sexta-feira, 12 de dezembro de 2025

Hugo Motta é a atração maior do circo do acordão de Natal. Por Marcos Augusto Gonçalves

Folha de S. Paulo

Poderes negociam acerto afobado que garanta as regalias e blindagens de cada parte

Lula, feitas as contas, não tem muito do que se queixar, como ele mesmo declarou

O presidente da Câmara, Hugo Motta, tem atributos cênicos para inspirar um desses personagens esquisitos de séries de streaming. Mas isso é apenas um gracejo inconsequente para falar da grande estrela midiática desse circo do acordão de Natal que vem sendo negociado no shopping center de nossa política institucional.

Por essa geringonça, os Poderes, dobrados por interesses corporativos e eleitorais, negociam um acerto meio afobado que garanta as regalias e blindagens de cada parte, mantendo-se o grande pacto da indulgência que preside o sistema.

Pode-se argumentar que se trata de fazer política, e é isso afinal que está em curso. Não deixa de ser verdade, mas que política rastaquera é essa, que mais lembra um ajuste entre famílias mafiosas como vemos em filmes do gênero?

O auge do espetáculo foi a tumultuada aprovação pela Câmara do chamado PL da Dosimetria, pelo qual se mudou a legislação sobre golpe de Estado e abolição violenta do Estado de Direito. A sessão, como se sabe, deu lugar a mais uma demonstração de incompetência, falta de liderança e apequenamento institucional de Motta, que mandou censurar a imprensa antes de convocar a polícia para remover o deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) de sua cadeira.

O PL, aprovado sob medida para amenizar as penas aplicadas a golpistas julgados pelo STF, causou aguda revolta na esquerda. Não poderia ser diferente, mas o fato é que esse caminho já tinha aparecido nas contas governistas.

Em abril, lembre-se, a ministra Gleisi Hoffmann, ao rebater a ideia inaceitável de anistia para o capitão e sua camarilha, ventilou como moeda de troca mais palatável a redução de penas. Agora, o roteiro indica que Lula, em encenação histórica, vetará, já sabendo porém que seu veto será derrubado.

O Supremo, por sua vez, depois da provocação monocrática do decano Gilmar Mendes, que legislou numa canetada sobre o processo de impeachment de ministros, acabou chegando a um bem bolado com o Senado, que vai rever a lei sobre o tema, de fato problemática.

A Câmara, em outra frente, acabou reafirmando uma derrota para o tribunal ao decidir que cabe a ela deliberar sobre mandatos. O que é isso, porém, perto do grande alívio da operação abafa do caso Master liderada por Dias Toffoli no Supremo?

Para a direitona, além da dosimetria, Papai Noel entregou o PL do Marco Temporal, descalabro que se segue à derrubada de vetos de Lula na lei do licenciamento ambiental. Já o governo foi contemplado com mudanças no PL Antifacção e abraçou o SenadoDavi Alcolumbre a essa altura talvez já nem se lembre muito bem quem é Jorge Messias.

É verdade que nem tudo foi champanhe e harmonia no acordão natalino, mas seria difícil que fosse num ambiente tumultuado pela chegada do ano eleitoral e sacudido pela acalorada competição no arraial da direitona, com o desespero bolsonarista e as indefinições flavistas e tarcisistas sobre a disputa.

O presidente Lula, feitas as contas, não tem muito do que se queixar, como ele mesmo, aliás, declarou. Soube ganhar e perder na relação com o Congresso e acabou garantindo o que de mais substancial precisava para tocar a reeleição. Não repete um fenômeno de popularidade fora da curva, mas está aí para quem quiser apoiar e levar.

 

 

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