quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Hora incerta

Míriam Leitão
DEU EM O GLOBO


O desemprego e a informalidade caíram quatro anos seguidos. Os salários e a renda aumentaram. Agora está havendo o inverso; os números devem piorar nos próximos meses. O desafio do governo e das empresas do Brasil este ano será manter e criar empregos. Ontem saíram assustadores indicadores antecedentes, todos apontando para quedas de produção e vendas.

O IBGE divulgou queda de 0,6% no emprego industrial em novembro, a maior queda mensal desde outubro de 2003. A indústria divulgou que as vendas de papelão ondulado caíram 15,5% em dezembro. A FGV divulgou um indicador antecedente desenvolvido junto com a Eletropaulo-AES, o Sinalizador da Produção Industrial, com queda de 13,5% em dezembro.

- Acho esse último dado mais assustador. Se o Sinalizador da Produção Industrial estiver certo, isso daria um efeito na produção industrial do Brasil de aproximadamente menos 5,5% em dezembro. Outros dados gravam esta tendência, como a queda de 15% na venda de papelão ondulado. Nossa projeção para a produção industrial de dezembro já é de queda de 6,5% - diz o economista Marcelo Sperb.

O economista Sérgio Vale, da MB Associados, diz que a previsão da consultoria também é pessimista.

- O choque foi amargo e dezembro de 2008 mostrará bem isso, com queda de 9,8% em relação a dezembro de 2007.

A crise econômica chegou quando o Brasil ainda não tinha resolvido os desequilíbrios no mercado de trabalho. Mesmo no auge do ano passado, a informalidade continuava grande, o desemprego para jovens não tinha caído e havia falta de trabalhadores qualificados. As empresas que investiram em formação dos seus funcionários estão hoje, em alguns casos, enfrentando o dilema de ter que demitir aqueles nos quais investiu.

Um médio empresário do Espírito Santo, da área de Tecnologia da Informação, fez isso. Passou quatro anos qualificando seus trabalhadores. Ele é fornecedor para a indústria siderúrgica. Quando a situação começou a complicar, ele não quis demitir, porque sentia que seu principal capital era o intelectual, os trabalhadores nos quais tinha investido. Veio a crise, seus contratos foram todos suspensos e ele está, agora, às vésperas de encerrar as atividades. Ele pediu que não publicássemos seu nome e o da empresa, porque está exatamente no meio do caminho de liquidar as últimas contas e fechar as portas, mas sua história é bem emblemática.

Em quatro anos ele formou uma equipe de 40 consultores - uma equipe jovem e bem treinada. Os cursos eram pagos pela empresa, que também oferecia bolsa para quem quisesse se especializar. Em 2006 surgiu a oportunidade de expandir os negócios em São Paulo. O faturamento, em um ano, passou de R$6 milhões anuais para R$12 milhões, mas os custos na capital paulista foram maiores. Ele não teve tempo de treinar jovens, teve que contratar profissionais mais caros.

- O que eu ganhei de cliente em São Paulo, rapidamente, perdi. E como não consegui renovar os contratos, e ainda acreditava em projetos e na equipe, demorei a desmontar a estrutura. Tive de pegar empréstimos para pagar salários. Depois que deixei os negócios em São Paulo, os contratos que eu tinha me permitiam pagar a equipe do Espírito Santo e os empréstimos. Mas a crise aqui chegou antes - diz o empresário, que luta para quitar os débitos fiscais de seu negócio.

Seus erros - digamos assim - foram gastar com qualificação de pessoal e querer ampliar o negócio no meio do boom de crescimento.

- No segundo semestre do ano passado as coisas foram piorando, os contratos não foram renovados e nestes últimos dois meses tudo piorou ainda mais. A crise abateu as empresas locais de prestação de serviços.

Há várias situações diferentes: grandes empresas com crises nas suas matrizes e que precisam reduzir custos de qualquer forma; as indústrias dos setores de bens de capital, bens de consumo duráveis, bens intermediários e matérias-primas industriais estão com queda forte de vendas e, o que é pior, sem visibilidade do que vai acontecer nos próximos meses. Por isso demitem. E isso vai afundando mais ainda a economia.

Esta deveria ser a hora de se pensar em encontrar outras formas menos rígidas de contrato de trabalho. O empresário capixaba afetado pela crise descreve sua situação assim:

- Me sentia trabalhando para pagar a bancos e ao governo. Parece que tudo conspira contra você quando vem uma crise. Aqui no Brasil, os impostos são altos, os encargos são elevados e o governo não quer saber da sua situação, só de arrecadar. O custo do trabalho é muito grande. Neste momento, fala-se de tudo, mas o governo não apresentou uma proposta para reduzir encargos trabalhistas. Não é tirar benefício do trabalhador, mas reduzir os custos do empregador.

Indicadores como consumo de energia, venda de papelão ondulado e sinalizador da indústria servem para antecipar o ritmo de crescimento que o país terá no futuro. Eles estão todos trazendo quedas fortes, como se viu ontem com o papelão ondulado. Quando se vende menos papelão ondulado é porque há menos produtos para serem embalados.

Até os índices de emprego começam a sentir o impacto.

- O emprego, geralmente, é um dos últimos índices econômicos a sentir a desaceleração, mas, pelas notícias correntes, as demissões estão se acelerando - diz Marcelo Sperb.

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