quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Lula e a direita

Merval Pereira
DEU EM O GLOBO


O presidente Lula tem uma visão utilitarista de sua base partidária que faz jus a seu histórico de sindicalista pragmático, mas volta e meia deixa vir à tona um viés esquerdista que já foi sua marca em tempos remotos, que ficaram para trás e que hoje volta e meia cismam de retornar à sua ação política. Mas são atitudes mais personalistas do que ideológicas. Há quem considere, ao contrário de sua própria palavra, que Lula, até a terceira derrota na tentativa de se eleger presidente, mantinha uma visão de esquerda, que abandonou para tentar ganhar a eleição em 2002.

Se pegarmos os verbetes "comunista", "comunismo" e "esquerda" do "Dicionário Lula, um presidente exposto por suas próprias palavras", o formidável livro de Ali Kamel, veremos a barafunda de conceitos que Lula faz, mas sempre tendendo para o conservadorismo.

Ao mesmo tempo que se orgulha de ter criado "o partido político mais importante de esquerda da América Latina", numa entrevista a emissoras de rádio, em 2003 ele relembra que, ao ser perguntado se era comunista, respondeu : "Não, sou torneiro mecânico".

Em outra ocasião, no mesmo ano, em visita ao retiro de Itaici da CNBB, ele lembrou que não queria ir para o sindicato quando tinha 21 anos porque achava que lá "só tinha comunista".

E, no discurso de uma entrega de prêmios em 2006, Lula definiu sua posição sobre "ser de esquerda" que ficou famosa:

"Se você conhecer uma pessoa muito idosa esquerdista, é porque ela está com problema. Se conhecer uma pessoa muito nova de direita, também está com problema".

Para Lula, isso acontecia devido "à evolução da espécie humana. Quem é mais de direita vai ficando mais de centro, quem é mais de esquerda vai ficando social-democrata, menos à esquerda, e as coisas vão confluindo de acordo com a quantidade de cabelos brancos que você vai tendo e a responsabilidade que você vai tendo, não tem outro jeito".

Como que para expurgar o sentimento de culpa que deve sentir por acordos políticos tão espúrios quanto os que se sente obrigado a chancelar diariamente, de vez em quando Lula faz como ontem, ao festejar o fato de que a eleição presidencial do próximo ano não terá nenhum "troglodita da direita" como candidato.

Ele passou espertamente por cima do maior representante dessa categoria, o hoje senador Fernando Collor, transformado em seu aliado estratégico tanto com relação ao PAC quanto na questão do pré-sal, indicado que foi para presidir a fundamental Comissão de Infraestrutura, e atacou o tucano Geraldo Alckmin como representante da "direita selvagem", logo ele, apelidado de "picolé de chuchu" por sua atuação neutra.

Na verdade, boa parte dos "trogloditas de direita" fazem parte da base governista, alçados por Lula a aliados incondicionais. O fato de não haver um candidato viável representando a direita é apenas mais uma das muitas distorções da democracia brasileira, e o comentário de Lula só revigora a sensação de que ainda estamos longe de atingirmos uma representatividade partidária real.

Um dado aceito como verdade na recente política brasileira é que, se o PMDB não consegue eleger um presidente da República, nenhum presidente da República consegue governar sem o apoio do PMDB, um partido que já foi o principal representante da esquerda brasileira e hoje patina no fisiologismo explícito, representando a parte "direitista" desse fenômeno, que tem no PT sua contraparte esquerdista.

Da mesma forma, nenhum político brasileiro se declara "de direita", mas a direita política está sempre presente nos governos formados a partir de 1985, quando Tancredo Neves se elegeu presidente da República numa aliança política antes impensável com os dissidentes do PDS, partido que dava sustentação à ditadura militar.

Boa parte desses políticos, abrigados depois no Partido da Frente Liberal (PFL), fizeram a aliança com o PSDB que levou Fernando Henrique ao poder em 1994, a bordo do Plano Real.

