quinta-feira, 5 de novembro de 2009

REFLEXÃO DO DIA - Luiz Werneck Vianna

“A política é capturada pelo Estado; de outra parte, o presidencialismo de coalizão em vigência converte os partidos políticos em partidos de Estado e sem representação significativa na sociedade civil. Tal configuração veio a ser reforçada pela crise de 2008, levando a uma revalorização acrítica do Estado Novo e até mesmo de governos do regime militar.”


(Luiz Werneck Vianna – no 33º Encontro Anual da ANPOCS, Caxambu/MG de 26 a 30/10/2209

Modelo de Lula não sobrevive sem ele, diz Vianna

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Maria Inês Nassif, de Caxambu (MG)

O Brasil de hoje é a obra de um único político, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e apenas uma peça de gênio consegue manter "fragmentos do moderno e do passado, da tradição republicana até setores que emergem na sociedade" no mesmo tecido social sem que ele se rompa. O problema é esse modelo sobreviver ao seu criador. "Sem Lula nada disso se aguenta", afirmou o cientista político Luiz Werneck Vianna ao Valor, na semana passada, quando participava do Encontro Nacional da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação (Anpocs), realizado em Caxambu. O ciclo de desenvolvimento sob Lula, ao contrário dos anteriores - de Getúlio Vargas (1930-1945 e 1950-1954), ou dos generais Emílio Garrastazu Médici e Ernesto Geisel (1969-1974 e 1974-1979) -, não está sob um regime autocrático, mas, de forma semelhante a esses períodos autoritários, tudo transita totalmente pelo Estado "e suas instituições (do Estado) usurpam o espaço da sociedade civil".

O potencial destrutivo de um modelo que é baseado na ideia de convivência numa "comunidade fraterna", onde todas as demandas são consideradas legítimas e o Estado arbitra os ganhos de cada classe, é bastante alto. "O Lula está ameaçando a todos com sua atuação. Vamos entrar num conflito de todos contra todos depois do seu governo", disse o cientista político. Na sua avaliação, nem a candidata do presidente à sua sucessão, Dilma Rousseff (PT), nem qualquer outro postulante à Presidência, governista ou oposicionista, tem condições de manter essa conjunção de forças. E essa não é uma construção em que basta ter a ajuda de Lula nos bastidores: é necessário o seu protagonismo.

"O modelo é de uma fragilidade espantosa. É uma peça de gênio que não permite que o autor descanse nunca", afirma. A figura invocada por Werneck Vianna é a do equilibrista que mantém os pratos sobre as varetas e tem que permanentemente girar as varetas para que os pratos não caiam. O estrago seria menor, segundo ele, se Lula assumisse outro papel, o de um "grande prestidigitador" que mantivesse um mínimo de contraditório na sociedade enquanto incorpora "políticas sociais de verdadeiro alcance". Isto é: se deixasse de nivelar interesses e conflitos de classe.

O modelo Lula de desenvolvimento é produto de aproximação progressiva com a "tradição republicana brasileira", que admite "a prevalência do Estado, do público, como uma forma do todo subsumir as partes, definindo o destino das partes" e concebendo a sociedade como uma "comunidade". Nela, todos os interesses são legítimos, "inclusive os da alta burguesia, desde que cumpram uma agenda social". O exemplo é a pressão direta exercida pelo presidente Lula sobre o presidente da Vale do Rio Doce, Roger Agnelli, com indicações de que obrigações a empresa deveria assumir.

"O Estado tem o papel protagônico", afirma Werneck Vianna. Esse protagonismo não foi um cálculo, mas o produto de "acidentes e incidentes de percurso", ao final dos quais foram legitimadas e incorporadas "tradições de um repertório antes estigmatizado", como, por exemplo, o organismo sindical corporativo. O ciclo de desenvolvimento do governo Lula está sendo conduzido, portanto, sob uma tradição renegada não apenas pelo PT, mas pelo próprio PSDB, na constituição desses partidos, reabilitada na crise e mantida sob o gênio de Lula.

"A luta política foi sendo trazida para dentro do Estado e tudo hoje é arbitrado por uma única pessoa. Só existe um político hoje no Brasil e ele se chama Luiz Inácio Lula da Silva", disse Werneck Vianna. Disso decorre que a política fica sem espaço na sociedade.

O "triunfo da ordem burguesa" sob o governo Lula não foi prosaico, diz o cientista político, mas "grão-burguês". Recuperou funções do Estado tradicional - inclusive a de mediador da luta política - e símbolos do passado, como o do Brasil-Potência, que remetem ao nacional-populismo de Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek e ao nacional-desenvolvimentismo de Geisel. No caso do atual governo, "é uma nacional sem popular, abduzido pelo Estado", disse Werneck Vianna.

"Do Bradesco, passando por Paulo Skaf e Blairo Maggi, indo para as grandes agências como Finep e CNPq, e terminando na massa de despossuídos desse país, todas essas forças passam pelo Estado - e são capilarmente articuladas pela intelectualidade, via Anpocs, ONGS, sindicatos etc", disse o cientista político.

Para a esquerda, à qual ele se filia, é necessário fortalecer a esfera pública. "É preciso que os partidos políticos se autonomizem e construam uma esfera pública rica, mesmo que isso importe a desaceleração de algumas políticas", disse.

Cautela prejudicial - Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

O governador de Minas, Aécio Neves, marcou dezembro para uma definição oficial do PSDB sobre o candidato à sucessão de Lula para retomar o controle da disputa interna, que estava se encaminhando para uma decisão unilateral do governador de São Paulo, José Serra, o líder das pesquisas de opinião, que escolheria o momento de assumir a candidatura e tornaria quase automática a aceitação da vice por Aécio. Com seu ultimato, Aécio quer forçar uma definição de Serra, testar se sua intenção de sair candidato a presidente é a todo risco, mesmo sem contar com seu nome como vice.

O governador José Serra não acredita na tese de que Lula transferirá sua popularidade para Dilma, mas, se em março ela estiver na frente das pesquisas, ele poderia desistir de se candidatar para tentar a reeleição ao governo de São Paulo. A essa altura, o governador de Minas já teria se lançado ao Senado, e com o ânimo um pouco menos doce do que começou a campanha.

Os últimos acontecimentos - a pesquisa do Ibope colocando-o como vice; os boatos sobre sua vida particular - não o fizeram perder o encanto pela disputa, mas ele exige uma definição até dezembro porque acredita que Serra, pressionado, não enfrenta o desafio.

Foi no que acreditou o então governador Geraldo Alckmin em 2006 que, assim como Aécio hoje em Minas, já não podia disputar a reeleição em São Paulo.

Mas a tática deu certo não porque Serra não quisesse enfrentar Alckmin, mas sim porque se convenceu de que a parada estava perdida para Lula.

Assim como Dilma não é Lula, o que facilita a decisão de Serra, Aécio também não é Alckmin, o que dificulta a indefinição de Serra.

O governador de Minas tem uma perspectiva real de arrebatar apoios políticos, e bagunçar o esquema cuidadosamente montado por Lula.

O PT, mais bem estruturado, paradoxalmente tem a vantagem da liderança pessoal de Lula que é, ao mesmo tempo, o fator que o mobiliza, mas também o paralisa.

O PSDB, com uma estrutura partidária débil que nunca se organizou, a tal ponto que não conseguiu fazer um cadastramento nacional para realizar as prévias que poderiam indicar seu candidato à sucessão de Lula, tem a vantagem de não ter um líder carismático a ditar-lhe as regras, mas está sempre se debatendo entre líderes regionais que não conseguem unir o partido. É mais democrático, mas menos eficiente.

Entre um partido que tem estrutura e liderança nacionais, mas não tem candidato natural à sucessão de Lula, e outro que tem dois candidatos viáveis, mas não tem nem organização nem unidade, a disputa sucessória vai se desenhando com vantagens para o lado governista, mais unido, apesar da liderança do governador José Serra nas pesquisas de opinião.

