terça-feira, 9 de março de 2010

Reflexão do dia – Fernando Henrique Cardoso

Hora de avançar a partir do que conseguimos nestes 25 anos de democracia e de buscar um futuro melhor para todos. As bases para o Brasil preservar seus interesses sem temer o mercado internacional estão dadas. Convém mantê-las. Controle da inflação, pelo sistema de metas, câmbio flutuante, Lei de Responsabilidade Fiscal, autonomia das agências regulatórias são pilares que podem se ajustar às conjunturas, mas não devem ser renegados, e não podem estar sujeitos a intervenções político-partidárias e interesses de facção.


(Fernando Henrique Cardoso, no artigo “A hora é agora”, em o Globo 7/3/2010)

A guerra das drogas:: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

O que o governador de São Paulo, José Serra, temia está acontecendo. O presidente Lula aproveitou uma série de inaugurações e entrevistas no Rio para se dizer contrário à “legalização das drogas”, uma abordagem precária de um tema complexo e polêmico que tem colocado em evidência internacional seu arqui-rival, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que copresidiu a Comissão LatinoAmericana sobre Drogas e Democracia, juntamente com os ex-presidentes da Colômbia César Gaviria e do México Ernesto Zedillo.

Fernando Henrique, por essa campanha, foi colocado pela importante revista americana “Foreign Policy” entre os cem maiores pensadores internacionais do momento “por dizer o que a guerra às drogas é: um desastre”.

E é também o personagem central de um documentário sobre o tema cujo título provisório é “Rompendo o silêncio”, dirigido por Fernando Grostein Andrade.

Há poucas semanas, o expresidente esteve no Morro Dona Marta, em Botafogo, uma das favelas ocupadas pelo programa de polícia pacificadora do governo do Rio, para registrar para o documentário o trabalho que vem sendo feito de controle territorial pelo estado e desarmamento dos criminosos.

O documentário, a pedido do provável candidato tucano José Serra, só será lançado no próximo ano. Mesmo assim, a atividade de Fernando Henrique sobre o assunto é considerada potencialmente perigosa para uma candidatura tucana, pela controvérsia que gera na sociedade brasileira.

A começar pela distorção da tese central, que não é a legalização das drogas, como foi perguntado ao presidente Lula ontem, mas sim a descriminalização do consumo de drogas.

Como salientou Fernando Henrique, “descriminalizar não quer dizer despenalizar e muito menos legalizar”.

Dentro da própria coalizão oposicionista há desacordo em relação ao tema.

O ex-prefeito Cesar Maia, do DEM, por exemplo, classificou de “gol contra” o empenho de Fernando Henrique no assunto, advertindo que o documentário pode trazer prejuízos à candidatura de Serra.

A Comissão Brasileira sobre Drogas e Democracia (CBDD), que é composta por representantes da sociedade civil e políticos de todos os partidos, fez recentemente na sede do Viva Rio sua terceira reunião em que ficou clara a dificuldade política de se levar adiante uma campanha nesse sentido, especialmente num ano eleitoral.

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso comentou o seu recente empenho no debate público acerca das drogas, que não foi prioridade em seu governo: “Pouco a pouco eu fui tomando consciência das conseqüências da repressão às drogas, e percebi que ela é pouco eficaz. A guerra às drogas fracassou”.

A proposta central é transferir o enfoque da ação governamental da área judicial para a área da saúde, com a implementação de uma política de redução de danos.

O objetivo imediato é a regulamentação da lei que regula as políticas de drogas no Brasil, diferenciando consumidor de traficante, e, entre os traficantes, os que exercem ou não o controle armado de territórios.

Fernando Henrique apontou como bom exemplo o caso de Portugal, que, em 2001, mudou o paradigma do combate às drogas, adotando uma postura de redução de danos.

Como salientou, para evitar mal-entendidos que o tema propicia, a discussão acerca do tema das drogas é mais complicada do que simplesmente defender a liberalização das drogas e, por mais que existam boas experiências, como a de Portugal, não existem receitas prontas para tratar o tema.

“A guerra às drogas e o proibicionismo não vão ajudar.

Precisamos pensar caminhos alternativos”, concluiu.

A dificuldade política da defesa de uma posição menos radicalizada no combate às drogas foi evidenciada pela ausência do governador Sérgio Cabral, do PMDB, que já defendeu publicamente a descriminalização das drogas, mas cancelou em cima da hora sua participação alegando problemas de saúde, sendo representado pelo secretário Régis Fichtner.

Apesar do caráter suprapartidário que tinha a reunião, com a presença de deputados de vários partidos, inclusive o deputado federal Paulo Padilha do PT, cujo projeto é a base que o movimento usa para flexibilizar a legislação, os entraves políticos ao debate foram ressaltados pelo deputado Raul Jungmann, do PPS, que alertou para a dificuldade de se avançar em assunto tão polêmico em ano eleitoral.

Mas o secretário Nacional de Segurança Pública, Ricardo Balestreri, participou da discussão aderindo claramente à tese de que é preciso mudar o caráter repressivo da atuação policial no combate às drogas.

Na sua definição, a criminalização do pequeno traficante e o perfil repressivo do combate às drogas tem sido uma tarefa de “enxugar gelo”.

Ele defendeu, a exemplo do que já acontece em Portugal, a especificação da natureza e da quantidade da droga na legislação.

O modelo prisional brasileiro cumpriria, segundo o secretário Nacional Ricardo Balestreri, papel de recrutamento e repasse da especialização para pequenos traficantes, que são 90% dos presos, ficando conhecido por isso como ‘escola do crime’ ou ‘faculdade do crime’.

Ontem, no Rio, o presidente Lula disse que o problema do crack nas cidades brasileiras está se tornando de grandes proporções, especialmente junto às populações mais pobres, e que o governo, através do Gabinete de Segurança Institucional, está preparando um grande debate sobre como combater essa nova droga.

O tema é urgente e atual.

Mas as eleições no Brasil não comportam discussões programáticas, e o assunto ou será postergado ou explorado politicamente.

Infecção generalizada:: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Em princípio, nenhum inconveniente há no fato de a ministra-chefe da Casa Civil comparecer a uma inauguração de obra custeada exclusivamente com recursos de governo estadual.

Governadores, prefeitos, qualquer um pode convidar a ministra Dilma Rousseff ou quem quer que seja para suas festividades oficiais.

Na condição de mera candidata não haveria nada demais na presença da ministra Dilma Rousseff na entrega do Hospital da Mulher Heloneida Studart à população de São João de Meriti, na Baixada Fluminense.

O governador Sérgio Cabral Filho faz a gentileza que quiser para quem bem entender.

Desde que não o faça ao molde de campanha política financiada pelo contribuinte, bem entendido. Nem dentro muito menos fora do prazo permitido para propaganda de candidatos.

Por um motivo bem objetivo: isso fere a Lei Eleitoral e afronta a Constituição no que tange à obrigação de o poder público se pautar pelos princípios da impessoalidade, probidade e transparência.

Impessoalidade significa governar para todos igualmente sem privilégios partidários, de amizade, parentesco ou de quaisquer interesses que não o desempenho da função.

Probidade significa o uso dos recursos públicos com lisura e em benefício do público pagante.

Transparência implica conduta franca, relação de confiança com o eleitor que lhe conferiu a delegação por voto e o contribuinte que sustenta suas atividades.

Nenhum desses preceitos foi observado no último domingo na cerimônia em que o governador recebeu Dilma Rousseff no primeiro ato estrelado por ela sem a companhia do presidente Luiz Inácio da Silva, desde que foi sagrada pré-candidata do PT à Presidência da República no congresso do partido, em 19 de fevereiro.

O governo do Rio de Janeiro organizou um comício, chamou ministro, prefeitos, deputados, vereadores. Pôs uma obra estadual a serviço de uma candidatura em evento com carros de som, militância, discursos de exaltação, manifestações de apoio, distribuição de lanches e desfaçatez suficiente para sustentar a negativa de que houvesse intenção eleitoral.

Distante alguns quilômetros, a Petrobrás patrocinava uma manifestação em plena praia de Copacabana a pretexto de anunciar uma parceria da empresa com a Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres.

Desde quando uma ação dessa natureza requer um ato público com direito a discurso da diretora de Gás e Energia exaltando os talentos da "nossa candidata"?

Desde que o presidente Lula passou a testar repetidamente as balizas da Justiça Eleitoral e obteve em resposta a absoluta leniência do Tribunal Superior Eleitoral para com ações de cunho eleitoral acrescidas de uso explícito da máquina pública em prol de uma candidatura.

Na Baixada, o governador celebrava a possibilidade da eleição "dessa mulher", nas palavras dele, comandante "do processo de transformação do Brasil como nunca se viu antes". Desnecessário citar o nome, pois ela estava ali mesmo e era objeto dos pedidos de votos feitos por militantes partidários e integrantes de ONGs.

