luta pelo poder, do ressentimento e do ódio forjado na distorção da linguagem e na exclusão do outro.
Assim, Viena, em 1913, era o prenúncio de uma enorme tempestade. As pessoas que ali viveram, intelectuais, revolucionários e ditadores em potencial, carregavam em si as sementes de um século de conflitos e revoluções. E a cidade, que um dia fora o epicentro do pensamento livre e da cultura, ficaria para sempre associada a um momento na história, ao ponto de virada que transformou o mundo indubitavelmente para sempre.
*Cláudio Carraly – Advogado, ex-Secretário Executivo de Direitos Humanos de Pernambuco

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