O presidente Lula assumiu como projeto político pessoal eleger seu sucessor, e deliberadamente antecipou o debate. A bordo de uma popularidade espantosa, Lula colocou-se em campo para eleger a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, escolhida a dedo na melhor tradição caudilhesca, usando todas as armas disponíveis, até o limite da ilegalidade.

Ele vai avançando os limites do permitido até onde o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a opinião pública aceitarem, vai ocupando todos os espaços na máquina federal e montando uma imensa rede de apoiadores e financiadores com base nos fundos de pensão e nos ministérios divididos entre sua base eleitoral.

E toma de assalto o horário de propaganda eleitoral pela televisão e rádio, buscando inviabilizar candidaturas saídas de seu meio, como as de Ciro Gomes e Marina Silva, para tentar montar um arco partidário tão heterogêneo quanto artificial, que servirá ao único propósito de dar à candidata chapa-branca o domínio absoluto da propaganda oficial.

A verdadeira operação de guerra que Lula está montando em favor de sua candidata ainda não tem reflexos positivos nas pesquisas de opinião, e a candidatura de Dilma Rousseff existe apenas com base na crença, que não tem nenhum comprovante científico na história política brasileira, de que Lula conseguirá transformar sua popularidade em votos.

Se até março, último mês para a desincompatibilização de candidatos que não disputam a reeleição, as pesquisas não apontarem uma subida nas intenções de voto de Dilma, é provável que a expectativa de poder se transfira do presidente Lula para o governador José Serra, que vem liderando as pesquisas de opinião.

Mas, de qualquer maneira, desta vez a divisão do PSDB tem mais chances de ser superada, seja qual for o candidato, sejam quais forem as mágoas.

Se Serra desistir da Presidência, é um candidato quase imbatível ao governo de São Paulo, e o candidato Aécio terá um palanque fortíssimo e um apoio quase natural num estado dominado pelos tucanos há anos.

Se o candidato for mesmo Serra, o que ainda é mais provável, Aécio não terá como não jogar seu peso político a favor da candidatura tucana, mesmo não sendo o vice.

O PT tem força em Minas, e a candidata oficial quer explorar o fato de que é mineira de nascença. Por isso, Aécio terá que se esforçar para manter sua liderança em Minas.

Em 2002 e 2006, Lula ganhou nas duas vezes em Minas, mesmo Aécio vencendo no primeiro turno da eleição para governador. Mas Dilma não é Lula.

Se Serra resolvesse correr o risco, poderia convidar Aécio para anunciarem juntos, em dezembro, a chapa puro sangue. Mas, para isso, precisaria deixar suas cautelas de lado, em nome da unidade partidária.

A desordem das coisas - Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O presidente do Senado, José Sarney, é seletivo em sua conceituação sobre democracia. Quando precisa, não hesita em acionar seus poderes para abrir o Legislativo à interferência do Executivo ou para impor censura à imprensa.

Fez assim recentemente ao pedir socorro ao presidente da República para se safar de processos por quebra de decoro parlamentar e há 97 dias goza do nefasto privilégio de ver O Estado de S. Paulo obrigado ao silêncio a respeito das investigações da Polícia Federal envolvendo um de seus filhos, o empresário Fernando Sarney.

Quando lhe interessa, faz pose de democrata.

Faz assim quando invoca seu papel na transição democrática, fez assim em 2004, quando se disse impedido de instalar a CPI para apurar as malfeitorias de Waldomiro Diniz - como manda o regimento da Casa e conforme mandou depois o Supremo Tribunal Federal -, sob a alegação de que não poderia substituir-se aos líderes partidários na indicação dos integrantes da CPI.

Faz de novo agora, quando se declara contrário à protelação do cumprimento da sentença de cassação do mandato do senador tucano Expedito Júnior por abuso de poder econômico na eleição de 2006, mas aceita "democraticamente" a decisão da Mesa Diretora do Senado de acatar um recurso (inútil) à Comissão de Constituição e Justiça.

Antes da conveniente cena, em nenhum momento se ouviu de Sarney, influente e poderoso, um argumento sequer de ponderação a seus pares para que se evitasse essa demonstração de impertinência institucional.

Compartilhou do atrevimento e depois, diante da reação geral, da anunciada intenção do procurador-geral da República de tomar alguma medida legal contra o ato do Senado, o presidente da Casa aparece vestido de Maria Santíssima fazendo a defesa do diálogo e da "harmonia entre os Poderes".

Não há como aceitar a tese dos advogados do senador cassado de que ele tem direito a defesa junto à CCJ. A cassação foi determinada em junho. Estamos em novembro, tempo suficiente para apresentação da mais extensa das defesas.

No lugar disso, o cassado preferiu esperar para lançar mão de um expediente protelatório. O grave aí não é o gesto do senador, mas a atitude da Mesa do Senado. Primeiro, ao não cumprir de pronto a sentença do STF. E, depois, sobrepondo-se à autoridade da Corte Suprema e, portanto, à Constituição.

O Legislativo reclama que o Judiciário lhe usurpa os poderes. Parece acreditar que a resistência ao cumprimento de sentenças funciona como uma espécie de afirmação de autonomia, quando não passa de uma reles desobediência à lei.

Se o Legislativo ignora decisões do Judiciário o que a sociedade entende é que tudo o mais é permitido.

O caso não mereceria grande atenção se fosse um fato isolado. Não é. Reiteradas vezes o Congresso tem sido chamado às falas por ministros do Supremo para cumprir decisões judiciais, ao custo de ouvir críticas ao seu "ativismo".

Ora, melhor um Judiciário hiperativo que um Legislativo passivo diante de um Executivo altamente impositivo.

Equilíbrio? Não há como exigi-lo numa conjuntura desequilibrada em que o Executivo exorbita no exercício do poder, o Congresso Nacional aceita ser usado como anexo do Planalto e, imbuído do espírito de auxiliar administrativo da popularidade do presidente da República, ainda se sente no direito de desdenhar das atribuições do Supremo Tribunal Federal.

E, se a oposição se cala - ora por estratégia eleitoral, ora, como no caso do senador cassado, integrante do PSDB, porque lhe é conveniente -, alguém precisa falar. E o Supremo fala. Fora dos autos e dentro do seu papel de fazer valer o poder da lei.

Zero a zero

O ministro relator do mensalão mineiro, Joaquim Barbosa, foi tão contundente em seu voto de acolhimento da denúncia do Ministério Público contra o senador Eduardo Azeredo e "coautores" no crime de peculato, quanto fora dois anos atrás quando aceitou a denúncia contra os 40 (agora 39) integrantes da "organização criminosa" acusada de arquitetar e executar o mensalão federal.

Se o plenário seguir o relator, a oposição terá dificuldades para falar de ética na campanha presidencial. Na época que estourou o escândalo, Eduardo Azeredo era presidente do PSDB e, nessa condição, foi defendido por seus pares de uma acusação, na essência, semelhante às que os oposicionistas imputavam aos adversários na CPI dos Correios.

Em ovos

A nota do Supremo Tribunal Federal sobre a festa de posse do ministro José Antônio Toffoli, parcialmente financiada pela Caixa Econômica Federal por intermédio da Associação dos Juízes Federais do Brasil, diz que é "usual" entidades de classe patrocinarem esse tipo de comemoração.

Mas não diz que acha normal o emprego de recursos públicos nos festejos.

