sábado, 18 de julho de 2009

A crise não viaja

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Quando o então presidente da República José Sarney se afastava do País costumava-se dizer que "a crise viajou". Se a memória não falha, quem disse pela primeira vez a frase foi o então senador Fernando Henrique Cardoso.

Mas, agora, com Sarney na presidência do Senado, passe ele suas férias na ilha de Curupu ou no exterior, a crise não viajará nem arrefecerá. Bobagem imaginar que duas semanas de recesso do Congresso tenham o poder de amenizar uma situação que, em cinco meses, não fez outra coisa além de se agravar.

Ao presidente do Senado apetece considerar que a crise é resultado de "uma campanha pessoal do jornal O Estado de S. Paulo" que obrigou "outros jornais e televisão a repercuti-la".

A despeito da fidalguia do senador de atribuir ao Estado um poder de influência grande o bastante para arrastar atrás de si a concorrência; não obstante a descortesia de imputar aos demais veículos de comunicação nacionais e internacionais traços de indigência e carência de discernimento, sua avaliação do caso é tão certeira quanto o foi na análise que balizou sua decisão de ascender pela terceira vez à presidência do Senado.

Na "prestação de contas" do primeiro semestre de mandato apresentada ontem para um plenário pleno de cinco senadores, o presidente da Casa falou uma verdade: "Infelizmente, avaliei mal."

Lamentavelmente, foi a única dita em sua inteireza. No restante do discurso, Sarney variou entre a mentira, a meia-verdade e as tergiversações habitualmente de plantão.

O cotejo entre os fatos, seus atos, seu discurso de posse e sua prestação de contas o demonstra.Ontem afirmou ter sido candidato quase obrigado. "Fui convocado e aceitei minha candidatura para servir ao País."

No fim do ano passado, quando o amigo Marcos Vilaça ainda tentava demovê-lo da empreitada e convencê-lo a disputar a presidência da Academia Brasileira de Letras - um fecho de biografia muito mais seguro que o comando do conturbado Senado -, Sarney aludiu a razões familiares e concluiu: "O destino me leva à política."

Numa nova conversa com o amigo, em março último, deu-lhe razão, mostrou-se arrependido da escolha e aventou a hipótese de renúncia antes do término do mandato, ao completar 80 anos de idade, em abril de 2010.

Foram razões políticas e não deveres cívicos que fizeram Sarney atender aos apelos do PMDB - interessado no comando do Congresso todo -, ao DEM - empenhado em impedir que o PT ocupasse o cargo - e interpretasse como incentivo a estratégica neutralidade do presidente Luiz Inácio da Silva em relação à candidatura do correligionário Tião Viana.

Segue a prestação de contas de ontem com o presidente do Senado afirmando que em seu discurso de posse enfatizou "a necessidade de fazermos uma reforma administrativa" para fazer frente aos "sérios problemas que precisavam ser enfrentados".

No discurso de posse, Sarney não só não enfatizou como sequer citou reforma alguma. Só depois de lido o pronunciamento escrito é que anunciou de improviso o corte de 10% nas despesas.

Um mero factoide (no dia seguinte, manchete dos jornais) diante da enormidade das mazelas depois reveladas.

Naquele discurso, aliás, Sarney dizia que acima de tudo estava a "independência, a autonomia e a dignidade da Casa". Seria esse o seu lema, ainda que ao sacrifício dos "deveres de amizade, deveres políticos ou partidários".

A submissão ao Palácio do Planalto e a invocação de todos os deveres há cinco meses negados testemunham a quebra do compromisso assumido.

"As circunstâncias", disse ele ontem, transformaram a "reforma" em "pretensa crise de desmoralização do Senado" e inviabilizaram "a discussão dos grandes temas do nosso momento político".

Quais sejam, as medidas provisórias, as reformas política e tributária e a crise econômica mundial. Para esta última, Sarney nomeou uma comissão de notáveis, cuja única função seria imprimir majestade ao início do seu mandato, pois concretamente não haveria nada que pudesse propor. Como, de resto, não o fez e o mundo ainda assim se acalmou.

Sobre as MPs, sua única atitude foi dar ao Palácio do Planalto na companhia do presidente da Câmara, para saber de que forma seria mais conveniente ao presidente da República se conduzir o assunto no Congresso.

A respeito das reformas política e tributária, atribuir o fracasso à crise é retirar da leniência do Executivo e da indiferença do próprio Legislativo suas inestimáveis contribuições.

Mas, segundo as contas prestadas pelo presidente do Senado, a adversidade não o impediu "de tomar as medidas necessárias para a modernização" da Casa, o "saneamento dos graves problemas de natureza ética e legal que foram revelados" - na maioria, pela "campanha pessoal do jornal O Estado de S. Paulo".

Assegurou não ter titubeado em agir. E citou, uma a uma, as decisões tomadas sob intensa pressão. Entre as quais se inclui o afastamento de Agaciel Maia, ora em gozo de licença-prêmio.

Lula defende adversários históricos

Ana Paula Scinocca
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Presidente "esquece" o que disse e sai em defesa de Sarney, Maluf e até do ex-inimigo Fernando Collor

Se o presidente Lula chamasse o ex-sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva para um debate sobre a honestidade dos políticos e o papel desempenhado por figuras como José Sarney, Paulo Maluf e Fernando Collor, o encontro terminaria mostrando, de maneira insólita, o quanto um diverge do outro. Ou quanto o Lula presidente resolveu adaptar aos tempos atuais tudo o que disse o Lula sindicalista e político da oposição ao longo de duas décadas - anos 80 e 90.

