sexta-feira, 10 de abril de 2009

As boas notícias da inflação

Luiz Carlos Mendonça de Barros
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


Com a capacidade ociosa muito alta em vários setores, a queda da inflação tende a se prolongar até 2010

A INFLAÇÃO no primeiro trimestre do ano surpreendeu -para melhor- os analistas do mercado financeiro. Para o IPCA esperava-se algo como 1,5% no período fechado de três meses. O resultado final foi de apenas 1,2%.

O mesmo ocorreu com a inflação medida no atacado, com o IGP-DI calculado pela Fundação Getulio Vargas fechando o trimestre com deflação de quase 1%, influenciada por cadeias fundamentais para a formação de preços na indústria, como petroquímica e metalurgia.

Com esses números, é possível esperar uma inflação ao consumidor em 2009 bastante abaixo do centro da meta fixada pelo Banco Central.

Mas as melhores notícias sobre o comportamento da inflação estão nos detalhes de alguns grupos restritos de preços. É o caso da inflação de serviços, que abrange itens como alimentação fora da residência e serviços pessoais de vários tipos.

Esse grupo sempre apresentou, no passado, uma dinâmica mais perversa devido à elevada inércia e aos resquícios de indexação. Seus componentes persistem em alta mesmo depois de uma fase de aceleração da inflação geral, e também são os últimos a responder à redução da demanda.

Pois foi aí que tivemos surpresas agradáveis no primeiro trimestre.

No grupo chamado pelos economistas da Quest Investimentos de Serviços Livres Diversos, que representa cerca de 10% do IPCA, tem havido uma tendência de acomodação nos últimos meses e o aumento em março foi de apenas 0,13%. A mesma dinâmica benigna pode ser encontrada no grupo de materiais de construção, que vinha apresentando taxas de inflação bem acima da média. Agora a moderação atinge uma gama muito grande de produtos. Se essa tendência se mantiver por mais tempo, teremos um sinal importante para a política monetária.

Esse comportamento favorável na inflação é resultado da desaceleração econômica verificada nos últimos meses. Com a capacidade ociosa muito alta em vários setores, inclusive no mercado de trabalho, a tendência de queda da inflação pode se prolongar até 2010: é possível que o IPCA fique abaixo de 4% no ano que vem. Com isso, haverá dois efeitos positivos sobre o crescimento da economia brasileira.

O primeiro virá da preservação do poder aquisitivo dos salários, na medida em que eles foram corrigidos a taxas nominais bem mais altas nos meses que antecederam a crise. Com a inflação na margem correndo perto de 4% ao ano, ou mesmo abaixo disso, o poder de compra da população empregada permanecerá defendido. Isso é valido principalmente para o salário mínimo. Medido em termos de cestas básicas, ele se encontra hoje no pico dos últimos anos. Essa é uma grande diferença em relação ao nosso histórico de crises, sempre agravadas por choques de inflação que corroíam a renda.

O segundo efeito positivo virá dos juros mais baixos, conforme o Banco Central se sinta confortável para continuar o processo de ajuste da taxa Selic. Com as informações que temos hoje, não há por que o Copom moderar o ritmo de redução dos juros em sua próxima reunião, marcada para os dias 28 e 29 deste mês.

É possível que a taxa Selic caia para algo perto de 8% até o último trimestre do ano, mesmo tendo em vista a gradual recuperação da economia esperada para os próximos meses. Juros em queda terão efeitos positivos sobre o Orçamento do governo e sobre a atividade econômica, compensando em parte a queda na arrecadação de tributos.

Luiz Carlos Mendonça de Barros, 66, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).

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