E uma dissidência do PFL, atual DEM, acabou apoiando Lula em 2002, capitaneada pelo senador José Sarney, que se transformou no principal apoio político de Lula no Senado e dentro do PMDB.
O presidente Lula, para eleger-se em 2002, procurou um empresário para compor sua chapa, como maneira de tranquilizar os que ainda o viam como uma ameaça. E, mais uma vez recorrendo ao "Dicionário Lula", podemos ver uma explicação bastante direta do presidente Lula sobre como age politicamente:

"(...) Meu comportamento político sempre foi prático. Nunca gostei de ser rotulado. (...) No movimento sindical, era chamado de agente da CIA pelos comunistas e de comunista pela direita. Isso me deixava tranquilo, pois como não era nem um nem outro, ficava livre para escolher o caminho que entendia melhor para os trabalhadores".

Portanto, quando ele identifica Alckmin com a direita raivosa, coisa que nunca foi, e finge esquecer as alianças que tem com partidos dessa mesma direita, Lula está apenas fazendo política. Deu certo na eleição de 2006, quando conseguiu pespegar no PSDB a pecha de "entreguista", com críticas às privatizações que Alckmin não soube responder.

Provavelmente não dará certo na próxima eleição, embora o governo já esteja preparando o ambiente para identificar-se com um sentimento nacionalista em relação à descoberta dos campos de petróleo do pré-sal, tachando todos que sejam contra a mudança do marco regulatório de "entreguistas".

A crise econômica internacional alargou o espaço estatizante dos governos, e Lula está se aproveitando para ampliar seu próprio espaço político, e o de seus aliados.

Mas nem Serra nem Aécio são tão fáceis de serem classificados de entreguistas, e o PSDB abdicou de lutar pelo modelo de concessão que implantou na exploração do petróleo justamente para não ser acusado de estar contra os "interesses nacionais".

Mundos e fundos

Eliane Cantanhêde
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - Antes de comprar, os compradores oferecem mundos e fundos, em preços, condições, manutenção, compensações. A ponto de o comprador pensar: "Daqui a pouco, eu vou receber de graça", como disse Lula sobre a aquisição de 36 caças para a FAB.

Um dos requisitos na seleção é um "offset" (sistema de compensações) de, no mínimo, 100% do preço do negócio. Assim: o Brasil paga por volta de 4 bi (uns R$ 10 bi) pelos aviões. E o vencedor, a França, a Suécia ou os EUA, tem de investir os mesmos 4 bi em programas/ projetos de interesse do desenvolvimento brasileiro.

Essa compensação pode ser comercial, industrial, tecnológica e/ ou em pesquisa. Daí porque, entre outras mil promessas (vãs?), a França anuncia a compra de aviões KC 390 da Embraer, os EUA correm atrás de mais de uma centena de empresas para somar às 27 já listadas como fornecedoras, e a Suécia já levou técnicos da Embraer ao país para "aprender fazendo" e já ir trabalhando na execução do projeto do caça Gripen NG.

Pelos requisitos da FAB, 80% das compensações têm de ser "diretas" -na área militar aeroespacial- e as outras 20% podem ser "indiretas" -em qualquer outra área, até investimento em pesquisas universitárias ou troca de estudantes.

Para dourar sua pílula, como todos os três concorrentes finais fazem, os EUA computam até investimentos em pesquisa e produção de biocombustíveis, uma área e uma palavrinha apetitosas para a opinião pública dos dois países.

Depois vem o final da concorrência, e é aí que o comprador cai na real e vê que, entre discurso e prática, promessa e realidade, há o céu e uma velocidade supersônica -em sentidos contrários.

Passam o primeiro, o segundo, o décimo ano, e quem vai lá conferir se o que estava escrito era para valer, ou só para brasileiro crer?

Isso sem falar na tal "transferência de tecnologia"...

