quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

LIVRO: LANÇAMENTO


Hoje
Livraria Museu da Republica

Catete, 153 – Rio de Janeiro

O futuro do PT

Merval Pereira
DEU EM O GLOBO

NOVA YORK. As diversas pesquisas de opinião que vêm sendo divulgadas nos últimos dias mostram o presidente Lula como um fenômeno de popularidade em meio a uma crise econômica mundial, aparentemente imune a suas conseqüências, diferentemente do país que governa, que vem sendo atingido de diversas maneiras, embora ainda de forma incipiente. Talvez esteja aí a explicação para esse descolamento da popularidade presidencial da realidade, que já não é mais tão rósea quanto foi, mas ainda não é tão ruim quanto tudo indica será nos próximos meses, sem que se saiba exatamente como e por quanto tempo.

O presidente Lula tem tomado conta, com dedicação de mascate, da face psicológica da crise, primeiro negando simplesmente sua existência nas nossas fronteiras - "Crise, que crise? Pergunta ao Bush" -, depois ressaltando sempre o fato de ela ter origem nos países desenvolvidos, e garantindo ao distinto público que os "emergentes" como o Brasil tratarão de salvar a humanidade ameaçada pelos neoliberais internacionais. Como se a política econômica de seu governo tivesse mudanças substanciais em relação ao que chama de "política neoliberal".

E, por fim, garantindo em inúmeros comícios que a culpa da situação cada vez mais difícil é dos outros, dos banqueiros internacionais gananciosos, do Bush, do Fernando Henrique, e que, graças a sua presença providencial à frente do país, estamos mais preparados do que qualquer outro para enfrentarmos a situação.

Por enquanto, tem dado certo, indicam as pesquisas de opinião. Segundo o diretor do instituto Sensus, Ricardo Guedes, o discurso de Lula afirmando que o Brasil vai sair bem da crise, mais as medidas tomadas, ajudaram na avaliação do governo. "A população está dando voto de confiança ao presidente Lula", analisou.

Ainda formam a maioria os que consideram que o país sairá mais forte da crise, seguindo as palavras do líder. Mesmo que já exista uma consciência de que o país não crescerá muito no próximo ano, nada menos que 65,4% dos entrevistados afirmaram que, de uma maneira geral, esperam um 2009 melhor do que este ano.

Não há nada que indique essa possibilidade, e nem mesmo Lula, nos seus surtos de super-homem, ainda ousou garantir isso a seu eleitorado.

Mas certamente essa fé cega é decorrência, em grande parte, além do otimismo nato do brasileiro, da animação constante que o presidente Lula vem fazendo pelos palanques do país.

Apesar do sucesso virtual, o presidente não tem conseguido, no entanto, convencer os agentes da economia real de que devem deixar de lado os temores para continuar investindo.

Diversos setores começaram a parar em novembro, com a perspectiva de meses piores à frente, o que já está criando um círculo vicioso de desemprego crescente e redução de investimentos.

Um índice criado pela Fundação Getulio Vargas para prospectar a atividade da indústria paulista está indicando uma queda da atividade no mesmo nível da que foi gerada pelo apagão de 2001, com efeitos dramáticos no crescimento do PIB do país.

Essa mesma paralisação já está se refletindo na arrecadação tributária, que caiu pela primeira vez após meses de recordes sucessivos que lastrearam uma política de gastos públicos que agora corre o risco de não se sustentar.

Ao mesmo tempo em que convergem para a mesma constatação, isto é, que a popularidade do presidente está resistindo à crise econômica internacional, uma das pesquisas, a da CNT/Sensus, tem um dado que mostra uma "significativa depreciação" dos "índices do cidadão", que medem a percepção dos entrevistados em relação a temas sensíveis para o seu dia-a-dia, como emprego, renda, saúde, educação e segurança pública.

