terça-feira, 28 de outubro de 2008

A derrota de Paes


DEU NO BLOG DE CORA RÓNAI

Abrindo mão das próprias convicções (se é que um dia as teve), aliando-se ao que há de mais podre no estado, gastando rios de dinheiro, jogando sujo, usando descaradamente a máquina estadual, federal e universal, beneficiando-se até de um feriado mal intencionado, enfim, com tudo isso, Eduardo Paes só conseguiu ganhar de Gabeira por 50 mil míseros votos.

Como vitória política, já é um resultado extremamente questionável; mas do ponto de vista pessoal, é uma derrota acachapante.

Eduardo Paes levou a prefeitura, sim, mas de contrapeso ficou com uma quadrilha de aliados que não deixa nada a dever àquela que ele acusava o presidente Lula de comandar.

Vai ser prefeito, sim, mas vai ter de arranjar boquinhas para o Crivella, para o Lupi, para o Piciani, para a Clarissa Garotinho, para o Roberto Jefferson, para a Carminha Jerominho, para o Babu, para o Dornelles, para a Jandira... estou esquecendo alguém?

Conquistou um cargo, é verdade, mas conquistou também o desprezo mais profundo de metade do eleitorado.

Em compensação, como carioca, perdeu a chance de viver um momento histórico, em que a prefeitura seria, afinal, ocupada por um homem de bem, com idéias novas e um novo jeito de fazer política; perdeu a chance de ver o Rio de Janeiro sair do limbo a que foi condenado nas últimas décadas, e ganhar projeção pela singularidade da sua administração.

Se Gabeira tivesse sido eleito prefeito, o Rio, que hoje não significa nada em termos políticos, voltaria a ter relevância, até pelo inusitado da coisa. Um prefeito eleito na base do voluntariado, do entusiasmo dos eleitores e da vontade coletiva de virar a mesa seria alguém em quem o país seria obrigado a prestar atenção.

Agora, lá vamos nós para quatro anos de subserviente nulidade, quatro anos em que o recado das urnas será interpretado, pela corja que domina esta infeliz cidade, como um retumbante "Liberou geral!"

Nojo, nojo, nojo.

Mudando de conversa


Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


O PT não esperava arrasar quarteirões em massa País afora. Sabia que as eleições municipais em alguns locais, como São Paulo, seriam uma parada dura e que poderia haver derrotas significativas aqui e ali.

O Palácio do Planalto tampouco imaginava que o partido seria um sucesso absoluto de bilheteria e já previa que talvez fosse um fracasso junto à crítica, aí entendida como tradução do eleitorado de classe média para cima, mais escolarizado e bem informado que vem se distanciando do partido.

Mas nem o partido nem o governo estavam preparados para colher das urnas tantos resultados adversos, ao ponto de o desfecho da eleição deixar o presidente Luiz Inácio da Silva desprovido de discurso.

Sem uma vitória importante para pôr na conta de sua popularidade (Luiz Marinho ganhou em São Bernardo ao custo de muito dinheiro, empenho e, ainda assim, só no segundo turno), Lula não teve outra saída a não ser improvisar uma fala de magistrado; isso depois de ter falado como militante partidário até as pesquisas revelarem os primeiros indícios de más notícias.

De acordo com o novo script, o presidente nunca foi um partidário da tese da transferência de votos, jamais perdeu a noção de que eleições municipais dizem respeito exclusivo a temas de interesse local, nem por um momento quis dar ao pleito um caráter plebiscitário de forma a produzir uma sentença de rejeição aos seus adversários e muito menos pretendeu estabelecer relações de causa e efeito entre as eleições de 2008 e a disputa presidencial de 2010.

Ontem Lula deu logo o passo adiante anunciando uma reunião de prefeitos eleitos em janeiro para “orientá-los” sobre a aplicação dos recursos do PAC e convidando a todos para, juntos, firmarem um pacto de combate ao analfabetismo.

Uma agenda tão inusitada quanto vazia: verbas orçamentárias (a razão social da marca fantasia “recursos do PAC”) não dependem de orientação do presidente da República e pactos são entidades de plantão destinadas a preencher vazios até a ocorrência de idéias mais criativas.

Aqui, a urgência é a mudança de assunto. Qualquer coisa é melhor que a análise fria e realista do resultado da eleição, principalmente frente à expectativa criada pela sobrevalorização do capital político/eleitoral do campo governista.

Por isso o PT prefere ater-se aos resultados numéricos, citar porcentuais de crescimento de prefeituras ocupadas pelo partido ou pela “base aliada”, fazendo de conta que a eleição de 13% a mais de vereadores no País e a reeleição de 56% dos prefeitos petistas é tão ou mais importante que a redução da presença petista nos redutos de maior peso político.

O PT ganhou em muitas cidades, é verdade. Mas não ganhou nas cidades em que gostaria e está fora daquelas onde seria preciso para firmar hegemonia, coisa que obviamente não se faz no comando de pequenas capitais nem de municípios geográfica e/ou politicamente periféricos.

A contabilidade miúda não reduz o impacto da derrota de Marta Suplicy em São Paulo para um político praticamente desconhecido, cuja candidatura passou meses sendo semeada no ambiente de guerra de extermínio interno do PSDB.

