ONDE PAROU A MUDANÇA?
Luiz Carlos Azedo
Luiz Carlos Azedo
O Bolsa Família virou um mecanismo de reprodução eleitoral do “sistema de poder” que Lula está montando
O Brasil teve dois processos significativos de inclusão de massas à sociedade de consumo, por meio da ação decisiva do Estado. O primeiro, a partir da Era Vargas, ocorreu com a industrialização, a legislação trabalhista e o sindicalismo oficial. O segundo, no governo Lula, com a instituição do Bolsa Família e de outros programas de transferência de renda. Ambos fortaleceram os carismas de seus criadores, os presidentes Getúlio Vargas e Luiz Inácio Lula da Silva. Vargas virou mito graças ao seu suicídio, em agosto de 1954; Lula ainda não é um mito, isso dependerá do desfecho de seu governo.
Adeus às ilusões
O populismo de Vargas subjugou o pensamento da esquerda brasileira, reduzindo-o ao nacionalismo. Combater o latifúndio e o imperialismo, as duas pragas que impediriam a industrialização, na década de 1930, representava ser moderno e progressista. O projeto da esquerda era um capitalismo autárquico, alavancado pelo setor produtivo estatal e liderado pela burguesia nacional, como via para emancipação do país. Apesar dessa retórica, o Brasil se industrializou com forte presença do capital estrangeiro e o latifúndio prosperou com uma agricultura moderna e competitiva. E mais: a maioria da população foi incorporada à produção.
O choque entre esse desenvolvimento real e o nacional-populismo ideológico desaguou no golpe militar de 1964. Os militares no poder fizeram uma reforma do Estado, modernizaram o sistema bancário, integraram o país por meio das rodovias e da comunicação por satélite, expandiram a geração de energia, a siderurgia e a petroquímica, além de estabilizar as relações sociais no campo com o Estatuto da Terra. A concentração de capital, a partir do sistema financeiro, legou ao país uma sociedade mais complexa e, contrariando o “Ame ou deixe-o”, mais pluralista. Dessa contradição emergiu, com a Constituição de 1988, uma democracia de massas (hoje somos 125 milhões de eleitores).
Nova esperança
O Brasil urbano que surgiu dos anos 1990 estava à frente da retórica terceiro-mundista. A desigualdade social exigia respostas novas da democracia: de um lado, um setor moderno da economia, com operários altamente qualificados e uma classe média instruída; de outro, a massa de miseráveis alimentada por sobras da sociedade de consumo e comunidades rurais em regime de subsistência. A Nova República fundada por Tancredo Neves e encarnada por José Sarney havia frustrado a esperança de mudança social. Esse passivo foi a força motriz da eleição de Fernando Collor, que utilizou com maestria as ferramentas do marketing para atropelar os adversários e chegar ao poder. Lançou por terra velhos discursos políticos, agora anacrônicos diante da globalização e da hiperinflação.
Lula (PT), Ulisses Guimarães (MDB), Mário Covas (PSDB), Leonel Brizola (PDT), Roberto Freire (PCB) foram derrotados. Apesar do confisco da poupança, Collor executou um programa econômico liberal cujo eixo foi a abertura comercial. Mas foi um governante desastrado e acabou apeado do poder por esses políticos que havia derrotado, respaldados por um forte movimento de classe média, sobretudo estudantil. Sua agenda de modernização do Estado e da economia, mesmo rejeitada pelo presidente Itamar Franco, foi parar no colo de Fernando Henrique Cardoso, que operou soluções mais competentes e compatíveis com o espírito republicano. A crise de financiamento do setor público foi superada com o programa de privatizações e um duro ajuste fiscal, que incluiu a reforma da Previdência. Pela primeira vez, desde a segunda metade da década de 1960, o país teve uma moeda estável, o Real, o que deu dois mandatos a FHC.
A vitória de Lula nem de longe foi uma ruptura com essa agenda. O “mais do mesmo” — câmbio flutuante, superávit fiscal e juros altos — ainda garante a estabilidade da moeda. A abertura comercial , apesar de assimétrica, continua. Entretanto, Lula é cada vez mais intervencionista na economia e nos grandes negócios cooptou as lideranças sindicais e populares e desmobilizou a sociedade civil. Sua política assistencialista, que “focaliza” o gasto social nos mais pobres e faz a diferença, carrega uma contradição: lançou 46 milhões de pessoas ao consumo, mas não à produção, mantendo-as dependentes do Estado. Com isso, o Bolsa Família virou um mecanismo de reprodução eleitoral do “sistema de poder” que Lula está montando. É aí que parou a mudança.
Onde está a mudança?
ResponderExcluir- aumento substancial do salário-mínimo, que não passava dos 70 dólares durante décadas e hoje é equivalente a 220 dólares.
- aumento do salário médio dos brasileiros
- redução gradual da mortalidade infantil, fato elogiado pela OMS
- redução do analfabetismo e aumento da inclusão universitária, fato elogiado pela UNESCO
- redução da miséria e morte por inanição por meio de programas de renda mínima e segurança alimentar, elogiado pela FAO
- redução do desemprego, mobilidade social para 30 milhões de brasileiros, que ascenderam das classes E e D para a D e C, respectivamente.
- superação da crise considerada como 'a pior desde a grande depressão'
- reconhecimento internacional amplo - além dos elogios explícitos de revistas como The Economist e Time, Lula recebeu vários prêmios como estadista e homem de prestígio internacional.
- política externa não alinhada automaticamente às das grandes potências, com independência de ação e pensamento
- pagamento da dívida histórica com o FMI, que colocava o Brasil de joelhos perante aquele órgão
- redução gradual do desmatamento amazônico, medido pelo INPE e por satélites americanos - em 2009 obtivemos o menor índice de desmatamento em três décadas
- melhora da relação dívida (interna + interna) / PIB: era de 56% em 2002, hoje é de 40%
- redução gradual da SELIC (taxa básica de juros) de um patamar que ultrapassava 20% ao ano, chegando a 26,3% em maio de 2003, para menos da metade (entre 8 e 9,4%) desde junho de 2009.
- retomada da construção naval
- construção do gasoduto do sul (em andamento)
- construção de refinarias (em andamento)
- construção de usinas hidroelétricas (em andamento)
- inauguração de 10 universidades públicas
- inauguração de escolas técnicas
- interligação das bacias do S.Francisco e do Parnaíba (em andamento)
- início da exploração do petróleo no pré-sal
Tudo isso com estabilidade e crescimento, apesar da enxurrada de factóides espalhados pela mídia tucana e repercutidos por meios de uma esquerda duvidosa.
F.Prieto