O índice geral, que vai de uma escala de zero a cem, caiu de 54,3 pontos em setembro para 49,29 pontos em dezembro, o que seria "um alerta", segundo o instituto. Assim como há um consenso no mundo da política de que é a economia que determina o grau de satisfação do cidadão com o governante, tendo implicação direta na avaliação de sua popularidade, há exemplos de presidentes populares que viram do dia para a noite sua avaliação desabar devido aos problemas econômicos que seus governos enfrentaram.

A lista é grande, mais recentemente tem em Sarney um exemplo clássico do presidente endeusado por seus cidadãos - os "fiscais do Sarney" do Plano Cruzado - que acabou sendo alvo de ataques ferozes com a crise econômica no fim do governo.

No plano internacional, o ex-presidente Bush teve seu momento de glória na Guerra do Golfo e perdeu a eleição para Bill Clinton devido aos problemas econômicos no fim do governo. O presidente Lula tem, na avaliação do próprio Sarney, uma dimensão maior, comparável à de Getulio Vargas na política brasileira, e sua influência continuará sendo efetiva nos anos a seguir.

Ele já se mostrou capaz de enfrentar problemas políticos graves, como a crise do mensalão, com dissimulação e negociações políticas, mas nunca esteve diante de uma crise econômica tão grave quanto a que enfrenta neste momento.

Em 2003, quando assumiu o governo com uma crise de confiança que abalou a economia, mostrou firmeza na reafirmação das políticas existentes. Mas sabia que tinha tempo para recuperar seu prestígio político num mandato que, na realidade, é de oito anos, com um teste eleitoral no meio para confirmar a continuidade do dirigente.

Com a aprovação nas nuvens, crescendo a cada pesquisa, já é clara a movimentação entre petistas para encontrar novas brechas legais para tentar trazer à discussão pública a questão do terceiro mandato consecutivo.

Ainda mais porque fica a cada dia também mais claro que o único cimento capaz de unir o PT à base aliada do governo é Lula. Sem ele, e com a crise econômica se tornando realidade, é cada um por si, e todos contra o PT.

O desafio da transferência de voto

Villas-Bôas Corrêa
DEU NO JORNAL DO BRASIL


O presidente Lula mergulhou novamente na banheira de águas aromatizadas com os sais que aliviam tensões e perfumam o corpo com a última pesquisa da seqüência que registra a disparada da sua popularidade para as alturas do recorde nacional.

Os 73% que qualificam o seu governo como ótimo e bom segundo o Ibope, e os 71,1% que o aprovam de acordo com o Sensus, em pesquisas encomendadas pelas confederações nacionais da Indústria (CNI) e dos Transportes (CNT), só perdem para os 84% e 80,3% da aprovação recordista da sua avaliação pessoal.

As rosas também picam a pele com os seus espinhos. Por enquanto, um simples arranhão que não chega a provocar insônias. Mas, enquanto Lula dispara, a sua candidata, ministra Dilma Rousseff, não consegue levantar vôo e quase não sai do lugar.

Quer dizer, não é bem assim. Na pesquisa em que o favorito, governador José Serra, de São Paulo, chega perto da maioria absoluta com 46,5% das intenções de voto, a ministra-candidata chega aos dois dígitos, com 10,4%, atrás da ex-senadora Heloisa Helena, do PSOL, com 12,5%. E na pesquisa em que o candidato é o também tucano governador Aécio Neves, de Minas, ele lidera com 25,3%, seguido pela ex-senadora Heloisa Helena, com 19,1%. A ministra Dilma, com 12,9%, mantém a terceira posição.

A esta altura da pré-campanha, que só deve embalar lá por meados de 2009, é simples desqualificar com um piparote os índices desfavoráveis das pesquisas. Ora, se pesquisas nada valem a mais de dois anos de distância das urnas de 2010, então por que empresas e partidos gastam fortunas para encomendá-las e a mídia abre espaço para o registro e as análises dos percentuais?