Lula e os conflitos entre Poderes

Maria Inês Nassif
DEU NO VALOR ECONÔMICO


Daqui há alguns anos os especialistas terão mais clareza para explicar o fenômeno, mas é possível registrá-lo com todos os detalhes neste sétimo ano de governo Lula, quarto a partir de 2005, quando o escândalo do mensalão, que atingiu em cheio o seu partido, o PT, foi sucedido de um contraditório e constante aumento da popularidade do presidente da República. O dado número um desse período é esse: a maior crise política do primeiro governo de Lula, em 2005, foi o ponto inicial de uma curva sempre ascendente de popularidade do titular do governo. O dado número dois é que as crises políticas, desde então, têm convivido com a popularidade do presidente. O último dado é que elas são constantes: as situações que envolvem especialmente a política criam focos de atrito do governo ora com o Legislativo, ora com o Judiciário. Existem fontes de tensão permanentes. Essa dificuldade de transitar conflitos com outros poderes deram ao governo Lula pós-2005 características próprias, diferenciadas dos governos anteriores: o maior fator de estabilidade tem sido, de fato, a popularidade do presidente. Essa fórmula de equilíbrio fundada em uma relação com eleitor, diga-se, hegemônica, não seria de equilíbrio se as regras democráticas tivessem sido quebradas. Felizmente não foram. Têm se mantido no estrito âmbito do voto.

Outra informação a ser extraída desse período é o fato de as dificuldades de trânsito com outros poderes acontecerem independentemente das facilidades que teoricamente o governo poderia ter, em alguns momentos, no jogo institucional. No Congresso, por exemplo, a negociação com o PMDB, em vez de dotar o governo da estabilidade parlamentar que ele não conseguia ajuntando pequenos partidos inorgânicos, acabou jogando o governo em crises políticas no Legislativo que sequer eram de sua lavra, sem obter solidez na sua base parlamentar. No Supremo Tribunal Federal (STF), nomeou sete dos seus onze membros - e ainda assim enfrenta crescentes dificuldades na alta Corte, em especial a partir da posse do seu atual presidente, Gilmar Mendes.

O ano de 2005 foi um marco. Até então, havia um total descompasso administrativo, atribuído por integrantes do governo à excessiva partidarização da máquina e à transferência dos conflitos internos do PT para dentro do governo, polarizados então entre o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, e o ministro da Fazenda, Antonio Palocci. Depois do escândalo do mensalão e do envolvimento de Palocci no caso da quebra de sigilo bancário do caseiro Francenildo Santos Costa, um rearranjo interno desmontou o anterior, que se equilibrava em conflitos petistas, trocando-o por uma estrutura firmada em gestores de projetos mais coordenados entre si e avalizados pela determinação presidencial de que executassem seus orçamentos - a queda de Palocci foi o fim, igualmente, da cultura de que superávits primários elevados deveriam prevalecer sobre qualquer outra determinação de governo. Os avanços gerenciais foram feitos em torno de projetos que, acanhados do ponto de vista orçamentário, mostraram potencial de popularizar o governo justo no momento em que a crise política do mensalão ocupava o espaço institucional. Foi o caso do Bolsa Família, das políticas para a agricultura familiar, do Luz para Todos e de outros programas sociais.

A ascensão da popularidade de Lula, que garantiu o seu segundo mandato apenas meses depois de ter sido sentenciado ao impeachment pela oposição, os resultados dos programas com maior foco e melhor gestão e o fim de polos de conflito interno deram ao segundo governo uma maior desenvoltura administrativa. Após 2006 a administração teve mais ritmo e obteve mais resultados que o primeiro, marcado por enorme paralisia. Em compensação, o governo Lula, depois de 2005, acumulou enormes problemas na gestão de conflitos com outros poderes.

A crise política de 2005 foi também o marco na definição do perfil da oposição parlamentar: depois da CPI do Mensalão, o discurso de grande confronto (que havia marcado o cenário eleitoral de 2002) migrou para o Congresso; o governo, que se equilibrava numa base parlamentar instável, de parlamentares do PT e pequenos partidos de esquerda e de direita, passou a ter dificuldades ainda maiores de transitar projetos de seu interesse.