Não há fabulação em torno de PAC ou de pactos que possa competir com o fato de governo tão poderoso terminar a eleição no Rio na base da disputa voto a voto e sendo representado por um candidato recentemente perdoado pelo presidente por ter sido chamado dos piores qualificativos. Isso depois de ter tido todo o plantel de aliados eliminado na primeira fase.

Impossível também esconder atrás de porcentuais o papel de caudatário do PMDB que conseguiu impor ao presidente Lula a regra da neutralidade e, com isso, posar diante de muitos eleitorados (sendo o caso da Bahia o mais eloqüente) como o verdadeiro canal de mobilização de benefícios federais.

Outra tarefa inglória a que se atribuem agora o governo e o PT é a da eliminação da figura da ministra Dilma Rousseff como candidata predileta do presidente Lula à sucessão de 2010.

Segundo a versão em vigor desde domingo à noite, o presidente Lula não apenas jamais pretendeu transferir votos como nunca pretendeu fazê-lo para Dilma e, por isso, não se pode dizer que a queda da “tese do poste” tenha enfraquecido a futura candidatura. Qual candidatura?

A mesma celebrada até há poucas semanas. A mesma que estaria agora sendo oficialmente lançada se o PT estivesse ocupado em comemorar exaustivamente os resultados e não preocupado em justificá-los à exaustão.

E agora, Paes, como unir a cidade do Rio?


Alessandra Duarte e Pedro Motta Gueiros
DEU EM O GLBO

Para especialistas e moradores comuns, eleitorado mostrou novo patamar de cobrança por ética na política

Vencedor da eleição no Rio por apenas 55 mil votos, o peemedebista Eduardo Paes herdará uma cidade não apenas dividida, mas com uma cobrança por ética na política muito mais forte, em grande parte por causa do desempenho do adversário, Fernando Gabeira (PV). Para moradores, cientistas políticos, urbanistas e economistas, enquanto o verde deixa como marca uma mudança na forma de fazer campanha no Rio - tendo tido praticamente a mesma votação do rival, sem a máquina estadual e o apoio de 13 partidos -, o novo prefeito terá que pagar a fatura das alianças com os partidos políticos sem fisiologismo, se quiser atender à cobrança por relações mais éticas na política cobradas pelo eleitorado .

Para o cientista político Luiz Werneck Vianna, do Iuperj, uma das dificuldades do novo prefeito será a divisão do eleitorado:

- A parte que não está dentro (do apoio a Paes) é grande, metade da cidade. Além disso, ele tem contas a pagar, e contas ruins. A conta do (Jorge) Babu (do PT, acusado de envolvimento com milícias) é ruim de pagar - disse Vianna, para quem Paes terá de ser hábil para governar com a marca deixada por Gabeira. - Gabeira teve uma campanha sem muito partido, na qual a sociedade se fez envolver.

Pela internet, por exemplo, que foi incorporada por Gabeira à gramática das campanhas eleitorais, segundo Vianna:

- Os próximos candidatos terão de levar isso em conta. Por todas essas marcas deixadas, sem dúvida Gabeira foi o vencedor. Não o vejo numa disputa para o governo estadual ou numa nova eleição para prefeito. Acho que, a partir de agora, ele aparece como um parlamentar muito influente, como estimulador de uma nova política.

Entre os aliados e a ética

O professor de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro Mauro Osório, doutor em planejamento urbano pelo Ippur, afirma que Paes terá de lidar com a exigência por ética levantada pela campanha de Gabeira:

- O Gabeira, no primeiro turno, conseguiu catalisar o sentimento pela ética, e mostrou que isso é uma demanda forte no Rio. Nas últimas décadas, a política na cidade teve uma hegemonia clientelista, e a população mostrou-se contra isso. A votação que Gabeira teve mostrou que as máquinas têm poder menor do que se pensa, e que a opinião pública conta muito numa eleição majoritária.

Para Osório, um desafio de Paes será atender aos pedidos dos apoios dos partidos que o elegeram e ao mesmo tempo atender a essa demanda da população por ética:

- Paes vai ter de não ser fisiológico ao nomear as secretarias e se relacionar com a Câmara, que continua predominantemente clientelista. Sem falar que alterou o campo político dele para vencer: o Paes nasceu com o Cesar Maia, na centro-direita, e agora venceu num campo centro-esquerda. Se ele, e também o governador Sergio Cabral, tiverem de consolidar a aliança com o PT, não pode ser de forma fisiológica. A população do Rio terá dois anos, até a eleição de 2010, para avaliar o governo do Paes e a sua aliança com o PT.

O professor de ciência política da PUC-Rio Ricardo Ismael chama atenção para a divisão geográfica do voto com o qual Paes terá que lidar. Para Ismael, Paes agora é devedor das forças políticas que o apoiaram. Ao mesmo tempo, terá de lidar com as promessas que fez, "em cima de novos gastos, como as UPAs e o bilhete único, num ano difícil, de crise internacional".

- Ele vai ter que ter muita criatividade - completa Ismael, para quem Gabeira "deixou uma marca política": - A outra campanha fazia um vale-tudo, com panfletos que podem ter pesado para eleitores menos esclarecidos. Já Gabeira mostrou que é possível fazer campanha com as forças sociais e sem os partidos, sem ficar refém de acordos políticos tradicionais. Ele reinventou a campanha no Rio, e agora a população passa a exigir isso.