Nem tanto ao mar nem os pés no buraco. Na alma em festa do presidente Lula não há lugar para pessimismo. Mas, quando o bom senso o aconselhou a sepultar as suspeitas manobras da turma que lota o governo e ensaiava o terceiro mandato, as especulações sobre a sua sucessão começaram a carambolar nas suas especulações. Nos quadros do PT, com os desfalques dos derrotados nas urnas e dos salpicados pelos escândalos de todos os tamanhos, inclusive os acusados de formação de quadrilha, só em última instância cogitaria de apostar uma ficha num dos salvados do incêndio com queimaduras que o tempo cura.

Não foi necessário cansar os miolos para chegar à decisão de correr o risco de lançar a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, para a aventura de bancar uma candidata que nunca disputou uma eleição e que começaria concorrendo à Presidência da República, por onde os bem-sucedidos terminam a carreira.

Lula ainda não descartou a sua candidata preferida. Mas, as barbas grisalhas que emolduram o seu rosto já não posam para a foto da certeza. Depois de vários lançamentos informais nos giros para as visitas às obras do Projeto de Aceleração do Crescimento, o PAC, que dividirá as verbas com as emergências da recuperação das áreas devastadas pelos temporais que inundaram vastas áreas de Santa Catarina, do Espírito Santo e do Estado do Rio, ficou mais reticente.

Não desmente, mas não afirma. Dissimula com as ponderações de um óbvio irrespondível. A ministra-candidata terá que fazer a sua parte. Além da silhueta esbelta com severa dieta, do sorriso que enfeita o rosto e alivia a rigidez da tensão, tomou gosto pelo palanque e não recusa microfone.

A crise econômica que assombra o mundo ainda não chegou às preliminares da sucessão. Por enquanto. E o otimismo presidencial não vai além do possível. Se o terceiro mandato não vingou, Lula não pretende passar o resto da vida conversando fiado com os amigos de São Bernardo do Campo.

Debate: Os 20 Anos da Constituição de República de 1988

O Centro de Estudos Direito e Sociedade e o Laboratório de Estudos sobre a República

Convidam para o debate:

Os 20 Anos da Constituição da República de 1988

com

Luiz Werneck Vianna
Renato Lessa


Data: 18 de dezembro de 2008

Horário: 16:00 horas


Local: IUPERJ

Rua da Matriz, 82 Botafogo

Tel.: 2266.8300

Condutor e passageiros

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O governo pode não saber direito se as medidas pró-consumo terão algum efeito real sobre os efeitos da crise econômica no Brasil, mas o presidente Luiz Inácio da Silva sabe perfeitamente o que faz quando pega no microfone e enche a alma do brasileiro de otimismo, dando à crise um sentido de intriga da oposição.

Os resultados das últimas pesquisas de avaliação de desempenho mostram com nitidez a habilidade de Lula no manejo de emoções. Sem um dado preciso para embasar as opiniões, 62% das pessoas consideram que as medidas do governo estão no rumo certo e apenas 29% já sentem conseqüências negativas no dia a dia.

Compare-se a quantidade de entusiastas ao contingente de afetados e não será difícil compreender a ascensão dos índices de popularidade de Lula à casa dos 80%. Se a maioria ainda não sentiu o problema no bolso, natural que a maioria prefira acreditar que nada de mau acontecerá.

O equívoco de quem se surpreende com a capacidade de Lula de ficar no alto na adversidade é acreditar que popularidade está necessariamente ligada a razões objetivas, enquanto quase sempre guarda relação com motivações subjetivas.

Lula pegou a coisa no ar quando a crise explodiu nos Estados Unidos. Jogou a culpa no colo de George Bush, depois transferiu responsabilidade ao “sistema” neoliberal e, enquanto apontava seus adversários políticos como torcedores do desastre, montava com capricho o nicho de onde reina quando é preciso tirar o corpo fora.

De um lado, anunciando medidas para não vir a ser acusado de apatia governamental e, de outro, construindo o discurso triunfalista em ritmo de Brasil grande.

Resultado, a maioria, quando perguntada, não tem dúvida: a crise é grave, mas o governo faz a sua parte.