Do ponto de vista do Judiciário, uma tendência crescente à ampliação de funções legislativas pelo Supremo Tribunal Federal, que se acentuou na presidência de Nelson Jobim na Corte (2004-2006), foi somada a momentos de conflito aberto com o Executivo. O julgamento do pedido de extradição do italiano Cesare Battisti, no dia 9, foi um deles. Curiosamente, foi posto em julgamento o direito que o ministro da Justiça tem de conceder refúgio - uma decisão divergente das anteriores, inclusive daquela que, em 2007, deu status de refugiado político ao colombiano Antonio Cadenas Collazzos, o Padre Medina, ligado às Farc. O voto do ministro Cezar Peluso no julgamento do pedido de extradição do italiano Cesare Battisti, por exemplo, não julga apenas o pedido de extradição, mas o próprio ministro da Justiça, Tarso Genro, acusado de "raciocínio fantasioso", "ilegalidades ruidosas" etc.

Nos governos Fernando Henrique Cardoso, houve uma incomum convergência ideológica entre as forças hegemônicas no Executivo, no Legislativo e no Judiciário. Certamente isso não ocorreu no governo Lula e essa situação foi agravada depois de 2005. O governo tem se sustentado na alta popularidade de seu líder, mas sem que essa estabilidade tenha correspondência nas suas relações com outros poderes. A causa mais clara para esse descompasso é, sem dúvida, a de raiz ideológica, mas esse descompasso poderia ter sido menor se o PT tivesse conseguido exercer o papel de dar um "impulso orgânico" ao governo. O PT estava em crise desde 1998, tinha graves problemas internos quando ascendeu ao governo, em 2002, levou-os para dentro do Planalto e não conseguiu fazer a transição de partido de oposição para partido governista - quando estava fazendo, foi atingido brutalmente pelo mensalão. E impôs-se, depois disso, uma posição de contrição em relação a Lula. A perda de massa orgânica pode ter sido ruim para ambos, partido e Lula, pois o partido não conseguiu assumir uma posição que lhe permita mediar politicamente os conflitos no Congresso ou dar densidade política a uma discussão em torno, por exemplo, das indicações para o STF.

Maria Inês Nassif é editora de Opinião. Escreve às quintas-feiras.

O QUE PENSA A MÍDIA

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A reforma da caiação do escândalo

Villas-Bôas Corrêa
DEU NO JORNAL DO BRASIL


Os senadores eleitos e os senadores de garupa, que nunca viram a cor de um voto, conseguiram concluir a votação da reforma eleitoral, uma promessa de todas as campanhas, mas que sempre morre na praia como afogado de curto fôlego, com a única novidade da derrubada da censura na internet na cobertura da campanha – uma bobagem que deveria sufocar de vergonha os seus autores – e manteve a doação oculta a partidos e candidatos, que sempre foi contornada com os truques de aceitação consensual.

O remendo terá que passar pela Câmara até o fim do mês para vigorar nas eleições do próximo ano e deve ser aprovado sem emendas. Resta à Câmara a responsabilidade disciplinar a exigência do convite a 2/3 dos candidatos dos partidos com no mínimo 10 deputados.

O Congresso não pode desperdiçar mais esta oportunidade de pedir desculpas ao distinto público do despudor do escândalo da roubalheira no Senado com qualquer condescendência com a censura.

É de surpreendente bom senso o acordo, aprovado pelo Senado depois de longos debates, que regulamenta a substituição de governadores e prefeitos no caso de cassação dos titulares, determinando nova eleição direta em qualquer momento da vacância. De eleitos sem votos estamos saturados. Não bastassem os quase 21 anos da ditadura militar dos cinco generais-presidentes quando todo o repertório de falcatruas e de desprezo pelo voto popular foi esgotado em patuscas invencionices como os senadores biônicos, eleitos pelas assembleias legislativas, presidentes eleitos pelos comandos militares e impostos ao Congresso, devidamente advertido pelas cassações de mandatos para acertar a conta dos confiáveis.

