terça-feira, 27 de julho de 2010

Remessa recorde faz o déficit externo triplicar

DEU EM O GLOBO

Com a crise na Europa e nos EUA, as remessas de lucros de multinacionais atingiram US$ 4,1 bilhões em junho, batendo recorde e levando o país ao maior déficit externo no mês em 63 anos: US$ 5,1 bilhões. No semestre o rombo chega a US$ 23,7 bilhões, o triplo de igual período do ano passado. Já o investimento estrangeiro caiu para US$ 708 milhões em junho. Os gastos dos brasileiros com viagens ao exterior subiram 60% de janeiro a junho, para US$ 7 bilhões.

Rombo histórico

Multinacionais elevam remessas e déficit externo vai a US$ 5 bi, pior junho em 63 anos

Patrícia Duarte

BRASÍLIA - Com a crise internacional ainda castigando os países ricos, as remessas de lucros e dividendos por parte das multinacionais instaladas no Brasil bateram recorde em junho, superando os investimentos feitos por essas companhias aqui e levando o país ao maior déficit de suas contas externas em 63 anos, informou ontem o Banco Central (BC). O rombo ficou em US$ 5,18 bilhões, o pior resultado para meses de junho desde o início da série histórica, em 1947, e o segundo pior desempenho mensal geral. No semestre, o déficit também é recorde, de US$ 23,762 bilhões e mais que o triplo do registrado em igual período do ano passado, quando o resultado negativo ficou em US$ 7,177 bilhões.

Esse desempenho ruim pegou de surpresa os analistas e colocou em atenção esse indicador a curto prazo.

Ainda não estamos à beira do perigo, mas os números de junho valem para pensar. Estávamos sendo financiados pelos Investimentos Estrangeiros Diretos (IED, produtivos) e, agora, precisamos dos recursos de portfólio (ações e títulos). A qualidade do nosso financiamento piorou afirmou o coordenador de projetos da consultoria Tendências, André Sacconato.

Viagens: gasto sobe 60%, para US$ 7 bi

Para este mês, o BC projeta um déficit em transações correntes de US$ 3,7 bilhões. Em junho, o IED ficou em apenas US$ 708 milhões, menos da metade do que esperava a própria autoridade monetária (US$ 1,5 bilhão) no período, acumulando US$ 12,058 bilhões no semestre. Se somados aos investimentos estrangeiros em ações e títulos no país, que em junho ficaram em US$ 3,339 bilhões, esses recursos não foram suficientes para cobrir o déficit em conta corrente em junho.

Segundo o chefe do Departamento Econômico do BC, Altamir Lopes, o mau desempenho do IED agora aconteceu por causa de algumas saídas de investimentos estrangeiros no período, sobretudo nos setores imobiliário.

No segundo semestre, pelas consultas que fazemos, (o IED) volta à normalidade. Por isso, mantemos nossa projeção de US$ 38 bilhões para o ano todo afirmou Lopes, acrescentando que, até ontem, esses investimentos já somavam US$ 1,6 bilhão em julho e a projeção é de fechar o período com US$ 2 bilhões.

O IED chegou até mesmo a ficar menor do que as remessas de lucros e dividendos no semestre, algo que não costuma ocorrer. Em junho, as multinacionais instaladas no país enviaram para suas matrizes US$ 4,156 bilhões, volume recorde, somando US$ 14,967 bilhões no semestre abaixo, portanto, dos aportes feitos via IED no período, de US$ 12,058 bilhões. Lopes argumenta que as remessas, que acertaram em cheio a conta corrente do país, aconteceram porque as empresas estão lucrando mais no país, em detrimento de maus desempenhos em outras regiões, como a Europa.

Pesaram também nas contas externas os gastos dos brasileiros com viagens internacionais que, entre janeiro e junho, somaram US$ 7,050 bilhões, quase 60% a mais do que em igual período de 2009. Isso ocorreu, segundo Lopes, por causa do dólar mais barato e do aumento de renda da população. Neste período, as receitas gastos de turistas estrangeiros no país cresceram apenas 15%, chegando a US$ 2,940 bilhões e originando uma perda líquida de US$ 4,109 bilhões ao país, também recorde.

As contas externas brasileiras têm mostrado sucessivos rombos por causa do bom momento econômico, com expansão da atividade, o que acaba impulsionando as importações. Por enquanto, os déficits têm sido financiados pelos investimentos produtivos e em carteira. No entanto, especialistas argumentam que é preciso ficar atento ao tamanho dos déficits, para não causar desvalorizações cambiais bruscas, ou seja, levar a uma perda do valor do real frente ao dólar.

Com piora no fluxo, real fica mais volátil

Atualmente, segundo o economista chefe da corretora Ativa, Arthur Carvalho, o saldo negativo nas transações correntes está em 2,13% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país) e deve fechar o ano a 2,5%. Para ele, neste patamar, o país pode se financiar com facilidade. O alerta fica para 2011: O real já está mais volátil do que em 2006 e 2007, quando tínhamos superávits em conta corrente. Em 2011, vamos depender muito mais desses investimentos estrangeiros.

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