Marcelo de Moraes e João Domingos
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Presidente está mais próximo politicamente do PMDB e menos sensível às demandas de sua legenda
Em dezembro de 2002, já eleito presidente, Luiz Inácio Lula da Silva pôs uma pá de cal na formalização de uma aliança com o PMDB, que previa abertura de espaço para o maior partido do Congresso na sua futura equipe de governo, como vinha sendo costurado por José Dirceu, seu principal articulador político. Ressentido pelo apoio do PMDB à campanha do tucano José Serra, Lula preferiu prestigiar o PT, oferecendo ao partido a maioria das vagas.
Isso incluiu o Ministério de Minas e Energia, que caberia ao PMDB (junto com a Previdência) na eventualidade de um acordo. Lula preferiu entregar o posto para a pouco conhecida Dilma Rousseff, sepultando a chance de aliança com o PMDB.
Sete anos depois, existe um outro Lula ocupando a Presidência. Muito mais próximo politicamente do PMDB e bem menos sensível às demandas de seu partido, o PT. E que tem como uma de suas prioridades fechar acordo nacional com o PMDB para 2010, ironicamente para tentar eleger sua candidata Dilma, hoje na Casa Civil.
A força regional e o tamanho de suas bancadas na Câmara e no Senado são os maiores atrativos que o PMDB tem a oferecer. E esse apoio dado desde 2004 - quando aderiu oficialmente à base de sustentação - aproximou a legenda de Lula e facilitou a governabilidade. Mesmo que isso tenha se dado muitas vezes às custas de pressões por nomeações e liberações de recursos, Lula não tem se constrangido em permitir livre trânsito ao partido.
Na terça-feira, Lula expôs suas ideias a respeito das alianças o mais claramente possível, e chegou a criticar o PT, dizendo que até adotou medidas à revelia do seu partido. Começou afirmando que um presidente não pode governar o Brasil "pensando em coisas pequenas". Acrescentou que o País "chegou onde chegou" porque, em alguns momentos, o seu governo fez as "coisas corretas". "Às vezes, mesmo companheiros do PT eram contra."
E continuou: "Governar um país do tamanho do Brasil significa que você tem que construir uma base de apoio, porque não é possível nem o Lula, nem um outro presidente governar o País se ele não construir uma maioria no Senado e uma maioria na Câmara. Acho que nós construímos uma maioria que até agora só me fez perder uma votação, que foi a CPMF."
O presidente tem pedido aos dirigentes e líderes regionais do PT para terem sensibilidade na formação dos palanques estaduais para 2010. Traduzindo, pediu que os petistas sacrifiquem as cabeças de chapa nos seus Estados em favor do PMDB como forma de facilitar o projeto maior, que é a sucessão presidencial, tendo os peemedebistas na vaga de vice-presidente. Lula teme que a falta de acordos nos Estados acabem empurrando pedaços importantes do PMDB para o lado da candidatura de oposição.
O problema é que à medida que Lula intensifica o trabalho de atração à legenda, o PMDB coloca mais dificuldades sobre a mesa de negociações. Líderes do partido ameaçaram uma rebelião contra o governo por causa da degola de afilhados políticos na Infraero. A limpeza, entretanto, foi promovida pelo brigadeiro Cleonilson Nicácio com o aval do ministro da Defesa, Nelson Jobim, do PMDB.
Na tribuna do Senado, o senador Pedro Simon (PMDB-RS) fez um violento discurso, irritado com o comportamento fisiológico. Chamou de "grosseira" e "ridícula" a barganha do PMDB com os cargos da Infraero e desafiou o partido a ter um candidato de verdade ao Planalto, em 2010.
"Existem dois grandes nomes disputando: o Serra, um grande líder, candidato natural do PSDB junto com Aécio, e a Dilma, com grande capacidade, uma grande candidata. E o PMDB, o maior partido? O maior número de governadores. Maior número de senadores, deputados federais, estaduais, vereadores, prefeitos. Na última eleição, 6 milhões de votos a mais do que o que está em segundo lugar. E o PMDB? Barganhando meia dúzia de cargos", reclamou.
