Folha de S. Paulo
Presentes influenciam decisões, mesmo que
presenteados não se deem conta disso
Se ministros do STF descartarem adoção de código de ética cometerão haraquiri moral
Quase tão ruim quanto pegar
carona em jatinhos de empresários cujos casos julgará, é o juiz insistir
que não precisa sujeitar-se a um código de ética porque já é ético. Mesmo
que comprássemos pelo valor de face a tese de que nossos valorosos magistrados
nunca se vendem, ainda restaria que eles têm um cérebro humano, e cérebros
humanos são facilmente sugestionáveis.
A literatura psicológica ensina que viagens, refeições e até brindes de valor irrisório predispõem as pessoas em favor de quem dá o presente, mesmo que elas não se deem conta desse efeito. Até não muito tempo atrás, médicos juravam de pés juntos que não eram afetados pelos mimos fornecidos por laboratórios. Mas aí vieram os dados...
Numa metanálise clássica de 2000 que sempre
cito aqui,
Ashley Wazana mostrou que pagar uma viagem para um profissional de saúde
aumentava entre 4,5 e 10 vezes a probabilidade de ele receitar as drogas
produzidas pela empresa patrocinadora.
Ora, se uma viagenzinha de fim de semana mais
do que quadruplica a chance de o alvo da investida agir com parcialidade, de
que prodígios não será capaz a transferência de R$ 3,6 milhões mensais para o
escritório de advocacia da família?
A menos que os ministros queiram cometer um
haraquiri moral, têm não só de aceitar um código de ética como fingir que o
defendem desde criancinhas. E receio que não possa ser um código de pegada mais
idealista como
o adotado pela suprema corte alemã, que privilegia a transparência. Dado o
estado de coisas por aqui, penso que é preciso também desenhar o que não
pode. Jatinhos?
Só se for UTI aérea.
Seminários no exterior? Nunca. Não há teoria
jurídica que possa ser exibida num hotel luxuoso de Londres que também não
possa ser apresentada numa sala abafada de universidade pública brasileira.
Regular a ação de advogados-parentes é mais complicado, mas precisamos tentar.
Fica difícil para pobres colunistas como eu
defender o Judiciário enquanto instituição se seus mais destacados membros se
esmeram em desmoralizá-lo.
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