O calor da disputa deixou marcas na velha relação. Para reconquistar a parte da cidade que perdeu, Paes tem a voz das ruas para orientá-lo. Ao sair de um restaurante, ontem à tarde em Ipanema, Gabeira foi aplaudido de pé e teve o nome gritado por moradores e trabalhadores. Como era dia de feira, o candidato do PV também foi ovacionado por barraqueiros e camelôs, saídos de várias partes da cidade.

- Dizer que o Gabeira é o candidato das elites é um preconceito com o qual não concordo. Mas já que essa visão partiu do Paes, ele deveria respeitar a tal parte intelectualmente superior e adotar as propostas do Gabeira - disse a urbanista Luísa Santos, que saudou a passagem de Gabeira enquanto almoçava com amigas num restaurante japonês.

Ao seu lado, a arquiteta Evelyn Gomes apontava o transporte público como principal caminho para a integração:

- É o principal. Se o prefeito conseguir fazer um planejamento, a cidade toda ganha.

Com dois cordões de dentes de alho em torno do pescoço, o feirante Diogo Rosário não tem expectativas de transformação pela política:

- Anulei o voto duas vezes, que paga minhas contas sou eu. Mês passado meu esgoto entupiu e, se eu não botasse a mão, ainda estaria assim.

Com oito filhos e uma barraca em que vende caju, jabuticaba e limão na feira que parou para aplaudir Gabeira ontem, o camelô Flávio Bastos votou no verde mas agora faz fé em Paes.

- Se for melhor do que o Cesar Maia, está bom. Precisamos trabalhar, mas a fiscalização não deixa - disse, apontando para sua banca.

- Votei no Paes porque tive um pouquinho de medo do novo. Se ele agir em toda a cidade, acaba com essa divisão - disse Luiz Dantas, sócio de uma loja em Ipanema.

Do outro lado da rua, as amigas do escritório de arquitetura ainda vão demorar para assinar embaixo dos projetos do novo prefeito.

- Temos que fiscalizar. Não ponho minha mão no fogo por ele, mas não estou contra, porque seria ficar contra o Rio - disse Ana Paula Philipsen.

O urbanista e ex-secretário municipal de Habitação Sérgio Magalhães avalia que Paes precisa, agora, investir na valorização do subúrbio, uma das tônicas de sua campanha:

- Precisa, por exemplo, investir no projeto de transformação de trens em metrôs e na recuperação dos corredores das zonas Norte e Oeste.

Projetos que alavanquem a receita do município nesse momento de crise, como a nota fiscal eletrônica, também devem ter atenção, segundo o economista Mauro Osório:
- Os programas dos dois candidatos não eram muito diferentes. A questão será a operacionalização, que vai depender da composição do secretariado e da relação com a Câmara. A boa relação com o estado e a União não é tudo.
Paes deve mirar na classe média
Para conservar a base de apoio e recuperar o eleitorado que perdeu, Paes tem alguns compromissos a cumprir. Para o cientista político Ricardo Ismael, o prefeito eleito precisa honrar compromissos de campanha e atender a algumas demandas da classe média.

- Primeiro, terá que atender aos projetos sociais, como a saúde pública e o fim da aprovação automática. Disso, não pode fugir - disse Ismael, antes de enumerar as ações para se reaproximar do eleitorado perdido: - Além de ações para conter as favelas, a desordem urbana e do trânsito, Paes precisa ter cuidado para não lotear cargos. Com as alianças que fez, não será tarefa tão simples.

Palco de rivalidades acaloradas, ontem o Maracanã abrigava a tolerância. Depois de fazer hidroginástica, Maria de Oliveira, de 75 anos, se dirigia à aula de dança de salão no Maracanãzinho com orgulho das conquistas que teve, na vida e nas urnas. Órfã de pai e mãe desde os 10 anos, voltou a estudar aos 42 para se tornar auxiliar em enfermagem. Com 15 netos e sete bisnetos, escolheu Paes para cuidar do futuro da família:

- Acho que ele devia conversar com o Gabeira. A cidade não agüenta mais briga, quem sofre é o povo.

Gabeira é visto como peça-chave em 2010


Wilson Tosta
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Qualquer que seja seu caminho agora, o candidato derrotado da Frente Carioca (PV-PSDB-PPS) à Prefeitura do Rio, Fernando Gabeira, será peça-chave para as eleições de 2010 no Estado, avaliam políticos que o apoiaram na disputa de 2008. Uma possível candidatura a governador, a senador e até a vice-presidente na chapa de José Serra (PSDB) à Presidência são algumas alternativas levantadas para o futuro político do parlamentar, que perdeu por apenas 55.225 votos para Eduardo Paes (PMDB).

No campo verde-tucano fluminense, ninguém quer desperdiçar o patrimônio político acumulado pelo candidato - 1.640.970 votos, 49,17% dos válidos, e uma invejável exposição à mídia.

