terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Uma reforma tributária verde :: Paulo R. Haddad

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Uma das claras manifestações da opinião pública no processo eleitoral deste ano foi a aspiração por um melhor tratamento a ser dado pelas políticas públicas aos ecossistemas do Brasil. Como tem se acelerado o ritmo de degradação e de destruição desses ecossistemas, a demanda de nossa população é por mais restauração, mais conservação e mais preservação dos diferentes biomas.

O que fazer? Intensificar os mecanismos de comando e controle (novos decretos, leis, normas e portarias), quando se sabe de sua relativa ineficiência e ineficácia, dadas as dificuldades observadas na capacidade operacional dos órgãos gestores (falta de pessoal especializado, níveis de salários insatisfatórios, incertezas jurisdicionais, etc.)? Ampliar o número e o espaço das áreas protegidas, quando se sabe que essas áreas já abrangem quase 20% do nosso território continental, e muitas delas se encontram relativamente abandonadas por absoluta falta de recursos para a sua gestão sustentável? Basta lembrar que o orçamento global do Ministério do Meio Ambiente aparece atualmente atrás de 17 outros ministérios, enquanto cortes e contingenciamentos são rotina para os recursos da Pasta.

Um caminho alternativo para equacionar esse hiato entre as aspirações da opinião pública e a realidade político-administrativa das ações governamentais passa pelo uso mais intenso de instrumentos econômicos nas políticas ambientais. A elaboração e a implementação de uma reforma tributária verde são processos institucionais que estão nessa linha de introduzir mecanismos de mercado nessas políticas. O objetivo principal dessa reforma é o uso do sistema tributário para estimular padrões de consumo, de produção e de acumulação de capital que atendam melhor a um processo de desenvolvimento sustentável do País e de suas regiões.

Já há algumas experiências de peças ou segmentos dessa reforma em processo de execução nos três níveis de governo. Algumas ilustrações podem ser mencionadas:

O ecocrédito municipal: um mecanismo econômico de mercado, sob a forma de incentivo fiscal, que visa a estimular, dentro das propriedades rurais nos limites geográficos de um município, a formação de áreas de preservação ambiental destinadas à conservação da biodiversidade e dos recursos hídricos.

O ICMS ecológico: é a denominação de qualquer critério ou conjunto de critérios de caráter ambiental, utilizados para o cálculo do valor que cada município de um Estado tem direito de receber, quando do repasse de 25% dos recursos financeiros do ICMS, decididos autonomamente por lei estadual; quanto maior a participação do ICMS ecológico nesse valor, maiores serão os incentivos fiscais para que os municípios implementem projetos de preservação ambiental, incluindo os ecossistemas de bacias hidrográficas e a sua biodiversidade.

Impostos verdes e taxas ambientais: basicamente, um imposto verde ou uma taxa ambiental representam a imposição de um ônus financeiro sobre a poluição ou degradação ambiental; seriam pagos pelas empresas que, nas fases de implantação, de operação e de manutenção de seus empreendimentos, provocassem danos ambientais, descarregando e emitindo resíduos no meio ambiente; as suas alíquotas diferenciadas seriam calibradas de acordo com o dano que a poluição do empreendimento provoca no meio ambiente. Inversamente, pode-se pensar no imposto verde positivo para empresas e consumidores, como o Imposto de Renda Ecológico, um tipo de Lei Rouanet para o patrimônio natural.

Financiamentos incentivados: abertura ou uso de linhas especiais de financiamento para projetos de investimento que tenham por objetivo a conservação e a preservação dos recursos do meio ambiente, assim como a introdução de critérios ambientais na avaliação de projetos de investimentos de infraestrutura econômica e de projetos de investimento diretamente produtivos.

Professor do IBMEC/MG, foi Ministro do Planejamento e da Fazenda no governo Itamar Franco

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