terça-feira, 22 de junho de 2010

No limite da responsabilidade:: Raymundo Costa

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Em conversa com antigos companheiros sindicais em São Paulo, na festa do 1º de Maio, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que faria "tudo" para eleger Dilma Rousseff presidente. Um dos presentes quis saber o que exatamente significava "tudo". Ouviu como resposta "tudo é tudo". Simplesmente.

À época, Lula já contabilizava algumas das multas que recebeu da Justiça Eleitoral por fazer campanha fora de época. Era muito, mas nem tudo o que poderia e pode fazer por Dilma. Prova disso é a sanção do presidente ao aumento de 7,7% aos aposentados, supostamente contrariando uma recomendação dos guardiões da responsabilidade fiscal.

Desde sempre o aumento de 7,7% é fava contada no comitê eleitoral do PT, onde se avaliava que o veto do presidente apenas daria munição eleitoral para a oposição na campanha sucessória. Lula não só tirou o discurso do PSDB como também fez média com com os aposentados, ao passar a impressão segundo a qual sancionara o projeto apesar da oposição dos ministros da Fazenda e do Planejamento.

Aposentados, aliás, é assunto latente no comité de Dilma Rousseff, onde sabe-se que a candidata, se for eleita, terá que enfrentar de imediato a questão previdenciária. Se depender do modo como hoje a ex-ministra avalia o problema, por meio de pequenas reformas para resolver demandas de médio prazo previsíveis.

A pauta do Congresso está recheada de bondades como o aumento de 7,7% aos aposentados. Só as propostas em curso que preveem a criação de novos cargos, se forem aprovadas, significam um gasto estimado em R$ 10 bilhões. A pressão por aumentos salariais também é intensa. Já o era na semana que passou e na semana anterior a ela. A diferença é que Lula piscou.

Nesta semana, a Câmara retoma as discussões sobre a criação de um piso salarial de R$ 3,5 mil para policiais e bombeiros de todo o país. É um bom teste para se medir a pulsação do governo.

O custo estimado da proposta é de R$ 50 bilhões. Já foi muito pior. O projeto original determinava a equiparação dos salários de todo o país com o dos PMs e bombeiros de Brasília, que é de R$ 5 mil.

Semana passada, sob pressão, o governo passou a negociar uma fórmula alternativa - aprova o piso, mas deixa para discutir valores depois. Já não se conversa mais sobre a necessidade de um piso nacional, o que espeta no Tesouro Nacional uma conta que a União hoje não tem.

A segurança da Câmara está de sobreaviso, preocupada com ameaças de invasão do prédio do Legislativo. O lobby dos policiais militares sempre foi um dos mais bem organizados do Congresso. Mas nunca desandou para ações violentas como as que foram desencadeadas, já no governo Lula, por alas mais radicais dos movimentos sem-terra.

O risco maior é o governo novamente piscar por motivos eleitorais. A maior dúvida hoje no Congresso é sobre até onde Lula é capaz de ir, no trato da coisa fiscal, na hipótese de Dilma cair nas pesquisas de opinião publica. Afinal, o presidente não teve dificuldade para sancionar o aumento dos aposentados num momento que é considerado favorável à candidatura oficial.

Apesar de se falar em R$ 50 bilhões, o certo é que ninguém sabe exatamente por quanto sairá para os cofres públicos o estabelecimento de um piso de R$ 3,5 mil para PMs, policiais civis e bombeiros de todo o país. Além do pessoal em serviço, o piso terá impacto também na folha do pessoal inativo. E é certo que áreas afins no Judiciário devem pedir equiparação.

O passado recente recomenda cautela a Lula, às vésperas de passar para a história como um presidente com a popularidade nas alturas. O governo Sarney se perdeu no descontrole fiscal; o de Fernando Henrique, no populismo cambial. Lula arrisca-se à danação nas duas situações.


Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras.

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