sexta-feira, 4 de setembro de 2009

O faz de conta do governo Lula em Pernambuco

Raul Jungmann
DEU NO PORTAL DO PPS

Todos esses anos, você deve ter ouvido dizer que o governo Lula fez mais por Pernambuco do que qualquer outro governo “na história deste País”. Deve, também, ter visto e lido inumeráveis manchetes de jornais que registravam a presença do presidente entre nós, lançando ou entregando grandes obras estruturadoras. Nada disso é verdade. E nós vamos mostrar aqui, sob forma de capítulos, a grande ilusão e manipulação da opinião pública pernambucana por parte do governo federal.

Os dados expostos a seguir, e análises decorrentes, foram objeto de requerimentos de informação (RI) da Câmara dos Deputados, em nosso nome, feitos aos ministros e órgãos do governo federal que cuidam das obras estruturadoras em curso em nosso estado. Portanto, todos os dados e informações a seguir, anote, foram fornecidos pelo governo federal e são oficiais.

Faz de conta, capítulo um: o caso da Refinaria Abreu e Lima

Começamos pela refinaria, por ser o mais emblemático e simbólico dos casos e, talvez, o caso mais exemplar, dentre todos, de manipulação e ilusionismo.

No distante 16 de dezembro de 2005, os presidentes Lula e Chávez da Venezuela, acompanhados pelo governador Jarbas Vasconcellos e nutrida comitiva de ministros, secretários, senadores e deputados, descerraram uma vistosa placa com os dizeres “A refinaria do Século XXI”, durante o lançamento da pedra fundamental da Abreu e Lima em Ipojuca. De acordo com um dos nossos diários, “a primeira refinaria a ser construída em 25 anos no país terá projeto de última geração, a cargo de técnicos (…) que a Petrobrás mantém no Rio de Janeiro”.

A planta, com capacidade de processar 200 mil barris diários, estava orçada em US$ 2.5 bi e seria construída em parceria com a Petróleos Derivados da Venezuela (PDVSA). A obra tinha previsão de término em 2011, devendo gerar 230 mil empregos diretos e indiretos.

Tudo falso. Senão vejamos:

Este mês, agosto de 2009, passados quase quatro anos do ato inaugural, o governador Eduardo Campos, em palestra no Rio de Janeiro, anunciou que “em setembro será firmada, finalmente, a parceria com a PDVSA, visando a construção da refinaria Abreu e Lima”.

O custo da obra já foi estimado em R$ 9 bi, em 23bi e hoje está cotado em R$ 10.1 bi (resposta ao RI anexo). A data de entrada em operação da Refinaria Abreu e Lima (RAL) é 2012, informa a Petrobrás. E isto depois de inúmeras declarações do presidente, governador e do secretário Fernando Bezerra Coelho que, em 2010, a Abreu e Lima estaria funcionando a pleno vapor (resposta ao RI em anexo). Aliás, com relação a este último ponto, temos um exemplo ímpar do descaso com a verdade e com o respeito à opinião pública e da manipulação despudorada por parte dos governos federal e estadual.

No mesmo momento em que a Ministra Dilma Roussef “inaugurava” uma ordem de serviço (!) da casa de força da refinaria, em fevereiro (?), o site da Petrobrás, discretamente, alterava a data de entrada em funcionamento da Abreu e Lima de 2010 para 2011, sem uma única explicação ou aviso aos pernambucanos…

A resposta da Petrobrás à nossa pergunta sobre o motivo do adiamento foi que “em função do aquecimento do mercado, muitas licitações foram frustradas em razão das propostas estarem excessivas” (grifo nosso). Ou seja, bem acima das estimativas e das metas de projeto estabelecidas pela companhia. Com isso, a Petrobrás se viu forçada a adiar o início das operações da refinaria de 2010 para 2011”. Entenderam?

De repente, não mais que de repente, as licitações (preços) ficaram excessivas, estourando o orçamento, num momento de crise mundial e queda livre dos preços do petróleo… E, não fossemos nós perguntarmos, nenhuma explicação nos teria sido dada. Porém, e como o “show” do faz de conta não pode parar, no mesmo dia em que a Abreu e Lima era jogada para as calendas, a ministra-candidata “inaugurava” uma ordem de serviço à noite, para não prejudicar sua recente plástica facial.

Convenhamos!

Oficialmente, até 31 de janeiro de 2008 foram desembolsados, pelo governo Lula, 100 milhões de reais nas obras da RAL. E, de lá até então, mais 118 milhões, totalizando 218 milhões de reais. Esse valor está anos-luz distante do programado, sempre de acordo com as respostas dadas pela Petrobrás. Segundo esta, o cronograma de desembolso, “conforme disposto no Plano Plurianual 2008/2012, era o seguinte: 389 milhões em 2008 e 4,269 bi em 2009. Ou seja, faltando aproximadamente 4 meses para a conclusão do biênio, os recursos efetivamente desembolsados montam a 4% do previsto!

Nesse ritmo, a RAL só estará concluída em 2031! Ou seja, daqui há 22 anos…Ao contrário das manchetes e estrepitosas declarações do presidente e do governador Eduardo Campos, de que a refinaria estaria operando em 2010, apenas duas décadas depois, no ritmo atual (ou mantido o ritmo atual), isso seria verdade.

