quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Faltou clareza

Celso Ming
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Os políticos continuam insistindo que a Main Street (o centro da economia real) é mais importante do que Wall Street (o coração do mercado financeiro americano). Com isso, querem dizer que é preciso parar de injetar dinheiro nos bancos e no inchado mercado financeiro e usar os recursos do contribuinte para acionar a produção e a criação de empregos.

Apesar da enorme hostilidade com que os bancos são vistos hoje nos Estados Unidos, o secretário do Tesouro, Timothy Geithner, anunciou a criação de um plano de três pontos a ser dotado de cerca de US$ 2 trilhões de capitais públicos e privados. E um novo esquema destinado a sanear o sistema financeiro americano.

Convém falar primeiramente do barril de pólvora assentado sobre os mercados e sobre a economia real, num quadro de alastramento do incêndio. E, em seguida, desse novo plano Geithner.

É preciso tomar as lambanças praticadas pelos bancos nos últimos sete anos, com a bênção ou a omissão das autoridades, como um dado da realidade. O Programa de Alívio de Ativos Problemáticos (Tarp, na sigla em inglês), do secretário do Tesouro do governo anterior, Henry Paulson, de US$ 700 bilhões, destinava-se a resgatar os ativos tóxicos que estavam nos livros dos bancos.

Foram consumidos US$ 350 bilhões com esse objetivo e, no entanto, os bancos continuam com a barriga cheia de títulos tóxicos e, por isso, estão longe de inspirar confiança. Além disso, esses recursos estão sendo distribuídos sem transparência e sem que ninguém exija a devida prestação de contas (accountability).

Essa é a principal razão por que ninguém empresta (nem aplica) aos bancos e, consequentemente, por que os bancos continuam sem condições de retomar as operações de crédito. E, sem crédito, consumo e produção, os postos de trabalho vão afundando nos Estados Unidos e no resto do mundo rico.

Por mais irresponsáveis que tenham sido os banqueiros e os demais gatos gordos de Wall Street, por tantos anos cevados com salários e bônus nababescos, deixar que os bancos afundem é perpetuar a falta de irrigação sanguínea e, assim, empurrar a economia para a gangrena.

Ontem, com queda das bolsas e baixa do dólar ante outras moedas fortes, os mercados reagiram mal ao anúncio do Plano Geithner, não propriamente porque o achassem ruim, mas porque não obtiveram elementos suficientes para o entenderem.

A ideia de atrair capitais privados para ficar com os ativos tóxicos não é ruim. O mercado financeiro trabalha há anos com junk bonds (títulos-lixo) e poderia absorver alto volume de micos, especialmente se o Tesouro ou outros organismos oficiais se dispuserem, como se anuncia, a dar garantias aos interessados em tomar esses ativos.

No entanto, ficou a sensação de que o principal problema continua sem solução: a que preços o setor privado seria convidado a adquirir esses papéis que ninguém sabe quanto valem? E, se o setor público vai distribuir garantias para respaldar o interesse privado, sobre que valor serão passadas essas garantias?

Enfim, o governo Obama conseguiu ontem expressiva vitória no Congresso com a aprovação do seu plano de US$ 800 bilhões para resgatar a economia real. Mas deixou a impressão de que não tem clareza sobre o que pretende fazer com os bancos.

Confira

Mais assimetria - Há anos os argentinos reclamam de que o Brasil faz jogo desleal no comércio com seus vizinhos.

No final dos anos 90, o então ministro da Economia, Domingo Cavallo, afirmava que o Brasil roubava os argentinos por ter um câmbio excessivamente desvalorizado. Agora, é o principal negociador comercial argentino, Alfredo Chiaradia, que acusa o Brasil de desestabilizar a economia argentina com os US$ 36 bilhões emprestados pelo BNDES aos produtores brasileiros.

Mas, se é para tirar o BNDES da parada, então é melhor acabar de vez com o Mercosul.

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