Uma brevíssima reflexão ensejaria a dúvida a respeito de qual parte mesmo se trata, mas no mundo das percepções captado pelas pesquisas, convenhamos, isso não passa de detalhe.

Quase tão irrelevante quanto a relação direta entre os índices de preferência eleitoral obtidos pelo rol de possíveis candidatos a presidente e o comportamento do eleitorado daqui a um ano e dez meses.

Só influem nas movimentações partidárias em torno dos pretendentes. Fora isso, vale quase zero saber que a oposição venceria qualquer candidato que não fosse Lula, que Dilma Rousseff é desconhecida por 48% das pessoas a despeito de sua exposição praticamente diária como candidata há dez meses e que 43% poderiam votar em quem o presidente pedisse.

A transferência automática de votos observada na recente eleição municipal falou bem melhor sobre a distância entre o ato da venda e a decisão de compra do produto eleitoral.

Bolha

Um tantinho demasiada a interpretação de alguns senadores de que a pretensão do presidente do Senado, Garibaldi Alves, de se reeleger poderia abrir espaço à idéia de um terceiro mandato para governantes em geral - Lula em particular.

A questão de Garibaldi não é institucional, embora seja matéria constitucional. Além disso, o plano diz respeito a um segundo e terceiro mandato.

Como as excelências estão cansadas de saber disso, há má-fé por parte dos intérpretes: tanto dos que recorrem à alegação para não assumir a rejeição a Garibaldi Alves de novo, quanto dos eternos praticantes do “se colar, colou”.

A história é simples de ser resolvida. Se o PMDB quiser mesmo lançar o nome dele, uma rodada de consultas informais a ministros do Supremo Tribunal Federal resolve o problema da segurança jurídica.

As condições e conveniências políticas da candidatura podem ser obtidas mediante sondagens no Senado mesmo. Considerando que o partido não vai entrar numa empreitada dessas para comprar briga com a Constituição nem com as intenções de voto dos senadores, a celeuma é desnecessária.

A menos que haja no PMDB e no PT gente interessada em alimentar o contencioso entre os dois partidos para amanhã transformá-lo em pretexto.

Cerca Lourenço

A motivação dos pemedebistas para o acirramento do conflito com os petistas seria 2010. Hoje o partido arrasta um bonde pela candidatura de José Serra não por amor às suas olheiras, mas por carinho ao primeiro lugar nas pesquisas.

Uma minoria assume, a maioria faz juras de fidelidade ao presidente Lula a fim de manter uma política mais que de boa vizinhança, de ótima permanência.

Entre os minoritários assumidos estão as seções do partido em São Paulo, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Piauí e Roraima.

Entre os majoritários enrustidos se incluem todos os ministros, governadores e demais interessados nas verbas e nos cargos, cujo desfrute ainda se estende por mais dois anos. São facilmente reconhecíveis pelos elogios enfáticos em público e a descrença veemente em particular à candidatura Dilma Rousseff.

Caminho de tormentas


Nas Entrelinhas :: Luiz Carlos Azedo
DEU NO CORREIO BRAZILIENSE


Neste ambiente de incertezas econômicas, o PT começou a manobrar na Câmara para mudar as regras do jogo da sucessão presidencial

A pirâmide

O Brasil fecha o ano navegando em mar de incertezas. A crise mundial atormenta o governo, os empresários e a oposição, mas a maior indefinição — por causa das projeções econômicas — é a sucessão presidencial. Como dizia o poeta lusitano, tudo é incerto e derradeiro, tudo é disperso, nada é inteiro. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, segundo as pesquisas, ostenta os melhores índices de sua avaliação, mas a do governo e a confiança na economia já são arranhadas pela crise. Como Lula não pleiteia um terceiro mandato, a sucessão presidencial é apenas uma linha no horizonte, para usar a imagem de Fernando Pessoa.