O Lula sindicalista denunciaria os "300 picaretas do Congresso", "o grileiro" Sarney e seu patrimonialismo, "a falta de honestidade" de Maluf, além de defender o impeachment de Collor, acusado de comandar um esquema com o ex-tesoureiro PC Farias. Desde que colocou a faixa presidencial, em 2003, Lula passou por uma série de experiências que o fizeram ir além da renúncia ao que disse. O presidente passou a julgar os políticos por critérios especiais, comportando-se com um juiz da história.

Para o senador Pedro Simon (PMDB-RS), um aliado de primeira hora do governo Lula, o presidente vive agora uma fase que merece uma reprimenda a la rei de Espanha. "Lula tem 80% de popularidade. Nunca um presidente teve esse índice. O sucesso deve ter subido à sua cabeça, pois só isso pode explicar o bando de bobagens e coisas que ele tem feito. Eu vou repetir o que o rei da Espanha (Juan Carlos) disse ao Hugo Chávez (presidente da Venezuela). Cala-te, cala-te Lula", disse o senador Pedro Simon (PMDB-RS).

A governabilidade máxima e a qualquer custo também ajudaria a explicar o comportamento.
Para o cientista político Marco Antônio Carvalho Teixeira, pesquisador da PUC-SP e da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Lula teve de fazer concessões antes mesmo de chegar à Presidência, o que definiu o estilo camaleônico atual. "O Lula tem defendido pessoas que têm importância em seus postos ou partidos. Tanto o presidente quanto o partido dele, o PT, tiveram que fazer concessões. Só que Lula se adaptou mais rápido a elas", avaliou Teixeira.

POLARIDADE

Na linha "esqueçam o que eu disse", o Lula presidente saiu nos últimos dias em defesa de adversários históricos, que ele tratava como inimigos, e de teses que sempre rejeitara. O Lula de hoje acha o Congresso "a caixa de ressonância da consciência política da sociedade no dia da votação" e as pessoas que lá estão, como o presidente José Sarney (PMDB-AP), a quem em 1986 chamara de "grileiro", de pessoa "com história e incomum". Ao mesmo tempo, como um político acima dos políticos, chamou os senadores de "pizzaiolos".

Lula também já "abençoou" Severino Cavalcanti (PP-PE), hoje prefeito de João Alfredo (PE), que se viu obrigado a renunciar ao comando da Câmara e ao mandato, em 2005, acusado de praticar "mensalinho" na Casa.

COLLOR

Na semana passada, em visita a Palmeira dos Índios, em Alagoas, sepultou as divergências com Collor - inclusive o fato de em 1989 o ex-presidente ter levado ao programa de campanha na TV a mãe de uma filha do então adversário fora do casamento -, para sair em defesa do hoje senador. Três anos atrás, com Collor à beira de ser eleito para o Senado, Lula sentenciou: "O que não vai melhorar é se o Collor se eleger senador."

Em Palmeira dos Índios, no último dia 14, de microfone na mão, Lula anunciou a mudança.

"Quero fazer justiça ao Collor", disse ele. Além da "justiça" a Collor, a quem o presidente elogiou pela sustentação política dada ao governo petista, Lula comparou o ex-presidente alagoano ao também ex-presidente Juscelino Kubitschek.

Com popularidade em alta, Lula diz o que quer, se contradiz, e não derrete sua gordura eleitoral.

Pelo contrário. Até aqui, segundo pesquisas, ele está na condição de maior cabo eleitoral da próxima eleição, no ano que vem.

O recesso começou tarde

Coisas da Política :: Villas-Bôas Corrêa
DEU NO JORNAL DO BRASIL


O bem-vindo recesso parlamentar deveria ter começado no princípio do mês e terminar no início da campanha eleitoral do próximo ano, prazo mínimo para os eleitores e a população esquecerem a pior temporada do pior Congresso de todos os tempos.

Mas, baixando a terra e pisando com cuidado para não sujar os sapatos, ninguém saiu ileso da sucessão de escândalos que desmoralizou o Congresso, exibiu a fragilidade da oposição – que pode ser avaliada pelo 8 a 3, resultado de pelada, da composição da CPI da Petrobras, com o governo senhor da presidência e da relatoria. Quando recomeçar o espetáculo, com a CPI coberta pela poeira do cerrado, todo o elenco estará cuidando do voto para mais um mandato.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nos dias que passou em Brasília, cuidou mais da campanha da sua candidata, a ministra Dilma Rousseff, do que da papelada que não lê e da qual toma conhecimento pelo resumo de meia dúzia de linhas digitadas por seus assessores.

Na pré-campanha de um descaro sem paralelo, o presidente no azul do céu da popularidade, acima de 80% nas últimas pesquisas, vê-se no espelho como o dono do país. As viagens semanais, quando está no país, acompanhado da ministra Dilma, para as visitas às obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), e o reforço do Minha Casa Meu Voto, ainda nos primeiros passos, com a promessa da construção de 1 milhão de residências populares, coadunam-se bem com o pacote do Bolsa Família, do Bolsa Escola, do aumento do salário mínimo, do Pró-Uni que promete universidade para todos.

