quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Uma leve compressão


Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


O ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, corre para desmentir qualquer interpretação de que a disputa entre PT e PMDB na eleição de Salvador possa ter conseqüência sobre a aliança nacional que sustenta o governo Luiz Inácio da Silva.

Nega com veemência que haja a mais remota intenção de pressionar o presidente quando pediu que ele e seus ministros ficassem longe da Bahia no primeiro turno e permanecessem distantes da capital na etapa final, para não dar ao eleitor a impressão de que só o candidato Walter Pinheiro, do PT, poderia assegurar benefícios federais à cidade.

“Conheço o meu lugar e não quero parecer chantagista. Ele é o juiz das suas decisões”, diz.

Mas, e se o presidente não atendesse e desembarcasse em Salvador para defender o candidato do PT?

“Eu faria minhas malas e iria embora do ministério, porque, nesse caso, não seria um deputado do PMDB, mas um ministro dele que estaria sendo desautorizado.”

Como se vê, quem conclui pela existência de pressão parte de uma premissa sem fundamento.

E já que está tudo ótimo, na maior leveza e santa paz, reformulemos o raciocínio para denominar de “leve compressão” a reação do ministro diante da conduta do parceiro de coligação nacional nessas eleições municipais, particularmente em Salvador: “O PT sinaliza que em 2010 tudo é possível”.

Refere-se a projetos eleitorais e mudanças de rumo, evidentemente, mas não dá passo maior do que lhe permitem as pernas agora: “Trabalho pela manutenção do PMDB na aliança do presidente Lula”, avisa, ressalvando que não representa todo o partido, cujos interesses são múltiplos. E voláteis, como está registrado na trajetória recente da substanciosa agremiação.

Na visão do ministro da Integração Nacional, as críticas à conduta do PMDB são duras na proporção inversa da tolerância com que são vistos os gestos do PT. “Salvador é o símbolo da falta de compromisso com os aliados.”

Na opinião dele, o comportamento dos petistas na capital não foi até agora corretamente analisado. “O PT participou da prefeitura do João Henrique (ex-PDT, candidato à reeleição pelo PMDB) durante 40 meses e, de uma hora para outra, resolveu ter candidato próprio e atacar a administração como se não tivesse nada a ver com ela.”

E mais: “Passou a se comportar como se só ele fosse aliado do governo federal, como se o presidente fosse dar tratamento privilegiado aos municípios onde o PT fizesse o prefeito, como se os outros partidos, ganhando, ficassem reduzidos a pão e água”.

A única maneira de o eleitor não tomar a insinuação como verdade absoluta, defende-se o ministro, seria evitar a presença do presidente e dos ministros. Com Lula lá, a disputa ficaria “injustamente” desequilibrada.

E não porque a Bahia seria exceção à regra que pelo País afora não confirmou o fenômeno da transferência automática de votos. “O problema está na mensagem nem sempre sutil de que ou o eleitor vota no PT ou a cidade fica sem nada.”

Passemos batido pelo caso do Rio de Janeiro, onde o candidato Eduardo Paes faz campanha dizendo que a cidade só “sai do isolamento” em relação ao repasse de verbas federais se o eleitorado escolher o PMDB.

Guerra é guerra. A questão é saber se depois de segunda-feira ela fica restrita ao âmbito municipal ou se sobrarão espaço e confiança para recomposições federais firmes o suficiente para resistir a ataques e contra-ataques nas disputas pela Presidência da República e os governos de 27 Estados. Um jogo bem mais poderoso que as batalhas de província ora prestes a se encerrar.

“Em 2010 tudo é possível”, disse acima o ministro sobre o efeito futuro da atual conduta petista; o que tanto pode significar abandono da aliança quanto a permanência ao lado de Lula, mas sem resquício de compromisso com os projetos do PT.

Adaptação

Se vai ser candidato e quer mesmo presidir a República, o governador José Serra precisará adquirir mais agilidade - e por que não dizer, um quê de virtualidade política - no trato de movimentos reivindicatórios se não quiser pagar sempre a fatura no final.

No ano passado, quando a reitoria da USP foi invadida por estudantes, ficou olhando a cena de longe, tal como acabou de fazer por mais de 30 dias com a greve da Polícia Civil de São Paulo até ser pressionado pela baderna produzida nas cercanias do Palácio dos Bandeirantes por sindicalistas e políticos eleitoralmente engajados.

Independente da justeza dos movimentos ou da razão da passividade - na USP, o receio do governo era ferir a autonomia universitária e, no caso da polícia, estava em jogo a pressão armada sobre uma autoridade -, aos olhos da opinião pública a responsabilidade não aceita nuances: recai sobre o chefe do Executivo, junto com o desgaste.

Ademais, se um tucano for eleito terá o PT na oposição, o que indicará tempos de muitos blocos na rua.

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