Todas as medidas adotadas pelo governo dos Estados Unidos e pela União Européia não foram suficientes para evitar a recessão mundial. A crise do mercado financeiro continua sendo um baú de surpresas desagradáveis. O espanto da semana foi a falência dos fundos geridos pelo ex-presidente da Nasdaq Bernard Madoff, calculados em US$50 bilhões. As bolsas dos Estados Unidos e da Europa foram atingidas, bem como investidores brasileiros que aplicavam em fundos geridos pelo Santander e HSBC. O fundo era uma pirâmide “Ponze”, uma operação financeira que pagava altos rendimentos aos seus investidores com dinheiro de novos clientes, como se fossem lucros reais. Ou seja, puro estelionato. Ontem, o Goldman Sachs anunciou prejuízo líquido de US$ 2,12 bilhões. Entre os emergentes, dois gigantes, Índia e Rússia, estão sentindo fortemente o baque; a China também, porém é mais robusta. O Brasil aparece em melhor situação, mas também sente o tranco.

O enigma

Todos os economistas que falam sobre a crise (alguns permanecem na muda) defendem categoricamente a redução da taxa de juros. Até agora, a única justificativa para mantê-la no patamar atual é a preservação da autoridade do Banco Central, a chamada credibilidade da autoridade monetária. É uma razão subjetiva demais para uma situação onde todos os fatores objetivos apontam em direção contrária. A expansão da economia atingiu seu ponto máximo em outubro. A arrecadação de novembro caiu. As projeções para o primeiro trimestre do ano apontam para a forte redução da atividade econômica, apesar do otimismo do discurso do presidente Lula. É que a demanda de bens de consumo desabou, principalmente de bens duráveis, como automóveis, e o crédito ficou mais curto e caro. A inflação está domada, mas o Banco Central argumenta que não baixa os juros porque ainda há muitas incertezas na economia. Ou seja, para preservar a credibilidade, promove a insegurança.

A manobra

Nesse ambiente de incertezas econômicas, o PT começou a manobrar na Câmara para mudar as regras do jogo da sucessão presidencial. O relatório do deputado João Paulo Cunha que propõe o fim da reeleição e mandatos de cinco anos foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça. A proposta abre espaço para a reapresentação do projeto de plebiscito que permitiria ao presidente Lula disputar o terceiro mandato. A reforma eleitoral também ameaça acabar com as coligações, restabelecer a cláusula de barreira e abrir a janela para o troca-troca partidário um ano antes da eleição. É um atalho para o golpismo continuísta. Lula não embarcou na aventura, mas o “queremismo” pode ganhar força com a crise. Enquanto isso, os governadores tucanos José Serra e Aécio Neves afiam os floretes.

A terceira via

Quando a candidatura do Michel Temer parecia consolidada, com a adesão do bloco de oposição PSDDB-DEM-PPS ao acordo PMDB-PT, o deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) se lançou candidato a presidente da Câmara com apoio do bloquinho PSB-PDT-PCdoB. Ambos são ex-presidentes da Casa e enfrentarão Ciro Nogueira (PP-PI) e Milton Monti (PR-PR). Essa eleição promete um segundo turno imprevisível. Na Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN) tenta uma estranha reeleição, mais um sinal de que o candidato petista Tião Viana (AC) não consegue o apoio da bancada do PMDB para ocupar a Presidência da Casa. Por incrível que pareça, os dois movimentos são mais sincronizados do que se imagina. Sinalizam que a candidatura da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT), ainda não empolgou os aliados de Lula.

Números e números

Marcos Coimbra
Sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi
DEU NO ESTADO DE MINAS


Lula pode se livrar de cobranças pelo agravamento da situação do país. Sua camada de teflon pode protegê-lo outra vez

A semana política começou sob o impacto de duas novas pesquisas, feitas nos primeiros dias de dezembro. Elas trataram de vários assuntos, mas dois mereceram destaque na imprensa. De um lado, a notícia de que Lula havia batido, mais uma vez, seu recorde de popularidade. De outro, que o quadro de sua sucessão permanecia basicamente igual ao que foi ao longo do ano, mas com uma mudança importante.