A vaidade do improvisador fluente subiu à cabeça, e não é boa conselheira. A chalaça insultuosa de chamar os senadores que combatem o governo na CPI da Petrobras de "bons pizzaiolos" deflagrou a reação do plenário, inclusive dos aliados, com as exceções de praxe do cordão que cada vez aumenta mais. Vários senadores, inclusive da ala governista, subscreveram o requerimento do senador Cristovam Buarque (PDT-DF) propondo um voto de censura ao presidente. Advertido, Lula caiu em si e manifestou seu arrependimento pela frase infeliz.

O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), passou o dia em seu gabinete, evitando comentar as novas denúncias contra ele e pessoas de sua família. E, ao deixar o gabinete, quando os repórteres perguntaram como se sentia com as férias parlamentares, desabafou: "Graças a Deus!".

É cedo para tentar especular sobre os próximos desdobramentos da crise do Congresso, na campanha eleitoral que deverá pegar fogo no próximo ano, depois da trégua das festas natalinas, da passagem de ano e do fim das férias escolares. Não é apenas a desmoralização do Legislativo que envolve os partidos e enxovalha lideranças atingidas por denúncias que estão sendo investigadas, que recomenda cautela nas análises, penduradas em tantas dúvidas.

O favoritismo da candidata Dilma Rousseff, herdeira da popularidade do presidente Lula e que começa a chegar às ruas das capitais e grandes cidades, ainda não foi submetido ao teste do confronto com as oposições. Enquanto o esquema governista tem uma candidata, com o apoio do presidente Lula, a oposição desperdiça o tempo com as hesitações entre dois e três pretendentes, incluindo o deputado Ciro Gomes (PSDB-CE), que confirma ser a Presidência sua ambição prioritária. O chove-não-molha entre os governadores José Serra, de São Paulo, e o mineiro Aécio Neves, engessa a oposição, fragilizada no Congresso e que se sustenta com a atuação vigorosa de meia dúzia de senadores e deputados. Poucos deputados. O presidente da Câmara, deputado Michel Temer (PMDB-SP), é candidato declarado a vice-presidente na chapa oficial, com o apoio de Lula. E tem conseguido preservar a Casa do descalabro moral do Senado.

Um inesperado sinal de que a desmoralização do Congresso começa a chegar à rua: a passeata dos estudantes, promovida pela União Nacional de Estudantes e outras entidades – que reuniu 2 mil pessoas, pelos cálculos da Polícia Militar, e mais de 5 mil segundo os manifestantes – no desfile pela Esplanada dos Ministérios, em Brasília, para o 51° Congresso Nacional da UNE. A UNE foi agraciada pela Petrobras e por órgãos públicos federais com a verba de R$ 920 mil. Não faltará dinheiro para a campanha oficial.

Anormal e imoral

Cristovam Buarque
DEU EM O GLOBO


No Brasil, é normal seus dirigentes serem vistos e sentirem-se como casta, com privilégios muito além dos direitos aos quais o povo tem acesso. Os serviços de saúde e educação à disposição das famílias dos eleitos são completamente diferentes daqueles dos seus eleitores.

Ninguém se espanta com o fato de o teto do salário no setor público ser 25 vezes maior que o piso salarial do professor — cujo valor, apesar de tão pequeno, até hoje, um ano depois de sancionado, ainda é contestado na Justiça, como inconstitucional.

É visto como natural que a parcela rica do Brasil tenha o maior índice de cirurgias plásticas de rejuvenescimento em todo o mundo e a parcela pobre não tenha acesso nem mesmo às mais fundamentais operações; que os 10% mais ricos tenham esperança de vida de 72 anos e os 10% mais pobres de apenas 45 anos. Todos aceitam que milhares peçam esmolas para comprar comida e remédios que enchem as prateleiras de farmácias e supermercados.

Considera-se normal que o 1% mais rico da população receba 20,5% da renda nacional e os 50% mais pobres recebam apenas 13,2%; que 19% das casas não tenham água encanada e 51% não tenham saneamento ou esgoto.

Aceitamos que 50 milhões dependam de ajuda no valor de R$ 182 por mês para a sobrevivência de toda a família, R$ 6 por dia, sem chance de trabalho com salário digno.

É natural que crianças vivam nas ruas, sejam mendigos, pivetes, prostitutas, trabalhadores, e não estudantes; que 11% delas cheguem aos 10 anos sem saber ler; e 60 abandonem a escola a cada minuto do ano letivo, antes da conclusão do ensino médio; e que, entre as que permanecem, muitas vejam a escola como um restaurantemirim que fornece merenda.

É aceito que os professores tenham a menor remuneração entre os profissionais com formação equivalente; que deem aulas em escolas sem água nem luz, raras com computadores e sistemas de vídeo. Ficou normal que as escolas tenham se transformado em campos de batalha, os professores sejam agredidos, as aulas viraram balbúrdia.

Mesmo sem guerra, nos acostumamos com 125 mil pessoas mortas por ano em consequência da violência. Aceita-se que o país com um dos cinco maiores territórios do mundo — além de litoral e espaço aéreo — não apoie suficientemente suas Forças Armadas para defenderem esse patrimônio.

Não discutimos sequer o fato de conviverem 4,5 milhões de universitários ao lado de 14 milhões de analfabetos adultos e 40 milhões de analfabetos funcionais; de que, 121 anos depois da abolição da escravatura, a cor da elite seja tão predominantemente branca quanto era durante a escravidão; é aceito como normal que as universidades sejam ocupadas, na imensa maioria, por jovens brancos e as prisões, por jovens negros; que em 120 anos da República, o Brasil tenha uma escola diferente para os ricos, na qualidade, da escola para os pobres; e que, depois de 20 anos de democracia, a corrupção seja vista como uma prática comum em todos os níveis da sociedade, especialmente entre os políticos.