Tudo devidamente registrado nos jornais.

Tudo em completo desacordo com o que dizia o presidente do TSE, ministro Carlos Ayres Britto, em entrevista que circulava na edição daquele mesmo dia no Estado.

"Este não é o momento de impulsionar candidaturas", pregava Ayres Britto, explicando que a proibição existe para evitar a "perturbação" do funcionamento da máquina pública, porque a propaganda antecipada propicia a mistura de atos administrativos com campanha eleitoral.

Cruzamento de propósitos este que, segundo o presidente do TSE, "viola o princípio constitucional da impessoalidade e torna desequilibradas as forças dos candidatos".

Entrou no detalhe: "O que se proíbe é que as chefias executivas passem a administrar a máquina pública na perspectiva de uma candidatura e de uma sucessão, aproveitando a entrega de obras para incensar candidatos."

É fácil ligar a tese defendida pelo presidente do TSE à realidade corrente, pois não?

A chefia do Executivo federal há praticamente dois anos administra a máquina pública na perspectiva de uma candidatura e de uma sucessão, aproveitando obras para incensar a candidata por intermédio da qual o presidente Lula quer dar prosseguimento ao seu projeto de poder.

Ainda que não cite nomes, é evidente a referência do ministro Ayres Britto. Mesmo assim, a Justiça Eleitoral tem considerado insuficientes as provas apresentadas pela oposição em seus recursos ao tribunal, por se basearem em relatos da imprensa.

É de se perguntar como seriam documentadas as evidências de outro modo.

Na prática, a sem-cerimônia do presidente da República já produziu seus efeitos como se viu no domingo, no Rio.

Outras transgressões do mesmo gênero virão e o que se avizinha é que a Justiça Eleitoral, tão rigorosa com governadores, prefeitos e vereadores cassados por abuso de poder, acabe vendo o método Lula de transgredir e não sua pretendida austeridade prevalecer nessa campanha.

Por que não ser vice:: Cláudio Gonçalves Couto

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Muito se tem noticiado e comentado na imprensa acerca da possibilidade de Aécio Neves, apresentar-se como candidato a vice-presidente na chapa encabeçada por José Serra. O governador mineiro, contudo, tem dado reiteradas declarações de que não pretende assumir tal posto, preferindo focar-se na disputa estadual por sua própria sucessão e em sua candidatura ao Senado Federal. De fato, Aécio tem razões de sobra para fazer esta opção e nenhum motivo para integrar a assim chamada "chapa puro-sangue" do PSDB à Presidência da República.

A primeira e menos importante dessas razões diz respeito ao passado. A direção do PSDB não tem muitas condições morais e políticas para exigir sacrifícios de Aécio Neves - e, no atual cenário, uma candidatura a vice-presidente na chapa de oposição certamente seria um sacrifício para quem tem coisa melhor a conquistar. Ao longo de meses, durante o ano passado, o governador mineiro instou seu partido a promover discussões internas sobre a candidatura presidencial tucana e, se necessário fosse, uma prévia. Seus clamores foram solenemente ignorados, pois a direção do partido optou por jogar a disputa interna em favor do outro pré-candidato à época, o hoje exclusivíssimo José Serra. Para este, que contava com maior notoriedade país afora e, ainda, com o recall das últimas eleições que disputara (nos planos nacional, municipal e estadual, respectivamente), nada poderia ter sido mais proveitoso do que cozinhar a disputa doméstica em banho-maria até que seu adversário (menos conhecido fora de Minas Gerais) se visse sem tempo hábil para viabilizar-se nacionalmente. Foi o que aconteceu, e Aécio desistiu da pré-candidatura presidencial no final de 2009.

A segunda razão para Aécio não ser vice diz respeito ao futuro: ele tem muito mais a ganhar politicamente caso se concentre na disputa mineira - para fazer o sucessor, Antonio Anastasia, e para eleger-se senador. Os ganhos decorrentes dessas duas eventuais vitórias (a segunda, praticamente líquida e certa) não se restringiriam, contudo, apenas ao front mineiro. Fazendo o sucessor, Aécio Neves asseguraria para seu grupo o controle sobre o segundo mais populoso Estado brasileiro pelos próximos quatro anos; assim, garantiria localmente para si uma plataforma de sustentação política considerável para atuar no plano nacional pelo próximo período. Tal atuação nacional tornar-se-á ainda mais efetiva caso Aécio esteja no Senado - palco das grandes disputas políticas da federação. No Senado, não seria um parlamentar comum, mas contaria naturalmente com os holofotes da mídia por se tratar de um potencial candidato competitivo à Presidência da República no curto prazo. Ademais, qualquer que seja o próximo presidente, Aécio Neves terá condições de atuar como protagonista no Congresso Nacional.

Caso a eleita seja Dilma Rousseff, o atual governador mineiro tenderia a despontar como principal liderança oposicionista no parlamento. Confirmando-se na prática a percepção de Dilma como uma presidenta pouco carismática, ainda mais espaço sobraria para políticos de perfil mais arrojado e boa capacidade de comunicação - como é o caso de Aécio Neves. Nisto, seria marcante o contraste com a situação atual, em que o carisma do presidente ofusca não apenas seus auxiliares, mas, sobretudo, os que lhe apupam. Ao fim deste período, seria o candidato natural das oposições e - a depender do desempenho do futuro governo - poderia até mesmo contar com certo favoritismo.

Caso o eleito seja José Serra, o cenário mais provável seria Aécio despontando como principal liderança situacionista no Congresso - a despeito de uma inescapável rivalidade interna com o eventual futuro presidente tucano. Tal disputa interna não seria suficiente para Serra deslocar Aécio, sobretudo se este conseguisse postar-se como um representante "do Congresso" perante o Executivo - para o quê seria um trunfo sua maior facilidade de diálogo com setores que são adversários do PSDB e do DEM. No caso de alguma grande surpresa eleitoral, como as hoje improváveis vitórias de Marina Silva ou Ciro Gomes, o atual governador mineiro tenderia a despontar como um potencial e indispensável articulador político. Ou seja, em todos os cenários prospectivos, as estratégias mais alentadoras para seu futuro requerem de Aécio Neves que vá para o Senado, onde poderá atuar com independência e visibilidade; como vice-presidente, ficaria na dependência do presidente outorgar-lhe alguma tarefa capaz de manter-lhe no centro do palco.

A terceira razão para não aceitar a Vice-Presidência na chapa de oposição é que, quanto mais o tempo passa, mais fica claro que a candidatura tucana terá seríssimas dificuldades na disputa. Se as atuais tendências apontadas pelas pesquisas de intenção de voto se mantiverem, em poucas semanas Dilma Rousseff ultrapassará José Serra, e será difícil reverter este quadro futuramente em decorrência da grande popularidade do governo e de Lula. Apenas o fator pessoal da suposta fragilidade da candidata situacionista poderá servir de arma eficaz à oposição para virar um jogo que cada vez menos lhe é favorável. Sucintamente, continuando as coisas a transcorrer da mesma forma, Dilma perde apenas para si mesma. Em tal situação, Aécio Neves como vice na chapa de oposição apenas teria a perder: ocuparia um lugar secundário nas eleições de outubro, não seria eleito, deixaria de investir onde possui chances tremendamente maiores de retorno eleitoral (Minas Gerais) e abriria mão de uma posição institucional crucial para a atuação política no próximo período - o Congresso Nacional. A propósito, é bom lembrar que Aécio projetou-se como liderança nacional a partir de sua atuação na presidência da Câmara dos Deputados.

Somente uma eventual desistência de José Serra tornaria interessante para Aécio Neves não disputar o Senado. Neste caso, mesmo saindo muito tardiamente para a disputa e, consequentemente, tendo chances reduzidas de vitória, teria a campanha presidencial como instrumento para tornar-se conhecido país afora e pavimentar o caminho para uma nova tentativa em 2014. Ademais, numa tal situação, seria o partido que ficaria em dívida com ele - após tê-lo cozinhado em fogo brando, precisaria implorar por seu socorro.

Cláudio Gonçalves Couto é cientista político, professor da FGV-SP. O titular da coluna, Raymundo Costa, está em férias

Serra paga preço por adiar decisão

DEU NO ESTADO DE MINAS

São Paulo. O presidente estadual do PSDB em São Paulo, deputado Mendes Thame, disse ontem, que o possível candidato tucano à Presidência da República, o governador paulista José Serra (PSDB), paga o preço por ainda não ter confirmado o seu nome para a disputa. Foi uma opção do governador ficar no estado em tempo integral. Isso tem um ônus, paga-se por ele, afirmou Thame. Quem governa não tem tempo de fazer campanha. Quem não faz campanha não ganha voto, acrescentou.

