terça-feira, 24 de agosto de 2010

Déficit externo é o maior em 63 anos

DEU EM O GLOBO

Aumento de gastos com turistas no exterior mais remessas e dividendos de empresas, além do saldo comercial em queda, fizeram com que o Brasil registrasse em julho déficit de US$ 4,5 bi nas contas externas, o maior desde 1947.

Gastos dos brasileiros em viagens batem recorde e déficit externo atinge US$ 28 bi

Com real forte e renda em alta, rombo nas contas de viagens dobra no ano

Patrícia Duarte

BRASÍLIA. Com o turista brasileiro gastando como nunca no exterior, a balança comercial mostrando saldos cada vez menores e as remessas de lucros e dividendos ainda intensas, o país fechou julho com o maior déficit de todos os tempos para o mês em transações correntes que traduz boa parte das operações com o exterior, como viagens internacionais e comércio. Segundo o Banco Central (BC), o saldo ficou negativo em US$ 4,499 bilhões no mês passado. A série histórica é de 1947. No ano, o rombo nas contas externas chega a US$ 28,261 bilhões, também recorde, mas ainda sem tirar o sono dos especialistas.

As transações correntes formam com a conta de capital (investimentos diretos e financeiros) o balanço de pagamentos do país com o exterior.

Esse número ainda não representa 3% do PIB (Produto Interno Bruto, conjunto de bens e serviços gerados no país). Está em 2,24% num fluxo de 12 meses e o Brasil tem condições de reverter esse déficit disse o economista-chefe do WestLB, Roberto Padovani.Segundo ele, o país tem instrumentos para fazer frente a esse cenário, como o câmbio flutuante e a capacidade de administrar o crescimento por meio da política monetária. As contas correntes brasileiras afundaram no vermelho porque, sobretudo, o país está crescendo mais do que o resto do mundo este ano (cerca de 7%, contra 3,5%). Como não tem condições de suprir todas as demandas, precisa importar.

De acordo com o BC, o saldo comercial em julho, por exemplo, ficou em só US$ 1,357 bilhão. Segundo o chefe do Departamento Econômico do BC, Altamir Lopes, veio abaixo do esperado. Ele não revelou qual era sua projeção.

Remessas de multinacionais chegam a US$ 16,7 bilhões Pesaram ainda no desempenho das transações correntes os gastos com viagens internacionais que, no mês passado, ficaram em US$ 1,535 bilhão recorde absoluto para todos os meses. As receitas, ou gastos de turistas estrangeiros no país, somaram no período US$ 438 milhões, gerando saldo líquido negativo em US$ 1,098 bilhão.

No ano, o descasamento na área de viagens já está em US$ 5,208 bilhões, quase 110% mais do que em igual período de 2009.

Em agosto, até o dia 23, o saldo já estava negativo em US$ 584 milhões.

Segundo Lopes, isso ocorre porque a economia mundial cresce menos, bem como a renda, afetando o número de turistas estrangeiros no Brasil: E aqui, no Brasil, temos mais renda e o câmbio (valorizado), que ajuda nas viagens internacionais.

As remessas de lucros e dividendos feitas por multinacionais instaladas no país também contribuíram para o pior resultado das contas externas em 63 anos, somando US$ 1,802 bilhão em julho. No ano o saldo é negativo de US$ 16,769 bilhões.

Para Lopes, esse segmento mostrou certa acomodação em relação aos meses recentes, mas é cedo para falar que isso seja uma tendência. Já o pagamento de juros, ainda segundo o BC, foi de US$ 1,545 bilhão no período.

Mais uma vez, os investimentos estrangeiros diretos (IED, voltados para o setor produtivo) não cobriram o rombo das transações correntes, com apenas US$ 2,643 bilhões em julho. No ano, esses investimentos que são de longo prazo e não sofrem com instabilidade dos investimentos financeiros somam US$ 14,701 bilhões, tornando cada vez mais difícil atingir a projeção do BC para o ano, de US$ 38 bilhões. O mercado, segundo a pesquisa Focus, está bem menos otimista, apostando em uma entrada líquida de apenas US$ 31 bilhões em 2010.

O BC informou também que os investimentos estrangeiros em carteira (ações e títulos, por exemplo) tiveram saldo positivo de US$ 5,806 bilhões em julho, somando no ano superávit de US$ 28,964 bilhões. O volume mensal é quase o dobro ao visto em junho, com US$ 2,984 bilhões.

Em agosto, até ontem, as aplicações em ações no país somavam US$ 2,968 bilhões, enquanto que títulos de renda fixa, US$ 1,877 bilhão.

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