É normal que nossas reservas florestais sejam devastadas sistematicamente; e que, apesar de todas as evidências da catástrofe do aquecimento global, abramos mão de bilhões de reais em impostos para viabilizar o aumento na venda de automóveis privados, sem buscar uma reorientação dessa indústria, como forma de manter o emprego do trabalhador, o bem-estar do consumidor e o equilíbrio ecológico, a serviço das próximas gerações.

É normal prender quem rouba comida ou remédio para os filhos e deixar solto quem rouba bilhões mas pode pagar bons advogados.

E é normal, nos dias de hoje, que os partidos que lutavam contra as injustiças tenham optado pelo abandono dos sonhos, entregando-se às mesmas práticas do passado e esquecendose de suas promessas. Na República, que comemora 120 anos, é normal que a justiça, a escola, a saúde, o transporte, a moradia, a cultura sejam tão diferenciados, conforme a classe social, que as pessoas não pareçam compatriotas.

No Brasil, o anormal é normal; por isso, o normal é anormal. E imoral.

Cristovam Buarque é senador (PDT-DF).

Sarney se diz injustiçado e culpa a imprensa

Gerson Camarotti
DEU EM O GLOBO

O CONGRESSO MOSTRA SUAS ENTRANHAS: Senador evita responder a apartes dos colegas e pede que respeitem seu silêncio

BRASÍLIA. O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), aproveitou o último dia antes do recesso parlamentar para, em discurso diante de um plenário vazio, com apenas cinco senadores, reafirmar que ficará no cargo para enfrentar a crise. Evitando usar as palavras renúncia e afastamento, Sarney disse que é a terceira vez que assume o comando do Senado e que sempre o encontrou em meio a crises. O senador acusou a imprensa de fazer uma campanha pessoal contra ele.

- Os desafios, a carga de trabalho, os insultos, as ameaças não me amedrontaram e não me amedrontam.

Para os poucos senadores presentes, ele leu o discurso "Uma prestação de contas" da cadeira de presidente, sem esconder o abatimento. Concluiu citando Sêneca, filósofo e escritor do Império Romano: "As grandes injustiças só podem ser combatidas com o silêncio, a paciência e o tempo".

Agradeceu aos partidos que sustentam sua gestão, inclusive o PT. E lamentou ter perdido o apoio do DEM. Disse que só disputou a eleição porque foi convocado pelo seu partido e admitiu, pela primeira, vez que avaliou mal os desafios da missão:

- Esqueceram o Senado para invadir minha vida privada e a de minha família.

Sarney tentou demonstrar que as turbulências não paralisaram a Casa, e enumerou 40 medidas tomadas por ele neste primeiro semestre para corrigir irregularidades e distorções administrativas. Ao ser questionado por jornalistas, ao deixar o plenário, Sarney pediu para que respeitassem o seu silêncio.

Ao discursar, enfrentou constrangimentos, em apartes de Cristovam Buarque (PDT-DF) e Álvaro Dias (PSDB-PR). O pedetista pediu que Sarney entregasse ao presidente Lula o balanço das atividades do Senado para que ele entenda que "não pode humilhar" a Casa, chamando senadores de pizzaiolos.

Evitando polemizar, Sarney respondeu que mandaria cópia do relatório a Lula e que transmitiria as observações do pedetista. Já Álvaro Dias demonstrou incômodo com as declarações do presidente do Conselho de Ética, Paulo Duque (PMDB-RJ), que disse não se preocupar com a opinião pública.

- Atue junto ao Conselho de Ética para que ele possa julgá-lo de forma transparente, imparcial e responsável que exige a sociedade brasileira, especialmente junto ao presidente do Conselho de Ética - pediu.

Sarney evitou responder. Mas lembrou de um episódio entre os dois, quando Dias o procurou no Maranhão, para convidá-lo a ingressar num partido que iria fundar. Diante desse relato, o presidente do Senado acrescentou que, se tivesse que procurar alguém para testemunhar sobre sua vida pública, escolheria o colega do Paraná.

Discurso de fiiliação do ex-Presidente Itamar Franco ao PPS

“Que importa saber qual o caminho que cada indivíduo segue para encontrar a verdade remota. Não há apenas uma estrada que conduza à sua solução.”
Quintus Aurelius, prefeito de Roma

Sinto-me feliz pelos inúmeros convites que recebi de várias agremiações, todas do mais alto valor cívico. Resolvi pelo PPS, presidido pelo meu líder na Câmara dos Deputados, Roberto Freire, quando exerci a Presidência da República.

Não há como desconhecer o passado de lutas do partido e do líder, sem nenhuma motivação que não fosse a ideologia, sem nenhum interesse contestável, fiéis à missão política maior que é a de defender os princípios democráticos.

Tocqueville disse que como o passado deixa de lançar luz sobre o futuro, o espírito do homem vagueia na obscuridade.

É oportuno analisar este pensamento, quando se COMEMORAM os 15 anos do plano real.

E, neste momento, informo que Três desafios eram prioritários, quando assumimos o governo federal, em dezembro de 1992:

-manter o Estado de Direito;

-recuperar a auto-estima do povo brasileiro;

-controlar a inflação e estabelecer o valor da moeda.