Tucanos fritos e aflitos - Vinicius Torres Freire

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Em seminário, tucanos se mostram otimistas com o país e desorientados sobre o que dizer na campanha de 2010

"2010 VAI ser muito pior que 2006", dizia ontem Luiz Carlos Mendonça de Barros ao final de uma palestra no Instituto FHC (iFHC). "Vai ser muito melhor", diz rindo, da plateia, o próprio FHC. Mendonça de Barros, ex-ministro do governo tucano, economista, acabara de terminar uma apresentação muito positiva a respeito da economia brasileira nos próximos dez anos, período no qual o Brasil poderia crescer entre "4% e 6%" ao ano. Mas Mendonça de Barros, claro, referia-se às perspectivas eleitorais da oposição em 2010, "piores" devido à "sensação de conforto" com a economia e, em especial, ao do crescimento forte e contínuo das vendas do comércio, mesmo nos piores momentos da crise.

O seminário no iFHC tratava de "O Brasil pós-crise: uma agenda para a próxima década". Mas o subtexto geral da conversa era o que a oposição pode dizer numa campanha que deve ocorrer sob grande "aplauso popular" (no dizer de FHC).

Mendonça de Barros enumerava os fatos. Após 2002, houve grande melhoria no comércio externo. A dívida externa praticamente desapareceu e, assim, também o grave constrangimento externo ao crescimento. Crescem o salário mínimo e a massa de salários. O mercado interno é grande e crescente. O país é supercompetitivo nos produtos em que a demanda mais cresce (commodities). Há estabilidade política, favorecida pelo surgimento da "nova classe média". O ambiente institucional é melhor que o de outros emergentes. Mesmo as burocracias estatais, algumas tão criticadas antes da crise, são vistas como um fator de estabilidade, em especial no exterior (bancos públicos inclusive).

Mas o "software pirata" (no dizer de Mendonça) que Lula usou para tocar a economia até antes da crise não funciona mais (isto é, uma política macroeconômica semelhante à de FHC). O Brasil tem agora "problemas de rico", como o real forte, que se fortalecerá ainda mais dado o sucesso econômico e ao redirecionamento das carteiras dos grandes investidores institucionais do mundo, que colocarão mais por aqui.

Mas a infraestrutura é ruim, e a carga tributária, incompatível com esse novo ambiente de real continuamente forte. Sem redução de impostos, reformas, melhorias na competitividade, a indústria pode naufragar e o país pode perder potencial.

Por que o governo do PT não muda? Porque ignora como fazê-lo, porque retomou seu gosto pelo estatismo, dado o sucesso que experimentou com as políticas anticíclicas, com muita intervenção estatal.

Mas o país fechará o ano no azul e Lula não deve deixar o BC elevar juros em ano eleitoral.

"Vamos ter de aguentar o Mantega", diz Mendonça. "Não vamos, não; não é preciso temer o Mantega", diz FHC.

"O comportamento eleitoral pode diferir do cotidiano. Lula tem 70% de popularidade, sua candidata tem 16%, e (José) Serra tem 40%. As pessoas não pensam em bloco nem votam pensando no passado. É preciso despertar confiança [no eleitor, indicar outras possibilidades para o futuro]". Mas, ontem, no iFHC, essas possibilidades de futuro eram apenas uma campanha por impostos menores e críticas que mostrem as indecisões e inércia do governo em relação a problemas estruturais.

Réu do mensalão, Genoino defende fichas-sujas

DEU EM O GLOBO

Deputado petista discursa contra projeto que tenta barrar candidatura de quem responde a processos na Justiça

Isabel Braga

BRASÍLIA. O deputado José Genoino (PT-SP), réu no processo do mensalão que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF), subiu às tribuna ontem para criticar o projeto de iniciativa popular que tenta barrar a candidatura dos que respondem a processos na Justiça, os chamados fichas-sujas. Para Genoino, a proposta é inconstitucional e autoritária. O discurso, feito no início da tarde, com o plenário ainda esvaziado, recebeu apoio de quatro deputados, entre eles Geraldo Pudim (PR-RJ), que já foi alvo de questionamentos na Justiça, e Ernandes Amorim (PTB-RO), que admitiu responder a processos e inquéritos judiciais.

Para Genoino, a Constituição brasileira deixa claro que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória". Ele rebate a tese de que a presunção da inocência só se aplica em casos de processos criminais e recorre a voto do ministro do STF, Celso de Mello.

- O ministro Celso de Mello, decano do Supremo, diz, ao afirmar o princípio da presunção da inocência: somente com cabeças autoritárias, em regime de autoritários, é que se estabelece a presunção da culpa. É um pouco o que estamos vivendo hoje: você é culpado até que prove a inocência, quando o princípio dos direitos humanos é exatamente a presunção da inocência - disse Genoino. - Os senhores sabem como se constituiu o autoritarismo nos regimes de terror, no mundo. Começa com a ideia de que há um maniqueísmo dos puros e dos impuros. Começa com a ideia de que tem que hostilizar, de que tem que criminalizar. Se este projeto tramitar na Câmara, centenas de prefeitos, alguns governadores e até presidente da República que, por ação de improbidade recebida pelo juiz em primeira instância, estariam impedidos de se candidatar. O que isso representa? A tutela dos juízes sobre a política.

Ao apoiar Genoino, o deputado Pudim enfatizou que o tema já é tratado na Constituição, impedindo a candidatura dos que têm sentença final condenatória. Ernandes Amorim afirmou que os processos contra ele não têm fundamento e acrescentou:

- É evidente que muita gente não responde a processo, alguns porque são honestos demais, outros porque são vermes.

Projeto já pode ir ao plenário, mas não há previsão

Entregue há mais de um mês à Câmara dos Deputados, o projeto de iniciativa popular que tenta barrar a candidatura dos chamados fichas-sujas está parado na Casa. Em tese, como foi anexado a outro projeto de teor semelhante que tramita na Câmara desde 1993, pode ser levado a qualquer momento a plenário. Isso porque o projeto de 93 já passou por várias comissões - mas está parado há anos. Não há previsão de quando será posto na pauta de votação.

O deputado Flávio Dino (PCdoB-MA), relator da reforma política e favorável ao debate da proposta de iniciativa popular, acredita que é difícil aprová-la ainda este ano:

- No momento, três temas polarizam as atenções da Casa: os projetos do pré-sal, o Orçamento e o projeto dos aposentados. Sendo realista, só devemos apreciar isso no começo do ano que vem.

FH admite que popularidade de Lula pode transferir votos para Dilma

DEU EM O GLOBO

Depois das críticas ao "subperonismo" petista, tucano evita polêmica

Adauri Antunes Barbosa

SÃO PAULO. Depois de fazer pesadas críticas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ao seu governo, falando inclusive em "subperonismo", o ex-presidente Fernando Henrique (PSDB) ontem evitou polêmica e ainda admitiu que a popularidade do petista poderá transferir votos para a candidatura da ministra Dilma Rousseff à Presidência.

- Um dos candidatos da oposição tem por volta de 40%. A candidata do governo tem por volta de 15%, 16%. Já teve mais e caiu. O presidente Lula tem 65%, 70%. (Dizem que) O presidente não transfere (votos). Como não transfere? Já transferiu 15%. Ela não tinha nada, zero. Ele transferiu e pode transferir mais - afirmou, durante o seminário "O Brasil pós-crise: uma agenda para a próxima década, promovido ontem pelo Instituto Fernando Henrique Cardoso (iFHC).

Para ele, a campanha de 2010 deve levar o eleitor ao futuro e não ao passado. A oposição, aconselhou, deve criar horizonte e "não discutir número".

- Na política você tem que criar um horizonte e despertar confiança, não é discutir número. Isso depende do personagem. Depende do desempenho. Mesmo com os dados que dei, que são verdadeiros, isso não assegura a vitória porque vai depender do desempenho. Mas o contrário também é verdadeiro. Você ter o apoio de alguém que tem muito voto não assegura a vitória. Depende do desempenho e da capacidade de haver, não é transferência de voto, é identidade de percepção da pessoa. Este é igual àquele. Aí você pode ter. E é raro ter transferência - disse o tucano.