Aliás, o balanço do efetivamente desembolsado pode ser ainda pior, por incrível que pareça. Quando indagamos à petroleira qual a data de lançamento do projeto, a resposta foi a seguinte: “O projeto conceitual (fase II) de implantação, foi aprovado pela diretoria executiva da Petrobrás em 21.12.2006”. Donde se deduz que, anunciado em 2005, só um ano depois a RAL teve o seu projeto conceitual aprovado e três anos após foram gastos apenas 4% do custo total da obra.

E em que foram gastos esses 4%? Vejamos:

Serviços de terraplenagem

Complementação do projeto de engenharia das unidades de facilidades da refinaria Elaboração do projeto executivo para construção e montagem da casa de força da RAL Mobilização de contratadas para serviços de construção e montagem industrial

Processos de aquisição e fabricação de equipamentos
Em síntese, noves fora os serviços de terraplenagem e a nebulosa “mobilização de contratadas” , o resto é papel, puro papel. E nada mais.

Voltando a 2005, ao ato de lançamento da pedra fundamental, eram esperadas mais de 4 mil pessoas, “entre políticos, empresários e populares de Ipojuca e Cabo de Sto. Agostinho”, noticiavam os jornais locais. O presidente Lula não se fez de rogado e assegurou “Essas coisas (a parceria com a PDVSA) são demoradas porque são difíceis (…). Quando os pessimistas estiverem dizendo que não vai acontecer nada, nós iremos anunciar, quando alguns meios de comunicação do Brasil e da Venezuela diziam que o acordo tinha fracassado”.

O presidente Chávez também não fez por menos, após receber a medalha Joaquim Nabuco da Assembléia Legislativa. Afirmou, entre frases do general Abreu e Lima e versos de Manoel Bandeira:

“Nos sentimos aqui do Recife. Também nos sentimos do Brasil. Somos compatriotas e companheiros. Estamos compartilhando a mesma pátria”. Talvez, mas passados 4 anos de sua grandiloqüente oratória, nem um centavo da petroleira venezuelana chegou à refinaria que leva o nome de um dos seus ídolos bolivarianos.

Em setembro de 2007, Lula estava de volta. Desta vez para o início das obras de terraplenagem de um “empreendimento com a proposta de mudar a história de Pernambuco e transformar a economia do estado”. Na reportagem da cobertura do ato, anota-se que aquela foi a “quinta visita de Lula ao estado desde o início do ano”. Então, foi reafirmado que a refinaria deveria “entrar em funcionamento em três anos” e que “somente sua construção demandaria “20 mil empregos diretos”. Adiante, afirmava-se que “ainda este ano há previsão de abertura de concurso público para pelo menos 300 vagas de nível médio que formarão o quadro da empresa” . Ainda segundo a matéria, “esta fase (terraplenagem) deverá custar 400 milhões e empregar cerca de mil pessoas”.

Nem bem tinham se passado 6 meses, e lá estavam Lula e Chávez de volta, em março de 2008. Festa, manchetes e mais manchetes bombásticas e matérias repetindo a cantilena de sempre.

Mas, nem mesmo as sirenas do palácio do Campo das Princesas conseguiram esconder o fato de que Lula e Chávez não fecharam um acordo definitivo. Segundo a mídia, os dois presidentes “apenas firmaram um acordo preliminar, com a intenção de uma futura parceria”. Tanto que estava previsto um pronunciamento dos presidentes, mas a programação foi cancelada.

Passados catorze meses, em vinte e oito de maio do corrente ano, assim respondia a Petrobrás ao nosso requerimento de informações, quanto à participação da PDVSA:

“Não existe nenhum valor referente a recurso externo. O que existe são negociações em andamento para a constituição de uma sociedade entre a Petrobrás e a venezuelana PDVSA, na proporção de 60% a 40%, o que ainda não se concretizou” (resposta ao RI em anexo).

Em excelente reportagem de Giovanni Sandes, no caderno de economia do Jornal do Comércio de domingo, 23 de agosto, a manchete sumaria o que dissemos até aqui: “Custo da refinaria é uma incógnita” . E emenda na sub manchete: “Prazo para conclusão também é incerto”.

Dias antes, o TCU divulgara o resultado de uma auditoria enviada à CPI da Petrobrás, onde foi detectado um sobre-preço de 121 milhões de reais em parte dos contratos da RAL, o que deverá retardar ainda mais o andamento das “obras”.

Com custos globais incertos, sem prazo definido para sua conclusão, sem qualquer acordo firmado de financiamento ou parceria externa, com apenas 4% do seu valor estimado gasto e passados quatro anos do lançamento da sua “pedra fundamental”, a Refinaria Abreu e Lima é um exemplo da manipulação e do faz de conta do governo Lula em Pernambuco. Agora, à falta de respeito soma-se o superfaturamento das obras e serviços, em realidade dos trocados até aqui investidos para iludir e enganar, de forma perversa, os pernambucanos.

* é deputado federal pelo PPS-PE e ex-ministro do Desenvolvimento Agrário.

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