O Plano Real, em seu conjunto, não era estático. Ele preconizava a necessidade da reforma tributária e fiscal, visando liberar nosso parque produtivo de obstáculos burocráticos e também criava condições para um novo pacto federativo, nova maneira de dividir encargos e responsabilidades entre os Municípios, Estados e União.

A ausência dessas providências complementares, se reflete hoje no chamado “custo Brasil”, deixando os Estados e Municípios em situação constrangedora, em áreas como a educação, saúde e segurança.

Eis alguns fatos:

- Em fevereiro de 1994 é assinada a Medida Provisória da URV;

-abril de 1994 os juros alcançaram 60 % e a inflação mensal 50%;

-ainda em abril Era fechado o acordo com os credores externos;

- em Junho de 1994 é sancionada a Lei Anti-Truste;

-Finalmente, Em 1° de Julho de 1994, entra em vigor o Plano Real.

Não se pode modificar a história ou intimidar os historiadores, falseando versões sob argumentos personalistas.

A moderna sociedade industrial arrisca perder o indivíduo no meio da massa, favorecendo a sua alienação. o enfraquecimento dos partidos aumenta o isolamento do homem.

O amor a crítica e ao debate, o apego às prerrogativas da cidadania, o dever político no seu mais nobre e dignificante sentido, a irresistível vocação para a vida pública, não são privilégios dos mineiros.

Mas devemos orgulhar-nos, por todas as razões, do fato de ser a comunidade mineira, por influência dos fatores de ordem histórica e social, aquela onde o sentimento dos interesses coletivos, a compreensão do múnus cívico, e essa indomável e altiva tendência política nunca perderam sua forma e constância: Em Minas habituamos a ver o Brasil acima das conveniências.

Rosseau, em “os Devaneios do Caminhante Solitário”, já alertava para a destruição dos recursos naturais do Planeta. Mas também Dizia que a verdade geral e abstrata é o mais precioso de todos os bens. Sem ela o homem é cego; ela é a luz da razão.

Por outro lado, Hoje fala-se muito em meio-ambiente, ao se mencionar a sustentabilidade. aliás, Em nosso governo foi criado o Ministério do Meio Ambiente e da Amazônia Legal.

Mas, não se pode esquecer que o termo sustentabilidade abrange outras áreas do universo político, como o campo ético, o da educação e a retomada da consciência de um patrimônio moral e espiritual, tudo isso muito longe de uma desmedida ação compressora da publicidade governamental, rolo implacável, azeitado por recursos orçamentários em nível antes nunca vistos, levando à indiferença das elites e ao anestesiamento das massas.

Corremos perigo quando o Governo se expande em demasia e foge de suas responsabilidades, transformando-se em único defensor de interesses.

O Ministro de Negócios Estrangeiros da Alemanha, Joschka Fischer, o mais popular político do país durante o governo Schroder, revelando toda sua perplexidade com os rumos do continente, ao final dos anos 40, parafraseou a angústia de São Pedro e iniciou seu célebre e controverso discurso na Universidade Humbold de Berlim com o famoso “Quo Vadis”, no caso inquirindo a Europa.

Acredito ser o momento de fazer o mesmo, pois o Brasil vive hoje uma das mais importantes etapas de sua história, exigindo de nós um esforço conjunto do que verdadeiramente se caracteriza como sustentabilidade, pois vivemos hoje um autêntico jejum da atividade política autêntica – o exercício da cidadania.

Corre também perigo a democracia, quando o Governo age para assegurar a um partido político a manutenção do poder a qualquer custo, transformando-a numa espécie de sátrapa, onde impera um servilismo contumaz.

Está chegando a hora da regeneração política do País, aviltado por um populismo inconseqüente, o que não se casa, Por exemplo, com o abandono dos aposentados, que foram os que fizeram ontem o que hoje desfrutamos.

Está entre os mais respeitáveis valores republicamos o que diz que não pode haver aliança entre a política maior e àquela menor, que atende inconfessáveis interesses privados.

As reiteradas ações do governo, destinadas a favorecer o culto da personalidade, pode levar-nos a uma espécie de cesarismo caboclo, altamente comprometedor da saúde republicana.

O exercício do poder impõe a seu titular austeridade e gravidade, muito longe de uma certeza messiânica, de incontinências verbais, de esforços destinados a negar o passado e a contribuição de antecessores.

A República não aceita a existência de atos administrativos secretos, inconcebíveis pela violência contra a Constituição, onde princípio basilar exige a publicidade de todos os atos. nem estudos que afetam sobremaneira os estados.

Senhor governador, tenho certeza que vossa excelência está atento à questão da renovação das concessões de geração, transmissão e distribuição das empresas do setor elétrico, que afeta a cemig, três marias em particular e muito aos consumidores mineiros. parece que o governo federal, segundo se noticia, está dividido.

O PPS, líder Roberto, deve acompanhar de perto o desenvolvimento desse assunto.

Governador Aécio Neves:

“Seja um libertador de idéias reprimidas”.

Olhos na Estrela Polar acima do horizonte ou no sol do meio dia, pois, às vezes, a latitude política pode não ser confiável.

Obrigado amigos do PPS!

Obrigado aos que aqui vieram!

Como dizia o poeta e cancioneiro juizforano, Roberto Medeiros, pé no chão e olhos nas estrelas.
Lembremo-nos, Senhor Governador, dos versos de Geraldo Vandré:

“Quem sabe faz a hora não espera acontecer”.

Muito Obrigado!

Itamar Franco

Belo horizonte, 06 de julho de 2009.