A avaliação de Thame precedeu aquela que seria a primeira reunião de mobilização para a campanha presidencial deste ano, no Diretório Estadual do PSDB, na capital paulista. O encontro reuniria líderes das 48 regionais do partido no estado, mas acabou sendo esvaziado e dividido em três reuniões. A primeira delas aconteceu ontem com representantes de sete regionais da Região Metropolitana de São Paulo, de Santos e de Campinas. Eram esperados, inicialmente, 90 convidados. Com a mudança, compareceram não mais que 50. Segundo Thame, a fragmentação foi necessária para maximizar os resultados das conversas.

De acordo com o presidente do diretório paulista, foi dada uma dimensão quase sobrenatural à reunião. Deu-se a entender que era uma reunião para tratar estratégias de campanha, mas o partido não coordena campanha. Nós cuidamos da infantaria, de mobilizar os filiados, alegou. Questionado sobre quem teria dado essa conotação ao encontro, Thame desconversou: Por conta do momento político, alguns companheiros imaginaram. A alteração da estrutura da reunião foi comunicada na sexta-feira aos convidados por e-mail.

Na opinião dele, a entrada de Serra na campanha se dará em três momentos. O primeiro é na hora que o candidato se desincompatibiliza e anuncia sua candidatura, cria-se o espaço em que se sabe quem são os candidatos; em segundo é a escolha desses candidatos nas convenções de seus partidos, eles passam a poder fazer campanha legalmente; e o terceiro, é o início da propaganda eleitoral, elencou. Thame garantiu que a estratégia de campanha está definida..

Resistência e ansiedade

A resistência de José Serra em assumir a sua eventual candidatura à presidência vem causando ansiedade entre os tucanos, avalia Thame. Há uma grande ansiedade em todos nós, do PSDB, para começar a pré-campanha, reconheceu. Questionado se o partido já manifestou esse sentimento a Serra, o deputado evitou polemizar. Serra acompanha a ansiedade do partido pelos jornais. Não temos de fazer essa pressão, disse. Compartilho da decisão de Serra, de governar mesmo com custo político, afirmou.

Um dos participantes da reunião, o deputado federal José Aníbal (SP), também procurou endossar a decisão do governador paulista de adiar a candidatura até o último momento possível. Nosso governador tem razão. Não se pode ao mesmo tempo fazer campanha e ação do governo, disse. Nenhuma dificuldade adicional se coloca pelo fato de o nosso candidato só assumir a candidatura a partir da data de desincompatibilização, disse. Ainda segundo Aníbal, o crescimento da candidata adversária, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT), nas pesquisas pode ser revertido a partir de abril. Eu conheço a nossa adversária (os dois militaram juntos no movimento estudantil em Belo Horizonte durante a ditadura militar). Ela não tem constância para enfrentar o nosso candidato, não tem história, não tem experiência, atacou.

Nome de Gabeira será lançado dia 1° de maio

DEU EM O GLOBO

Maiá Menezes

Reunião entre integrantes de coligação define Cesar Maia e Marcelo Cerqueira para o Senado

Uma reunião ontem à tarde, na casa do ex-governador Marcello Alencar, definiu que DEM e PPS indicarão os candidatos ao Senado na chapa encabeçada pelo deputado federal Fernando Gabeira (PV) ao governo do estado. O PPS vai lançar o ex-deputado Marcelo Cerqueira e o DEM mantém o nome do ex-prefeito Cesar Maia.

O PV aguarda consulta feita à Justiça Eleitoral sobre a possibilidade de lançar um terceiro nome ao Senado e aposta na vereadora Aspásia Camargo para a vaga.

— A coligação está firme. As divergências em relação ao Senado parecem estar superadas, pelo menos em termos de clima — disse Gabeira.

O PV, em especial o vereador Alfredo Sirkis, presidente estadual do partido, resistia ao nome de Cesar Maia. O ex-prefeito disse que “não há nenhuma aresta” na coligação em relação à candidatura ao Senado.

— Nunca houve isso. O que há é uma dúvida jurídica se o PV pode ter candidato a senador fora da coligação — disse o ex-prefeito, que avaliou que a reunião foi “nota 10”.

O encontro, com a presença, entre outros, de Cesar Maia, de Fernando Gabeira e do deputado federal Otávio Leite (PSDB-RJ) e do deputado estadual Comte Bittencourt (PPS), definiu ainda um cronograma para a pré-campanha de Gabeira. O lançamento oficial da pré-candidatura será no dia 1° de maio.

Antes disso, no entanto, as viagens ao interior do estado começam. Gabeira disse que a partir do dia 18 de março fará a primeira, para Macaé.

A agenda do pré-candidato será definida por integrantes de todos os partidos da coligação.

PSDB prepara evento para Serra anunciar candidatura em 2 semanas

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Serão chamados para a "pré-convenção" candidatos tucanos nos Estados, quadros tradicionais da sigla e aliados

Julia Duailibi e André Mascarenhas

O PSDB prepara um grande encontro nacional para o anúncio oficial dacandidatura do governador de São Paulo, José Serra, à Presidência daRepública. Serão convidados para a "pré-convenção", que deve ocorrerprovavelmente na semana do dia 22, candidatos a governador do partidoem outros Estados, parlamentares e políticos aliados. O objetivo é dara largada extraoficial da candidatura de oposição ao governo federal -a formalização do nome de Serra só ocorrerá em junho, mês dasconvenções partidárias, segundo determina a Lei Eleitoral.

Parlamentaresjá receberam avisos do núcleo próximo ao governador de que a data maisprovável é dia 22. A ideia é criar um evento que dê repercussão e sirvade contraponto ao lançamento, há pouco mais de duas semanas, dapré-candidatura da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT). Para ostucanos, o crescimento de Dilma nas pesquisas está relacionado a suaexposição nos últimos dias. No evento, será feito um balanço da gestãotucana em São Paulo e será apresentado ao público o discurso quebalizará a campanha do PSDB.

Uma das maiores preocupações deSerra hoje, afirmam aliados, é com o discurso que servirá decarro-chefe para a disputa. O núcleo mais próximo do governador tem sereunido com frequência para discutir e formatar a espinha dorsal dacampanha. Participam do grupo, que se reúne semanalmente na casa deAndrea Matarazzo, nomes que atuaram durante o governo FHC, como EduardoGraeff e Eduardo Jorge Caldas Pereira, que ocuparam a Secretaria-Geralda Presidência.

Na reta final do prazo de desincompatibilização,dia 3 de abril, os tucanos resolveram esvaziar encontro de ontem com 47coordenadores estaduais do PSDB e parlamentares paulistas. A reuniãodiscutiria estratégias para a campanha eleitoral em São Paulo. Deacordo com integrantes do partido, o próprio governador interveio paraque o encontro fosse esvaziado. Avaliou-se que a reunião daria aimpressão de que Serra está sendo pressionado pelos próprios tucanos aassumir publicamente a candidatura a presidente.

"Ficou aimpressão de que era uma reunião para definir estratégia, e não é isso.O partido não cuida da campanha dos candidatos, mas da infantaria",afirmou o presidente paulista do PSDB, Mendes Thame, que negou terconversado com o governador sobre o assunto. A reunião de ontem contoucom apenas 7 coordenadores. "Da nossa parte, não haverá pressão. É umaopção dele governar o Estado em tempo integral. Tem um ônus porque fica100% do tempo governando e não faz campanha", disse.

Para odeputado José Aníbal, a estratégia é correta. "Você não pode fazer aomesmo tempo campanha e ação de governo." Sobre a ansiedade de parte dalegenda por um anúncio oficial, afirmou: "É uma ansiedade que vem defora para dentro."

Um novo encontro com os coordenadores foimarcado para 22 de março, mas é provável que também seja esvaziado emrazão do encontro nacional do PSDB. Após o lançamento de Serra, ostucanos pretendem confirmar a candidatura de Geraldo Alckmin ao governodo Estado. A ideia é criar outro ato de repercussão na imprensa.

Aliado dá camiseta de Lula e caracteriza campanha no Rio

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Brindes do vereador Luiz Cláudio de Oliveira tinham ologotipo de seu projeto na Rocinha e a frase "Lula e Cabral contra adesigualdade social"

Luciana Nunes Leal, RIO


Depois de bandeiras de partidos e carros de som que animaram ainauguração de um hospital estadual no domingo, uma farta distribuiçãode camisetas com a inscrição "Lula e Cabral contra a desigualdadesocial" marcou ontem a visita do presidente da República à favela daRocinha. Os brindes eram presente do vereador Luiz Cláudio de Oliveira,o Claudinho da Academia, do PSDC.

