sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Um político que faz falta


Editorial
DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Pernambuco e o Recife acabam de perder um dos políticos de melhor qualidade que já produzimos, o ex-prefeito da capital Pelópidas da Silveira. Seria um lugar-comum dizer que já não se produzem políticos como antigamente. Há, sim, bons políticos, excelentes mesmo, mas em cada vez menor quantidade. Infelizmente. Pelópidas nasceu no Recife em 1915, formou-se em engenharia e começou a fazer política no Estado Novo, em 1946, como prefeito da capital, quando o cargo era de nomeação do interventor federal no Estado. Em 1955, foi eleito prefeito pelo voto direto da população, numa coligação que juntava socialistas, comunistas e trabalhistas. Em 1958, foi eleito vice-governador na chapa encabeçada por Cid Sampaio, que derrubou uma oligarquia que governava o Estado desde a ditadura de Vargas. Em 1963, foi novamente eleito prefeito do Recife pela mesma coligação que o elegera em 1955.

Teve o apoio do então governador Miguel Arraes, mas, como ele, foi deposto e cassado em 1964. Como Arraes, foi preso. Foi também aposentado compulsoriamente da então Universidade do Recife (hoje UFPE), onde ensinava nas escolas de Engenharia e Belas Artes. Pouco antes de morrer, Arraes disse sobre ele: “... é a convergência das esquerdas e do centro”. Para o senador Jarbas Vasconcelos, ele foi fonte de inspiração e “seu nome sempre surgia como fator de unidade, quando havia impasse na esquerda quanto à escolha de candidaturas”.

Mas, depois do golpe, nunca mais quis se candidatar a cargos eletivos. Foi o grande esteio da Frente do Recife, que, nos anos que precederam o golpe de 1964, a partir de 1958, elegeu prefeitos do Recife e governadores comprometidos com causas populares. Sempre empenhado em pautar-se pelos interesses de toda a população, Pelópidas criou, como administrador da então Prefeitura do Recife, audiências públicas semanais, que eram realizadas no Teatro Santa Isabel, com líderes de comunidades e setores, para discutir prioridades. Iniciativa que inspirou mais adiante os Núcleos de Planejamento Comunitário de Gustavo Krause, a Prefeitura nos Bairros de Jarbas, e o Orçamento Participativo de João Paulo.

O falecido líder deixou um legado de realizações, que incluem o alargamento e pavimentação em concreto das Avenidas Conde da Boa Vista e Norte, e a construção da Agamenon Magalhães e da Mascarenhas de Morais. Outra marca registrada dele foi o desenvolvimento com planejamento e a preocupação com programas de cunho social. Quando prefeito nos anos 50, encomendou à consultoria francesa Economie et Humanisme o primeiro Plano Diretor da Cidade do Recife, iniciativa pioneira na época. Num tempo em que ainda seria possível planejar e organizar a expansão urbana da capital, aquele plano detectou áreas residenciais e industriais, e demarcou áreas non aedificandi (em que não se pode construir), que, se houvessem sido respeitadas, evitariam o caos sem solução à vista que tomou conta da nossa capital. Hoje, fazem-se planos diretores descartáveis que não chegam a ser devidamente aplicados devido a todo tipo de pressão de interesses não sociais.

Para o governador Eduardo Campos, “Pelópidas é uma das grandes referências da esquerda. Ao lado de Arraes, fundou a Frente do Recife, instrumento que impulsionou as forças democráticas e populares, com repercussão até hoje. Na sua bonita trajetória, lutou para unir nosso campo de idéias e projetos, sendo nosso ponto de apoio e aconselhamento”. E João Paulo lembra que “ele governou priorizando a população de baixa renda. Com participação popular, executou grandes obras. [...]Foi ele que nos ensinou”.

O próprio senador Marco Maciel, que sempre militou em campo oposto ao de Pelópidas, vê nele “um grande administrador e um político competente e de reconhecido discernimento sobre os problemas do Estado e do País”. A morte de Pelópidas coincide com a comemoração que fazemos do centenário de nascimento de Josué de Castro, outro político pernambucano de escola, que inspirou-se na realidade dos nossos mangues e favelas para levar ao mundo sua mensagem de paz via justiça social. Outro grande pernambucano que faz falta.

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