quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Na expectativa da onda vermelha


Rosângela Bittar
DEU NO VALOR ECONÔMICO


Nas eleições municipais de 2004, portanto antes de estourar o escândalo do mensalão, que desnudou e desestabilizou o partido, o PT fez a previsão de que elegeria mais de mil prefeitos em todo o país. Anunciou a meta e correu para conquistá-la, mas acabou ficando em menos da metade. Os pouco mais de 400 prefeitos eleitos, que representavam, na verdade, uma conquista extraordinária do partido, pois lograra dobrar as prefeituras que possuía à época, transformaram-se em um resultado frustrante. O partido saiu da eleição como se tivesse sido derrotado. Esta inversão de expectativa é o que o PT quer evitar na disputa municipal de 2008.

Por isto, não quer e não está falando em metas e números, mas as tem, sim, e espera, no mínimo, varrer o país com sua onda vermelha. Novamente a marca das mil prefeituras é um objetivo, e desta vez, para atingi-lo, o caminho foi traçado detalhadamente, apesar das negativas.

Na segunda-feira, o Grupo de Trabalho Eleitoral do PT fez uma análise parcial do desempenho até aqui e chegou à conclusão de que o partido vai muito bem nesta campanha. Um dos integrantes da cúpula partidária define, revelando a euforia que em público todos tentam conter, o que lhes vai ao pensamento: "O PT vai ter um sucesso absoluto".

E este êxito se deve não a uma só estratégia, mas a uma combinação de várias delas, analisadas por integrantes do comando da legenda. A quebra do tabu das alianças foi uma delas. Ainda há muitas cidades estratégicas onde o PT radicalizou sua velha posição de não ceder postos a aliados, mesmo que melhor posicionados, mas a regra geral não foi esta. No Rio, por exemplo, o partido não quis dar apoio à candidata Jandira Feghali, do PCdoB, e ficou com o seu candidato, Alexandre Molon, isolado e amargando um constrangedor sexto lugar na preferência do eleitorado.

Em Porto Alegre, a candidata petista Maria do Rosário acaba de ser ultrapassada por Manuela D"Ávila, do PCdoB, e o partido não admitiu, ali, em nenhum momento, somar seu eleitorado para eleger facilmente um aliado. Em Goiânia, a decisão de aliar-se ao PMDB, ficando este partido na cabeça de chapa, foi sofrida e aprovada no diretório por apenas um voto de diferença. Em Belo Horizonte, se o prefeito Fernando Pimentel (PT) não se rebela contra a decisão da cúpula, estaria o PT fora da chapa do candidato Márcio Lacerda, do PSB, que parece ter plenas condições de vencer no primeiro turno.

No interior do país houve também muitas exceções à nova postura sobre alianças. Agora, já às vésperas da votação, por exemplo, ainda tem petistas impugnando alianças do partido que há meses fazia campanha em coligação com legendas com quem divide o governo federal, tirando as chances suas e dos aliados. Na cidade goiana de Formosa, a 80 quilômetros da sede nacional do partido, nas vizinhanças do Distrito Federal, o PT forçou o PR, esta semana, a mudar o candidato a vice-prefeito porque decidiu sustentar candidatura própria.

Esta reincidência no isolamento partidário, segundo avaliações da cúpula, não é, porém, a tônica desta eleição. Seria possível contar os municípios onde o PT lançou sozinho um candidato, ou que o PT saiu só com os aliados de esquerda. O PT considera que está, nesta campanha, mais junto com a base do governo do que jamais esteve.

A segunda estratégia que, esta sim, tem se revelado arrasadora para os adversários do partido é que o PT descobriu-se destinatário principal do prestígio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e está conseguindo colar sua imagem à de Lula. As avaliações mostram que Lula, não necessariamente, transfere sua popularidade para o partido, razão pela qual todos os candidatos de siglas da base de apoio ao governo federal exploram a proximidade com o presidente. Mas o PT está sabendo explorar bem o fato de ser o partido do presidente e, em localidades absolutamente essenciais ao conforto político de Lula, ele próprio está se envolvendo no embate.

Uma terceira estratégia que estaria permitindo colher vitórias este ano foi a decisão de vários candidatos, em cidades mais arejadas, de abrir o seu programa de TV para que personalidades não petistas possam também falar. O exemplo analisado foi o de São Paulo, onde, segundo dirigentes partidários, o PMDB de Orestes Quércia, que apóia o candidato à reeleição, Gilberto Kassab (DEM), foi contestado pelo PMDB do escritor Fernando Morais, uma cria política de Quércia que com ele rompeu e agora pede votos, na TV, para a candidata Marta Suplicy.

Os candidatos, nesta avaliação, tornaram-se mais abertos para permitir que pessoas com nichos eleitorais definidos tenham espaço na sua propaganda política.

E, mais um caminho eleitoral trilhado pelo partido, foi levado adiante um processo de filiação qualitativa ao PT. O partido não se recusou a permitir que filiado novo se transformasse em candidato, desde que suas perspectivas fossem boas. A campanha seletiva de filiação levou para o PT pessoas bem qualificadas, diz um integrante da cúpula, tanto do ponto de vista moral quanto eleitoral. "Foram pessoas com boa representação social". Há casos exemplares até em cidades da região metropolitana de São Paulo.

Destas estratégias emerge o mesmo pragmatismo que levou o presidente Lula a fazer alianças à esquerda e à direita, no Congresso. Foi também o pragmatismo que levou a direção petista a definir uma política de distribuição de dinheiro para a campanha de quem tem realmente chance, faltando três semanas para a votação. Fora disso, haverá apenas um teatro para marcar posição, até o fim, uma prática muito difundida no passado que o PT acredita estar superando nesta disputa.

As avaliações feitas agora apontam também a possibilidade de sucesso, no futuro, destas estratégias testados nesta campanha. Partidos de oposição estão acompanhando o trabalho do partido e sabem que não têm e dificilmente conquistarão o mesmo nível de organicidade, pragmatismo, e obsessão que caracterizam esta campanha de fortalecimento nacional do PT que, avaliam petistas e não petistas, chegará muito forte a 2010.

O PT evita falar no assunto, mas espera uma onda vermelha em outubro, com a eleição de mil prefeitos em todo o país.

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

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