O nome do vereador e ologotipo do projeto social que desenvolve na Rocinha também estavamestampados nas camisetas. Claudinho foi denunciado pelo MinistérioPúblico Eleitoral por suposta coação a eleitores na favela e suspeitade receber apoio do chefe do tráfico no morro. O vereador nega e dizter sido eleito graças à atuação na comunidade.

Em discursodurante a inauguração do complexo esportivo da Rocinha, construído comrecursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), Lula citou aexistência de bandidos nas favelas cariocas, mas lembrou que elesexistem também nos bairros ricos, e criticou o preconceito contra apopulação pobre. "É verdade que na Rocinha deve ter algum bandido. Éverdade que deve ter algum bandido no Pavão-Pavãozinho, no Alemão. Masquem disse que não tem bandido nos prédios chiques de Copacabana? O queé grave é que os perseguidos são sempre os pobres dos morros, e não osricos."

O presidente fez referência ao fato de não ter diplomauniversitário e criticou os antecessores. "Uma parte da grã-finagemdeste país não aceita que um metalúrgico seja presidente da República emuito menos que seja mais aceito do que eles. Aí é mortal, porque elespassaram a vida inteira dizendo que eram eles que sabiam governar, quesabiam gerenciar."

Lula passou quase três horas na Rocinha,acompanhado da pré-candidata do PT à Presidência, ministra DilmaRousseff, do governador Sérgio Cabral (PMDB), que tentará a reeleição,entre outras autoridades.

Do alto do palanque, o presidenteavistou um jovem com deficiência e determinou que fosse providenciadauma cirurgia de reparação do lábio leporino. "Se fosse uma pessoa rica,já estava com a boca boa. Como é pobre, não está." Jailson Marinho, de15 anos, ficou surpreso. "Dei meu telefone para eles", contou o garoto,que deixou os estudos na 4ª série do ensino fundamental e prometevoltar às aulas "após a cirurgia".

Dilma Rousseff foi recebidacom exaltação. "Rocinha presente, Dilma presidente", gritavam osmoradores. Os investimentos do PAC na favela somam R$ 231 milhões.

Colaborou Adriana Chiarini

O antipetista - Editorial

DEU EM O GLOBO

O PT subiu a rampa do Planalto, em 2003, com a imagem de exercitar a ética na política. Quadros da legenda, é verdade, em administrações municipais e estaduais, haviam mantido contato com o reprovável costume de buscar em prestadores de serviços públicos recursos “não declarados” para financiar atividades políticoeleitorais.

Mas, àquela altura, nada que pudesse manchar o partido, nivelandoo a alguns outros, conhecidos por atrair financiadores com o aceno de generosos contratos de obras públicas no futuro. O escândalo do mensalão, em 2005, trincaria de forma irremediável aquela imagem, até porque não se tratou só de captação de dinheiro “não declarado” — não bastasse isto também ser crime —, mas de desvio de recursos públicos para gastos políticos privados, por meio da lavanderia financeira de Marcos Valério.

Tratava-se de azeitar com dinheiro sujo a aliança parlamentar de apoio ao governo Lula.

Os detalhes, revelados pela revista “Veja”, da investigação do Ministério Público de São Paulo sobre como a Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo (Bancoop) operava no financiamento oculto da campanha de Lula em 2002 reforçam a percepção de que o partido já havia mergulhado fundo no submundo financeiro da política e da corrupção. As investigações detectaram também desvios para o orçamento particular de diretores petistas da cooperativa. O trabalho do MP paulista, conduzido pelo promotor José Carlos Blat, atinge o novo tesoureiro do PT, João Vaccari, presidente do Bancoop naqueles tempos, e que se encontraria em ascensão para ser o responsável pelo caixa da campanha de Dilma Rousseff. Não mais será.

Restam também estilhaços para outros petistas ilustres, como Ricardo Berzoini, ministro do Trabalho quando, de acordo com “Veja”, para evitar a quebra do Bancoop, a pedido de Vaccari, ajudou a montar uma operação de socorro à cooperativa que, na prática, transferiu parte do rombo para fundos de pensão de estatais administrados por militantes do partido. A peculiaridade do caso é que sindicalistas petistas prejudicaram companheiros, aqueles que confiaram sua poupança para ter a casa própria via Bancoop e perderam tudo. Sequer pode ser alegada uma suposta “ética proletária” para “expropriar” a burguesia em prol de uma justa causa popular. E não adianta o partido utilizar o conhecido truque da vitimização, denunciando uma fantasiosa “guerra de extermínio” contra a legenda. Balela. Se existe algum exterminador antipetista, ele pode ser encontrado entre militantes que executam com método e competência o trabalho de pulverização ética da legenda.

Benedita pede votos para Dilma em festa oferecida pelo governo federal

DEU EM O GLOBO

Eu quero uma presidenta do Brasil. E o seu nome é Dilma Rousseff

Chico Otavio

A secretária estadual de Assistência Social, Benedita da Silva, ocupou ontem o palco de uma festa popular na cidade para pedir aos presentes que elejam Dilma Rousseff, ministrachefe da Casa Civil, presidente da República. A festa, uma homenagem ao Dia da Mulher oferecida pela Secretaria Especial de Políticas para Mulheres do governo federal, com o apoio da Caixa Econômica Federal e da Petrobras, teve também a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da ministra Dilma.

— Não podemos perder este momento. Eu quero uma presidenta do Brasil. E o seu nome é Dilma Rousseff — disse Benedita.

Público gritou jingle eleitoral

O público, estimado pelos organizadores em 6 mil pessoas, reagiu ao apelo cantando o jingle das campanhas eleitorais de Lula, mas substituindo o nome do presidente pelo da ministra: “olê, olê, olê, olá... Dilma, Dilma”.

A festa em homenagem às mulheres aconteceu, no início da noite de ontem, na antiga estação ferroviária da Leopoldina.

No palco, cartazes informavam os responsáveis pela festa. Além da secretaria e das instituições estatais, o evento teve o apoio do governo estadual, da Prefeitura do Rio e do Conselho Estadual de Direitos da Mulher (Cedim).

Em seu discurso, Lula lembrou dos tempos em que, já no governo, não podia patrocinar os eventos pedidos pela ministra Nilcéia Freire, da Secretaria Especial das Mulheres: — Quanto dinheiro faltou para as reuniões mais simples que a secretaria queria fazer.

Além dos discursos políticos, a festa de ontem teve atrações musicais, feira de artesanato e distribuição de brindes. De acordo com representantes da secretaria, a ajuda da Petrobras e da Caixa serviu para garantir, entre outras atividades, a distribuição de kits e bolsas e a confecção de material impresso sobre a situação da mulher no Brasil.

Lula chegou ao palco por volta das 19h, quando a festa já estava em andamento.

Acompanhado de Dilma, do governador Sérgio Cabral e alguns ministros (Carlos Minc, Márcio Fortes, José Gomes Temporão e Franklin Martins), ele usava um leque de papel do Sindicato dos Trabalhadores Públicos da Saúde (Sindisaúde) para se abanar.

Ao notar o que estava escrito no leque, amplamente distribuído na festa, mostrou para Cabral e Dilma. De um lado, o rosto do presidente simbolizava a “cara” de uma moeda.

Do outro lado, o rosto de Dilma representava a “coroa”.

— Se uma mulher é capaz de parir um político, por que ela não é capaz também de parir uma administração mais competente do que o político que ela colocou no mundo? — indagou o presidente.

Lula dividiu o seu pronunciamento em duas etapas.

Quando falou ao lado de Nilcéia, procurou destacar os avanços e as lutas femininas do país. Já quando chamou Dilma, seu discurso ganhou eloquência e um tom de campanha eleitoral: — Não poderia dar demonstração de apreço mais forte pela luta das mulheres deste país do que indicar ao meu partido, aos meus aliados, para me substituir, uma mulher que já demonstrou na luta que é capaz.

Dilma, no discurso, disse que o país está preparado para eleger uma mulher presidente.

Sete minutos de inspeção e duas horas de palanque

DEU EM O GLOBO

Durou sete minutos a vistoria do presidente Lula e da ministra Dilma Rousseff ao canteiro de obras do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), em Itaboraí. O presidente, Dilma e o governador Sérgio passaram, porém, duas horas no palanque montado pela Petrobras para assinatura de contratos. No Rio, numa festa popular paga pelo governo federal com Lula e Dilma, a secretária Benedita da Silva pediu votos para a ministra.


Lula: vistoria relâmpago...