Entre verdes, tucanos e integrantes do PPS, o chamado de Gabeira às forças que o apoiaram para uma mobilização anti-dengue, anteontem, foi interpretado como sinal de que o parlamentar pretende ser um ator importante na próxima eleição, talvez concorrendo a algo mais que apenas uma reeleição para a Câmara dos Deputados. Antes de admitir oficialmente a derrota, no domingo, Gabeira expôs a idéia a aliados.

“Conversei com ele por telefone”, contou a vereadora Andréa Gouvêa Vieira (PSDB). “Ele disse para continuar o movimento, juntar a sociedade civil, a iniciativa privada, entrar nessa questão da dengue, melhorar o Rio de Janeiro. Então, acho que tem aí, sim, uma caminhada para frente, para 2010.”

CAETANO

Principal cabo eleitoral de Gabeira, Caetano Veloso não votou nele no domingo. O cantor e compositor, que mora no Rio, estava em Roma, onde participou do 3º Festival Internacional de Cinema da cidade - o documentário Coração Vagabundo, de Fernando Grostein Andrade, que o retratou durante uma turnê internacional, foi exibido durante uma mostra paralela em homenagem ao cinema brasileiro.

Serra diz que existe diálogo entre PSDB e peemedebistas


Roberto Godoy e Guilherme Scarance
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Governador resiste a falar como presidenciável, alegando que 2010 está mais longe do que parece?, mas destaca sua boa relação com o PMDB

Embora diga que "2010 está mais longe do que parece" e garanta que não está "focado" na corrida presidencial e não negocia apoio, o governador José Serra admitiu, em entrevista ontem à TV Estadão: "Existe um diálogo do PSDB com o PMDB, isso é indiscutível." O partido foi o grande vitorioso da corrida municipal e é cortejado tanto pelos partidos governistas como de oposição ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Assista à íntegra da entrevista

Indagado sobre o saldo dos peemedebistas, Serra admitiu que o partido sai com "posição forte, do ponto de vista nacional". "O PMDB é um partido que tem capacidade, elasticidade. Fogaça, em Porto Alegre, tinha sido do PMDB, foi eleito pelo PPS, voltou para o PMDB e aí foi reeleito. Paes era PSDB, foi eleito pelo PMDB. O PMDB consegue absorver integrantes de outros partidos em situações-chave e conseguiu esse resultado bastante apreciável."

Serra resiste, porém, a admitir a candidatura a presidente. Diz que o partido conversa com o PMDB, não ele. "Não estamos negociando 2010", afirmou.

Mesmo assim, o tucano destacou a boa relação que mantém com o partido: "Temos proximidade com muitos setores do PMDB. Quando fui candidato em 2002 tive o apoio do PMDB, na eleição presidencial. E há proximidade, até em alguns casos mais pessoal do que política."

Tomando cuidado para evitar falar como presidenciável, Serra insistiu em que a corrida municipal "foi uma eleição local". E acrescentou: "2010 ainda falta muito para chegar, tem muito tempo daqui até lá e eu, realmente, não estou focado na questão de eleição. Os jornalistas estão. Eu não estou na questão de 2010 porque tem muito chão, tem muita coisa para acontecer daqui até lá."

O governador listou os pontos que, segundo ele, impedem raciocinar agora em torno da sucessão de Lula: "Quero apenas mencionar de passagem a crise econômica, que está chegando ao Brasil, impasses políticos, problemas de alianças partidárias. Há muita coisa indefinida no ar a respeito das suas conseqüências e do que vai acontecer, de modo que 2010 está longe, mais longe do que parece."

MONOPÓLIO

Ao fazer um balanço do País que saiu das urnas, o tucano disse: "O fundamental que essa eleição mostrou é que ninguém tem o monopólio da verdade nem do voto. A eleição sublinhou a pluralidade, a diversidade da vontade do eleitorado. Esse é o aspecto mais importante. Se for olhar o conjunto do Brasil e também o que aconteceu no primeiro turno, você vê que o povo não concentrou os votos, não deu a ninguém o monopólio."

Indagado se sai também vencedor das urnas na cidade de São Paulo, onde viu seu padrinho político, Gilberto Kassab (DEM), reeleito - contra a mesma adversária que ele próprio bateu, em 2004 -, o tucano se disse "muito satisfeito".

"Me considero partícipe pelo fato de que fui eleito em 2004, Kassab era o meu vice, deu continuidade ao programa que nós começamos na prefeitura, ampliou, inovou, fez coisas até diferentes e deu certo", comentou. "Kassab foi eleito, ou reeleito, devido à boa administração que ele fez em São Paulo. Não é o fato de ser meu afilhado, até porque os meus afilhados têm menos idade."

Quadro decadente


Merval Pereira
DEU EM O GLOBO

NOVA YORK. O quadro partidário brasileiro é tão caótico que permite que se faça a análise que se quiser do resultado das eleições municipais. O presidente Lula, por exemplo, foi peremptório: PSDB, DEM e PPS foram os grandes derrotados, pois perderam prefeituras e número de votos, enquanto os partidos aliados do governo venceram, porque todos eles aumentaram a participação no bolo eleitoral. Parece verdadeiro, mas não corresponde à realidade política. O grande vencedor desta eleição foi o PMDB, que formalmente faz parte da base aliada do governo. Mas é possível dizer que em 2010, ou mesmo antes, o partido estará unido em torno da candidatura oficial do PT à sucessão de Lula?