Uma cilada

Paulo Pinheiro, vereador (PPS) no Rio.
DEU EM O GLOBO

Está no "Aurélio": cultura e o conjunto de características humanas que se criam e se preservam através da comunicação e cooperação entre indivíduos em sociedade. Portanto, privatizar a cultura vai contra a natureza do próprio termo usado pa­ra designá-la. Respiro aliviado por saber que 0 Teatro Municipal do Rio conseguiu escapar da cilada contida no argumento de que a transferência de gestão para a iniciativa privada daria mais transparência à sua administração.

É lamentável o fato de os governos preferirem entregar a terceiros as atribuições que, costitucionalmente, sempre foram suas. Em médio prazo, tal atitude só pode gerar a desqualificação das instituições publicas.

O primeiro semestre de 2009 foi marcado por discussões nas casas legislativas do Rio sobre os projetos que criam as Organizações Sociais - autorização concedida pelo poder publico.a entidades de direi­to privado sem fins lucrativos para executar atividades em diversas áreas. Na mesma época, a prefeitura optou por enviar à Câmara um projeto mais amplo, contemplando também a educação, a saúde,o meio ambiente e o esporte.

O objetivo de ambos os projetos está ligado ao interesse dos gestores públicos de fugir das amarras da Lei das Licitações, do rigor do regime jurídico único (estabilidade do funcionalismo publico) e das obrigações com os tribunais de contas.

É possível detectar incoerências entre os autores das duas propostas: enquanto o Estado pede autorização para habilitar pessoas jurídicas em OSs sem necessidade de experiência anterior, a prefeitura diz que só habilitara PJs com pelo menos dois anos de experiência.

A falta de coerência também esta presente em outro fato: na Alerj, pa­ra conseguir a maioria dos votos favoráveis, 0 governo aceitou retirar do projeto um dos seus principais equipamentos, 0 Teatro Municipal. Já na área municipal, foram retira­dos os mais importantes equipa­mentos das áreas de educação e saúde. Apesar de serem flagrantes incoerências, a retirada do Municipal, das escolas e dos hospitais desse imbróglio nos deixa um pouco menos preocupados.

Os rios voam

Míriam Leitão
DEU EM O GLOBO


Seis da manhã no resto do país, lá ainda eram cinco, quando o carro entrou no campus da centenária Universidade Federal do Amazonas (Ufam).

O motorista reduziu a velocidade: “Aqui a gente tem que ir bem devagar para não atropelar os bichos.

Preguiça ainda dá tempo de ver, mas cotia aparece do nada.” Assim deve se chegar à Amazônia: com respeito, devagar. A informação surge do nada.

Nossa maior floresta é a maior floresta do mundo. A gente só acha que aquele mundo é simples quando está longe; mais perto, mais difícil de entender ele é. Tenho ido lá para ver um pedacinho por vez. Desta vez, fui à reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em Manaus.

No pouco que vi, aprendi muito. Fui, convocada pelo Globo Amazônia, um projeto que tem levado os repórteres da Rede para reportagens, reuniões, entrevistas, no local do nosso maior desafio. Madruguei para entrar ao vivo no Bom Dia Brasil.

A SBPC foi, quando o Brasil precisou, centro de resistência política. Hoje, porque disso o Brasil precisa, escolheu o tema: “Amazônia, Ciência e Cultura”. Numa reunião dessas, só se consegue ver uma parte daquele mundo de aulas, palestras, mesas-redondas e cursos. Os eventos ocorrem simultaneamente, o Campus é enorme.

Só a área verde é equivalente a 700 mil campos de futebol. As construções são em pontos diferentes e distantes, a logística da cobertura tem que ser estudada com cuidado.

Nas salas de aula, as explicações técnicas são dominantes, mas há a hora de ver o panorama. Foi assim que o professor Ângelo da Cunha Pinto, da UFRJ, numa aula sobre química das plantas, saiu dos taxóis e alcalóides à convocação de pesquisa em massa na Amazônia.

Os recursos de pesquisas fizeram como os portugueses, se concentraram no litoral.

Não que devam agora ser reduzidos os investimentos em centros de outras regiões, mas é preciso aumentar o que vai para a Amazônia.

Só 4,5% dos mestres e doutores do Brasil estão lá.

— Como Getúlio um dia pensou em ocupar a região com soldados da borracha, temos agora que convocar os mestres e doutores da Amazônia — disse.

A Academia Brasileira de Ciências tem feito a mesma convocação, a pioneira Bertha Becker tem apontado nessa direção há anos. Eles têm razão: não se protege o que não se conhece; não se transforma em valor econômico o que não foi entendido.

Entender é exercício caprichoso, que exige tempo. O erro do professor de Harvard Mangabeira Unger foi achar que sabia tudo, antes de ver de perto e com calma o que nos tem assombrado há séculos.

Ele tinha soluções prontas e frases feitas. Errou no diagnóstico e, pior, deixou remédios aviados que terão efeitos colaterais.

Mandar os cérebros na frente, explorar com a razão, ocupar com o entendimento.

Essa é a única coisa sensata a fazer diante de uma encruzilhada na qual estão os destinos do Brasil e do mundo.

Com o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), numa viagem anterior, aprendi o que é o BoomColapso. A tese, recentemente publicada na “Science”, mostra com estatísticas irrecorríveis que a ocupação desordenada, feita por motosserras, correntões e fogo, produz surtos de crescimento seguidos de colapsos. As áreas atacadas dessa forma medieval até crescem, por pouco tempo; até produzem riqueza, apropriada por poucos; mas depois retornam a quadros agravados de pobreza e violência. O progresso é breve; a destruição e miséria, permanentes.