... e presença longa em palanque no Comperj

Bruno Villas Boas

O evento era para vistoriar as obras do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj) e assinar novos contratos de R$ 2,6 bilhões da Petrobras com empreiteiras. Mas o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua comitiva passaram ontem apenas sete minutos “vistoriando” o canteiro de terraplenagem do Comperj (das 15h01m às 15h08m) e duas longas horas no palanque montado pela estatal (das 15h45m às 17h45m) para assinatura de contratos, que ficaram em segundo plano. Os elogios de ministros, prefeitos e do governador Sérgio Cabral (PMDB) à pré-candidata do PT, Dilma Rousseff, deram tom de campanha eleitoral e palanque oficial ao evento em Itaboraí.

Três mil pessoas foram convidadas para servir de plateia. A maioria, operários convocados de casa por empreiteiras do complexo responsáveis pelas obras, que estão paradas há quase duas semanas, desde 25 de fevereiro, por causa das chuvas. Ontem, tratores e retroescavadeiras aguardavam encostados nos canteiros de obras, que estão atrasados em cerca de dois anos.

Lula abriu seu discurso se defendendo das críticas de uso da máquina pública para impulsionar a campanha de sua candidata.

Segundo ele, “o olho do dono é que engorda o porco”, ao justificar a terceira visita ao Comperj em quatro anos, embora as obras de construção estejam ainda em fase de terraplanagem, que está 65% concluída.

— Então tenho que estar presente sempre para saber se as coisas que nós decidimos estão funcionando — disse ele, acrescentando que voltará a visitar o complexo outras vezes.

— Ainda virei mais vezes aqui. Para desgraça dos meus opositores e para desgraça daqueles que acham que eu deveria ficar sentado em Brasília, vou continuar andando por este país.

O presidente também defendeu a decisão de liberar as obras do Comperj e de outros três projetos da Petrobras no Orçamento da União de 2010. Parlamentares incluíram o Comperj na “lista negra” do Orçamento deste ano, após o Tribunal de Contas da União (TCU) identificar indícios graves de sobrepreço nas obras de terraplenagem. Empreiteiras estariam recebendo da estatal mais do que o devido nos períodos de paralisação das obras por causa de chuvas. Ao sancionar o Orçamento, Lula liberou as obras passando por cima do Congresso e TCU.

— Se a gente não fica esperto, essa obra estaria parada, assim como a da Refinaria do Paraná e a Refinaria de Pernambuco. A Petrobras teria que ter mandado embora 27 mil trabalhadores porque se levantou suspeita de sobrepreço em algumas obras — disse o presidente. — Vamos fazer toda a investigação, mas isso não pode ter como contrapartida 27 mil chefes de família na rua.

O governador Sérgio Cabral, que em 2008 havia chamado a ministra Dilma de “presidente” durante evento no Comperj, voltou a apoiar a candidata.

Chamou Dilma de “mulher corajosa, extraordinária”. O prefeito de Itaboraí, Sergio Soares (PP), chegou a sugerir que Lula e Dilma seriam praticamente iguais: — Eles são tão homogêneos em sua forma de pensar que até nos perguntamos: “Quem está falando, Lula ou Dilma?” — disse.

Coube ao ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, fazer as promessas. Após afirmar que o Comperj seria um “exemplo magnífico” do trabalho de Dilma, disse que a população do entorno do complexo não será abandonada.

Prometeu “casas, saneamento, escolas e hospitais” bancados pela Petrobras e pelos ministérios.

Dilma fez discurso de candidata.

Comparou a atuação da Petrobras nos governos FH e Lula. Lembrou que ocupa a presidência do Conselho de Administração da Petrobras desde 2003, quando a estatal teria parado de encomendar plataformas em estaleiros estrangeiros e passado a encomendar no país, gerando empregos.

Companhia indigesta

DEU EM O GLOBO

Lula, Dilma e Cabral dividem palanque com Claudinho da Academia

Na cerimônia de lançamento do PAC da Rocinha, um dos convidados que estiveram no palanque, junto às autoridades, foi o vereador Luiz Cláudio de Oliveira, o Claudinho da Academia (PSDC), denunciado pelo Ministério Público por seus métodos de campanha na favela.

A presença de Claudinho foi notada não apenas no palanque, mas também em dezenas de camisetas distribuídas por seus correligionários durante o evento.

A camiseta — que na frente estampava os dizeres “Rocinha, Lula e Cabral contra a desigualdade social ” e, atrás, a logomarca e o site do vereador — foi distribuída a quase todos os moradores presentes ao complexo esportivo.

Além disso, um grupo de colaboradores, vestidos com a camiseta com o nome do vereador, também chefiou uma claque entusiasmada para a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, pré-candidata do PT à Presidência da República.

O governador Sérgio Cabral agradeceu a “presença dos líderes”, entre eles Claudinho.

Claudinho da Academia foi denunciado pelo Ministério Público em janeiro por “uso de violência e ameaça para coagir eleitores” na Rocinha, onde obteve 73% dos 11.513 votos que lhe garantiram uma vaga na Câmara Municipal.

Na denúncia, enviada ao juiz da 211° Zona Eleitoral, a promotora Isabella Pena Lucas descreveu uma reunião na quadra de futebol no alto do morro, na qual o chefe do tráfico local, Antônio Francisco Bonfim Lopes, o Nem, teria determinado aos cerca de cem participantes que votassem em Claudinho e divulgassem a candidatura dele.

Realizada em julho, três meses antes das eleições de 2008, a reunião foi presenciada por dois cabos do Corpo de Bombeiros, que contaram o que viram à Polícia Federal. Segundo eles, o traficante Nem chegou à quadra no meio do encontro, sentou-se à mesa ao lado de Claudinho da Academia e, em tom ameaçador, disse que na Rocinha só havia um candidato. Ouvidos novamente pela promotora, os cabos do Corpo de Bombeiros confirmaram a versão do depoimento à Polícia Federal.

Notícia de que Dilma usa máquina irrita governo

DEU EM O GLOBO

O presidente Lula atacou ontem a imprensa ao reagir à revelação de que a ministra Dilma Rousseff, sua pré-candidata ao Planalto, participou da inauguração, em clima de campanha, de um hospital na Baixada que não recebeu recursos federais. O presidente, que inaugurou ontem menos de 20% das obras do PAC na Favela da Rocinha, disse que a imprensa se interessa por desgraças.

Revelação de carona de Dilma em obra irrita Lula

Presidente ataca a imprensa por noticiar clima de campanha em inauguração do governo do estado

Cássio Bruno e Natanael Damasceno

A revelação de que a pré-candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, veio ao Rio inaugurar um hospital que não recebeu um centavo sequer de investimento do governo federal irritou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que atacou a imprensa logo ao chegar ontem ao Rio e também durante visita à Rocinha, na Zona Sul. No evento na favela, onde o cronograma das obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) é o mais atrasado no estado, Lula “inaugurou” menos de 20% das obras.

— A imprensa brasileira, por hábito ou por desvio, não gosta de falar de obras inauguradas. Coisa boa não interessa.

O que interessa é desgraça — protestou. Mais cedo, em entrevista para uma rádio evangélica, atacara: — Eu vi que a grande notícia de um jornal do Rio não é para o que serve o Hospital da Mulher, que foi inaugurado ontem (domingo), mas é porque a dona Dilma vem numa obra que não é do governo federal. Imagina a distorção da informação ao nosso leitor.

Ora, porque qualquer pessoa de consciência imaginaria o seguinte: por que o governo do Rio teve dinheiro para fazer um hospital dessa magnitude? É porque a parceria com o governo federal permitiu que colocássemos dinheiro em outra área e desafogássemos o governo estadual para fazer esse investimento. Qualquer pessoa menos medíocre saberia analisar assim.

Dilma, por sua vez, voltou a afirmar que houve parceria federal com o governo do estado na construção do Hospital da Mulher em São João de Meriti, na Baixada. A ministra, porém, não deu detalhes: — Tem sim (participação do governo federal). Até porque nós sabemos que o que é muito caro de fazer é manter o hospital funcionado. É pagar aos médicos, garantir todo o atendimento, o que a gente chama de custeio.

Em Meriti, o secretário estadual de Saúde, Sérgio Côrtes, justificou a participação da ministra na inauguração, que teve militantes do PT e do PDT, carros de som da prefeitura de Mesquita pedindo votos para Dilma e distribuição de lanches. Segundo ele, o governo Sérgio Cabral pôde fazer o hospital porque o governo Lula investiu em outras áreas da saúde no Rio.

Lula inaugurou na Rocinha um complexo esportivo e um Complexo de Atendimento à Saúde (CIAS/UPA). No entanto, faltam ainda serem concluídos uma passarela, uma creche, um centro de convivência, abertura e alargamento de ruas, urbanização, dois planos inclinados e unidades habitacionais.

Ao todo serão investidos na favela R$ 231,2 milhões do PAC.

