sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

O jogo foi antecipado

José Luciano Dias
DEU EM O GLOBO


Para um olhar mais atento, a agenda política das últimas semanas teve como foco real a candidatura da ministra Dilma Rousseff (Casa Civil). Sob os episódios quase exóticos gerados pelo encontro dos prefeitos eleitos com o presidente da República, como as montagens de fotos ao lado da ministra e de Lula, está a realidade de uma campanha eleitoral em curso.

Está em campanha justamente porque não está bem nas pesquisas, ainda muito distantes das eleições, mas próximas das definições dos partidos e da formação das chapas para 2010. É natural que esse contraste preocupe a mídia e os meios políticos, mas a experiência eleitoral recente mostra que esse fenômeno não é desconhecido e pode sofrer mudanças com grande rapidez.

Vale a pena, portanto, examinar alguns casos importantes da associação entre governos populares e candidatos desconhecidos.

A expressão "eleger um poste" nasceu precisamente nas eleições municipais de 1996, quando os governos bem-sucedidos de Paulo Maluf (PPB-SP) e Cesar Maia (PFL-RJ) buscaram a continuidade administrativa por meio da eleição de seus principais secretários municipais. Sem o mecanismo da reeleição em vigor, restava esse recurso a um governante bem avaliado com planos de manter a gestão seguinte sob controle.

Em julho de 1996, quatro meses antes da eleição, o ex-secretário municipal de Finanças Celso Pitta (PPB-SP) tinha na sondagem Datafolha cerca de 19% das intenções de voto, estando bem atrás da favorita, Luiza Erundina. Em agosto, depois da campanha na televisão, o até então desconhecido Pitta tinha 29%. Na véspera da eleição, a última pesquisa eleitoral mostrava-o com 40% das intenções de voto, patamar compatível com a avaliação positiva do governo Maluf.

No Rio de Janeiro, a transição foi ainda mais drástica, devida talvez à evidente falta de carisma pessoal do secretário de Urbanismo, Luiz Paulo Conde. Na pesquisa Datafolha de julho de 1996, Conde somava apenas 4% das intenções de voto.

Logo em agosto, a campanha ao lado do prefeito Cesar Maia levou Conde ao patamar de 24%. Na véspera da eleição, ele acumulava 36% das preferências, sendo posteriormente eleito prefeito do Rio de Janeiro.

Os confrontos seguintes, já sob as regras da reeleição, tiveram concorrentes conhecidos às prefeituras do Rio e de São Paulo, mas, novamente em 2008, o governador José Serra decidiu apostar na eleição de seu "poste", o prefeito Gilberto Kassab (DEM-SP).

Os números são conhecidos. Na série Ibope, Kassab tinha 13% das intenções de voto em maio de 2008. Na véspera da eleição, tinha 32% e, nas urnas, praticamente empatou com Marta Suplicy, que liderou as pesquisas ao longo do ano.

A eleição de um candidato desconhecido por um governante popular, portanto, nada tem de especial, podendo ser produzida no curso de poucos meses antes da eleição.

Esses números mostram, assim, que a pergunta não é "por que Dilma Rousseff?", mas "por que tal antecedência?" O presidente Lula poderia deixar toda essa atividade para meados de 2010, sem incorrer em qualquer risco maior.

A antecipação da candidatura de Dilma Rousseff só faz sentido, neste momento, como uma ofensiva política do presidente Lula, que não quer deixar à oposição nem mesmo um ano tranquilo em 2009, com Serra em vantagem nas simulações.

O presidente Lula está antecipando, na verdade, o julgamento eleitoral do seu governo, buscando derrotar a oposição desde agora. Justamente, aliás, quando essa não tem condições de concorrer com o governo em matéria de exposição pública.

O tempo disponível até a eleição de 2010 não justificaria o investimento imediato do governo Lula em uma candidatura presidencial, mesmo sendo Dilma Rousseff uma personalidade desconhecida do eleitor médio. O objetivo primordial é diminuir os espaços da oposição desde logo. É possível prever, portanto, que outras vulnerabilidades do PSDB e dos Democratas serão exploradas.
José Luciano Dias é cientista político.

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