quinta-feira, 17 de julho de 2008

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

LÁ, COMO CÁ
Celso Ming

O estrago da inflação sobre a vida do americano médio é maior do que os especialistas vinham prevendo.

Ontem saiu o Índice de Preços ao Consumidor (CPI, na sigla em inglês). Acusou um avanço de 1,1% sobre o mês anterior, substancialmente maior do que o 0,7% com que as projeções vinham trabalhando. No período de 12 meses terminados em junho, a inflação foi de 5,0%. Apenas para comparar, o IPCA brasileiro foi de 0,74% em junho e atingiu 6,06% em 12 meses.

O combustível para o disparo desse foguete é a alta dos alimentos mais a da energia (petróleo e derivados). Se esses dois componentes fossem tirados da lista - como gosta de argumentar o ministro da Fazenda, Guido Mantega, em relação à inflação brasileira -, em junho a inflação americana não teria passado de 0,3% e, em 12 meses, dos 2,4%.

Nos Estados Unidos, os preços assim expurgados constituem o núcleo da inflação (core inflation), usado como referência para a definição dos juros pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano).

Essa fantasia estatística não serve de refresco para o consumidor americano. Ninguém pode parar de se alimentar e, por lá, as condições de consumo são tais que também é difícil deixar de queimar a mesma quantidade de combustível.
Na prática, isso significa que, na planilha mensal de despesas, as famílias americanas estão gastando mais em comida e em combustível. Assim, sobra menos do salário para as demais despesas.

Em condições normais, o Fed já teria usado seu arsenal de política monetária (política de juros) para derrubar a inflação. Mas o atleta está com sérias lesões musculares. Puxar pelos juros seria obrigá-lo a disputar uma maratona.

A economia dos Estados Unidos está sobrecarregada com problemas agudos. A crise do mercado imobiliário provocou uma trombose no crédito; enorme quantidade de bancos (pequenos, médios e até grandes) está ameaçada por problemas de liquidez. Grandes empresas enfrentam grave retração do mercado. Assim, um aperto monetário agora parece impraticável. O Fed está dando prioridade a manter a economia com o nariz fora da lâmina d’água. Os juros básicos (Fed funds) nominais a 2,0% ao ano continuam fortemente negativos.

A síndrome de inflação alta e juros negativos, por sua vez, produz outra distorção e um círculo vicioso. A distorção são rendimentos também negativos nas aplicações financeiras. As Notas do Tesouro americano de 2 anos, por exemplo, vêm pagando uma remuneração ao redor dos 2,4% ao ano e as de 10 anos, cerca de 3,9%.

Tudo isso ajuda a derrubar o dólar no câmbio internacional. Como a moeda americana é a principal unidade de conta do planeta, os preços das commodities tendem a subir em conseqüência dessa desvalorização e isso turbina a inflação. É o círculo vicioso.

Tudo isso, por sua vez, é parte de um enorme processo de ajuste cuja trajetória é incerta. Não se sabe sequer se será suficiente para dirimir as distorções.
O Brasil está no meio dessa chuva. Mas, a acreditar na percepção geral, vai sair dela melhor do que quando entrou. Assim seja.

CONFIRA

Eclipse - A Operação Satiagraha, que expôs manobras do banqueiro Daniel Dantas supostamente contrárias ao interesse público, produziu efeito previsível: escondeu ou deixou ao quase esquecimento outros escândalos que antes tomavam o espaço dos jornais e do noticiário das TVs. Quase não se fala mais do advogado Roberto Teixeira e de seu jogo no caso Varig.

Safra boa - Mais alguns dias e sairão os balanços semestrais dos grandes bancos. O mercado já espera pelos habituais lucros fantásticos. Por conta disso, ontem as ações do Itaú subiram 9,1%; do Bradesco, 7,2%; do Unibanco, 7,6%; e do Banco do Brasil, 4,0%.

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