Discursando para os moradores, Lula disse que bandido não se esconde apenas em favelas, mas em “prédios chiques de Copacabana”.

— Acabou o tempo em que as pessoas não olhavam para cá (Rocinha). É verdade que a Rocinha deve ter algum bandido. É verdade que no Pavão-Pavãozinho deve ter algum bandido e no Complexo do Alemão também, mas quem disse que não tem bandido naqueles prédios chiques em Copacabana? — discursou o presidente.

Em entrevista a uma rádio, perguntado sobre sua posição em relação à legalização das drogas, Lula afirmou que é contrário.

— A princípio sou contra a legalização de drogas. Não me consta que venha ajudar acabar com a droga no Brasil ou em qualquer país do mundo — disse.

Cinco ministros participaram da solenidade na Rocinha: Franklin Martins (Comunicações), José Gomes Temporão (Saúde), Orlando Silva (Esportes), Márcio Fortes (Cidades) e Carlos Lupi (Trabalho).

NOTA DE REDAÇÃO: “Mais uma inauguração serviu de precário biombo para um mal dissimulado comício da candidata Dilma Rousseff, fora de todos os prazos estabelecidos pela legislação eleitoral.” A advertência já constava de editorial do GLOBO em 22 de janeiro último — e de lá para cá a situação só se intensificou, mas parece que o que incomoda mesmo o presidente Lula é o fato de a imprensa estar vigilante ao uso da máquina pública em favor de sua candidata.
Pelo raciocínio presidencial exposto nos palanques da vez, ontem no Rio, para justificar a presença da ministra Dilma na inauguração de um hospital sem qualquer verba federal, conclui-se que todas as obras do país só são possíveis graças ao governo Lula.
Não é de se admirar, portanto, se em breve a candidata Dilma vier ao Rio para inaugurar algumas “obras federais”, como a barreira acústica da Linha Vermelha , o asfaltamento de ruas, a despoluição da Lagoa, a limpeza de bueiros ou um novo choque de ordem.

Greve política - Editorial

DEU EM O ESTDO DE S. PAULO

Dez meses depois de ter promovido uma greve contra as mudanças realizadas pelo governador José Serra no magistério público, que criou uma escola de formação, submeteu a escolha de professores temporários a concurso público e condicionou os aumentos salariais a avaliações de mérito, os 215 mil docentes das 4,5 mil escolas da rede estadual de ensino básico estão invocando o mesmo pretexto para cruzar os braços outra vez. Como 2010 é um ano eleitoral e Serra deverá anunciar em abril sua candidatura à Presidência da República, o sindicato da categoria ? a Apeoesp, que é filiada à Central Única dos Trabalhadores e há muito tempo age como um braço do PT ? está propondo a suspensão das aulas por "tempo indeterminado".

Tomada há apenas um mês após o início das atividades letivas de 2010, essa iniciativa pode comprometer o calendário escolar. E, mais grave ainda, pode prejudicar a formação dos 5 milhões de alunos da rede estadual, que continuam sendo utilizados como reféns de sindicalistas irresponsáveis. Entre o interesse público e os interesses corporativos, os líderes da categoria não parecem ter dúvida nem pudor.

A greve do professorado paulista não passa de encenação. No plano retórico, os grevistas defendem a "qualidade da educação" e acusam o governo estadual de ameaçar a "dignidade do magistério", ao cobrar mais eficiência da categoria. Na verdade, contudo, eles não admitem ser avaliados. E também não querem se submeter a concursos públicos nem a provas classificatórias. O que explica a repulsa da categoria a testes de avaliação é o fato de que, dos 181 mil docentes que se submeteram ao exame aplicado em dezembro de 2009, cerca de 88 mil não conseguiram alcançar a nota mínima para lecionar.

Em outras palavras, quase 50% dos candidatos foram reprovados, não tendo acertado metade das 80 questões apresentadas. E, como um quinto da nota final vinha de uma pontuação recebida pelos anos de serviço na rede escolar, o desempenho médio do professorado paulista pode ter sido ainda mais vexaminoso. Portanto, resistir às avaliações impostas pelo governo estadual e se opor à prova para escolha de temporários, sob a alegação de que elas são injustas e "discriminatórias", é apenas uma estratégia política para tentar esconder a falta de preparo de parte dos docentes.

O outro pretexto para a greve por tempo indeterminado proposta pela Apeoesp é de caráter salarial. Para estimular os docentes a se qualificar, o governo adotou uma medida amplamente utilizada nos países com altos índices de eficiência escolar, fixando um programa de promoção por mérito que prevê bônus e gratificações variáveis para até 20% dos professores mais bem colocados nas provas de desempenho aplicadas pela Secretaria da Educação. No entanto, o professorado quer receber ? sem qualquer avaliação ? um reajuste salarial de 34,3%, que também beneficiaria os docentes aposentados. Como sempre, a justificativa é a reposição da inflação ? além, é claro, da defesa do princípio da "isonomia de classe".

Essa pauta de reivindicações, como se vê, é requentada. Ela já foi usada pelo professorado para justificar não apenas protestos e greves, como também malogradas ações judiciais contra a política educacional do governo paulista. Por colocar sistematicamente os interesses corporativos à frente do interesse público, descumprindo leis e prejudicando o tráfego com passeatas, em julho do ano passado a 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo aplicou uma punição exemplar à Apeoesp, obrigando-a a pagar R$ 1,2 milhão de indenização para o Fundo de Interesses Difusos. Ao justificar o rigor da punição, o relator, desembargador Ênio Zuliani, afirmou que a entidade não era ré primária, tendo sofrido duas outras condenações judiciais. Segundo ele, a "conduta desafiadora" da Apeoesp não poderia ficar impune, sob pena de desmoralização da ordem jurídica e do princípio da autoridade.

Essa é a entidade que se diz "defensora da educação" em São Paulo. Na realidade, ao invocar a qualidade do ensino como justificativa para mais uma greve, ela quer apenas criar fatos políticos adversos para Serra e ofuscar uma das bandeiras que poderá utilizar em sua campanha.

Brasil inicia retaliação comercial contra EUA

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O Brasil iniciou ontem o processo deretaliação às importações de produtos dos Estados Unidos por causa desubsídios ao algodão. Em 30 dias, 102 produtos terão o Imposto deImportação elevado. Com isso, o Brasil espera receber uma proposta deacordo. Um negociador americano já está no País. O maior trunfobrasileiro, no entanto, é a ameaça de retaliação sobre patentes eserviços.

Brasil inicia retaliação aos EUA

Governo americano se diz "decepcionado"; representante do comércio dos EUA chega ao País para negociar acordo

Renata Veríssimo, BRASÍLIA

OBrasil iniciou ontem o processo de retaliação às importações deprodutos dos Estados Unidos. A sanção foi autorizada em 2009 pelaOrganização Mundial de Comércio (OMC) diante da recusa americana deretirar os subsídios concedidos à produção e exportação de algodão. Umalista com 102 produtos, que terão o imposto de importação elevadodentro de 30 dias, foi publicada no Diário Oficial da União.

Ogoverno dos Estados Unidos se declarou "decepcionado" com asautoridades brasileiras, por darem início à retaliação. O governobrasileiro espera, ao indicar a disposição de retaliar, receberproposta concreta dos Estados Unidos para eliminar os subsídios. Hoje,o conselheiro-adjunto de Segurança Nacional para Assuntos EconômicosInternacionais da Casa Branca, Michael Froman, deve apresentar umaprimeira proposta de compensações comerciais ao Itamaraty, segundoapurou o Estado. Froman acompanha o secretário de Comércio americano,Gary Locke, em visita oficial a Brasília.

A maioria dos produtosé de bens de consumo, para evitar danos à indústria nacional quedepende de insumos, máquinas e equipamentos importados dos EUA. Foramincluídos veículos, alimentos, produtos agrícolas, aparelhoseletrônicos, cosméticos, têxteis e confecções. O maior impacto será nasimportações de trigo, que somaram US$ 318 milhões em 2008, ano usadocomo base para o cálculo.

O impacto comercial é relativamentepequeno, o mais importante é o sinal político. O diretor doDepartamento Econômico do Itamaraty, Carlos Márcio Cozendey, disse quea lista de bens deve ter um impacto comercial de US$ 591 milhões. Ovalor é estimado com base no efeito que o aumento do imposto terá sobreo valor final do produto e na redução do consumo. No entanto, a medidacom maior impacto ainda está por vir. O Brasil pode ainda estender arepresália às áreas de propriedade intelectual e serviços, pontos maissensíveis para os EUA.