Paulo Bernardo falta e também é elogiado

Ele não quis comentar as repercussões do artigo publicado no GLOBO de domingo com críticas ao governo Lula, mas durante sua participação no seminário disse que se expõe "além do limite" da prudência:

- As instituições se fortaleceram (no meu governo). Escrevi este artigo aí. Aliás, não é a primeira vez. É que pus tudo junto porque sinto que há um risco de desfazer o que achei que já estivesse consolidado. É preciso ficar atento a esse risco. A política vem sempre em primeiro lugar. Se desfizer mais adiante, o preço será pago por toda a sociedade. Mas é tarde. E a economia não vai se ajustar da maneira que se queria.

Comentando a ausência no seminário do ministro Paulo Bernardo, do Planejamento, que havia confirmado mas na última hora cancelou sua presença no seminário, Fernando Henrique lembrou que conheceu o ministro de Lula quando ele era secretário do governador Zeca do PT, em Mato Grosso do Sul:

- Disse para ele, depois de conversarmos, que se eu o tivesse conhecido antes poria ele no lugar do (Pedro) Malan no Banco Central.

No seminário com foco na economia do país, houve certa unanimidade em torno de um crescimento entre 4% e 5% para os próximos anos.

Alencar contraria Lula

DEU EM O GLOBO

Vice elogia TCU e defende reajuste maior para aposentados

Chico de Gois

BRASÍLIA. Num mesmo dia, o presidente da República em exercício, José Alencar, contrariou por duas vezes posições do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que está em Londres. De manhã, em discurso no Tribunal de Contas da União, Alencar elogiou o órgão, alvo de constantes críticas de Lula. Depois, em entrevista, defendeu reajuste maior para os aposentados, medida que o governo tenta a todo custo evitar que seja aprovada. Para Alencar, é necessário que "alguma coisa" seja feita pelos aposentados.

- Tudo o que puder ser feito para dar alguma coisa que é devida a essas pessoas, eu acho que precisa ser feito. É claro que o governo tem que estar atento às questões do equilíbrio orçamentário. Todos sabemos que a Previdência Social tem déficit grande. Agora, por exemplo, estamos fazendo um esforço grande para equilibrar as contas. Mas alguma coisa precisa ser feita, porque isso também significa distribuição justa da renda.

Alencar considera que o déficit na Previdência acaba prejudicando os aposentados:

- Temos que oferecer à Previdência condições de equilíbrio fiscal capaz de dar tranquilidade a todos os aposentados e, para isso, é só respeitar os cálculos autuariais.

Mais cedo, ao receber o grande colar do mérito do TCU, Alencar elogiou o tribunal:

- Os eminentes brasileiros que o compõem honram a Justiça, a independência e a imparcialidade para, sob a égide da lei, defender os interesses da sociedade. O esforço pessoal, o devotamento à causa da Justiça, o incontestável conhecimento técnico, a reconhecida integridade com que se conduzem os eméritos membros do TCU dignificam seu trabalho que, por isso, tem conquistado, com sobra de méritos, o respeito e a credibilidade fundamentais ao fortalecimento da instituição e essenciais à vida democrática.

Autoritarismo popular pelo voto direto - Maria Inês Nassif

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Ao final de sete anos de governo e à véspera de uma eleição em que a sua simples presença de um lado da disputa pode definir a sua sucessão, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva está dando um nó na cabeça da oposição. Não só pela sua popularidade, mas pela forma como conseguiu usar essa popularidade para mudar completamente uma agenda política e econômica à qual, no primeiro mandato, parecia amarrado.

À direita e à esquerda, essa mudança de agenda está sendo colocada como autocrática. Todavia, como definir historicamente uma mudança de agenda política e econômica num regime democrático sem a suposição de que existe apoio popular a ela? O apoio é a um presidente ou a um outro projeto de poder? Como desvincular o presidente Lula do seu partido político, o PT, quando a história política de ambos é a mesma (e isso é um fato mesmo se constatando que, depois de quase dois mandatos como presidente num regime presidencialista, Lula tornou-se maior que o PT)? Se projetos políticos não se sucederem no poder, em alternância, o que se pode querer de uma democracia? É personalismo ou projeto político diferenciado uma inversão completa de agenda em relação aos governos anteriores?

A definição - ou acusação - imputada a Lula pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em artigo recente publicada em dois jornais paulistas ("Folha de S. Paulo" e "Estado de S. Paulo"), e reiterada em entrevista ao colunista Vinicius Torres Freire, ontem, na "Folha", de exercer uma "Presidência imperial", ou ser o artífice de um estado de "apatia com autoritarismo popular", não parece plausível. Não dá para "acusar" alguém de ser popular. FHC também o foi no seu primeiro mandato e venceu as eleições para a reeleição no primeiro turno, em 1998. Não dá para "acusar" alguém por estar no poder, se essa pessoa foi eleita. FHC também foi, duas vezes. E, como Lula, também tentou, embora não com tanto empenho, fazer o seu sucessor.

Como Lula, Fernando Henrique Cardoso foi vitorioso como principal articulador de uma nova agenda política e econômica - no seu caso, o discurso vitorioso foi o de rompimento com a agenda nacional-populista de Vargas que ainda estava entranhada na sociedade. Como Lula, FHC teve que fazer valer o seu projeto num regime presidencialista com forte dispersão partidária. Ninguém o acusou de autoritário por isso. E não existe nenhuma objetividade numa acusação de autoritarismo se a pessoa que está sendo acusada se submeteu às urnas e mantém-se estritamente no jogo político institucional (ainda anteontem, Michael Bloomberg se elegeu, pela terceira vez, prefeito de Nova York).

A grande arte do Brasil democrático foi a de conseguir criar, mesmo após longo período de ditadura militar, uma cultura democrática. Foi arte, não foi sorte. Um único presidente, Fernando Collor, tinha um perfil que tendia ao autoritarismo mas, salvo a edição do Plano Collor numa conjuntura de hiperinflação no primeiro dia de seu governo - que enxugou drasticamente a liquidez com o confisco de poupança -, o autoritarismo não conseguiu passar de um discurso forte com cores nazistas. Collor mais ladrou do que mordeu: aceitou sem reações um processo de impeachment que acabou se tornando um símbolo da democracia brasileira. O presidente Itamar Franco, eleito como seu vice, governou por dois anos, tinha tradições democráticas e não as negou no poder.

Antes deles, o primeiro presidente civil depois do golpe de 1964 e último a se eleger pela via indireta, José Sarney, teve muitos defeitos, mas seu governo foi fundamental para a consolidação da democracia. Foi nesse período que funcionou a Assembleia Nacional Constituinte. Não consta que Sarney, mesmo com o pecado original de ter antes vivido à sombra do regime autoritário, tenha cometido atentados contra a então tenra democracia. Como vice do presidente eleito pelo Colégio Eleitoral, Tancredo Neves, Sarney ascendeu ao poder pela morte de um dos grandes articuladores da transição para a democracia. Estava comprometido com as forças democráticas, já majoritárias na sociedade, e não conseguiria sobreviver no poder sem o apoio delas.

Os governos do presidente Fernando Henrique Cardoso tiveram grande conteúdo democrático. FHC vinha da oposição institucional ao regime militar, o MDB, ingressou no PMDB e ascendeu pelo PSDB, partido surgido de um racha do PMDB. FHC, assim como Lula, esteve presente nos grandes movimentos pela democracia no pré-85. No governo, foi um hábil, e democrata, articulador de forças econômicas que emergiam num Brasil que se abria para o capitalismo financeiro internacional. Não houve autoritarismo nessa mudança de agenda: ele articulou forças que se moviam no cenário democrático a partir de mandato ao qual foi investido pelo voto popular. FHC foi bastante popular no final do primeiro governo, quando o Plano Real produziu um ganho de distribuição de renda incomum num país de renda concentrada como o Brasil. Perdeu esse legado no segundo mandato, quando a renda voltou a se concentrar.

