segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

A sufocante sombra de Lula

DEU NO CORREIO BRAZILIENSE

Apesar do alto nível de aprovação do governo, só quatro ministros são candidatos competitivos em disputas estaduais. Sinal de que os dividendos são creditados, basicamente, na conta do presidente

Denise Rothenburg

No meio político, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva é constantemente comparado a uma mangueira frondosa: sob sua sombra nada cresce. Um passeio pelas perspectivas eleitorais dos titulares da Esplanada dos Ministérios mostra que a comparação não é exagerada. À exceção da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT), que Lula guindou ao posto de coordenadora do governo e escolheu para tomar um banho de sol nos palanques do país, são poucos os auxiliares que conseguiram se sobressair no cargo e ganhar luz própria para concorrer a governos estaduais.

“Só conseguiu algum destaque quem já tinha uma estrutura política forte em seus estados e soube conciliar o poder federal com o local. Mas, no geral, nenhum ministro teve um desempenho estelar. Lula não tem hoje um ministério de ponta, capaz de montar palanques fortes nos estados”, diz o cientista político Murilo Aragão. No rol daqueles que conciliaram atividades estaduais e federais, Aragão e analistas citam apenas quatro entre os comandantes de 37 pastas da Esplanada: Alfredo Nascimento (Transportes), Geddel Vieira Lima (Integração Nacional), Hélio Costa (Comunicações) e Tarso Genro (Justiça).

O quarteto tem um ponto em comum: força política em seus estados. Genro, por exemplo, foi prefeito de Porto Alegre duas vezes. Na segunda, deixou o mandato pela metade para concorrer ao governo estadual. Perdeu para Germano Rigotto (PMDB) e foi chamado a assumir o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, órgão vinculado à Presidência da República. Quando o senador Cristovam Buarque (PDT) foi afastado do Ministério da Educação, em 2004, Genro assumiu um mandato-tampão na pasta. Precisou sair em 2005 para assumir o PT no meio da crise do mensalão. Só sossegou em 2007, quando foi transferido para o Ministério da Justiça, onde permanece até hoje, de malas prontas para concorrer ao governo gaúcho em 2010. “O Tarso foi um curinga do Lula. Agora, terá todo o apoio como candidato”, revela um assessor palaciano.

Cristão-novo

Do quarteto, o único que não esteve com o presidente desde o primeiro mandato foi Geddel Vieira Lima (PMDB). Em 2003, ele dava expediente no térreo da Câmara dos Deputados, no cargo de primeiro-secretário da Casa. No ano seguinte, o PMDB baiano elegeu só 20 prefeitos dos 417 do estado. Geddel, no entanto, foi um dos mais votados na eleição de 2006 e, guindado ao ministério em março de 2007, fez crescer para 119 o número de prefeitos do PMDB baiano. Essa base levou o partido a lançá-lo candidato ao governo baiano em 2010. “Serei candidato a governador”, afirmou Geddel ao Correio, depois do jantar natalino com o presidente Lula, com ares de quem já está com a pré-campanha solta no estado. Um dos adversários dele será o governador Jaques Wagner (PT).

Quem já esteve citado para diversos cargos e hoje não sabe nem sequer se concorrerá a mandato eletivo é o ministro da Educação, Fernando Haddad (PT). No início do segundo mandato de Lula, Haddad integrava as listas de possíveis candidatos a presidente da República e a governador de São Paulo. “Faltou tempero para ele”, comentou um colega de governo. Na verdade, avaliam os próprios petistas, Haddad só seria considerado uma opção se tudo o mais desse errado, especialmente em São Paulo, onde as estrelas da legenda não abrem espaço para ninguém. “Ele é um bom ministro, mas o partido tem outros quadros em São Paulo”, desconversa o líder da bancada na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), do alto de quem conhece como poucos o funcionamento da sigla em território paulista.

No ministério, também existem aqueles que ninguém imaginava que teriam destaque e agora vão tentar uma investida na seara política. Dois exemplos mais emblemáticos são os ministros de Relações Exteriores, Celso Amorim, recém-filiado ao PT, e do Esporte, Orlando Silva (PCdoB).
Embalado pela campanha para as Olimpíadas do Rio de Janeiro em 2016 e a pela Copa do Mundo de futebol no Brasil, em 2014, Silva sonha em concorrer a deputado federal por São Paulo. “É esse o plano e não mudou”, declarou o ministro. Amorim e Silva são as raríssimas exceções de flores sob a mangueira. No geral, garantem os analistas, diante de alguém tão popular como Lula, os ministros terminaram mesmo numa grande sombra.

Análise da notícia
Perfil calculado
A falta de ministros de ponta para concorrer a governos estaduais, de forma a estampar os feitos do governo federal na campanha, é resultado de uma decisão do próprio presidente Lula. Ele passou os primeiros dois anos de sua gestão como árbitro de uma disputa surda entre os ministros da Fazenda, Antonio Palocci, e da Casa Civil, José Dirceu, ambos digladiando para ver quem seria o grande herdeiro político do petista. Nas raias três e quatro dessa piscina, corriam ainda Ciro Gomes, na Integração Nacional, e Cristovam Buarque, na Educação.

Cristovam foi o primeiro a sair, uma vez que Dirceu identificou ali um futuro concorrente no quesito herança política de Lula. O então ministro da Educação foi afastado por um telefonema do então chefe da Casa Civil. Com as denúncias do mensalão, em 2005, Dirceu foi afastado e, logo em seguida, o caso do caseiro Francenildo detonou Palocci. Lula se viu livre da pressão. Um ministro é direto quando fala dos dois: “Ali, Lula passou a governar, como senhor da equipe”.

Sobrou apenas Ciro Gomes, que saiu em 2006 para concorrer a uma vaga de deputado federal. Lula, no entanto, nunca mais chamou Ciro para voltar ao governo. Escaldado pelas dificuldades que enfrentou com os ministros de grande estatura política, optou no segundo mandato por um grupo menos robusto do ponto de vista político. E, nesse colegiado sem grandes estrelas da articulação política, ele pinçou a que considerava mais fiel ao seu projeto político para concorrer à Presidência da República, transformando-se em senhor do governo e da sua sucessão dentro do PT. Agora, Lula não tem adversários nem um candidato que faça sombra ao seu último ano de mandato. (DR)

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