Essa ala do PMDB não alinhada ao comando nacional é hoje um dos obstáculos que atrapalham a concretização do casamento com o governo em 2010. Menos pelos votos que têm e mais pelo alcance que obtêm junto à opinião pública. No início do ano, o senador Jarbas Vasconcellos (PE) provocou grande constrangimento ao partido, ao acusá-lo de ser corrupto. E causou um outro mal-estar, indiretamente, quando não sofreu qualquer sanção partidária por essas acusações, parecendo receber uma concordância silenciosa do PMDB.
Início do governo
O Lula petista
Nomeação de petistas derrotados nas eleições
Logo após a posse, em 2003, Lula decide trazer para o governo vários aliados petistas. Distribuiu ministérios, autarquias e postos diplomáticos para candidatos derrotados, como Jaques Wagner (BA), no Ministério do Trabalho, Benedita da Silva (RJ), na Ação Social, Humberto Costa (PE), na Saúde, José Eduardo Dutra (SE), para a Petrobrás, e Tilden Santiago (MG), para a Embaixada de Cuba, entre outros. Chegou a criar o Ministério da Pesca para atender José Fritsch, derrotado em Santa Catarina. Lula reconheceu mais tarde que foi um erro usar esse critério para escolha
Veto à participação do PMDB
Na transição, em dezembro de 2002, o futuro ministro da Casa Civil, José Dirceu, fechou com o comando peemedebista a adesão formal do partido à base do governo. Em troca, o PMDB ocuparia cargos importantes, incluindo os Ministérios de Minas e Energia e da Previdência. Ainda aborrecido com o apoio dado pelo PMDB ao PSDB na campanha e preocupado em fortalecer o PT, Lula derruba o acordo. De quebra, nomeia a petista Dilma Rousseff para Minas e Energia, pasta prometida ao PMDB
Ministérios sem porteira fechada
Lula prestigia o PT nas pastas entregues a aliados. Ao indicar um ministro de outro partido, manteve pontos-chave nas mãos de indicados do PT. Medida provoca irritação
Núcleo duro
Lula se cercou de amigos petistas que formaram uma espécie de equipe de aconselhamento. O núcleo duro do governo foi formado por José Dirceu, Luiz Gushiken, Luiz Dulci e, correndo por fora na área econômica, Antonio Palocci. Seis anos depois, só Dulci permaneceGoverno atualO Lula peemedebista
Participação ampla do PMDB no governo
Um ano depois de vetar a participação do PMDB, Lula recua e abre as portas da Esplanada para o novo aliado. Em 2004, entrega ao maior partido do Congresso as pastas da Previdência e Comunicações. Cinco anos depois, essa presença se multiplicou. O partido hoje manda na Defesa, com Nelson Jobim; Comunicações, com Hélio Costa; Agricultura, com Reinhold Stephanes; Minas e Energia, com Edison Lobão; e Integração Nacional, com Geddel Vieira Lima
Prioridade para aliança nacional com o PMDB em 2010
Lula tem instruído seus principais aliados do PT para terem a maior flexibilidade política na formação dos palanques regionais, procurando atender ao máximo os pleitos do PMDB. Lula já ofereceu ao partido a vaga de vice numa chapa encabeça por Dilma Rousseff. Em troca, admite ceder a cabeça de chapa para disputas pelo governo até em Estados onde PT e PMDB são tradicionalmente rivais, como no Rio Grande do Sul
Apoio ao PMDB nas eleições para Câmara e Senado
De olho na aliança nacional com o PMDB, Lula não titubeou em apoiar as candidaturas dos peemedebistas Michel Temer e José Sarney para as presidências da Câmara e do Senado. No caso do Senado, apoiou o PMDB contra a vontade da bancada petista, que desejava eleger Tião Viana
Abertura de espaço para o PMDB nas decisões de governo
Depois de desfazer seu fechado clube petista de assessores, Lula não descarta a possibilidade de atender à reivindicação do PMDB e permitir sua participação numa espécie de novo núcleo duro de governo. Informalmente, Lula já tinha aberto espaço para o partido nas negociações feitas com Sarney e Temer