O presidente Lula não foi nem mais, nem menos democrático que os outros civis. Foi igualmente democrata. Com mandato popular, articulou forças que se moviam no território da democracia para mudar a agenda política e econômica. A interpretação de que é a figura central de um "autoritarismo popular" não leva em conta a origem do mandato de Lula - o voto, como os dois mandatos de FHC -, mas o fato de que o atual presidente articula outras esferas da sociedade que foram incorporadas ao projeto de poder tucano apenas durante o Plano Real, e dele foram apartadas por sucessivas crises e um modelo de acumulação que se tornou excludente, passado o efeito desconcentrador do êxito anti-inflacionário.

A designação de "autoritarismo" não leva em conta o voto; a "acusação" de popular não faz justiça a quem vota.

Maria Inês Nassif é repórter especial de Política. Escreve às quintas-feiras

FHC ataca ''inércia da oposição'' diante de ''autoritarismo popular'' de Lula

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Ex-presidente tucano volta a lançar ceticismo sobre o futuro do País nas mãos de uma administração petista

Julia Duailibi

Na contramão do que defendem setores do PSDB, que querem evitar a comparação entre o governo do petista Luiz Inácio Lula da Silva e os oito anos de gestão tucana na Presidência da República, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso criticou ontem a "inércia da oposição" e voltou a lançar ceticismo sobre o futuro do País nas mãos da administração petista.

Três dias após a publicação de artigo no Estado, no qual usou expressões como "subperonismo" e "autoritarismo popular" para classificar a atual gestão, o ex-presidente traçou ontem um diagnóstico duro sobre o governo Lula. As críticas abrangeram da discussão sobre os recursos do pré-sal no Congresso ao biodiesel e às taxas de crescimento econômico.

"Escrevi esse artigo, não é a primeira vez que digo isso. Eu pus tudo junto. Sinto que há um risco de desfazer o que a gente pensou que já estivesse consolidado. É preciso estar atento a esse risco", afirmou ontem o tucano, em encontro em que discutiu a conjuntura econômica com especialistas ligados ao PSDB, no Instituto FHC, em São Paulo. No artigo, o ex-presidente afirmara que, "se Dilma ganhar as eleições, sobrará um subperonismo (o lulismo) contagiando os dóceis fragmentos partidários, uma burocracia sindical aninhada no Estado e, como base do bloco de poder, a força dos fundos de pensão".

ESTATÍSTICAS

Durante os debates de ontem, Fernando Henrique disse ser necessário "politizar" os números sobre crescimento, porque "as estatísticas enganam muito". "A linguagem política é a que estou fazendo aqui. O número vazio não diz nada. Temos de politizar o número. Cresceu 5%, mas cresceu sobre zero", afirmou em referência às expectativas de crescimento em 2010 e 2009, respectivamente. Usando um discurso comparativo, o tucano disse ainda que na sua gestão a economia cresceu acima da média mundial e agora cresce abaixo.

Setores do PSDB ligados aos governadores José Serra (SP) e Aécio Neves (MG), nomes do partido cotados para disputar a Presidência no ano que vem, querem evitar o confronto de dados entre as duas gestões de FHC (1995-2002) e os dois mandatos de Lula. O argumento é que as pesquisas têm mostrado que o eleitor avalia mais positivamente o atual governo - Aécio, por exemplo, chega a falar numa "era pós-Lula" e Serra já afirmou publicamente que a disputa de 2010 não será entre o atual presidente e FHC.

Ao comentar o que chamou de inércia da oposição e da sociedade, FHC disse "que todo mundo fica com medo de falar contra". O próprio tucano comentou que se expõe muito. "Me exponho além dos limites da minha prudência", disse. "Poderia ficar em casa."

O ex-presidente, no entanto, afirmou que algumas políticas implementadas por Lula começaram no passado. Citou como exemplo o reajuste do salário mínimo acima da inflação e os programas de transferência de renda, como o vale-gás. Relativizou também a capacidade de transferência de votos de Lula, ao argumentar que o eleitor "vota no futuro, não no passado".

Na esteira das discussões no Congresso sobre os recursos do pré-sal, FHC aproveitou para dizer que esse é um debate em torno de recursos que ainda "não existem". "Estamos desfocados porque o governo desfocou por questões políticas", disse.

Apesar do clima do encontro no Instituto FHC ter sido crítico ao governo, houve o reconhecimento de alguns avanços e os especialistas presentes chegaram a dizer que a economia em 2010 poderá crescer até 6%.

IGNORANTES

O ex-ministro das Comunicações Luiz Carlos Mendonça de Barros declarou que no ano que vem, do ponto de vista do bem-estar econômico, a situação vai ser melhor que em 2006 - ano em que houve a última eleição presidencial. Foi, no entanto, irônico e chamou setores do governo de "ignorantes e neófitos que não sabem o que estão fazendo" - "sem citar nomes".

"O que fazem com o superávit primário é uma manobra contábil de quinta categoria. Nós fizemos alguma, mas com muita classe", ironizou ao comentar a contabilidade de gastos e investimentos para o cumprimento da meta fiscal.

Frases:

""Por trás do que podem parecer gestos isolados e nem tão graves assim, o DNA do "autoritarismo popular" vai minando o espírito da democracia constitucional"

(Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente)

""Diferentemente do que ocorria com o autoritarismo militar, o atual não põe ninguém na cadeia. Mas da própria boca presidencial saem impropérios para matar moralmente empresários, políticos, jornalistas ou quem quer que seja que ouse discordar do estilo "Brasil potência""

(Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente)

""Devastados os partidos, se Dilma ganhar as eleições sobrará um subperonismo (o lulismo) contagiando os dóceis fragmentos partidários, uma burocracia sindical aninhada no Estado e, como base do bloco de poder, a força dos fundos de pensão. Estes são "estrelas novas""

(Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente)

""Esse artigo deixa claro que ele é um homem amargurado, que não se conforma com a queda de sua popularidade"

(Ricardo Berzoini, Presidente do PT)

""É triste ver um intelectual que foi presidente do Brasil, do porte de FHC, descer tão baixo numa avaliação política"

(Candido Vaccarezza, líder do PT na Câmara)

Aprovação do presidente inibe tucanos

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Enquanto oposição atribui cautela à indefinição de presidenciável, crítica mais dura a Lula vem de fora dos partidos

Marcelo de Moraes, Brasília

Setores da oposição reconhecem que a popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a falta da definição de um candidato oposicionista à sua sucessão têm dificultado a tarefa de se contrapor ao Planalto. Na prática, as manifestações contrárias aos interesses do governo federal mais duras não têm partido do Congresso.

É fato que a crítica mais contundente das atividades de Lula e da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, durante a visita a obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), em cidades próximas do Rio São Francisco, no Nordeste, não partiu de políticos do PSDB, DEM ou PPS. Ela coube ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, que apontou o tom de campanha da viagem e a classificou de "vale-tudo" eleitoral.

"Durante essa viagem, eu ocupei a tribuna do plenário todos os dias para criticar a passagem do presidente Lula e da ministra Dilma pelo Rio São Francisco. Falei claramente que era um ato de campanha antecipada, que os gastos com as obras eram muito baixos, mas não houve visibilidade para essas críticas", afirma o líder do PSDB na Câmara, José Aníbal (SP).

Já o deputado e também tucano Luiz Carlos Hauly (PR) busca argumentos em outra direção. "A oposição atual não é irresponsável como foi o PT durante os oito anos do governo Fernando Henrique. Somos uma oposição civilizada, que não atrapalha a governabilidade como eles fizeram. Mas tenho certeza que a população entende que representamos projetos de governo absolutamente diferentes e que podemos oferecer um salto de qualidade com a vitória da nossa candidatura."