Não é demais insistir que os números atuais da aprovação presidencial querem dizer, por enquanto, pouco. Faz tempo que eles vêm melhorando, acompanhando a melhora das avaliações da população a respeito da situação da economia brasileira. Enquanto estiveram crescendo o emprego e a renda, vimos subir as percepções positivas do desempenho do governo, em uma relação quase imediata.

Estávamos perante uma equação simples e direta, na qual maior consumo gerava maior satisfação com a vida, em geral, e, em particular, com a atuação do presidente à frente do governo. Todas as pesquisas feitas do começo de 2007 até agora mostraram, uma a uma, que nenhuma política específica alcançava a nota média do conjunto do governo, salvo as de transferência de renda. Ou seja, que o todo era maior que a soma das partes, pois o Bolsa Família, por mais relevante que fosse, não seguraria, sozinho, números tão elevados de popularidade do governo. Onde, então, eles se sustentavam?

A solução desse mistério é que, na maior parte dos casos, quando perguntadas sobre o governo, as pessoas tendem a responder baseadas nos sentimentos que têm sobre o país e estes, na sua situação concreta. A fórmula é simples: se minha vida está melhor, é porque o Brasil está melhor e, se o Brasil está melhor, é porque o governo é bom.

Existe quem estabelece uma relação de causa e efeito entre esses elementos. São os que acham que foi Lula quem criou as condições para que o país melhorasse e, em conseqüência, para que sua vida ficasse mais confortável. Mas não são a maioria, para a qual os nexos causais são menos claros. Foi Lula? Foi a economia mundial? Os empresários e os trabalhadores? Tudo isso junto, sem que a paternidade de Lula fosse inequívoca?

Os resultados da pesquisa CNI/ Ibope são interessantes, pois permitem comparar os números de Lula, no seu ápice atual, aos de Sarney, quando atingiu seu máximo, no apogeu do Plano Cruzado. Os 73% obtidos por Lula, na soma de avaliações de que seu governo é “ótimo” ou” bom”, por mais altos que sejam, são apenas iguais aos 72% que Sarney alcançava em setembro de 1986, quando faltava um mês para que despencasse, com a decepção provocada pelo fim do Cruzado.

Há vinte e poucos anos, a melhoria das condições de vida da população, propiciada pelo fim aparente da inflação, foi relacionada diretamente à ação do governo, como as pesquisas de então revelaram. Sarney foi às alturas como seu criador e aos infernos quando tudo deu errado. Quem era identificado como responsável pelo sucesso não tinha como fugir das responsabilidades pelo fracasso. E com Lula, agora, como se darão as coisas?

Vamos saber com a evolução da economia, que não promete ser boa. Por ora, tudo indica que será pior. Mas Lula pode se livrar de cobranças pelo agravamento da situação do país. Sua camada de teflon pode protegê-lo outra vez.

O segundo conjunto de resultados dessas pesquisas diz respeito ao quadro sucessório de 2010. Comparando com outras que foram divulgadas recentemente, parece que o processo de contração da candidatura de Ciro Gomes continua, em função de sua menor visibilidade nas eleições municipais de outubro.

De acordo com os dados da pesquisa CNT/Sensus, Ciro estaria agora sempre em terceiro lugar, atrás dos dois nomes do PSDB e de Heloísa Helena, à frente apenas de Dilma, que qualquer um aposta que vai crescer, em função do apoio de Lula. A rigor, Ciro estaria, portanto, perto de ir para um possível quarto lugar.

A novidade é que, na pesquisa, tanto Serra, quanto Aécio lideram nas listas em que são contrastados aos demais candidatos. Ela conduz a algo que já se podia antever e que agora ficou claro: não faz muito sentido o raciocínio de que a candidatura Serra “se impõe”, por liderar as pesquisas. Aécio também está na frente dos demais candidatos, no cenário atual.

O PSDB pode escolher quem achar melhor para o cargo, com liberdade. O argumento da pesquisa não basta. Se o indicado, quem quer que seja, vai ganhar, são outros quinhentos cruzeiros (ou reais ou cruzados, sabe-se lá).