Já ontem começaram as escaramuças, com o PMDB mais uma vez brandindo a ameaça de uma candidatura própria e o PT mostrando dentes para o "aliado", anunciando pelo secretário-geral Luiz Eduardo Cardozo que não abre mão de candidato próprio.

O presidente do PMDB de São Paulo, por sua vez, na qualidade de sócio da vitória de Gilberto Kassab na prefeitura da capital, já se colocou como parte "daquele PMDB que quer Serra como presidente do país". Portanto, nada indica que a base política do governo poderá contar integralmente com as 1.201 prefeituras peemedebistas.

Embora tenha perdido prefeituras e eleitores nas estatísticas, o PSDB continua sendo o segundo partido em número de prefeituras - elegeu 786 prefeitos contra 861 em 2004 -, e, sobretudo, manteve sob sua órbita a capital paulista. Os votos dados a Kassab não entraram na contagem oficial dos tucanos, o que mostra a distorção da estatística, que mascara o real poder político.

Assim como em Belo Horizonte, onde os votos contabilizados para o PSB de Márcio Lacerda devem-se muito mais ao PSDB de Aécio Neves e ao prestígio pessoal do prefeito Fernando Pimentel e à parte do PT que ficou com ele.

No Rio, por exemplo, a enxurrada de votos que o candidato Fernando Gabeira teve foi contabilizada na conta do Partido Verde, formalmente na base aliada do governo, o que é um equívoco político.

Os três partidos de oposição, PSDB, DEM e PPS, que são, segundo Lula, os grandes derrotados, têm somados 1.416 prefeituras, o que os torna a maior força política municipal saída desta eleição, já que nada indica que estarão separados nas eleições de 2010.

O mesmo não se pode dizer do chamado "bloco de esquerda", que, teoricamente se aliará ao PT na eleição presidencial. PSB, PCdoB, PDT, PMN e PRB têm juntos 784 prefeituras, mas terão dificuldades em se aliar ao PT na sucessão de 2010.

O PP, outro partido teoricamente da base do governo, fez 555 prefeituras em todo o país, e não é sensato dizer-se que estará coligado ao PT na sucessão de Lula.

Como se vê, uma análise linear do resultado das urnas leva a confusões próprias de um quadro partidário que consegue fazer com que a extrema direita política esteja junta à extrema esquerda num mesmo governo, cujo projeto político só os une por ser indefinido, dando margem de manobra a todo tipo de atuação.

O fato de que os membros dessa estranha coalizão tenham crescido na distribuição de poder municipal é mais uma demonstração de que deu para cada um dos seus representantes no gigantesco Ministério do segundo governo de Lula usar seus poderes e suas verbas para alavancar seu partido, sem um projeto coletivo.

O Ministério das Cidades, ocupado pelo PP, certamente teve papel relevante para o aumento de prefeituras do partido, assim como o da Integração Nacional teve para a vitória do PMDB baiano, não apenas em Salvador como no interior do estado, consolidando o poder político do ministro Geddel Vieira Lima.

O que vai dificultar a negociação para a permanência no governo, ou facilitar a lenta e gradual mudança de rumo em direção aonde os ventos soprarão para 2010, é justamente a força política de cada um, revigorada na eleição em que ser do governo local representou uma força natural, fosse ele oposição ou situação a nível federal.

Esse, aliás, é um dos motivos pelos quais o movimento para rever a legislação e acabar com a reeleição está perdendo fôlego. Quem estava no poder se reelegeu em uma média de 70%.

A mesma lógica impede que se faça uma reforma do quadro partidário, que a cada dia se mostra mais deformado.

Não há nenhum interesse das lideranças partidárias em mudar o que está dando certo para eles, embora esse seja um raciocínio que leva à decadência em que nos encontramos.

O novo prefeito do Rio, Eduardo Paes, terá que levar em conta a demonstração de metade do eleitorado da cidade em favor da mudança da maneira de se fazer política. Sem máquina partidária, sem estrutura de campanha, sem reduto eleitoral, o deputado Fernando Gabeira transformou-se no símbolo de um movimento que se alastrou pela cidade.

O governador Sérgio Cabral teve uma grande vitória política ao eleger seu candidato preferido, mas, diante do anseio de grande parte da cidade por uma nova postura no enfrentamento das dificuldades, ela foi ofuscada pela maneira nem sempre lisa com que a campanha oficial foi tocada, deixando antever que as alianças com representantes do atraso político que sempre dominou o estado estavam se sobrepondo aos propósitos declarados tanto do governador quanto do seu candidato, finalmente eleito.

As primeiras palavras de vitória do governador, exaltando Eduardo Paes como "o mais preparado", pareceu mais um desabafo arrogante de um governante que foi surpreendentemente contestado em sua vontade por uma cidade dividida entre o velho e o novo.

O novo prefeito deu um passo adiante, afirmando que trabalhará para unir novamente a cidade.

Para isso, terá que abrir mão da velha política que aprendeu quando preferido do prefeito Cesar Maia, e adotar novas posturas, mais de acordo com o futuro por que grande parte da população da cidade anseia.