POPULARIDADE

Presidente do DEM, o deputado Rodrigo Maia (RJ) admite ser complexo fazer oposição a um presidente que é "o mais popular desde Getúlio Vargas". Mas defende a tese de que a oposição deve colar cada vez mais os problemas do governo na imagem de Lula.

"Prosperou na oposição a tese de que não deveríamos bater na figura do presidente Lula. Para mim, é um equívoco que não será repetido. Porque se a saúde vai mal, se a segurança pública enfrenta graves problemas, a culpa não é apenas do governo federal. É do presidente Lula. Porque é o governo dele que tem graves problemas nessas áreas e em várias outras", diz.

"Sei que é difícil criticar alguém que tem avaliação positiva de 80%, mas é nosso dever baixar esse índice para pelo menos 50% ou 60% mostrando quais são os problemas de seu governo e como as falhas de gestão são de responsabilidade do presidente. Claro que a ausência na definição de um candidato torna isso mais complicado. Porque não adianta propormos uma estratégia de ação e o candidato depois não concordar com isso", acrescenta o presidente do DEM.

"Não precisa ter medo do Mantega", diz FHC à oposição

DEU NA FOLHA DE S. PAULO
Da Reportagem Local

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse ontem que a oposição não deve se intimidar diante dos sinais de recuperação da economia, com expectativa de 5% de crescimento no ano eleitoral.

"Não precisa ter medo do [ministro da Fazenda, Guido] Mantega", recomendou, durante debate sobre o cenário econômico após a crise.

FHC afirmou que o próximo presidente deverá adotar medidas impopulares. "Quem tem liderança tem que saber que, ao assumir o governo, vai ter que fazer certas coisas." Mas ressaltou: "Na campanha, o discurso que vai sacrificar hoje para o futuro não vai pegar".

Sugeriu ainda que o debate dessas medidas seja realizado pela sociedade. Não pelo candidato. "Só pude fazer reformas porque houve um debate muito amplo. Por isso que me exponho além dos limites da minha prudência."

Sob a tese de que existe risco às instituições, reafirmou o teor de polêmico artigo, segundo o qual vê tendência ao "autoritarismo populista" no governo Lula. "Sinto que há risco de desfazer o que achei que já estivesse consolidado [...] Se desfizer, mais adiante o preço será pago por toda a sociedade", argumentou.

Após ouvir do ex-ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros que, "do ponto de vista do bem-estar econômico, o ano que vem será muito pior [para a oposição] do que 2006", ele afirmou que é preciso "politizar o número".

FHC citou o desempenho da ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) nas pesquisas como uma prova de que, por melhor que seja o cenário, a transferência não é automática. "Você depende do personagem." Sobre o risco de eleição sem grande apoio partidário, minimizou:

"Não se esqueçam de que muito raramente o presidente faz a maioria. Mas não se esqueçam também de que as maiorias vão com o presidente".

O diagnóstico do lulismo, por FHC, e a “reestatização” de Armínio Fraga

Jarbas de Holanda
Jornalista

Oportunas e suscitando expressiva repercussão as duras críticas à escalada centralizadora e populista do governo Lula, sobretudo no segundo mandato, feitas pelo economista Armínio Fraga, numa entrevista ao Valor, na quinta-feira, e pelo ex-presidente FHC, em artigo no Estadão e no Globo, de domingo. Título da entrevista: “É preciso reestatizar o Estado, diz Armínio”; e do artigo – “Para onde vamos?”. Entre tais repercussões destacam-se análises dos colunistas Merval Pereira e Dora Kramer; um artigo, na Folha de S. Paulo, de Vinicius Torres Freire; e editorial do Estadão.

Segue-se um resumo dessas análises. Do artigo, de ontem, do colunista da Folha – “Em síntese, FHC e Fraga dizem que o projeto luliano: 1) Coopta os principais atores econômico-sociais por meio de políticas públicas cujo financiamento não está explicitado no Orçamento; e 2) Manipula fundos e instituições paraestatais com o objetivo de implementar tais políticas. Com subsídios, via BNDES e outros bancos públicos, beneficia grandes empresas. Por meio de fundos de pensão estatais, cujos dirigentes são nomeados pelo governo e por sindicatos aninhados no Estado, o governo atua em outra frente a fim de cooptar e/ou pressionar empresas. Por meio de convênios com movimentos sociais (de ONGs ao MST), muitas vezes bancados pelo Tesouro, coopta boa parte de organizações civis antes autônomas em relação ao Estado”. Mais adiante: “O governo, além do mais, atropela a sociedade com a discussão apressada do pré-sal ou com decisões vazadas sobre processos em curso (como a compra de aviões de caça)”.

Subperonismo – Trechos da análise de Merval Pereira, no Globo de ontem: “Não foi por acaso que FHC fez comparações entre o lulismo e o peronismo, no artigo em que acusa o governo Lula de estar cometendo ‘pequenos assassinatos’ da democracia” na direção do que chamou de “subperonismo”, onde predominam ‘uma burocracia sindical e, como base do bloco de poder, a força dos fundos de pensão”. Mais à frente: “Assim como Perón transformou duas mulheres – Evita e Isabelita – em ícones políticos, também Lula teria escolhido Dilma Rousseff (como candidata a sua sucessão) apenas por questões de gênero, não por qualidades próprias dela”. “O sociólogo Francisco Oliveira foi o primeiro a registrar que a elite do sindicalismo passou a constituir uma nova classe social nos conselhos de administração dos
principais fundos de pensão e no BNDES.

Personalismo – Da coluna de Dora Kramer, no Estadão, também ontem: “Em análise precisa sobre a guinada personalista que o presidente Lula imprimiu à democracia brasileira nos seus dois mandatos, FHC deu as pistas dos caminhos que levam o País aos poucos a abrir mão de valores institucionais para adotar como referência única a popularidade de um líder político voraz no exercício do poder. ‘Partidos fracos, sindicatos fortes, fundos de pensão convergindo com os interesses de um partido no governo e para eles atraindo sócios privados privilegiados, eis o bloco sobre o qual o subperonismo se sustentará no futuro, se ganhar as eleições’, escreve o ex-presidente em artigo de domingo”. Outro trecho: “(Ele) Cita exemplos de ações autoritárias, agora de cunho popular. Por que fazer o Congresso engolir uma mudança mal explicada na legislação de petróleo? Por que anunciar quem venceu a concorrência para a compra de aviões militares, se o processo ainda não terminou? Por que na política externa fazer mesuras a quem não se preocupa com a paz e
com os direitos humanos?

Trechos do editorial de ontem do Estadão: “É preciso reestatizar o Estado brasileiro, hoje submetido a interesses partidários, sindicais e privados, disse o ex-presidente do BC, Armínio Fraga”. “De modo simples e direto, ele demonstrou uma das grandes mistificações dos últimos tempos: a crise mostrou a importância da boa regulação e da supervisão eficiente (do sistema financeiro) mas não de um setor público mais inchado e mais gastador. No caso do Brasil, a crise confirmou o acerto das políticas do governo anterior (meta de inflação, câmbio flutuante, superávit primário)”. “A mistificação distorce o debate público. Na pregação do intervencionismo crescente, o presidente Lula e seus companheiros atacam os defensores do Estado mínimo.
Mas quem são esses defensores? Não sei. Nem o Roberto Campos, no auge do seu liberalismo, defendia isso. Aliás, ele foi o pai do BNDES”. “Fraga apontou a politização das decisões e de ações do governo federal no domínio econômico (o modelo estatizante do pré-sal, intervenções no mercado de crédito, tentativas de comandar os investimentos da Vale)”. “A descrição feita por ele é expressiva: a hipertrofia do Estado posto a serviço do governo acaba resultando, paradoxalmente, na subordinação do interesse geral ao interesse particular”. Outro editorial, de hoje – O ‘autoritarismo popular’ de Lula – avalia o artigo de FHC.

