domingo, 11 de abril de 2010

O tema da eleição é o futuro. O Lula não é candidato, nem o FH

DEU EM O GLOBO

Serra diz que busca eficiência e que reúne teoria e prática sem "birra política"

ENTREVISTA José Serra

Nos últimos dias, após se afastar oficialmente do governo de São Paulo, o pré-candidato do PSDB à Presidência, José Serra, evitou a imprensa como pôde.

Não o Twitter, de onde mandava recados às vezes leves (Sou fã do Google... rs Graças ao Google é mais difícil montar central de boatos, espalhar inverdades e enrolar as pessoas), às vezes diretos (Em todos os cargos que exerci, sempre mantive e muitas vezes melhorei o que era bom e funcionava) aos seus mais de 190 mil seguidores.

Sexta-feira à noite, o ex-governador recebeu O GLOBO em sua casa no Alto de Pinheiros, em São Paulo, com o aviso de que não discorreria sobre seus planos para a campanha presidencial ou um eventual futuro governo.

A conversa, horas antes de seu discurso em Brasília, se resumiria à sua trajetória e aos seus gostos pessoais.

Mas, na pequena sala de leitura e TV de sua casa, com uma biblioteca de clássicos como as obras completas de Machado de Assis e Eça de Queiroz ou livros de Graham Greene, Pablo Neruda e Shakespeare, Serra falou não apenas de si. Entre um e outro gole de chá, deixou claro que esta corrida eleitoral é sobre José Serra, Dilma Rousseff e Marina Silva. É uma disputa pelo futuro e não uma comparação entre governos passados. E que a história, a experiência e os pensamentos de cada candidato serão o que os eleitores, afinal, irão julgar na hora de escolher o novo presidente.

Gilberto Scofield Jr. - SÃO PAULO
O GLOBO: O senhor disse que os temas da campanha este ano seriam a folha de serviços prestados dos candidatos, o peso do ataque dos adversários e, em terceiro lugar, aspectos subjetivos, como a imagem pessoal de cada um. Como candidato do PSDB, o senhor ainda acha isso?

JOSÉ SERRA: O tema da eleição é o futuro. Vai tratar de se escolher alguém que seja capaz de botar o Brasil para a frente. É o que eu disse: o Brasil pode mais. Nisso conta o que a pessoa fez, o preparo que tem, as ideias que tem, o significado das suas palavras, mas sempre apontando para frente. O Lula não é candidato, nem o Fernando Henrique, nem o Sarney e nem o Collor.

A disputa então é entre José Serra e Dilma Rousseff.

SERRA: E Marina Silva.

Como o senhor descobriu o Twitter e como usa?

SERRA: Há pouco mais de um ano as pessoas começaram a me falar dessa ferramenta e tive a ideia de usar. Em 90% das vezes, faço de madrugada, que é uma hora vaga. E procuro falar de coisas leves porque o Twitter não é uma linguagem de blog para você defender teses ou ideias. É para dar pequenos lances sobre aquilo que você está fazendo. As pessoas têm curiosidade. Como gosto muito de cinema, sempre que vejo um filme, quando vale a pena, comento. Recebo muitas sugestões de música também.

É propositada sua determinação de evitar temas polêmicos?

SERRA: Porque não é o canal. Dá vontade, mas não é o canal.
Mas o senhor usa o Twitter para discutir realizações do governo paulista...

SERRA: É raro. Só quando é coisa muito óbvia ou factual. Por outro lado, é um termômetro para mim. Por exemplo: metrô. Por mais de uma vez encaminhei para o metrô reclamações.

O Twitter é então também uma ferramenta de medição da sua gestão de governo?

SERRA: Exatamente. E pretendo me manter no Twitter.

De onde vem o hábito de dormir tão tarde?

SERRA: Sempre fui noturno, desde a adolescência, porque ficava lendo. Aos 11, 12 ,13 anos, fui desenvolvendo o hábito de ler. Depois passava a noite resolvendo problemas de matemática.

Sua equipe não reclama?