O Brasil é dividido em regiões e estados para organizar a geografia e a política, mas, na vida real, o Brasil é uma continuidade por terra, mar e ar. Blocos de umidade se formam sobre a Amazônia, correntes de ar levam a umidade para o resto do país nos “rios voadores”. Nem todo vapor de água será chuva, por isso os cientistas falam em umidade precipitável.

Diante de um mapa mundi , o professor Pedro Leite da Silva Dias explicou que sobre três regiões do mundo se formam imensas massas de umidade: Amazônia, África e Indonésia. Essa água em forma gasosa é transportada para outras regiões do globo terrestre. São responsáveis em grande parte pelas chuvas do mundo. Como se dá essa formação de massas úmidas? Como elas são transportadas? De onde exatamente vêm? Os cientistas estão estudando isso há anos. Já no fim dos anos 70, o professor Eneas Salati fez modelos. Em 1985, uma parceria entre a NASA e o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), aprofundou os estudos dos JBNs, Jatos de Baixo Nível.

O professor José Marengo batizou os JBNs com o feliz nome de “rios voadores”. A nova e complexa metodologia de pesquisa foi explicada pelo professor Marcelo Moreira numa aula tão técnica que tive saudades da “banda diagonal endógena”. Achei que os economistas são simples, e o economês, língua corrente. O desafio da pesquisa é captar no ar o vapor de água, condensá-lo, para estudar fisicamente as gotas.

— Precisamos conversar com as moléculas, perguntar de onde elas vêm. Elas têm características diferentes dependendo da origem — explicou, claro como água limpa, Pedro Leite Dias.

Mas quem vai pegar gotas no ar? Quem é o louco? Gerard Moss entra em cena.

Suíço, no Brasil há duas décadas, apaixonado por rios e florestas, Moss foi empresário, hoje voa pela ciência.

Meu espaço acabou.

Amanhã eu conto o resto.

Com Alvaro Gribel

Tensão se amplia em Honduras com anúncio da volta iminente de Zelaya

EFE E AFP
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Segundo Chávez, líder deposto retornaria ao país ?nas próximas horas?, complicando ainda mais possível acordo

A expectativa da volta do presidente deposto Manuel Zelaya causou ontem uma nova escalada de tensões em Honduras. O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, afirmou, em visita à Bolívia, que o retorno de Zelaya era iminente e disse que o líder deposto estaria disposto "a arriscar a vida" para isso. "Zelaya disse que nas próximas horas entrará em Honduras e estamos com ele. É preciso apoiá-lo", disse Chávez.

Em resposta, o presidente de facto de Honduras, Roberto Micheletti, acusou países da região de "infiltrar uma grande quantidade de gente" em seu país para cometer "atos guerrilheiros". Ele disse que 56 nicaraguenses teriam sido presos em protestos contra seu governo em Tegucigalpa e advertiu que o Exército e a polícia hondurenhos estariam preparados "para repelir tentativas de intervenção estrangeira" no país.

"Temos certeza de que o apoio estrangeiro (a Zelaya) já está dentro de Honduras", afirmou Micheletti à rede de rádio e TV colombiana RCN. "As manifestações aqui nunca haviam sido tão violentas e além disso foram usados lemas de países da América do Sul."

Chanceler do governo destituído, Patrícia Rodas tinha dito na quinta-feira que Zelaya poderia até já estar em Honduras e seu objetivo era estabelecer uma nova sede para sua administração, de onde ele lideraria a "batalha final contra os golpistas". Horas mais tarde, o presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, acusou o Exército hondurenho de ter realizado um movimento militar "impressionante" na fronteira.

O porta-voz das Forças Armadas de Honduras, Ramiro Archaga, negou a informação. E a secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, pediu que outros países não interfiram em Honduras e advertiu contra "ações que poderiam levar à violência".

Ontem pela manhã, 500 simpatizantes de Zelaya bloquearam as principais estradas de acesso a Tegucigalpa pelo segundo dia consecutivo. O governo de facto adiantou o salário dos professores numa tentativa de evitar que eles se juntassem aos manifestantes.

ENCONTROA escalada da tensão aumenta a pressão sobre o encontro, previsto para hoje, na Costa Rica, entre representantes dos governos de Zelaya e de Micheletti. Mediador das negociações, o presidente costa-riquenho, Oscar Arias, propõe a formação de um governo de reconciliação em Honduras e diz que a normalização da situação deve passar pela volta de Zelaya ao poder.

Sindicatos hondurenhos ameaçam iniciar uma greve geral se não houver acordo até amanhã. Mas as posições dos dois lados parecem irreconciliáveis. Zelaya quer voltar ao poder de forma incondicional, embora tenha dito na ONU que não pretende se eleger novamente. Micheletti - que é apoiado pelas Forças Armadas, a Suprema Corte e o Congresso - diz que pode deixar o cargo, que assumiu após o golpe, desde que Zelaya não volte.

"Se Zelaya desistir de incitar um movimento revolucionário no país e de voltar (ao poder) eu cedo meu cargo", afirmou Micheletti à RCN. "Não queremos ficar como os venezuelanos, os equatorianos e os bolivianos. Queremos um país livre e democrático."