Verdades e meias verdades


Eliane Cantanhêde
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


BRASÍLIA - O presidente não transferiu votos, os governadores foram os grandes vencedores e o PMDB virou o partido mais cobiçado do planeta. Isso tudo é verdade, mas política não se faz com números nem com certezas, mas com combinações de números e tendências. Senão, vejamos.

Lula não transferiu voto para este ou aquele candidato, mas seus 80% de popularidade pairaram sobre a eleição e sobre muita vitória por aí.

Serra, Aécio e Sérgio Cabral saem bem na foto, mas Jaques Wagner enfrentou uma barreira de PMDB e carlismo na Bahia e recua nas suas pretensões nacionais. E o PMDB...bem, o que vem a ser o PMDB?

Cabral e Eduardo Paes, no Rio, são peemedebistas e lulistas ferrenhos hoje, mas já foram tucanos ontem e podem muito bem estar ou com Dilma ou com Serra amanhã.

Caso do grande vitorioso na Bahia, o já bastante badalado Geddel Vieira Lima, que é Lula no plano nacional e anti-PT no regional.

Se José Sarney votou no domingo pregando a aliança PMDB-Lulismo para 2010, Quércia apoiou Gilberto Kassab sob a perspectiva de uma vaga ao Senado na composição serrista em São Paulo para 2010.

Avaliações numéricas devem ser lidas com uma lupa dialética em eleições municipais, onde o que interessam são as questões comezinhas, o jogo político local e composições às vezes estapafúrdias, bem distantes do Planalto.

Dá para atribuir os 3,8 milhões de votos de Kassab para o DEM? Dá para creditar a derrota de Walter Pinheiro em Salvador para Lula? E o PSB, computado entre os 16 partidos da base aliada, em quantos lugares se aliou ao PSDB para derrotar o PT? Isso foi vitória governista ou oposicionista?

A eleição municipal fortaleceu uns, enfraqueceu outros. Pôs as cartas na mesa para a sucessão presidencial. Mas tem muito jogo até lá.

As fichas dependem da crise e de seus efeitos sobre o país e sobre a força política de Lula.

O fim dos "ismos"?


Clóvis Rossi
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - Algumas anotações sobre o tema da transferência de votos, que é tudo o que 2008 lega, eventualmente, para 2010.

Transferência de voto, ao menos em São Paulo, tem tudo a ver com os "ismos" que empobreceram durante décadas a política paulista.

Antes do golpe militar, Adhemar de Barros elegeu Lucas Nogueira Garcez (1951), assim como Janio Quadros elegeu Carlos Alberto de Carvalho Pinto (1958). Os dois eleitos (para o governo estadual) tinham pouca ou nula experiência eleitoral, eram considerados técnicos e de escasso apelo emocional para o eleitorado.

Ganharam porque a política paulista foi dominada por dois "ismos", o "janismo" e o "adhemarismo", que só começaram a morrer quando seus líderes foram cassados pelo regime militar. Mesmo assim, surgiu outro "ismo", o "malufismo", que, como seus parentes próximos, elegeu o poste da vez na figura de Celso Pitta, em 1996, ou seja anteontem -o que prova a permanência do poder de transferir votos.

Por que, então, Lula não conseguiu eleger Marta Suplicy? Palpites, à espera dos sociólogos:

1 - Não existe "lulismo", pelo menos não em São Paulo, tanto que nem Lula nem o PT conseguiram eleger um único governador no Estado, nem quando o candidato foi o próprio Lula (1982).

2 - Os "ismos" estão em fase terminal na política brasileira, à medida que o país se moderniza -aos trancos, mas se moderniza. O "carlismo" perdeu duas vezes seguidas na Bahia -e para partidos diferentes, o que, em tese, significa que não houve troca de um "ismo" pelo outro.

Mauro Paulino, diretor-geral do Datafolha, ficou perto desta tese em seu comentário antes do turno final: "Os dados mostram que o eleitor está prestando mais atenção à perspectiva de resolução dos problemas locais, mais próximos, do que aos apoios recebidos pelos candidatos".

A agenda de "um novo Bretton Woods"


José Eli da Veiga
DEU NO VALOR ECONÔMICO

Foi somente em 1950 que o crescimento econômico virou objetivo supremo das políticas governamentais. Ruptura forjada por rápido convencimento prévio de que só ele seria capaz de engendrar pleno emprego, objetivo até então preferido por todos os que haviam aderido ao keynesianismo. E uma ruptura para a qual foi decisiva a combinação das idéias de Sir Roy Forbes Harrod, na Inglaterra em 1939, com as de Evsey Domar, nos EUA em 1946, no persuasivo modelo Harrod-Domar. Em plena Guerra Fria, a panacéia foi inevitável: fosse qual fosse o contexto, não haveria mazela social que pudesse resistir a uma boa dose de crescimento econômico. Nem mesmo as desigualdades.

As críticas não demoraram a surgir. Basta lembrar que em 1958 foi lançada a primeira edição do clássico "A Sociedade Afluente" de John Kenneth Galbraith. Embora tenha sido ignorado pela maioria dos economistas, por considerarem o autor no máximo um bom comentarista político, nada de parecido poderia ter ocorrido com Ezra J. Mishan ao publicar, em 1967, uma obra-prima sobre os custos do crescimento econômico (traduzida no Brasil com título tragicamente equivocado). O longo e acirrado debate entre Mishan e Wilfred Beckerman inaugurou a controvérsia científica sobre o crescimento como dogma.