Mas nem tudo está decidido. O relator da reforma na Câmara, deputado Flávio Dino (PCdoB-MA), avisa que o entendimento na outra Casa do Congresso é que “a regulamentação sobre isso depende de mudança constitucional”. E que a Câmara de corrigir o engano do Senado.

Com mais ou menos emendas de tão tímida expressão, a reforma fica adiada para o Dia de São Nunca. Pois a crise do Congresso é ética, é moral, como o escândalo do Senado expôs com as mais escabrosas evidências. O nó que tem quer ser cortado, pelo visto na próxima crise ou na recaída de nova ditadura militar. O que a opinião pública não pode aceitar é a continuação cínica da farsa das mordomias, das vantagens e dos privilégios, gerados e multiplicados desde a mudança da capital do Rio para Brasília inacabada, em obras, em 21 de abril de 1960. Nada justifica que senadores e deputados, com apartamentos funcionais mobiliados à disposição, sejam mimados com passagens aéreas semanais, pagas pela Viúva, para o fim de semana de quatro dias úteis nas suas bases eleitorais. E a longa lista de mutretas de fazer inveja a um marajá, como a verba de gabinete para contratar assessores sem concurso, a verba para jornais, para compra de selos, os dois celulares com as contas pagas.

A mamata é tão sedutora que carimba com a veracidade a nota da coluna do Ancelmo Gois, em O Globo. Animado com o sucesso do comício em Boa Vista, capital de Roraima, quando escapou da vaia dos fazendeiros e foi ovacionado por 15 mil pessoas favoráveis à solução à partilha de terras com os índios, o presidente Lula, de volta nas asas do Aerolula, fez um agrado a sua candidata, ministra Dilma Rousseff, prometendo tirar três meses de licença para correr o país fazendo comícios e garantir a sua eleição. E a inesperada revelação que “daqui a dois anos vou me candidatar a vereador por São Paulo”.

Brincadeira ou para valer, o mandato de vereador que deveria ser gratuito, um serviço à comunidade, chega a despertar a cobiça de um presidente da República ao fim de dois mandatos.

* Villas-Bôas Corrêa é repórter político do JB.

Lula: 2010 não terá ‘trogloditas de direita'

Luiza Damé e Chico de Góis
DEU EM O GLOBO

O presidente Lula disse que a próxima eleição presidencial será a primeira sem "trogloditas de direita". "Antigamente, como era a campanha? Era centro-esquerda ou esquerda contra trogloditas de direita."

Lula: "trogloditas de direita" não disputarão em 2010

Presidente diz que nível da próxima eleição será elevado

BRASÍLIA. Em discurso improvisado, durante a comemoração dos 45 anos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que a próxima eleição presidencial será a primeira no país sem os candidatos "trogloditas de direita", o que, na sua opinião, baixava o nível da campanha eleitoral. Mais cedo, ao ser perguntado sobre o desempenho nas pesquisas da ministra Dilma Rousseff (Casa Civil), Lula afirmou que campanha política é como uma maratona: nem sempre quem sai na frente, ganha.

Para Lula, Dilma não deve ter pressa em colocar a candidatura na rua e, agora, tem de cuidar das suas tarefas no governo, como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e o "Minha casa, minha vida".

- Não há por que ter pressa em querer ser candidata com antecedência. Uma campanha é uma maratona: quem ganha, nunca sai correndo de forma atabalhoada. Vai devagar até chegar - afirmou, ao sair do almoço com o presidente do Malaui, Bingu Wa Mutharika.

