quarta-feira, 26 de agosto de 2009

'Existem outras interferências'

Fábio Fabrini e Ricardo Galhardo
DEU EM O GLOBO

Demissionário diz que Receita não pode abrir mão da isenção

BELO HORIZONTE, SÃO PAULO e RIO. No dia de arrumar as gavetas e deixar o cargo ocupado havia quase 11 meses, por indicação de Lina Vieira, o superintendente da Receita Federal em Minas Gerais, Eugênio Celso Gonçalves, disse que as intervenções do governo no Fisco vão além do que foi revelado à imprensa.

Em entrevista por telefone, declarou que a suposta ingerência que motivou a revolta no Leão não se resume aos casos da Petrobras e da investigação sobre a família Sarney.

— Certamente, existem outras interferências — afirmou. — Não posso entrar em detalhes, porque há sigilo fiscal e poderia sofrer processo administrativo por causa disso.

Funcionário da Receita há 29 anos, Gonçalves assumiu em outubro de 2008 a chefia em Minas. Será substituído pelo chefe da Divisão de Fiscalização no estado, Hermano Lemos de Aguiar, nomeado por portaria publicada no Diário Oficial da União ontem. O demissionário disse que sairá “em solidariedade às diretrizes de Lina, abortadas pela atual administração”: — São as diretrizes de uma Receita justa, transparente, cidadã. E que não pode, como instituição do Estado, abrir mão da isenção e da autonomia para prover o poder público dos recursos necessários às políticas sociais.

— Essas são interferências indevidas e que vão de encontro ao espírito republicano.

O manifesto é uma forma de demonstrar que os servidores do Estado não podem se submeter a ingerências — acrescentou.

Ele criticou o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), acusado de contratar parentes, entre outras irregularidades, chamandoo de coronel “fora de seu tempo”.

Em São Paulo, o superintendente regional demissionário Luiz Sérgio Fonseca Soares divulgou carta ontem para explicar os motivos de sua saída e ressaltou a importância da autonomia técnica e da independência política na Receita Federal. Diferentemente da carta assinada por ele e outros 11 funcionários de alto escalão da Receita anteontem, na qual cobravam uma instituição “mais republicana”, o texto divulgado ontem justifica o pedido de exoneração como uma manifestação de liberdade para a nova direção escolher novos superintendentes e chega a elogiar a Receita.

“A solicitação fundamenta-se no entendimento de que a nova administração pode e deve assessorar-se de quadros que tenham perfis mais adequados às novas diretrizes que estão sendo implementadas”, diz a carta de Soares.

Ele agradece aos servidores “que participaram do nosso esforço para construção de uma instituição republicana, balizada pelos princípios constitucionais, com autonomia técnica e imune às ingerências e pressões de ordem política ou econômica”.

No lugar de Soares, assumiria seu adjunto, Roberto Alvarez, mas ele também pediu demissão.

Segundo a assessoria, Soares e seus assessores demissionários continuarão trabalhando até que sejam definidos os substitutos.

No Rio, o agora ex-superintendente-adjunto José Carlos Sabino Alves passou o dia reunido com assessores, na sede do órgão. Foi nas mãos dele que auditores da Receita entregaram manifesto em defesa da ex-secretária Lina Vieira, logo depois de sua demissão, em julho.

O manifesto foi assinado por 38 delegacias do Sindicato dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (Unafisco) e por sete sindicatos estaduais.

Sabino foi primeiro-secretário de Finanças da Delegacia Sindical do Rio. Procurado em casa e na Receita, ele não atendeu as ligações do GLOBO. A superintendente no Rio, Eliana Pólo Pereira, deverá ficar no cargo.

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