Entretanto, foram posteriores os mais incisivos ataques contra aquilo que passou a ser chamado de "mania" ou "fetiche" do crescimento. E menos motivados pelos custos apontados por Mishan, do que pelo avanço da consciência sobre seus limites socioambientais. Particularmente nas obras pioneiras publicadas na década de 1970 por William Kapp, Kenneth Boulding e Herman Daly. Que, por incrível que pareça, nada pesaram no processo de emergência da noção "desenvolvimento sustentável". O famoso documento da ONU "Nosso Futuro Comum", mais conhecido como Relatório Brundtland, mostra bem como era forte em 1987 a miragem de uma "nova era de crescimento econômico baseada em políticas que sustentem e expandam a base de recursos naturais".

Ocorreu o avesso. O que ficou cada vez mais evidente ao longo dos últimos dois decênios foi a irresponsável temeridade de se aceitar a dependência de energias de origem fóssil. Não apenas pela necessidade de se combater o aquecimento global, que agora se mostra incontornável. Também porque não poderiam ser mais sombrias as conseqüências geopolíticas das desigualdades de acesso às jazidas de petróleo, carvão e gás. E o que é pior: sem que qualquer promessa de inovação científico-tecnológica permita vislumbrar a saída. Por isso, é claro que os problemas ambientais globais deveriam dominar a pauta da eventual reunião de cúpula que talvez se imponha por outra razão: o cenário recessivo que brota de uma das mais sórdidas crises financeiras de que se tem notícia.

Só que esse hipotético "novo Bretton Woods" de pouco serviria se não engendrasse firme cooperação internacional para promover efetivas decolagens em cerca de 70 dos países mais periféricos, nos quais o crescimento econômico é condição necessária, e até suficiente, para que se desenvolvam. Exatamente o inverso do que ocorre nos países centrais, onde o mito do "crescimento sustentável" continuará a causar muito mais prejuízos do que benefícios. E se tal virada fosse bem arquitetada, certamente poderia amortecer os impactos sociais causados por reestruturações no Norte, assim como os ambientais resultantes de mais dinamismo no Sul.

A grande incógnita estaria na semi-periferia. Mas não apenas em quatro "BRIC", ou em punhado de "emergentes". Em 72 países cujas trajetórias de crescimento fazem com que tenham emissões de gases estufa que ultrapassam as de países centrais. Principalmente um grupo de 20 que já causa estrago bem maior que o dos dez maiores emissores do núcleo central. E sem que possam sequer admitir uma ínfima dúvida sobre a necessidade de crescimento de suas economias. Continuariam inteiramente à mercê do surgimento de inovações que descarbonizassem suas matrizes energéticas.

O maior obstáculo, contudo, talvez nem fosse esse, e sim a dificuldade de se admitir que os países mais desenvolvidos já possam dispensar o crescimento econômico. Daí a importância de três claros sinais de que começa a sair do gueto o movimento intelectual que pretende caminhar nessa direção.

O primeiro é um livro cujo próprio título enfatiza ser muito melhor reduzir o crescimento de propósito do que ter de encará-lo por desastre: "Managing Without Growth - Slower by Design, Not Disaster", do professor Peter A. Victor, da Universidade de York do Canadá (Edward Elgar: 2008). Com a ajuda de simulações econométricas, mostra os possíveis resultados de um decrescimento bem administrado da economia canadense com a meta de atingir uma condição estacionária por volta de 2030. Os benefícios socioambientais e econômicos não poderiam ser superiores: pleno emprego, eliminação da pobreza, mais lazer, considerável redução das emissões de gases-estufa, e tudo com equilíbrio fiscal.

O segundo está no dossiê "A estupidez do crescimento", que ocupou 15 páginas da edição de 18/10 da revista britânica "NewScientist", com merecido destaque para Herman Daly. Ele reconhece que, além de radical, o anseio de abolir a obsessão pelo crescimento parece politicamente inviável. Mas também pede que se admita quão absurda é a idéia oposta, de crescimento além dos limites biofísicos da Terra. E lembra que seus limites econômicos já estão patentes, pois os benefícios de mais crescimento são cada vez mais excedidos pelos custos.

O terceiro foi a realização da primeira conferência internacional sobre "decrescimento econômico para a sustentabilidade ambiental e a equidade social" (www.degrowth.net). Nem tudo chega a ter razoável qualidade na salada de textos que ocupa as mais de 300 páginas de seus anais. Mas há ali algumas pérolas, como a demonstração proposta pelo mestre holandês Roefie Hueting de que não há conflito entre emprego e conservação, por mais que a sustentabilidade seja incompatível com o permanente aumento da produção.

José Eli da Veiga, professor titular do departamento de economia da FEA-USP e pesquisador associado do "Capability & Sustainability Centre" da Universidade de Cambridge, com apoio da Fapesp, escreve mensalmente às terças.