Unesco é lugar para criar o novo modelo


Rosângela Bittar
DEU NO VALOR ECONÔMICO


A diplomacia brasileira está negligenciando uma disputa a que o país tem direito e boas chances de êxito por razões que, pelo menos as explícitas, não são de todo convincentes. Trata-se da candidatura do senador Cristovam Buarque (PDT-DF) a diretor-geral da Unesco, a Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura. Desta vez, o continente latino-americano tem direito a pleitear o cargo. O ex-presidente português, Mário Soares, iniciou a campanha de Cristovam. Falou com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre o assunto e disse que o Brasil deveria apresentar uma candidatura. Informou que o candidato dele e de um bom número de países é o senador, com quem convive em iniciativas internacionais na área da Educação.

Lula já perguntou a Cristovam se a história é para valer e, diante da resposta afirmativa, pareceu vislumbrar aí uma boa idéia. Há um processo eleitoral completo a se cumprir para a escolha do diretor geral da Unesco, e os prazos estão correndo. Cristovam disse ao presidente Lula que se ele e o ministro Celso Amorim quiserem apresentar seu nome, tem não só interesse, como acha que é um cargo que vale a pena o Brasil tentar obter neste momento. Segundo o senador, a Unesco é o único lugar, hoje, onde se pode pensar a civilização, o modelo inteiro de sociedade.

"As outras entidades, ou elas pensam a política, como as Nações Unidas, por exemplo, ou pensam a economia, como a OIT, a Unctad, ou são muito específicas, como a organização do Meio Ambiente", diz . Na opinião do senador, o lugar onde se pode refletir um modelo novo e, além disso, colocar a Educação no centro deste modelo, é a Unesco.

Depois da conversa inicial com Lula, Cristovam viu se ampliar o movimento, no exterior, a favor de seu nome. Também no Brasil começaram a crescer as adesões. Artistas, no Rio e em São Paulo, o receberam para apoiar a candidatura. A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) está analisando formas de encaminhar um apelo às autoridades. Os reitores já apoiaram. Os ministros da área da Unesco - da Educação, Fernando Haddad, da Cultura, Juca Ferreira, e da Ciência e Tecnologia, Sergio Resende - querem, apóiam e, inclusive, o voto do governo brasileiro, no caso da Unesco, é levado pelo ministro da Educação.

Esta semana, os senadores, colegas de Cristovam, de diferentes partidos, levarão ao ministro Celso Amorim, das Relações Exteriores, a quem cabe coordenar o processo eleitoral e dar a última palavra (antes do presidente da República, claro) e a decisão sobre o assunto, um abaixo assinado com o pedido para que apresente a candidatura de Cristovam. O senador Aloysio Mercadante vai levar o caso também ao Parlamento do Mercosul. O processo todo precisa fluir até o Natal, porque depois o Brasil entra em recesso até depois do Carnaval e, por inércia, corre o risco de ficar fora da disputa. Até março é o prazo para indicar o candidato ao Conselho da Unesco. Este conselho reúne-se e divulga os nomes apresentados. Em novembro, a escolha.

Cristovam Buarque já teve duas conversas com o chanceler Celso Amorim, em cujas mãos está a possibilidade de ter ou não a candidatura aprovada. Do chanceler o senador ouviu dois argumentos contra. O primeiro é que, embora seja a vez do continente latino-americano, os árabes querem o posto, e Amorim acha que o Brasil não deve disputar nada com os árabes. O outro é que o governo brasileiro já perdeu seis disputas de cargos em organismos internacionais, na sua administração, e não gostaria de perder mais uma.

As alegações são discutíveis. Primeiro porque a diplomacia sabe que os árabes já estão completamente divididos neste assunto. Se perdurar o desejo de lançar candidato, não terão um só, mas vários, e se não se unirem não há porque o Brasil fugir da disputa pois, mesmo levando em conta a opção pela submissão à preferência, não estará indo contra uma determinada indicação mas contra vários, e a favor do seu.

