quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Fadiga de material


Maria Inês Nassif
DEU NO VALOR ECONÔMICO


Nada como uma eleição depois da outra para confirmar a máxima de que resultado, só depois de contados os votos. Em São Paulo, o "demista" Gilberto Kassab começou o processo eleitoral na lanterna das preferências de voto; no segundo turno, vai para a eleição ostentando grande diferença nas pesquisas em relação à candidata que no início da campanha eleitoral era a favorita, Marta Suplicy (PT). Em Minas, havia uma certeza quase arrogante, confirmada pelas pesquisas depois do início da campanha eleitoral gratuita, de que o eleitor de Belo Horizonte seguiria cegamente os seus dois líderes, o governador Aécio Neves (PSDB) e o prefeito Fernando Pimentel (PT), e elegeria ainda em primeiro turno o candidato Márcio Lacerda (PSB), apoiado por ambos. Houve segundo turno e, em bom momento do processo eleitoral, o deputado Leonardo Quintão (PMDB) esteve na frente nas pesquisas. A vitória de Lacerda, se ocorrer, não será mais um passeio. No Rio, a certeza de que o voto evangélico é majoritário elevou as apostas no candidato-bispo Marcelo Crivella (PRP), que sequer foi para um segundo turno que está sendo disputado, voto a voto, por Eduardo Paes (PMDB) e Fernando Gabeira (PV).

É difícil estabelecer um padrão para as eleições das capitais dos três maiores Estados do país, mas existem algumas coincidências. Em São Paulo, a campanha de Marta concentrou-se na tática de nacionalizar a disputa, na tentativa de quebrar os índices de rejeição que a candidata ostenta com a aprovação que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva desfruta. Enquanto a aprovação de Lula ultrapassava os 80% nas vésperas do primeiro turno, Marta não conseguiu superar os 37%, uma marca que parece ter se tornado o seu teto. As características pessoais da candidata que desagradam o paulistano e a mantêm com alto índice de rejeição não foram reavaliadas pelo eleitor em função do apoio direto e militante de Lula à petista. Da mesma forma, o eleitor de Belo Horizonte rejeitou votar simplesmente por procuração - e, enquanto na propaganda eleitoral Lacerda abria mão de apresentar-se como um candidato com qualidades próprias, contentando-se em ser um projeto de criatura de dois criadores, Quintão subiu nas pesquisas expondo-se ao eleitorado. No caso das duas capitais, o voto foi pessoal e intransferível: Lula, ao que parece, não transferiu votos para Marta; assim como Lacerda não se tornou automaticamente o depositário das escolhas da maioria dos eleitores belo-horizontinos - está tendo que despender esforços para isso. No Rio, Eduardo Paes, embora apoiado pelo governador Sérgio Cabral (PMDB), que por sua vez é da base de apoio de Lula, emergiu do nada no primeiro turno mais pelo fato de ser uma novidade do que propriamente pelo padrinho que tem; no segundo turno, a ansiedade do carioca por novas lideranças parece estar favorecendo Gabeira. Os dois disputam voto a voto não pelo que os vincula aos velhos líderes, mas pelo que deles estão separados.

O que une as três capitais nesse segundo turno, ao que parece, é o fato de que as questões nacionais e estaduais não estão tendo quase influência na decisão de voto; os padrinhos políticos tiveram pequeno poder de transferência; e há uma tendência a privilegiar atores políticos com menor experiência e, em consequência, também com uma rejeição menos consolidada. Em São Paulo, embora Kassab seja o prefeito, é a primeira vez que disputa uma campanha para cargo executivo (é prefeito porque era vice de Serra, quando este saiu para disputar o governo do Estado), isto é, tinha antes uma exposição pequena, que lhe garantiu inclusive um índice de rejeição muito inferior ao de Marta. Em Minas, Quintão e Lacerda são novidades, mas Quintão, em algum momento, pareceu novidade maior que Lacerda - agora ele tem de provar que a novidade é ele. No Rio, Gabeira é mais novidade, já que nunca antes exerceu cargo político, é oposição e entrou nessa sem padrinhos, mas terá que provar que é mais novidade que seu adversário.

Talvez sejam sobre esses dados que os partidos devem refletir até a próxima eleição. O país vive, nesse momento, uma exaustão das lideranças que se formaram durante a ditadura e no período pós-redemocratização; os políticos que se tornaram competitivos às custas de terem se exposto a várias competições eleitorais seguidas estão dando sinais de desgaste. Os partidos não estão conseguindo manter uma taxa de renovação apropriada, tornando-se redutos dos mesmos políticos. Se a renovação não for feita em profundidade, pelos mecanismos partidários, será feito mais à frente, pelo voto, e a despeito dos partidos.

Maria Inês Nassif é editora de Opinião. Escreve às quintas-feiras

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