quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

O ensaio geral de um novo modelo

Rosângela Bittar
DEU NO VALOR ECONÔMICO

As prévias das eleições americanas, ou a busca de um modelo de contato preliminar com o eleitorado que esteja mais ao gosto da política brasileira, entraram definitivamente na agenda de políticos de diferentes partidos e até de ministros de Estado com pretensões eleitorais. O governador de Minas, Aécio Neves, foi apenas o primeiro a anunciar formalmente seu projeto de correr o país, a partir de fevereiro próximo, com o objetivo declarado de formular, ouvindo a sociedade, um projeto de governo a ser oferecido pelo PSDB na campanha presidencial de 2010.

Parlamentares do seu grupo político, no entanto, informam o objetivo não declarado do périplo, que teria como finalidade tornar o governador mineiro mais conhecido e afastar a idéia de que há apenas um candidato competitivo entre os tucanos, que seria o governador de São Paulo, José Serra, sempre em primeiro lugar nas sondagens de opinião realizadas por qualquer instituto de pesquisa.

Está ai, pois, o governador mineiro, dois anos antes do encerramento de seu mandato, já partindo para outra campanha que tem boa parte das características de uma prévia eleitoral. Há um ministro, também de Minas e potencial candidato à sucessão de Aécio, que vem intensificando a propaganda de seus atos e aumentando as viagens. Patrus Ananias (PT), pelo que revelam seus assessores em informes distribuídos com regularidade, visita os Estados mas tem um rota pelo interior de Minas bem característica de uma campanha prévia, a bordo dos programas assistenciais de sucesso do Ministério do Desenvolvimento Social, que servem bem às suas pretensões eleitorais.

A candidata do PT à sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff, há mais de um ano freqüenta os palanques presidenciais Brasil afora, com extrema regularidade, para elevar o nível de conhecimento que os eleitores têm dela e associar seu nome e projeto político aos do presidente. Isto é uma prévia, pois embora não haja uma disputa dentro do seu partido, um dos objetivos deste tipo de campanha - testar programas, discursos e até imagem - está se realizando integralmente.

Um grupo de parlamentares do PDT, PV, PT, PSB e PMDB deve iniciar brevemente a execução de um programa de contatos com a sociedade de todas as regiões do país, também comparável às prévias. Os senadores Cristovam Buarque (PDT), Eduardo Suplicy (PT), Paulo Paim (PT) e Pedro Simon (PMDB), os deputados Ciro Gomes (PSB) e Fernando Gabeira (PV), e a ex-senadora Heloísa Helena (P-SOL) vêm conversando sobre alternativas ao fugaz e tardio contato com o eleitorado que se dá no período da propaganda gratuita de televisão ou do debate entre candidatos.

"Vamos chegar a uma universidade, ou a uma praça, a uma reunião de associações, e debater com a população um projeto para o país, explicar o que faríamos se fôssemos presidente", informa Cristovam Buarque. Suplicy não pretende disputar prévia eleitoral para escolha do candidato do PT a presidente da República, já avisou isto ao presidente Lula e à ministra Dilma Rousseff, a quem deu seu apoio. Mas aceitou fazer parte deste projeto de palestras pelo país. "Falar às universidades, ser ouvido como uma pessoa com idéias para o Brasil, eu aceito. Avalio como muito importante o processo de debater idéias", assinala.

Fernando Gabeira, que acaba de sair de uma campanha extremamente disputada para a Prefeitura do Rio, em que perdeu por uma pequena margem de votos e cresceu muito ao longo da caminhada, diz que há uma diferença entre as campanhas eleitorais americana e brasileira que é fundamental. O período pré-eleitoral da eleição americana é muito intenso, nele é possível mobilizar o país de forma ampla. "Estávamos querendo que as eleições brasileiras fossem discutidas e acompanhadas de forma que os candidatos pudessem mobilizar seus eleitores e a campanha não fosse reduzida apenas a assistir debates pela televisão".

De qualquer forma, Gabeira argumenta que não chegou a firmar compromisso em torno do programa porque, na sua opinião, a situação política de cada um dos envolvidos é diferente. "O Cristovam é candidato a candidato, a Heloísa Helena também, seria mais interessante que eles saíssem fazendo estas palestras. Não sou candidato a presidente. De uma certa maneira vou ter que cuidar da eleição local, estadual", explica.

Sem prejuízo da atenção à política estadual, no entanto, Gabeira poderá contribuir para que o debate nacional seja o mais intenso possível. "Quando chegar o momento, podemos dar palestras, participar de algum debate sobre a perspectiva do país para animar um pouco mais a eleição presidencial. Minha pretensão pessoal é apenas a de animar, de fazer com que seja o mais participativa possível, mas pessoalmente não estarei dentro dela. E qualquer eleição que eu dispute, do espectro que existe aqui, de senador, deputado, governador, será decidida no âmbito estadual". Além das viagens pelo Brasil, Gabeira lembra o novo papel da Internet na dinamização das campanhas com que, a seu ver, chega-se a melhores resultados gastando menos energia.

Cristovam diz que várias universidades já estão manifestando interesse em sediar esses debates, entre elas a Cândido Mendes, no Rio, e as Federais do Paraná e de Pernambuco.

"Temos que criar a cultura da prévia, é positiva, é democrática, permite que a população se envolva no processo eleitoral antes do horário gratuito", enfatiza Cristovam. Para o senador, o processo eleitoral brasileiro, como está no momento, não permite o surgimento de propostas novas. "No Brasil nem tem prévia nem tem primeiro turno, pois a mídia e os institutos de pesquisa já definem logo quem são os dois contendores", afirma. Se nada lograr em termos de resultado eleitoral, o senador confia em resultados importantes do ponto de vista da opinião. Uma boa proposta, em um processo pré-eleitoral deste tipo, terá que, a seu ver, merecer atenção dos candidatos viáveis.

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

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