Quanto ao segundo argumento, é ainda menos crível. Quem perdeu 6 é porque insistiu após cada uma das derrotas. Não há porque não tentar a sétima, exatamente a de maior chance.

Outra argumentação do Itamaraty contra o pleito de Cristovam, e foi o próprio ministro Amorim quem alegou esta razão a colegas seus, é que o senador, no início do processo, lançou Ingrid Bittencourt para o cargo. É verdade. Quando ela foi libertada, Cristovam chegou a afirmar, em entrevistas, que sendo a vez do continente latino-americano, Ingrid seria um bom nome, entre outras razões porque daria uma levantada na imagem da instituição, que anda muito apagada. A própria Ingrid lhe telefonou para agradecer e dizer que o interesse dela está na Colômbia e em ações pela paz, não na Unesco.

A fragilidade destes motivos pode indicar que, na verdade, existem outros, mas ainda não convém ao Ministério expor o que lhe vai à alma. Como, por exemplo, o Itamaraty ter um outro candidato brasileiro ao posto. Já se falou, meses atrás, que o atual segundo nome da Unesco, Márcio Barbosa, está em campanha para ser indicado pelo governo brasileiro. Além de integrar uma diretoria que colocou a Organização da ONU para Educação, Ciência e Cultura numa posição de extrema discrição, para não dizer omissão internacional, há o declarado desejo de mudança, manifestado à Unesco por diferentes continentes, e a informação do próprio Itamaraty, aos que levantam a candidatura de Cristovam, que Barbosa não foi convidado.

Há sempre disputa pela diretoria da Unesco, e vários nomes são lançados dentro do continente da vez. Uma indicação forte do sucesso de uma candidatura agora é que até o momento não há nenhum outro nome latino-americano na roda. Unidos, os latinos conseguem votos na África, além de outros que vêm acompanhando pleitos do Brasil, como a China, por exemplo. Europa e Estados Unidos não vetarão um candidato brasileiro. Se Celso Amorim quer entrar só se tiver certeza da vitória, esteja certo de que não a terá, mas as chances nunca foram tão grandes.

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

A festa americana


Clóvis Rossi
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

COSTA DO SAUÍPE - Experiente funcionário público, ex-ministro de mais de uma pasta no Chile, pré-candidato às primárias que escolherão o candidato presidencial da "Concertación", a coligação que governa o país desde o fim da ditadura Pinochet em 1989, José Miguel Insulza põe uma pitada de ceticismo (ou realismo?) no entusiasmo dos governantes latino-americanos pelo que alguns chamam de OEA sem os Estados Unidos e o Canadá.

Insulza é justamente o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos. Diz: "Não se pode confundir uma instituição [como a OEA] com uma conferência [como as multicúpulas da Bahia]".

Teme que, por não ser uma instituição, a cúpula latino-americana e caribenha termine por apenas convocar uma nova cúpula, já que não tem poder institucional para ir além de declarações de intenções, por generosas que sejam.

Formalmente, ele até tem razão. Mas, na América Latina, sempre se dá um jeitinho. Tanto que a Unasul, o conglomerado das 12 nações sul-americanas, também não é uma instituição, suas regras nem sequer foram aprovadas pelos Parlamentos, exceto os de Bolívia e Venezuela, mas, ainda assim, ontem foi aprovado o estatuto do Conselho Sul-Americano de Defesa, justamente uma área sensível.

O problema parece ser menos o aspecto formal e mais as divisões entre os países ao sul do rio Bravo.

Para resumir o que não é tão facilmente resumível, há duas grandes divergências embricadas: entre os que aceitaram gostosa ou constrangidamente o capitalismo e entre os que falam e/ou praticam um socialismo, embora ainda incipiente e pouco nítido.

Dessa divergência decorre a outra: a integração deve ser por meio de uma OEA sem Canadá e Estados Unidos ou é inevitável chamar também os dois para a festa americana?

Aguardo o seu palpite.