DEU EM O GLOBO
O governo federal anunciou ontem a retirada da Eletrobrás do cálculo do superávit primário (antes do pagamento de juros), o que já havia feito com a Petrobras. Com isso, a meta baixou de 3,3% para 3,1% do PIB. Especialistas preveem necessidade de novo ajuste fiscal em 2011.
Esforço fiscal menor em 2011
Governo retira Eletrobras do cálculo do superávit e meta cai para 3,1% do PIB
Martha Beck e Cristiane Jungblut
Ogoverno anunciou ontem a retirada da Eletrobras do cálculo do superávit primário, acabando com a contribuição das estatais federais à economia para o pagamento de juros da dívida pública. A Petrobras saiu do cálculo em 2009. Com isso, a meta de esforço fiscal do setor público consolidado foi reduzida de 3,3% para 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB) para 2010 e 2011 - as empresas públicas contribuem com 0,2 ponto percentual. Nos cálculos do Ministério da Fazenda, o novo número é robusto o suficiente para garantir a trajetória de queda da relação entre a dívida pública e o PIB dos 40% atuais para 30% em 2014.
Analistas ouvidos pelo GLOBO se dividem sobre a viabilidade desses números. Enquanto para alguns o governo teria que fazer um superávit primário bem maior - chegando até a 4% do PIB -, para outros o quadro preparado pelo governo é factível. Mas todos são unânimes em dizer que, qualquer que seja a meta, ela precisa ser cumprida em sua totalidade, sem descontos ou manobras para reduzir o esforço, e com uma redução efetiva dos gastos correntes. Isso seria algo que o governo sinalizou no passado, mas não pôs em prática nos últimos anos.
As equipes econômica e de transição trabalham num grande ajuste para o Orçamento de 2011, com revisão de despesas e receitas para acomodar o cumprimento integral (sem abatimento) da meta de superávit primário. A persistência no objetivo de 3,1% levaria o país a registrar o chamado déficit nominal zero - quando todas as despesas, incluindo os juros, são cobertas pela arrecadação - em 2014. Haveria ainda a adoção de metas para os gastos correntes e para os investimentos.
Para economistas, é preciso limitar gastos
O compromisso do ministro Guido Mantega, que será mantido no comando da Fazenda no governo Dilma Rousseff, é cumprir à risca esta equação. Ela seria a fiadora de uma política de redução de juros pelo Banco Central (BC), garantindo ainda a meta de crescimento médio de 5,5% anuais.
- O superávit sem abater os investimentos, em 2010, é pouco mais de 2% efetivamente. Aumentar para 3,1% ano que vem, sem abatimentos, é um esforço fiscal substancial. A União está elevando o superávit na prática e por isso confia na trajetória firme de queda da relação entre dívida e PIB - defendeu um auxiliar de Mantega.
Os analistas, porém, ainda acham o compromisso nebuloso, uma vez que as despesas têm subido muito e ainda não houve uma sinalização concreta de que os gastos correntes serão limitados:
- Uma coisa é falar que existe um objetivo e a outra é mostrar como vai chegar lá. O governo ainda não disse o que vai fazer para limitar os gastos correntes. O que estamos vendo agora é pressão do Judiciário por reajustes e uma negociação difícil sobre o salário mínimo, que tem impacto sobre a Previdência - afirma o especialista em contas públicas Raul Velloso.
O professor da Trevisan Escola de Negócios, Alcides Leite, considera o compromisso do novo governo factível, mas um ajuste nas despesas é crucial para tal:
- A equipe econômica teve que fazer mágica para cumprir a meta fiscal de 2010 porque as despesas correntes e os investimentos subiram muito. Elevar investimentos é importante. Mas isso tem que ser calibrado com uma limitação nas despesas correntes.
A retirada da Eletrobras das contas é justificada pelo governo como uma forma de dar à estatal mais espaço para investir sem ter que se preocupar em poupar para o superávit primário. Essa seria uma maneira de ajudar a melhorar a infraestrutura no país e reduzir pressões inflacionárias, dando também condições para que os juros caiam no país. A equipe econômica tem em seus cálculos que os juros reais - hoje em torno de 5% - poderiam passar para 2% até 2014.
- Mas o sinal que foi dado (com a retirada agora da Eletrobras) foi ruim. Este ano, o governo já fez manobras na área fiscal, utilizando até a capitalização da Petrobras para conseguir receitas. Parece que toda vez que a situação aperta, é preciso mudar a contabilidade - afirma o economista da consultoria Tendências, Felipe Salto, acrescentando: - A mudança com a Eletrobras foi feita ao mesmo tempo em que o limite de gastos foi ampliado em quase R$20 bilhões.
Para reduzir a meta de superávit, o governo ainda tem que aprovar no Congresso um projeto modificando a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) relativa a 2010. Na proposta que foi encaminhada aos parlamentares, o Ministério do Planejamento admite que a retirada da Eletrobras do primário terá efeito sobre a dívida pública, uma vez que a empresa tem uma posição de credora no estoque. O impacto é estimado em 0,05 ponto percentual.
"No entanto, a dívida terá trajetória decrescente, passando de 43,3% do PIB em 2009 para cerca de 40,8% do PIB em 2010", diz o texto. Segundo os técnicos do governo, se o superávit ficasse em 3,3% do PIB por ano, a dívida pública poderia ficar em 27,8% em 2014.
- Mas agora, com a mudança, a diferença será pequena. A dívida ficará em torno de 30%. É algo residual - frisou um técnico da Fazenda.
Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
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