PMDB quer apoio do PT em cinco Estados

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Raymundo Costa, de Brasília

Na ponta do lápis, o PMDB precisa que o PT o ajude em cinco Estados para assegurar o apoio da maioria dos convencionais do partido à chapa a ser encabeçada por Dilma Rousseff na eleição para presidente de 2010. Esta foi a conta apresentada pelos pemedebistas ontem ao PT na primeira reunião formal das duas siglas para discutir palanques regionais, agenda, programa e participação no futuro governo, caso Dilma saia vencedora da eleição.

Os Estados são Minas Gerais, Rio de Janeiro, Ceará, Pará e Mato Grosso do Sul. São cinco dos maiores colégios eleitorais do PMDB. A perda do apoio de apenas dois deles pode implicar a transferência da maioria para o grupo que hoje pensa em apoiar o candidato do PSDB a presidente, provavelmente o governador de São Paulo, José Serra. O PMDB também quer que sejam estabelecidas regras de convivência onde não for possível um acordo entre as duas siglas.

Na reunião, da qual participaram dez pemedebistas e quatro petistas, ficou acertado que mais tarde será criada uma comissão executiva para tratar da aliança. Como o PT está em transição, em processo de eleição de seus diretórios regionais, só em nova reunião, marcada para o dia 25 deste mês, PT e PMDB esperam avançar mais nas questões regionais. Em alguns dos cinco Estados - caso de Minas Gerais -, a negociação depende fundamentalmente dos novos dirigentes que o PT deve eleger nos próximos dias.

O PMDB quer um acordo para lançar a candidatura do ministro das Comunicações, Hélio Costa. Na avaliação da direção nacional do partido, um acordo será mais viável se o grupo do ministro Patrus Ananias (Desenvolvimento Social) vencer a disputa no PT. Mas o ex-prefeito de Belo Horizonte Fernando Pimentel é o favorito e já conversa com o PMDB regional. Costa, segundo avaliações nos dois partidos, não teria mais que 10% do diretório regional. Na reunião, o ministro propôs o estabelecimento de um critério: sai candidato aquele mais bem situado nas pesquisas.

Além de Costa, participou também da reunião o ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima (PMDB), que se lançou como candidato ao governo da Bahia, posto atualmente ocupado pelo PT. Neste caso, o PMDB quer estabelecer não só uma regra de convivência (os candidatos evitariam o jogo baixo) como também acertar previamente a participação do presidente Lula nos palanques dos aliados da Bahia: ou vai aos dois (de Jaques Wagner e Geddel Vieira Lima) ou a nenhum dos dois.

No Ceará, o PMDB quer assegurar uma vaga ao Senado para o deputado Eunício Oliveira, mas a vaga na chapa da aliança é reivindicada pelo ministro da Previdência, José Pimentel (são duas as vagas em jogo, mas uma delas deve ser do senador Tasso Jereissati, caso ele não concorra ao governo estadual). No Pará, o deputado Jader Barbalho rompeu com a governadora petista Ana Júlia, cuja reprovação é alta, segundo as pesquisas, mas pode viabilizar um acordo por meio do deputado Paulo Rocha. Em Mato Grosso do Sul, o PMDB quer apoio na reeleição do governador André Puccinelli, mas Zeca do PT se lançou candidato.

Os cinco Estados representam mais de 300 votos na convenção do PMDB - para atingir a maioria, são necessários 292 votos. Perder Minas Gerais (66 votos) e Pará (58), por exemplo, significa 124 votos que podem mudar de lado. O Rio de Janeiro, com 78 votos (os dirigentes do PMDB não conseguem concordar quanto ao número de delegados e de votos), é o Estado com maior peso na convenção e hoje está majoritariamente ao lado do presidente Lula. O diretório do PMDB de São Paulo, controlado pelo ex-governador Orestes Quércia, tem a metade dos votos do Rio.

O PT compareceu com menos representantes à reunião para evitar que, logo no primeiro encontro, emergissem os conflitos regionais. O PMDB também quer que o PT reconheça que o partido não tem como entrar unido na aliança e apoie seus candidatos nos Estados atualmente governados pela sigla. O deputado Ricardo Berzoini, presidente do PT, reconheceu que os interesses da candidata (Dilma) e os do partido (PT) são diferentes.

Sem rumo: Míriam Leitão

DEU EM O GLOBO

A ministra Dilma Rousseff é contra o Brasil levar metas para Copenhague porque o número tem que ser "credível". Custa a crer que o Brasil queira chegar de costas a Copenhague. O país só tem a ganhar tendo objetivos ousados na reunião do clima, porque cada medida pensada traz ganhos econômicos para nós. Além disso, assumiríamos um papel de liderança que merecemos ter.

A divisão que paralisa o governo é provocada por uma visão distorcida do tema. Na reunião de terça-feira entre Lula, ministros e técnicos dos ministérios, os participantes levaram números pedidos pelo presidente. Lula queria saber quanto custaria cada política imaginada para o esforço de cada área na redução dos gases de efeito estufa.

O Ministério da Ciência e Tecnologia tem a ideia de que para aumentar a sua contribuição precisaria de mais investimentos em satélites. Assim, ajudaria de forma mais eficiente o monitoramento do desmatamento. Gostaria de pôr em prática propostas que nasceram na Academia Brasileira de Ciências, de maior integração entre pesquisa e cadeia produtiva. Desta forma, seriam criados centros produtivos em cidades médias da Amazônia, explorando produtos desenvolvidos por pesquisa em biotecnologia. Seriam clusters (pólos produtivos) que ofereceriam emprego, atividade econômica derivada da floresta, mas sem destruí-la. Isso exigiria investimentos de R$1 bilhão por ano.

A Agricultura poderia contribuir com uma redução substancial nas emissões dos gases de efeito estufa com medidas que só melhorariam nossa produtividade. Os projetos são a integração lavoura-pecuária, que permitiria um uso de área menor de terra para produção; incentivo ao plantio direto, que não revolve a terra, e por isso reduz emissões; recuperação de área degradada; fim da queima da cana-de-açúcar. Os números não estão fechados, mas um dado aproximado era de que isso exigiria R$5 bilhões de investimento anual.

O Ministério do Desenvolvimento teria muito a fazer criando normas de produção mais sustentável como, por exemplo, o aço verde, ou seja, uma produção siderúrgica que só use carvão vegetal de área de plantio. Se não for assim, o aço brasileiro pode ser barrado no mercado internacional. É por isso que o antigo Instituto Brasileiro de Siderurgia mudou o nome para Aço Brasil. Ele quer se diferenciar dos produtores de ferro gusa que ainda usam madeira de desmatamento.

O Ministério da Energia deveria olhar o pesado investimento que a China está fazendo em energia eólica e solar (fotovoltaica) e concluir que o melhor é abandonar projetos de termelétricas a carvão e a óleo combustível. Se a oferta futura de energia for de fontes renováveis, e não fósseis, o Brasil consolida a imagem de país de matriz energética mais limpa do que a de outros países.

Essas são algumas das medidas que se forem assumidas farão com que o Brasil apresente uma proposta mais ousada para Copenhague e se credencie para mecanismos de financiamento da nossa transição. Mas caminha-se para não ter meta alguma e para se limitar a prometer o já prometido: a redução do desmatamento em 80%. Como já expliquei neste espaço, é 80% a partir de 19 mil km de desmatamento por ano. Parte da queda já houve. Tendo como meta 80% até 2020, isso é o mesmo que ter uma cota anual de destruição de quase quatro mil km de florestas por ano. E na Amazônia quase todo desmatamento é ilegal. O compromisso com o desmatamento ilegal zero é lutar para que a lei seja cumprida. Isso não pode ser ruim para o Brasil. Pelo contrário.