Zelaya foi expulso de Honduras no dia 28 por militares que o enviaram de pijama para a Costa Rica. Segundo os golpistas a ação foi necessária porque o presidente queria violar a Constituição hondurenha, organizando uma consulta popular sobre uma emenda que lhe permitiria se eleger novamente. Para os golpistas, a iniciativa seria uma indicação de que Zelaya pretendia seguir o caminho de Chávez, seu aliado nos últimos anos.

Agora, a oposição hondurenha acusa o venezuelano de estar por trás dos planos do presidente deposto para voltar ao país secretamente. Os EUA também condenaram o golpe, mas têm aconselhado Zelaya a só retornar a depois de um acordo.

No dia 5, Zelaya tentou entrar em Honduras, mas seu avião foi impedido de aterrissar em Tegucigalpa e ele foi obrigado a ir para El Salvador.

Os EUA vão para o spa

Clóvis Rossi
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


SÃO PAULO - Na conversa que teve com seu colega Luiz Inácio Lula da Silva, em Áquila, durante as multicúpulas do G8 e cia., o presidente Barack Obama transmitiu um recado claro: que o mundo não conte mais com o consumo norte-americano para tocar a vida. Lula deve ter ficado impressionado, a julgar pelos comentários que fez no dia seguinte, durante sua entrevista coletiva.

Ontem, Lawrence Summers, um dos principais nomes da assessoria presidencial, avançou alguns detalhes sobre o que será a economia do G1, que continuam sendo os Estados Unidos, se os planos de Obama forem de fato adiante.

"A economia americana reconstruída tem que ser mais orientada para a exportação e menos para o consumo; mais orientada para o meio ambiente e menos para a energia fóssil (menos petróleo); mais orientada para a biotecnologia e para o software e menos para a engenharia financeira; mais orientada para a classe média e menos para o crescimento da renda que favorece desproporcionalmente uma fatia muito pequena da população", afirmou Summers.

Fácil e bonito de falar, difícil de fazer. Mesmo assim, eu votaria, em 2010, em quem defendesse esse tipo de conceitos, desde que tivesse credibilidade para fazê-lo. Pena que credibilidade e política, no Brasil, raramente se encontram.

A construção dessa nova economia não é um problema apenas dos Estados Unidos. A crise demonstrou a plena vigência de um ditado que alguns afoitos davam por ultrapassado, o que diz que, quando os Estados Unidos espirram, o mundo pega pneumonia.

Pegou. Agora que os Estados Unidos se encaminham para um tremendo spa/academia, o mundo será de novo afetado, para o bem e para o mal. O diabo é que ninguém, no Brasil, está pensando em como adaptar-se a um país de apetite menos pantagruélico.

Argentina x Brasil?

Cesar Maia
DEU NA FOLHA DE S. PAULO


OS JORNAIS argentinos -"Clarín" e "La Nación"- publicaram, em dois dias, artigos questionando as relações entre os EUA e a América do Sul, pró-Brasil, e contra a Argentina.

Dia 8 de julho, no "Clarín", ("Brasil, um aliado sui generis"), o professor Fabian Calle diz que a política externa interamericana EUA/ Brasil é apenas o desdobramento da estratégia do general Golbery do Couto e Silva durante o regime militar. Cita o recente informe "A Second Chance. US policy in the Americas" e afirma que os EUA, como potência mundial, têm o Brasil como "primus interpares" sulamericano. Lembra a reunião Obama-Lula em que ficou clara a imagem transmitida de Brasília como um poder brando.

"A visão de Golbery era o destino do Brasil como uma potência ocidental com estreitas ligações com Washington e com graus de manobra para consolidar sua hegemonia sulamericana e garantir aos EUA um status não desestabilizador." "O ponto era reforçar a hegemonia regional do Brasil sobre a Argentina", e conclui afirmando que, "em pleno século 21, a história das grandes potências não parece convalidar visões lineares de delegação".

Dois dias depois, no "La Nación", o professor Carlos Escudé vai mais longe. Diz que o Brasil nasceu com vantagem ao ficar independente sem crise. Mas que nos anos 1890 a Argentina o superou. Um trabalhador argentino trabalhava a metade de um belga ou alemão e um terço do italiano para comprar o mesmo.

Em 1937 o PIB per capita argentino era superior aos de Áustria e Finlândia, o dobro do italiano e o triplo do japonês. Nos dois casos, o Brasil não era sequer listado. No plano militar, em 1920, a Argentina mobilizaria imediatamente 379 mil homens e o Brasil, 136 mil. Isso valeria para toda a década de 30.

Escudé afirma que o ponto de inflexão foi a Segunda Guerra. Os EUA privilegiaram o Brasil. A neutralidade Argentina teria aberto uma política de sanções dos EUA. A Argentina teria sido privada dos insumos necessários a seu desenvolvimento industrial (departamento de Estado 1945: "essencial não permitir a expansão da indústria pesada na Argentina").

Cita Roosevelt em 1944: "Estou totalmente de acordo que deveríamos proceder duramente com a Argentina. Ao mesmo tempo, é essencial fortalecer o Brasil. Isso deve incluir armas e munições. "Por isso o Brasil emergiu como potencia regional." No final do artigo, Escudé alivia e diz que hoje as relações com o Brasil são de cooperação comercial, e não geopolíticas.

Artigos como esses, em meio à crise política argentina, devem prevenir os canais político-diplomáticos de forma a que nossa imprevisível América Latina não acorde surpreendida, mais uma vez.

Cesar Maia escreve aos sábados nesta coluna.