Já na sede do Ipea, Lula voltou a falar de eleição presidencial, dizendo que em 2010 o futuro será o principal mote da campanha, em substituição ao debate sobre inflação, dívida externa, Fundo Monetário Internacional (FMI) e desemprego. Para Lula, o pré-sal e as mudanças climáticas - temas defendidos, respectivamente, por Dilma e pela senadora Marina Silva, pré-candidata do PV a presidente - estarão no centro do debate:

- Vai ser uma campanha que terá um nível muito melhor. Pela primeira vez não vamos ter um candidato de direita. Não é fantástico isso? Vocês querem conquista melhor do que numa campanha neste país a gente não ter nenhum candidato de direita? Antigamente, como é que era a campanha? Era o de centro-esquerda ou o de esquerda contra os trogloditas de direita. Era assim toda campanha.

Embora tenha começado o discurso dizendo que não falaria do seu governo, pois não segue o estilo "eu me amo", Lula passou 52 minutos se autoelogiando. Disse inclusive que o nível do debate eleitoral melhorou com a disputa entre ele e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em 1994 e 1998.

- Começou a melhorar já comigo e o Fernando Henrique Cardoso. Eu e Serra, também. Depois, eu e (Geraldo) Alckmin baixou o nível por conta dele e não por minha conta. Agora, se estiverem se apresentando os candidatos que estou vendo aí vai ser inédito neste país: quatro ou cinco candidatos, todos do espectro de esquerda - disse.

Lula amenizou o tom no final do discurso, afirmando que hoje há uma mistura:

- Uns podem não ser tão de esquerda quanto eram, mas não tem problema, a história e a origem dão credibilidade. A direita ficou mais progressista e entrou em partidos de esquerda. As coisas vão se misturando.

Serra apressa seu projeto do Palácio do Planalto mas ainda mantém a alternativa de SP

Jarbas de Holanda
Jornalista


Praticamente garantida a recuperação da economia e parecendo superadas as dúvidas a respeito das condições de saúde da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, o problema, persistente, que cerca sua candidatura presidencial é a incerteza sobre o grau de transferência para o nome dela da alta popularidade do presidente Lula, existente entre os caciques do PMDB, os dirigentes de outros partidos aliados e no próprio PT. Incerteza reforçada por números das pesquisas mais recentes indicativos de interrupção do crescimento e até de queda dos seus modestos índices de intenção de votos. E que podem refletir já efeitos da emergência e da reemergência das pré-candidaturas de Marina Silva e Ciro Gomes, capazes de inviabilizar, se confirmadas, o cenário de polarização, plebiscitária, entre o lulismo e os tucanos, programado pelo presidente.

Estes elementos do processo preparatório da disputa político-eleitoral maior de 2010 estão na base da reafirmação – nos últimos dois meses – do projeto presidencial do governador de São Paulo, José Serra. Reafirmação que, curiosamente, não vem sendo contraposta, mas ao contrário facilitada, pelo revigoramento simultâneo da outra pré-candidatura tucana, a de Aécio Neves. Este com base em análise coincidente de boas possibilidades oposicionistas e orientado pela conveniência de estreito relacionamento entre os dois. Com a distinção de que Serra avalia que com a consolidação de tais possibilidades esvaziará o apoio formal do PMDB a Dilma Rousseff e se beneficiará de expressiva divisão do partido, enquanto Aécio segue considerando possível evitar esse apoio ou até reorientá-lo – bem como o de outros partidos da base governista – para o seu nome, caso seja o indicado pelo PSDB.

O relacionamento cooperativo dos dois foi bem evidenciado nas promessas de apoio recíproco explicitadas anteontem na inauguração da Casa de Minas Gerais em São Paulo. E deverá ser mantido na multiplicação de viagens aos estados e de articulações por parte de um e de outro – Serra buscando preservar os índices que lhe propiciam folgada liderança nas pesquisas, e Aécio, ampliar os seus, ainda muito pobres, e afirmar-se como alternativa com maior capacidade de aglutinação de funções políticas. Esforços paralelos que poderão ser interrompidos por uma antecipação para o começo de 2010, com ou sem prévias partidárias, da escolha consensual do candidato. Sem que José Serra tenha ainda descartado o seu Plano B – a disputa da reeleição. Embora já esteja dando passos concretos em São Paulo para fortalecer o Plano A, ao preparar o apoio a Geraldo Alckmin como candidato a governador – que, segundo reportagem da Folha de anteontem, já estaria definido por ser ele considerado o melhor nome (em face do largo favoritismo que tem nas pesquisas) para encabeçar uma aliança com o PMDB e o DEM, além de possivelmente o PTB, e para ampliar a vitória no estado da candidatura presidencial serrista.