Lula ainda testa nomes para 2010


Raymundo Costa
DEU NO VALOR ECONÔMICO



A ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) ainda é o nome predileto de Luiz Inácio Lula da Silva para candidato do PT, em 2010, mas o presidente da República quer testar outros nomes do partido, antes de fazer uma aposta definitiva para a sucessão. No partido a hora é de reflexão sobre os números que saíram das urnas municipais.

O Diretório Nacional do PT deve se reunir, nos próximos dias, para analisar um relatório com o balanço das eleições preparado pela Executiva Nacional da legenda. Lula quer ler esse relatório antes de pautar seus próximos passos.

Entre os nomes que o presidente deve testar estão os dos ministros Patrus Ananias, do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, e Fernando Haddad, da Educação. Se há alguma novidade, Lula guarda a sete chaves. A derrota para o PMDB, na eleição de Salvador, parece ter tirado o governador Jaques Wagner da possibilidade da sucessão.

A Bahia é uma situação que o PT quer analisar cuidadosamente. O Estado concentra o quarto maior colégio eleitoral do país. Jaques se expôs na disputa além do que recomendava a prudência e saiu chamuscado. A disputa por Salvador também pôs em evidência a relação do PT com o PMDB, a base na qual se assenta a sustentação política do governo petista.

Numa primeira avaliação, o PT não vê razões para o PMDB posar com ares de grande vitorioso. Em suas contas, dos seis prefeitos de capital eleitos pelos pemedebistas, apenas dois são do PMDB/MDB histórico: Iris Resende, de Goiânia, e José Fogaça, de Porto Alegre. Os outros quatro são cristãos novos. Assim como foram parar no PMDB, circunstancialmente podem mudar de camisa, por conveniência.

O ex-governador de São Paulo Orestes Quércia, que é um histórico, acha difícil que o PMDB venha a ter candidato próprio - "o que seria o ideal" -, por falta de um nome que galvanize o partido. Sem esse nome, vai defender o apoio à candidatura de José Serra (PSDB) a presidente.

"É para contrabalançar com o Lula", diz Quércia. "Se o PMDB tivesse candidato próprio, seria melhor. Não tendo, nós colocamos em São Paulo essa alternativa". Quércia nega que pretenda viajar pelo país para defender a tríplice aliança PSDB, DEM e PMDB na sucessão de Lula. Mas assegura que vai "conversar com as pessoas nesse sentido".

Outro ponto importante no balanço petista é a situação do partido em São Paulo. No plano estadual, afora a derrota em Santo André - onde o PT quase ganha no primeiro turno e não estava nos planos perder no segundo -, se confirmaram as demais expectativas do partido. Esse foi o melhor desempenho do PT até agora no Estado de São Paulo.

O problema que merece a imersão do Diretório Nacional é a capital, porque o placar de 60% a 40% mostra que não foi só a classe média que migrou para a candidatura de Gilberto Kassab, a periferia também votou no candidato do DEM. Até mesmo áreas consideradas redutos eleitorais do PT.

Na realidade, a candidata Marta Suplicy perdeu votos em algumas dessas áreas do primeiro para o segundo turno, casos, por exemplo, de Sapopemba, São Miguel Paulista e Capela do Socorro, o curral eleitoral urbano da família Tatto.

O PT fará uma análise detalhada da conduta da campanha de Marta no segundo turno, o que inclui o ataque homofóbico a Kassab. Não há como esconder a realidade de que o partido perdeu votos em São Paulo. Em 2004, Marta perdeu para Serra por cerca de 500 mil votos de diferença. Agora, Kassab pôs mais de um milhão de frente.

O que os números dizem é que o PT precisa se reciclar na capital. É curioso notar que em sete eleições municipais o partido teve apenas três candidatos: Eduardo Suplicy (duas eleições), Luiza Erundina (duas eleições) e Marta Suplicy (três eleições, duas derrotas). São evidentes o desgaste e a necessidade de renovação.

Os nomes que estão na bica são Luiz Marinho, eleito prefeito de São Bernardo do Campo, o berço do PT, Emídio de Souza, eleito em Osasco, município que já foi reduto tucano, o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, o presidente petista, Ricardo Berzoini, e seu secretário-geral José Eduardo Cardozo.

É dessa lista que sairão os futuros candidatos do PT à prefeitura e ao governo estadual, se o partido apostar na política de renovação. Uma incógnita é o deputado Antonio Palocci - ele passa à frente da fila se conseguir se desvencilhar do modesto caseiro Francenildo Pereira, no julgamento do STF.

Maior colégio eleitoral do país, São Paulo é fundamental para qualquer projeto presidencial. Para ajudar Lula a eleger o sucessor o PT precisa se fortalecer no Estado e se recuperar com urgência na capital. Salvador serve como advertência de que o Nordeste não é a moleza que os petistas esperam encontrar na região na eleição de 2010.

Acertado o PT paulistano, tantas vezes questionado pelas outras seções do partido, Lula tem como arrumar os demais palanques estaduais.

O discurso já está pronto e é provável que seja sacado antes mesmo da campanha presidencial, já na condução da atual crise econômica, que terá abordagem diferenciada do governo e da oposição, segundo se crê no Palácio do Planalto, revelando um choque (ideológico) de visões entre o PT e o PSDB.

Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras