quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Em condições de igualdade com Serra

Maria Inês Nassif
DEU EM VALOR ECONÔMICO

A oposição pode estar cometendo um erro fatal ao superestimar as chances de vitória do PSDB nas eleições presidenciais de 2010. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva é um fenômeno de popularidade na história recente do país e esse é um dado novo que, se não elege automaticamente a ministra Dilma Rousseff - a mais que provável candidata do PT de Lula -, dá a ela condições de disputar em igualdade de condições com o candidato favorito, o governador de São Paulo, José Serra (PSDB). Os 13,5% que ela exibe na mesma pesquisa CNT/Sensus divulgada na última terça-feira já são produto da transferência de popularidade do presidente para a sua candidatura. A ministra, afinal, nunca disputou uma eleição e não tem o "recall" de Serra, que foi candidato a presidente em 2002 e por isso é conhecido nacionalmente. Se ela passou dos dois dígitos, é porque está sendo identificada como a candidata de um presidente campeão de votos e como a possibilidade de continuidade de um governo que tem aprovação de 72,5% (este também é o momento em que a popularidade do presidente e do governo mais se aproximam. Os dois índices já foram esquizofrenicamente estanques: Lula sempre foi bem mais popular que seu governo).

Dilma já polariza com Serra. Sinal disso é que, da última pesquisa, de dezembro, para esta, coletada em janeiro, as intenções de voto em Dilma subiram quase na mesma proporção que a queda nos índices do tucano. A ministra ganhou 3,1 pontos percentuais e o governador perdeu 3,7 pontos. É certo, ele neste momento é o favorito, com seus 42,8% das intenções de voto, mas isso não o torna seguramente o eleito. Ainda vai rolar muita água debaixo da ponte.

Disputar com o apoio de um presidente tão popular é algo inédito na história recente e não existem parâmetros para avaliar qual a tendência do eleitor que aprova Lula e seu governo. O primeiro presidente pós-redemocratização foi José Sarney, que saiu do governo no turbilhão de uma hiperinflação. Não elegeria síndico de prédio. O candidado de seu partido, o PMDB, o deputado Ulysses Guimarães, não conseguiu sair de um dígito; o mesmo ocorreu com Mário Covas, o candidato do PSDB, partido recém-saído da costela do PMDB. Foi eleito Fernando Collor, o candidato que fez o discurso oposicionista mais violento e mais aproximado da classe média descontente, mas temerosa de perder o status quo no caso de vitória de Lula, que foi o candidato de esquerda no segundo turno.

Collor sofreu o impeachment em 1991 e assumiu o resto de seu mandato o vice Itamar Franco, que era popular quando saiu do governo por causa do Plano Real mas não participou ativamente da eleição, nem tinha grande carisma, sequer a enorme popularidade que hoje tem Lula. Fernando Henrique Cardoso (PSDB) foi eleito como o candidato de situação, mas deve sua eleição mais ao sucesso do Plano Real, do qual assumiu a paternidade como ministro da Fazenda de Itamar, do que à ajuda do presidente da República que teoricamente o apoiava, mas não participou ativamente da sua campanha.

Em 1998, Fernando Henrique foi o primeiro presidente a ser reeleito na história do Brasil, beneficiário que foi da emenda da reeleição, aprovada no ano anterior. Em dezembro daquele ano, recém-saído das urnas, tinha um índice de aprovação, pela mesma CNT/Sensus, de 32%. Foi o máximo a que chegou. Essa popularidade garantiu sua reeleição, mas dificilmente um índice nesse patamar seria suficiente para credenciá-lo a transferir um voto que seria seu para outra pessoa. Em 2002, já com a popularidade abaixo dos 30%, não conseguiu acrescentar votos à candidatura de seu candidato, José Serra, que perdeu para Lula.

Lula manteve seus índices de aprovação ascendentes ao longo do governo, exceto pelo período em que foi afetado pelo escândalo do mensalão. Nessa última pesquisa, chama atenção não apenas os inacreditáveis 84% de aprovação no âmbito nacional, mas os mais inacreditáveis ainda 90,8% de aprovação no Nordeste, uma das regiões mais beneficiadas com os programas de transferência de renda de seu governo. Isso quer dizer que a quase totalidade da população nordestina aprova o presidente. Essa é uma região mais propensa à transferência de votos, quer por ter tradicionalmente uma tendência governista, que pelo fato de o PT e dos partidos que apoiam o governo lá terem expandido sua influência nesses seis anos de governo petista. Segundo a pesquisa CNT/Sensus, Dilma já tem 21,8% das preferências dos nordestinos. Na região Sul, onde Lula sempre manteve popularidade mais baixa, Serra atinge sua maior popularidade - 57,4% das intenções de votos. O tucano é forte no Sudeste, que tem 43% do eleitorado total, mas a região parece mais sujeita a uma reversão de tendência do que o Sul, que teve no governo Lula uma tendência marcadamente antipetista. Nas eleições de 2006, o então candidato tucano, Geraldo Alckmin, venceu no primeiro e perdeu no segundo turno no Sudeste. O Nordeste tem 26% do eleitorado brasileiro e capacidade para desestabilizar uma candidatura de Serra. O Sul ajuda, mas tem apenas 15% do total de votos nacionais. Na lanterna de eleitores estão o Norte (7%) e o Sudeste (7%).

Em 2005, animados com os efeitos do escândalo do mensalão sobre a popularidade do presidente, os partidos de oposição chegaram a sugerir que Lula renunciasse a disputar o segundo mandato. Deram o presidente como morto. A recuperação de Lula foi rápida e notável, com a ajuda da oposição, que não percebeu o peso que teria na disputa eleitoral a população de baixa renda, beneficiada pelos programas sociais. Confiou que a classe média, mais sensível a escândalos políticos, seria a grande formadora de opinião contra o governo. Em 2010, corre o risco de entrar na campanha apostando que a tradição política no Brasil recente é a de que presidente não transfere voto para candidato. Pode estar cometendo um erro igualmente grande.

Maria Inês Nassif é editora de Opinião. Escreve às quintas-feiras

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