Mas uma variável importante dos estímulos que a movimentação de Serra e Aécio tem recebido – a performance precária nas pesquisas da campanha governista de Dilma Rousseff – poderá mudar negativamente para eles até o final de setembro em face dos números de novos levantamentos da opinião do eleitorado, que estão sendo esperados – nos quais deverão refletir-se o bombástico lançamento do pré-sal e a intensa mobilização pró-Dilma desencadeada pelo presidente Lula, de par com o esgotamento da crise do Senado e o esvaziamento da CPI da Petrobras. Cabendo esperar para ver se isso reduzirá, ou não, a incerteza sobre a transferência da popularidade de Lula para sua candidata.

“Melhorar antes de piorar”

Trechos de artigo no Valor, do último fim de semana, de Ivan Sant’Ana, especialista do mercado financeiro.

“Enquanto nos Estados Unidos, Obama, cujo primeiro mandato termina em 2013, terá que resolver, antes das eleições de novembro de 2012, os problemas causados pela abertura dos cofres do Tesouro, o sucessor de Lula herdará, em janeiro de 2011, o cenário negativo provocado pela gastança.

Aqui, tem tudo para melhorar antes de piorar. Se isso acontecer, não será a primeira vez que o Brasil, com sua síndrome de Fausto, abdicará de um futuro grandioso, só para ter um presente risonho. Geisel fez isso ao ignorar o início da primeira crise do petróleo, enquanto construía sedes faraônicas para as estatais e tocava projetos ambiciosos (e jamais concluídos) como a Ferrovia do Aço. Sarney fez isso ao trocar um ano de crescimento, 1986, com o Plano Cruzado, por quase uma década de estagnação.

Só uma coisa salvará o Brasil dos chifres e garras de Fausto: a China crescer muito, levando a reboque o preço das commodities, e nos garantir um crescimento sustentado. Pelos chineses.”

Câmara derruba exigência de idoneidade moral e eleição direta para substituir cassados, mas mantém liberdade na internet

Isabel Braga e Maria Lima
O Globo; Agência Câmara; Agência Brasil

BRASÍLIA - A Câmara derrubou nesta quarta-feira parte do texto da reforma eleitoral aprovada pelo Senado que tentava coibir os "fichas-sujas" nas eleições. Caiu emenda do senador Pedro Simon (PMDB-RS) que exigia comprovação de idoneidade moral no momento do registro da candidatura. Os deputados também derrubaram a emenda que estabelecia a eleição direta para substituir governadores cassados. Por outro lado, eles mantiveram um dos principais pontos introduzidos pelo Senado na votação terça-feira , a liberação das campanhas eleitorais na internet. Das 67 emendas feitas pelos senadores, apenas quatro foram mantidas, todas sobre a campanha na rede.

Para os deputados, o texto sobre os "fichas-sujas" daria margem a preconceito, com a avaliação de idoneidade nas mãos de um único juiz.

" Dizer que tem que ter reputação ilibada é jogar para a plateia "

- Isso é ridículo, é fazer lei sem responsabilidade. Dizer que tem que ter reputação ilibada é jogar para a plateia. Quem vai dizer, o juiz? A boa técnica legislativa não combina com pirotecnia - criticou o líder do PT, Cândido Vaccarezza (SP).