O que paralisa o governo é a opinião da ministra Dilma Rousseff, do ministro Celso Amorim, e de outros, de que, como o Brasil não é obrigado a ter metas, por não ser do anexo 1 do Protocolo de Kioto - onde estão os países de industrialização mais antiga -, é melhor não se comprometer com coisa alguma em Copenhague. É um erro. Primeiro, porque combater o desmatamento ilegal, investir em biotecnologia, ter novas fontes de energia, aumentar a produtividade da agricultura, ter uma logística mais eficiente, não queimar floresta em alto-forno de siderúrgica, aumentar a eficiência energética, acabar com queimadas da cana são medidas de bom governo e não concessões ao mundo. São avanços para nós e, como consequência, aumentam nossa contribuição para a tarefa global de lutar contra o aquecimento. Favorece o Brasil primeiro, depois o mundo.

Segundo, porque o Brasil está no time que decide. Na Rio-92 éramos um país com inflação descontrolada, dívida externa alta, presidente sob risco de impeachment, e mesmo assim conseguimos ter uma posição de liderança na convenção do clima. Hoje, o Brasil é um dos grandes, tem economia sólida, respeito internacional. Não deve se apequenar aproveitando as brechas para nada fazer em Copenhague. Brechas dadas por um protocolo que pode morrer em 2012. O Brasil pode liderar a construção do futuro.

Não é crível que o Brasil se perca nos atalhos, nas miudezas, nas mesquinharias, em vez de embarcar para Copenhague com a estatura que merece ter, com metas voluntárias, mas ousadas e que possam ser medidas e cobradas de nós. Não porque o mundo nos impõe isso, mas porque isso é o sensato a fazer. Por nós, nossos filhos e netos.

MST depreda fazenda de Dantas

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Cem homens armados invadiram duas propriedades no sul do Pará e expulsaram os moradores da área

Carlos Mendes, Belém

O Movimento dos Sem-Terra (MST) invadiu ontem as fazendas Maria Bonita e Rio Vermelho, localizadas nos municípios de Sapucaia e Xinguara, no sul do Pará. A Delegacia de Conflitos Agrários abriu inquérito para apurar os atos de vandalismo.

Cem homens armados e encapuzados derrubaram e queimaram casas, expulsaram empregados e atearam fogo em tratores, além de roubar gado, segundo a assessoria da Agropecuária Santa Bárbara, que administra a Fazenda Maria Bonita e é ligada ao banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity.

Um avião com três mulheres e três crianças, expulsas pelo MST, caiu logo depois de decolar de uma das fazendas invadidas. As seis pessoas nada sofreram, mas o comandante e o piloto ficaram feridos e estão internados em um hospital da região.

Os policiais e a imprensa tiveram dificuldades para chegar às propriedades. O MST bloqueou a rodovia PA-150 em três pontos, afirmando que a ação foi um protesto contra a morosidade da reforma agrária no Estado.

O gerente da fazenda Maria Bonita, Oscar Boller, contou que os invasores chegarem ao local durante a madrugada. Entraram nas casas dos funcionários, gritando que todos deveriam sair. Em seguida, passaram a destruir moradias e currais, usando tratores da própria fazenda, que foram incendiados, segundo o gerente.

A coordenadora estadual do MST, Maria Raimunda Cézar, afirmou que a ocupação foi apenas para "protestar contra a presença de escolta armada" na área. E negou que casas e tratores tivessem sido destruídos.

A polícia constatou danos na Rio Vermelho. Uma vila, onde moravam 30 empregados, foi incendiada. Segundo os empregados, cerca de 50 homens do MST participaram da ação.

Honduras tenta criar hoje governo provisório

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Comissão de Verificação negocia renúncia de Micheletti e administração por ministro enquanto Congresso não votar volta de Zelaya

Líder deposto admite não participar já do governo de unidade, desde que arranjo esteja condicionado à sua futura restituição ao cargo

Fabiano MaisonnaveEnviado Especial a Tegucigalpa
O presidente interino de Honduras, Roberto Micheletti, está disposto a renunciar ao Poder Executivo para o estabelecimento de um governo de "unidade e reconciliação" ainda hoje, como prevê o cronograma do acordo assinado com o presidente deposto, Manuel Zelaya, na semana passada.

"O senhor Micheletti deixou claro que estaria disposto a deixar o poder", disse, em entrevista coletiva, a secretária de Trabalho dos EUA, Hilda Solis, integrante internacional da Comissão de Verificação para implementar acordo, junto com o ex-presidente chileno Ricardo Lagos.Lagos e Solis se reuniram ontem com Micheletti, com a mesa diretora do Congresso e com o Tribunal Supremo Eleitoral para negociar um acordo que viabilize, ainda hoje, a conformação de um governo de unidade provisório, até que o Congresso decida se Zelaya será ou não restituído à Presidência.

A nova proposta foi formulada anteontem à noite, durante reunião de Zelaya com Solis e Lagos na embaixada brasileira, onde o presidente deposto está abrigado há 45 dias.Em rápida entrevista à Folha ontem, o representante de Zelaya na Comissão de Verificação, Jorge Arturo Reina, disse que a "ideia fundamental" é a criação de um primeiro governo de unidade sem a presença de Zelaya ou Micheletti.

Zelaya admitiu não participar inicialmente do governo de unidade, desde que a instalação desse governo esteja condicionada à sua futura restituição.

Ontem, a Comissão de Verificação discutiu com a direção do Congresso uma modificação do artigo 20 da lei de Administração Pública, para que o Executivo seja comandado por um ministro de Governo, e não por um presidente. Até o fechamento desta edição, os deputados, que estão em recesso, não haviam sido convocados para nenhuma sessão.

Com 10 dos 13 membros fiéis a Micheletti, a direção do Congresso aprovou anteontem o envio de consultas à Suprema Corte de Justiça, ao Ministério Público e à Procuradoria-Geral da República sobre a restituição de Zelaya, sem prazo para entrega dos pareceres. Só após recebê-los o Congresso se reunirá para decidir o tema.

A ação foi duramente criticada por Zelaya, que acusou Micheletti de adiar ao máximo uma decisão sobre a sua volta à Presidência. A exigência inicial do presidente deposto era que a sua volta fosse aprovada até ontem, para instalar um governo de unidade hoje.

Apesar de a instalação ainda ser incerta, Lagos e Solis já deram sua "primeira visita" como encerrada. Para seus lugares, a OEA (Organização dos Estados Americanos), responsável pela Comissão de Verificação, designou o diplomata argentino José Octavio Bordón e o ex-ministro socialista chileno Enrique Correa.

A crise hondurenha corre contra o relógio, já que faltam apenas 24 dias para as eleições presidenciais, legislativas e regionais. Dois dos seis candidatos à Presidência afirmam que desistirão do pleito caso Zelaya não seja restituído.

Caso Zelaya volte ao cargo, seu mandato terminará em 27 de janeiro, data original para o fim de seu governo, ratificada no acordo da semana passada.

A crise hondurenha estourou em 28 de junho, quando Zelaya foi detido por militares e expulso do país. Sua deposição foi apoiada pelas principais instituições do país, inclusive o Congresso, mas foi condenada por organismos internacionais como a ONU e a OEA.

No dia 21 de setembro, Zelaya voltou clandestinamente ao país e se refugiou na embaixada brasileira. A sua presença em Honduras desatou uma nova onda de manifestações e precipitou a retomada das negociações com o governo Micheletti.

Na semana passada, uma missão dos EUA intermediou acordo entre as duas partes, que condiciona a volta de Zelaya à aprovação do Congresso. Zelaya aposta nos votos do Partido Nacional, do candidato favorito à Presidência, Porfirio Lobo, e de parte do seu partido, o Liberal (também de Micheletti), para ser restituído.

Paraguai: Presidente muda cúpula militar

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Após descartar o risco de sofrer um golpe militar, o presidente Fernando Lugo trocou os chefes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. A mudança sucede a ruptura de Lugo com seu vice, do Partido Liberal, e quando o governo sofre pressão da oposição, histórica aliada dos militares.