segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

A crise enfim chegou? Sorriam, brasileiros


Augusto Nunes
DEU NA GAZETA MERCANTIL

"Você é feliz?", perguntou o jornalista a Tonia Carrero. "Sou", fez uma ligeiríssima pausa a grande atriz. "Várias vezes ao dia." Bela, talentosa, vencedora, rica, bem-sucedida - o que estaria faltando a essa rainha dos palcos? Nada. Ocorre que Tonia pensa. Quem tem a cabeça em bom estado, e não concede férias ao cérebro, sabe que não existe a dor que nunca passa, mas é impossível ser feliz o tempo inteiro. É assim com as pessoas. É assim com os países.

Não com o Brasil, ressalvam os resultados da pesquisa divulgada na quinta-feira pelo Datafolha. O governo Lula é considerado ótimo ou bom por 70% dos entrevistados - o maior índice obtido por um presidente desde o fim da ditadura. Estão satisfeitos com a situação econômica 61%. E somam 78% os que crêem que 2009 vai ser ainda melhor. "Os brasileiros, até agora, não sentiram os efeitos da crise", deduz Mauro Paulino, diretor do Datafolha. Bem ou mal, 72% sabem que problemas financeiros andam tirando o sono de muita gente. Só que longe daqui.

Já faz algum tempo, Lula deu por resolvidos problemas acumulados em cinco séculos de incompetência, avisou que logo cuidaria do pouco que restava, comunicou que nunca antes neste País houve um governante tão formidável e ordenou ao Brasil que fosse feliz todos os dias. Quem tem motivos para não viver em estado de graça no paraíso que Deus poupou de catástrofes naturais e Lula blindou contra desastres econômicos? Só os napoleões de hospício, os que babam na gravata e os que acordam e dormem torcendo pelo insucesso do ex-operário genial.

A seqüência de pesquisas avisa que a tribo dos descontentes hoje não passa de 7% , e caminha para a extinção. Em contrapartida, a grande maioria não se limitou a acatar a decretação da felicidade geral e permanente. Resolveu ficar mais feliz sempre que se conjugam um claro sinal de perigo e uma maluquice do Grande Pastor. A marca dos 70% foi alcançada ao fim dos três dias em que Lula jurou que haverá emprego para todos, a Vale demitiu 6 mil, Lula explicou que a crise vai fortalecer o Brasil e a inflação ficou mais musculosa.

Deve-se presumir que, graças à medonha conjunção dos astros ocorrida na quinta-feira, a próxima pesquisa acusará outro salto no índice de popularidade do presidente. Excitado com a cavalgada do dólar, com a queda da produção industrial e com outras evidências de que a marolinha quer ser tsunami quando crescer, Lula fundiu a indigência intelectual com o apreço pela vulgaridade e foi à luta.

"Quando o mercado tem uma dor de barriga, e nesse caso foi uma diarréia braba, quem é chamado? O Estado", perguntou e respondeu, aos berros e com o rosto avermelhado, no meio do improviso inverossímil. Sem pausas, incorporou um médico examinando o doente em estado grave para justificar o otimismo inabalável. "O que você fala? Dos avanços da medicina ou olha pra ele e diz: meu, sifu?". Sabe-se agora que o doutor Lula acha que o Brasil doente sifu. Só não diz a verdade para poupar o paciente.

Se fizer outro discurso desses numa semana ruim, o País passará da felicidade à euforia e Lula finalmente chegará aos 100%.

Augusto Nunes - O autor escreve nesta seção às segundas e quartas

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