Pela decisão da OMC, o Brasil tem deaplicar retaliações na área de bens em pelo menos US$ 560 milhões dototal autorizado de US$ 829 milhões. O resto pode ser em propriedadeintelectual e serviços. O governo fechou a lista acima do piso fixadopela OMC e decidiu que US$ 238 milhões serão usados na retaliação naárea de propriedade intelectual. O valor da retaliação é o segundomaior da história da OMC.

Cozendey informou que, até o momento,houve várias indicações dos EUA para negociar, mas nenhuma propostaconcreta. "Após oito anos de litígio, e na ausência de oferta de opçõesconcretas para uma solução para o contencioso, resta ao Brasil fazervaler seu direito", afirmou a secretária executiva da Câmara deComércio Exterior (Camex), Lytha Spíndola.

Ameaça do crescente déficit em transações correntes:: Yoshiaki Nakano

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Com a recuperação da economia brasileira, as importações estão voltando a crescer rapidamente e as previsões são de um déficit em transações correntes de mais de US$ 50 bilhões neste ano. Mantida a tendência, o déficit poderá atingir US$ 80 bilhões em 2011, com déficit na balança comercial depois de muitos anos de superávit. Além da recuperação econômica, esse quadro deve-se à sobreapreciação do real. O aumento do compulsório dos bancos comerciais e a sinalização clara, pelo Banco Central, de que a taxa de juros sofrerá elevação, deve agravar o quadro de sobre apreciação, pois a elevação da taxa de juros neutralizará os efeitos sobre os custos de IOF dos especuladores com o real. Volto a recolocar neste artigo algumas questões de fato muito simples para desmistificar a ideia de que a taxa de câmbio flutuante responderia antecipadamente a esse déficit, fazendo o ajuste necessário.

Se nós vivêssemos em meados do século passado em que todos os países controlavam os fluxos de capitais sob comando do Fundo Monetário Internacional (FMI), cumprindo uma cláusula do acordo de Bretton Woods, essa organização recomendaria ao Brasil a depreciar a taxa de câmbio provendo, para isso, financiamento para evitar danos ao nível de emprego.

Com o rompimento do acordo de Bretton Woods e com taxa de câmbio flexível nos anos 70 e 80, essa ainda respondia, em alguma medida, às exportações e às importações. A perspectiva de crescente déficit em transações correntes e aumento do passivo externo levariam a uma depreciação da taxa de câmbio. Assim, se eu tivesse parado no tempo poderia afirmar que o real deverá agora iniciar um ciclo de depreciação, pois o mercado, diante do crescente déficit e antevendo a inevitável necessidade de depreciação da taxa de câmbio, em algum momento, iniciaria já um processo de depreciação até que as transações correntes se ajustassem.

Mas o que aconteceu ao longo das últimas décadas foi a integração dos mercados financeiros com crescimento explosivo dos ativos financeiros de forma que, cada vez mais, as operações de câmbio estão voltadas para fazer transações financeiras diárias de trilhões de dólares. As estimativas indicam que apenas 1% das operações de taxa de câmbio estão atreladas a operações de exportações e importações de bens e serviços. Assim, podemos dizer que a taxa de câmbio é 99% determinada pelo mercado de ativos financeiros, dependendo da política monetária dos Estados Unidos, superávit em transações correntes (excesso de poupança) da China e dos exportadores de petróleo, portanto, dos fluxos de capitais e da estratégia daqueles que especularam nesses mercados. Sabidamente esses especuladores têm diferentes apetites ao risco de acordo com as circunstâncias e têm comportamento de manada.

Assim, o déficit em transações correntes pode persistir por muitos anos independentemente da taxa de câmbio? Não. A longo prazo a taxa real de câmbio acaba sendo depreciada, mas ex post, isto é, pela crise de balanço de pagamentos. Em outras palavras, quando as nossas transações correntes se deterioram suficientemente, os bem informados e "insiders" começam a deixar de financiar e retirar seus recursos do Brasil, sendo, em seguida, acompanhados pela manada quando todo o mercado financeiro deixa de apostar no Brasil.

Isso desencadeia a "parada súbita" no fluxo de capitais e a disparada na taxa de câmbio. Daí o chamado "overshooting" e drástico ajuste com elevados custos sociais. Fique claro que a taxa de câmbio responde ao déficit em transações correntes, mas com a parada súbita no fluxo de capitais e crise de balanço de pagamentos. Nesse quadro, se o déficit acumulado for elevado, isto é, se o estoque de passivo externo for significativo, as reservas cambiais, por mais elevadas que sejam, podem desaparecer rapidamente.

O problema de países como o Brasil é a crença numa mão invisível que regula o mercado de câmbio de forma a ajustar antecipadamente as transações correntes ou de que a divina providência faz o dólar cair do céu nos leva a políticas populistas. A apreciação da taxa de câmbio traz surtos de crescimento baseados no aumento de consumo, com elevação do salário real, sem sustentação na elevação da produtividade física do trabalhador, podendo até aumentar o investimento com compras de máquinas e equipamentos importados com "subsídio" do câmbio apreciado. Mas esse surto não se sustenta no longo prazo, pois o déficit de transações correntes acumulado acaba provocando, ainda que ex post, a depreciação bem como a apreciação da taxa de câmbio, e a elevação do salário real reduz a margem de lucro das empresas, neutralizando o "subsídio" do câmbio apreciado. Além do mais, a livre flutuação gera volatilidade excessiva da taxa de câmbio, aumentando o risco de câmbio de investimento no setor de "tradables" de forma que, a longo prazo, deprime os investimentos.

Analisando a experiência brasileira podemos afirmar que é possível o país acumular pequenos déficits em transações correntes, digamos uma média de 1% a 1,5% do PIB, ao longo de muitos anos se as exportações estiverem crescendo e o passivo externo sob controle, como aconteceu com o Brasil desde a Segunda Guerra Mundial até o início do fim da década de 60. Alguns estudos empíricos mostram que um pequeno endividamento de até 60% das exportações pode até ajudar o país a crescer mais, mas quando passa desse nível, a sua contribuição é cada vez menor e quando passa o valor das exportações começa a ter efeitos negativos. É o que aconteceu com o Brasil ao longo da década de 70. Os déficits acumulados geraram um passivo externo crescente que desencadeou a crise de balanço de pagamentos e a maxidesvalorização cambial no final de 1980. Assim, o endividamento da década de 70 passou a ser entrave ao crescimento e resultou na década perdida dos nos 80 e semi-estagnação dos anos 90. Da mesma forma, os déficits em transações correntes dos primeiros anos do Plano Real desencadearam a crise de balanço de pagamentos e a depreciação cambial de 1999. A lógica é tão simples quanto óbvia que quem se endivida tem que pagar a dívida. Se quisermos evitar desastres como da década de 80 e a crise de balanço de pagamentos de 1999, é melhor administrar a taxa de câmbio levando-a ao nível que resulta em um déficit em transações correntes aceitável de longo prazo.

Yoshiaki Nakano, ex-secretário da Fazenda do governo Mário Covas (SP), professor e diretor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas - FGV/EESP, escreve mensalmente às terças-feiras.

O partido da bandidagem - Editorial

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O recém-escolhido tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, está tecnicamente certo quando diz que nunca tinha sido acusado de nada nem responde a processo algum, civil ou criminal, por sua atuação na Cooperativa Habitacional do Sindicato dos Bancários de São Paulo (Bancoop), de que foi diretor financeiro (entre 2003 e 2004) e presidente (de 2005 até fevereiro passado). Mas os seus protestos de inocência só se sustêm graças à letárgica andadura da Justiça brasileira. Datam de setembro de 2006, há 3 anos e meio portanto, as primeiras denúncias de irregularidades na cooperativa, levantadas pelo Ministério Público (MP) do Estado. Em 2007, foi aberto inquérito criminal para apurar delitos da entidade, como superfaturamento de obras, apropriação indébita, desvio de verba e formação de quadrilha. No ano seguinte, uma testemunha disse ao MP que recursos desviados da Bancoop ajudaram a financiar clandestinamente a vitoriosa campanha presidencial de Lula em 2002.

A testemunha, Hélio Malheiro, era irmão de um ex-presidente da cooperativa, Luiz Eduardo, falecido em um acidente de carro em 2004, juntamente com dois outros dirigentes da instituição. Dizendo-se ameaçado de morte, Hélio foi acolhido no Programa de Proteção a Testemunhas do governo paulista. O seu depoimento foi crucial para o MP caracterizar a Bancoop como uma "organização criminosa" e solicitar a quebra do seu sigilo bancário, como foi noticiado em junho de 2008. Só na semana passada, porém, o promotor responsável pelas investigações, José Carlos Blat, recebeu o papelório ? mais de 8 mil páginas de registros de transações entre 2001 e 2008. E foi com base nessa documentação que ele pediu, na última sexta-feira, o bloqueio das contas da Bancoop e a abertura dos dados bancários e fiscais de João Vaccari Neto, acusando-o de "gestão fraudulenta".