Pelo acordo na Câmara, aprovado em votação simbólica, fica mantida, sobre os "fichas-sujas", a regra atual de permitir que políticos processados ou com contas de campanha rejeitadas concorram sub judice. Só a sentença final cassa a candidatura.

Para Temer, os líderes da Câmara aceitaram a parte mais importante do texto do Senado, a liberação da internet:


" Foi uma evolução ao texto da Câmara. Foi um grande avanço "

- O uso da internet é um grande passo que o Senado deu ao projeto e que nós concordamos. Foi uma evolução ao texto da Câmara. Foi um grande avanço - afirmou.

Perguntado sobre o motivo da pressa na votação, já que o texto do Senado só chegou na noite desta quarta à Câmara, Temer disse que como a pauta de votações da Casa estará trancada a partir de sexta-feira por medidas provisórias dificilmente haveria tempo para votar o projeto para valer para as eleições de 2010. O projeto tem que ser sancionado até o inicio de outubro para valer para as eleições do ano que vem.

Outras propostas derrubadas pela Câmara

Para debates em sites comerciais, as regras serão as mesmas usadas em rádio e TV: dois terços dos candidatos têm de aprová-las. A novidade é que os debates podem ser realizados em grupos menores.

A doação oculta aos partidos, uma proposta original da Câmara, se manteve. Caiu a emenda que proibia a criação e ampliação de programas sociais no ano da eleição. E ainda a que permitia a propaganda paga para campanhas presidenciais na internet, mantendo a proibição total de propaganda paga na rede.

" Deram um chega para lá nos senadores "

Com a rejeição da maioria das emendas, volta o voto impresso, em 2014, e o voto em trânsito para presidente da República nas capitais. Apesar do acordo, tucanos criticaram a decisão de rejeitar a maioria das emendas.

- É um absurdo! Vamos votar sem sequer saber o que o Senado aprovou. Deram um chega para lá nos senadores - disse Arnaldo Madeira (SP).

O relator da reforma na Câmara, Flávio Dino (PCdoB-MA), enfatizou que o texto do Senado remete a regulação do conteúdo da internet à Justiça Eleitoral. O texto da Câmara, afirmou Dino, dizia que os "conteúdos próprios" de empresas de comunicação e de provedores teriam que seguir as regras da lei eleitoral para rádio e TV.

- Tenho que dizer que o Senado não liberou geral, felizmente, a regulação da internet porque remete à Justiça. Na Câmara tentamos regular na lei. A diferença é o tipo de regulação. A Justiça dirá o que é indevido ou devido - disse Dino.

Nem parlamentares têm certeza sobre novas regras

Nem mesmo senadores e deputados têm interpretação segura do que pode e o que não pode ser feito na cobertura da campanha eleitoral na internet. O texto final aprovado no Senado, que a Câmara deveria ratificar, diz que "é livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato durante a campanha eleitoral, por meio da rede mundial de computadores" e "outros meios de comunicação interpessoal mediante mensagem eletrônica".

A proposta assegura o direito de resposta e diz que as representações pela utilização indevida da rede "serão apreciadas na forma da lei". O relator na Comissão de Ciência e Tecnologia, senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG), diz que a redação dada evita que a Justiça Eleitoral determine as normas para utilização da rede, como fez nas eleições de 2004 e 2006.

Pelo texto aprovado no Senado, que diz que "é livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato", o entendimento dos senadores é que os comentaristas que participarem de bate-papo ou opinarem em blogs, por exemplo, não têm como ser identificados. Mesmo porque podem se cadastrar com e-mails falsos ou usar apelidos. Nesse caso, o dono do blog, o veículo ou seu moderador, assumem a responsabilidade de liberar os comentários. E, em caso de calúnia e difamação, serão os responsáveis.

Mas há interpretações divergentes, por exemplo, de que caberá justamente à Justiça Eleitoral a palavra final sobre o que é "utilização indevida" em sites noticiosos, blogs, Orkut, Twitter e outros sistemas de troca de mensagens eletrônicas.