SERRA: Só mando mensagem de madrugada para o dia seguinte. E não acordo ao meio-dia. Às vezes 9h, às 10h. Uma coisa é hora de dormir e outra, de acordar; uma não tem a ver com outra.

Qual a sua opinião sobre a mídia brasileira?

SERRA: Ela cumpre um papel informativo muito bom. Os problemas que vejo é o excessivo gossip (fofoca, em inglês). Não é bem fofoca. Uma vez era colunista da Folha de S. Paulo. Pedi à minha secretária que pegasse cinco grandes jornais brasileiros e contei o número de colunas. Tinha 20 e tantas. Pega uma média de 15 notas e você chegava a umas 500 por dia. Se sobre essas notas, você admite uma margem de redundância, cerca de metade, você tem que ter 250 novidades por dia. Algumas notícias são muito boas por serem ponderadas, mas a maioria não é assim e acaba se fazendo política por aí. Substitui a política.

O senhor disse em seu Twitter que quase toda a sua vida foi feita de incertezas e acasos. Mas o senhor não disse em seu discurso que é um homem de planejamento?

SERRA: É justamente como contraposição à ideia de que faço tudo planejado. Planejo uma ação determinada. Sou muito cartesiano nas análises, abrangentes, lógicas e bem informadas. Mas se você olhar para minha história, como virei líder estudantil porque fui presidente da UNE na época do golpe, em 1964 , foram 12 anos fora do Brasil, tudo isso é coisa que você não tem controle. Fui preso no Estádio Nacional no Chile, podia perfeitamente ter sido morto. Há três componentes na sua vida: o que você decide, as circunstâncias em que você está e o destino. Não há escolha. É assim.

O senhor fez teatro. Em que medida isso ajudou sua carreira política?

SERRA: Não foi pela carreira política que fiz teatro, mas por gosto. Mas me ajudou na presença pública, diante de gente concentrada em você. Tenho uma personalidade tímida, então o teatro foi importante.

O senhor definiu seu estilo no seu discurso de despedida. Seus amigos o consideram engraçado, fofoqueiro e espirituoso. Os críticos, sisudo, pouco carismático e antipático. O que os eleitores percebem em José Serra?

SERRA: Não sou capaz de te dizer. Nas macropesquisas com a população isso não aparece. Não aparece que sou muito bem-humorado, mas também não aparece que sou simpático. São interpretações de certos círculos. Para mim é natural não ser mal-humorado, a não ser quando estou sob pressão. Sou impaciente, é diferente. Às vezes, a impaciência é só desgaste e é inútil. Tenho treinado para controlar isso ao longo dos anos. Faço alongamentos e até automassagem.
Sua filha Verônica diz que o senhor não finge ser o que não é e que seu marketing é o da sinceridade. Mas políticos não são cínicos?

SERRA: Não é marketing ou uma estratégia deliberada. Para mim, é um desrespeito enrolar alguém. Dizer não, vou ver, vou passar para fulano ou sicrano, não gosto de fazer isso.

O que faz um estudante de engenharia virar político?

SERRA: Pensava em ser político desde os 7, 8 anos. Fazia política no Grêmio Politécnico. Houve uma greve, fui participante ativo aqui em São Paulo. E o pessoal da Juventude Universitária Católica, à qual eu não pertencia, me pediu que disputasse a eleição na União Estadual dos Estudantes. Ganhei e começou assim. Costumo dizer que carrego tudo aquilo que fui. Não tenho mal-entendidos com a vida. Costumo dizer que, como Piaf, não me arrependo de nada.

O senhor disse que, nos os cargos que exerceu, sempre manteve ou melhorou o que era bom. É um recado?

SERRA: Sou demasiado prático e procuro muito a eficiência para me dar ao luxo de desfazer coisas só pela birra política.

É hipocondríaco?

SERRA: Acho que não, mas quem tem fama deita na cama, não é o que dizem? Aliás, se você tiver uma boa dica de remédio para garganta aí para sugerir...

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