A apropriação para fins pessoais e políticos dos recursos dos cooperados, fundos de pensão e empréstimos captados pelo sindicato dos bancários transformou 400 famílias em vítimas do conto da casa própria: os imóveis que compraram na planta não foram construídos, mas os lesados continuaram a pagar as respectivas prestações. Segundo a revista Veja, que teve acesso aos autos do inquérito, a Bancoop sacou em dinheiro vivo de suas contas pelo menos R$ 31 milhões. Outros cheques, somando R$ 10 milhões, favoreceram uma empreiteira formada por diretores da entidade, que, por sinal, era sua única cliente conhecida. O responsável pelas obras da cooperativa disse que os pagamentos eram superfaturados em 20%. "Os dirigentes da Bancoop", apurou Blat, "sangraram os cofres da cooperativa em benefício próprio e também para fomentar campanhas políticas do PT."

A prova mais gritante foi o R$ 1,5 milhão pago entre 2005 e 2006 ? quando a instituição estava praticamente quebrada ? a uma firma espectral de serviços de segurança, então de propriedade de Freud Godoy, na época segurança de Lula. Cada qual a seu modo, Godoy e Vaccari se envolveram no escândalo do dossiê, a compra abortada pela Polícia Federal de material supostamente incriminador para candidatos tucanos na campanha de 2006. Quando a operação fez água, Lula chamou os seus autores de "aloprados". Pelo dossiê, os petistas pagariam R$ 1,7 milhão. Nunca se descobriu de onde veio a dinheirama. À luz do que já se sabe das falcatruas da Bancoop, ela pode ter sido a fonte pagadora da baixaria. Tão logo entregou parte da bolada aos encarregados de comprar o dossiê, foi para Vaccari que ligou um dos cabeças da operação, Hamilton Lacerda, então assessor do senador Aloizio Mercadante.

Mas Vaccari não é o primeiro elo da cadeia. Ele deve a sua carreira ao companheiraço Ricardo Berzoini, que presidia o PT até poucas semanas ? e, como tal, foi acusado de autorizar a compra do dossiê. Berzoini alçou o bancário Vaccari à presidência do sindicato da categoria, em 1998. Em 2004, Berzoini salvou a Bancoop da falência, ajudando-a a levantar no mercado R$ 43 milhões ? via fundos de pensão de estatais comandados por petistas do grupo dele e de Vaccari. A Polícia Federal chegou a abrir inquérito sobre o prejuízo imposto aos fundos para favorecer a Bancoop. A rigor, nenhuma surpresa, considerando a folha corrida do PT. Mas, a cada escândalo, mais se aprende sobre a destreza com que a bandidagem petista se apossa do dinheiro alheio para chegar lá, e ali se manter.

Inanição agrária :: Xico Graziano

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Reforma agrária não se confunde com invasão de terra. Menos ainda com saque de propriedade rural ou roubo de gado. Assim atestam decisões recentes da Justiça brasileira. Ponto para a democracia.

A fazenda da Cutrale, em Iaras (SP), invadida pelo MST em 28 de setembro passado ilustra o mais notório caso. A 1ª Vara Criminal de Lençóis Paulista aceitou recentemente denúncia do Ministério Público paulista contra os transgressores. A decisão partiu da juíza Ana Lúcia Aiello. Vão responder os acusados pelos crimes de formação de quadrilha, furto e dano qualificado. Segundo laudo técnico, apresentado pela Promotoria, 12.298 pés de laranja foram destruídos. Considerando insumos e máquinas agrícolas furtados, o prejuízo soma R$ 1,3 milhão. Bandidagem sai caro.

Segundo caso. Em fevereiro último, a Justiça de Tupã (SP) ofereceu liminar em ação de interdito proibitório, garantindo a integridade da Fazenda Salmourão, situada ali, na região da Alta Paulista. Grupo de 200 pessoas, ligado ao briguento dissidente José Rainha, pretendia invadir a área, promovendo seu "carnaval vermelho". Com o parecer judicial, seriam presos se o fizessem. Aquietaram-se.

Ocorreu no Paraná, entretanto, a decisão judicial mais importante. Um marco na Justiça agrária do País. O governo do Estado acaba de ser condenado a pagar indenização de R$ 54 milhões, em valor atualizado, aos proprietários da antiga Fazenda Sete Mil, localizada no município de Jardim Alegre. A determinação partiu do Tribunal de Justiça.

Essa batalha judicial já dura 13 anos. Em 1996, antevendo sua invasão, os proprietários da fazenda conseguiram na Justiça local um interdito proibitório. De nada adiantou. Meses depois, a área estava ocupada pela turma do MST. Nova decisão judicial ordenou a reintegração de posse da área. A medida, porém, nunca foi cumprida pela autoridade policial. Um descaso ao Judiciário.

Com área total de 14 mil hectares, a fazenda mantinha rebanho aproximado de 15 mil cabeças de gado. Desapropriada pelo governo, teve o decreto presidencial anulado pelo Supremo Tribunal Federal, fazendo o Incra passar vergonha. Tratava-se de terra produtiva. Mas continuava nas mãos do MST, que abatia o gado regularmente e distribuía sua carne na base de 3 quilos para cada uma das 650 famílias invasoras. Um açougue rural.

Cinco anos depois, cansado de reclamar politicamente, o fazendeiro entrou na Justiça solicitando indenização, a ser paga pelo Estado, visto o descumprimento da ordem judicial que determinava a reintegração da posse. Ao mesmo tempo, seu advogado solicitou intervenção federal no Paraná. Funcionou. Após dois anos de processo, o Superior Tribunal de Justiça, em Brasília, deu ganho de causa, determinando a intervenção política no Estado. Aumentou o quiproquó.

Atuante, inteligente, idealista, o incansável advogado Antônio Carlos Ferreira seguiu adiante. Em face da demora no cumprimento da ordem judicial, solicitou o impeachment do presidente da República. Isso ocorreu em junho de 2004. Dizem que o Lula se enfureceu.

Dois meses depois, em negociação com o Incra, o dono da propriedade, Flávio Pinho de Almeida, acabou por vender sua propriedade para servir à reforma agrária. Resolveu-se dessa maneira a querela jurídica preliminar, que permitiu suspender a intervenção federal no Paraná. Lula escapou da fria. O governador Requião, nem tanto.

Passados mais cinco anos, o Tribunal de Justiça do Paraná confirmou a sentença da primeira instância, obtida na Comarca de Ivaiporã, obrigando o governo a ressarcir o prejuízo dos proprietários. Por que o governo, e não o MST? Esse é o ponto crucial. Devido ao fato de a autoridade pública não ter tomado as devidas providências para, cumprindo mandado de reintegração de posse, retirar os invasores da terra. Preço da inanição agrária.

O que leva uma autoridade, como o governador do Paraná, a deixar de cumprir uma ordem judicial como aquela da Fazenda Sete Mil? Não é simples a resposta. O governo estadual argumentava que os proprietários eram ilegítimos e que havia risco de confronto violento numa eventual desocupação. Mas, sinceramente, a razão parecia mais política que social ou jurídica. Falava-se que um acordo, realizado ainda na época das eleições, em troca de apoio político garantiria facilidades aos invasores de terras. Vai saber.

Casos semelhantes se contam atualmente também no Pará. Dezenas de áreas rurais invadidas, todas com mandados de reintegração de posse expedidos, aguardam o cumprimento da ordem judicial pelo Estado. Que, entretanto, nunca chega, abrindo espaço para a brutalidade. Com a ausência do Estado, milícias armadas substituem a Polícia Militar. A vida corre por um fio naquelas bandas.

O paranaense Flávio Pinho não pôde testemunhar sua vitória judicial. Morreu, desgostoso, antes de saber que, além da milionária indenização, ele e sua esposa, Sylvia, devem receber do governo R$ 50 mil cada, a título de danos morais. De pouco adiantará. A Fazenda Sete Mil zerou.

Com a jurisprudência que começa a ser firmada no Paraná, as coisas devem melhorar, preservando o Estado Democrático de Direito. Ordem judicial deve ser cumprida, e acabou. Por outro lado, vai complicar a equação financeira. Imaginem a enxurrada de ações indenizatórias que poderá vir por aí, responsabilizando o poder público pelo prejuízo das invasões de terras. Talvez demore, vá-se acumulando atrás do armário, mas um dia a onerosa conta terá de ser paga. E, pra variar, recairá no futuro sobre os ombros do contribuinte, que não tem nada que ver com isso.

Invasão de terras violenta a democracia e custa caro. Um caminho sem solução.

Xico Graziano, agrônomo, é secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo.