terça-feira, 18 de novembro de 2008

O jogo da Amarelinha


Raymundo Costa
DEU NO VALOR ECONÔMICO


O governador José Serra (PSDB) e a ministra Dilma Rousseff (PT) disfarçam, mas avançaram uma casa no jogo da sucessão presidencial. Os dois procuram vestir agora o figurino de o melhor gerente da crise. O feitio cabe melhor em Serra, que tem mais tempo de janela no assunto, mas não fica desajeitado em Dilma, que rapidamente adaptou o discurso do PAC e do pré-sal às "medidas anticíclicas" necessárias para combater os efeitos da crise internacional.

Os aliados de Serra negam que o tucano tenha mudado estrategicamente de fase e procura agora se expor mais nacionalmente, quesito no qual acreditam que o governador de São Paulo perde para a ministra-chefe da Casa Civil: eles se queixam de que um ato no Palácio dos Bandeirantes com a presença do ministro Guido Mantega (Fazenda), por exemplo, atrairia menos a mídia nacional que um balanço do PAC.

A menos, claro, quando Serra anuncia ao lado de Mantega uma bilionária linha de crédito para a indústria automobilística, como fez semana passada, e põe o governador do maior Estado do país no centro do combate à crise, no nível do governo federal.

Serra começou devagar, acertando acordos fiscais com um ou outro Estado, acelerou nas eleições municipais, ao apostar na candidatura de Gilberto Kassab a prefeito de São Paulo, e hoje fala sem cerimônia sobre assuntos que até bem pouco tempo reservava para conversas de bastidor, algumas com o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva, outras com Mantega. A crítica às políticas cambial e monetária do Banco Central (BC), por exemplo.

"Temos a maior taxa de juros do mundo. Aliás, é o único país com uma taxa assim, porque todos os outros países baixaram no meio da crise, e o Brasil, não", disse Serra, recentemente, em uma entrevista ao jornal gaúcho "Zero Hora".

A crise definitivamente passou a fazer parte da discussão sobre as alternativas à sucessão de Lula. Dilma e Serra se apresentam como as melhores opções para gerenciá-la e fazer a travessia. Serra exibe um longo currículo de gestor e afirmações que fazem tremer um mercado - cujas opiniões já foram mais reverenciadas -, como a de que, se estivesse no governo, teria reduzido a taxa de juros. Dilma aposta todas as fichas numa política que mantenha os investimentos previstos e num processo de crescimento que contemple o "mercado interno de massas".

Serra e Dilma ainda enfrentam problemas em casa. No caso de Dilma, manifestações de Lula favoráveis a sua candidatura, em Roma, reativaram antigas armadilhas no PT, segundo as quais a definição do candidato, sem relevar a opinião de Lula, dependerá do PT, dos aliados históricos do partido e do PMDB. O ministro Tarso Genro (Justiça) já havia dito algo parecido antes das eleições municipais - e também que outros ministros pensavam exatamente como ele.

O PT, se puder, sem dúvida impõe um candidato ao presidente Lula. Ocorre que a frustração de algumas das expectativas eleitorais petistas, nas eleições municipais passadas, só confirmaram ainda mais uma vez que o ativo eleitoral de Lula ainda é maior que o do partido.

"O agente político mais importante para a sucessão de 2010 é o presidente Lula, não é o governador José Serra", diz o cientista político José Luiz Niemeyer, coordenador do curso de graduação de Relações Internacionais do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais. "As pessoas ficaram um pouco inebriadas com a vitória de Kassab, mas o Lula tem um poder muito grande junto às centrais sindicais, aos governadores do Nordeste às prefeituras dos grotões. É o Lula que vai lá, fala no comício na praça. Então ele ainda é um cabo eleitoral importante. Não vamos poder diminuir a importância do presidente no processo não".

Só que, em vez de Dilma Rousseff, o professor fala em uma outra escolha de Lula, nome que volta e meia embala conversas políticas de Brasília: o do ministro Henrique Meirelles, presidente do Banco Central. "A saída Meirelles é uma saída estratégica para o presidente começar a criar - o que eu acho cada vez mais importante -, que é um nome novo dentro do partido". Um nome aceito pela banca internacional, com vínculos no PSDB, capaz enfim de juntar o "lulismo" a um segmento importante dos tucanos, formado por Aécio Neves, Geraldo Alckmin e Tasso Jereissati, no ponto de vista do professor do Ibmec.

É óbvio que o nome de Meirelles aparece na esteira da crise financeira internacional. Pretensões eleitorais o ministro-presidente do BC tem, embora elas sempre apareçam camufladas com uma candidatura ao governo do Estado de Goiás ou até mesmo à Prefeitura de Anápolis - um teste para sua filiação partidária feito ano passado. Sua escolha por Lula causaria, sem dúvida, uma reviravolta - além de reações desesperadas no PT - num jogo que atualmente parece encaminhado à indicação dos primeiros da fila: José Serra e Dilma Rousseff.

"Eu acho o Meirelles uma candidatura muito interessante para Lula usar, mas não para o PT usar", argumenta o cientista político José Luiz Niemeyer. "Essa seria a característica da candidatura. Um candidato mais do grupo de Lula e menos do partido, como se o presidente Lula quisesse dar uma guinada mais ao centro - não para a direita, mas para mais ao centro".

A teoria do professor é clássica: embicada em direção ao centro, a candidatura de Henrique Meirelles, na realidade, significaria mesmo a aproximação do atual governo "de um ponto de vista do PSDB, do ponto de vista de política econômica, o que seria rico". Por quê? "Porque alguns setores do PSDB se aproximariam mais de Lula, como já estão próximos alguns setores, e não do PT. E se Meirelles vencesse mesmo o Serra, com grande apoio de Lula, você teria um Congresso mais fácil de trabalhar, a partir de 2010".

Sem dúvida, esquematicamente, parece a comprovação do teorema de Aécio Neves. Mas nada indica hoje que tanto Serra quanto Dilma, caso eleitos, venham enfrentar grande dificuldade para compor uma maioria estável. a partir de 2010.

Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras

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