segunda-feira, 22 de março de 2010

Reflexão do dia – Eduardo Graeff

"Como ressuscitar o mensalão se ele não morreu? Está mais vivo do que nunca no comando do PT."

(Do tucano Eduardo Graeff, secretário-geral da Presidência no governo FHC, em resposta a Dilma Rousseff, que acusou a oposição de querer ressuscitar o escândalo de 2005 com propósito eleitoral, hoje, na Folha de S. Paulo)

Resgate da política:: Luiz Carlos Bresser-Pereira

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Não temos alternativa senão pensar a política em termos republicanos de virtude cívica e busca do bem comum

Sempre afirmo que a política é a mais nobre e a mais importante das profissões. É a mais nobre porque apenas homens e mulheres dotados da capacidade de tomar decisões e de qualidade moral são capazes de exercê-la bem. É a mais importante porque a política influencia nossas vidas para o bem ou para o mal, porque é por meio dela que somos governados.

Essa afirmação sobre a nobreza da política sempre causa surpresa em meus interlocutores, porque leem todos os dias notícias sobre a corrupção dos políticos. Assim, a política não estaria associada à virtude da nobreza, e sim ao vício da corrupção.

Foi, portanto, com alegria que li no "Estado de S. Paulo" (14/3) uma entrevista de José Serra a Dora Kramer na qual ele defende "uma prática transformadora na política brasileira, começando pelo repúdio ao mote fatalista e reacionário de que a desonestidade é inerente à vida pública, que o poder necessariamente corrompe o homem".

Terá razão o governador paulista ao rejeitar a visão reacionária da política? Estarei eu correto quando defendo a política apesar dos constantes deslizes dos políticos? Para responder a essas questões,devemos considerar dois conceitos básicos.

O Estado é o sistema constitucional-legal e o aparelho público que o garante; é o instrumento por excelência de ação coletiva da nação; é a lei e a administração pública; é a expressão maior da nossa racionalidade coletiva.

A política, por sua vez, é a prática de argumentar e fazer concessões mútuas para alcançar o poder político e é a arte de governar o Estado moderno que foi inicialmente liberal e depois se tornou democrático. É por meio da política que reformamos permanentemente a sociedade e o Estado para que esse cumpra seu papel contribuindo de forma efetiva para os grandes objetivos políticos das sociedades modernas: segurança,autonomia nacional, desenvolvimento econômico, liberdade, justiça social e proteção do ambiente. Podemos obter algum sucesso na busca individual de nossa felicidade e segurança econômica. Entretanto, os demais objetivos políticos, e mesmo esses dois que acabei de citar,somente poderão ser atingidos por meio da construção política do Estado.

Não podemos esquecer que, conforme ensinou Max Weber, a ética na política é diferente da ética pessoal: é uma ética da responsabilidade, não da convicção. Para governar e promover o bem público, o político deve buscar a maioria e, para isso, é obrigado a fazer acordos ou compromissos que um indivíduo não precisa fazer. Não devemos, porém, confundir com a corrupção essa ética baseada na responsabilidade do político em alcançar bons resultados para a sociedade que governa.

Não se justifica, portanto, a tese do caráter intrinsecamente corrupto da política. A política é o grande instrumento de que dispõe a sociedade para reformar seu Estado. Só por meio da lei e da administração pública que a garante progrediremos na busca da segurança, da liberdade e da justiça. A identificação da política com busca exclusiva do poder pessoal e da riqueza é uma tese neoliberal e autoritária que desmoraliza a política para, assim, legitimar o governo das elites.

Precisamos ser implacáveis em relação à corrupção, mas não é por meio do moralismo negativista que lograremos atingir nossos grandes objetivos políticos. Para isso, não temos alternativa senão pensar apolítica em termos republicanos de virtude cívica e busca do bem comum.

Só assim estaremos fortalecendo nosso grande instrumento de ação coletiva que é o Estado.

Luiz Carlos Bresser-Pereira, 75, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado (primeiro governo FHC) e da Ciência e Tecnologia (segundo governo FHC), é autor de "Globalização e Competição".

Enquanto é tempo:: Alon Feuerwerker

DEU NO CORREIO BRAZILIENSE

No cenário pacífico, democrático e plural, a liderança do Brasil é indisputável. No outro, não é. A Alemanha conseguiu em meio século de paz o que não obtivera em um século de grandes guerras: mandar na Europa. E Berlim não tem a bomba

As guerras são sempre produto de ações incrementais, um processo químico. Todos os reagentes são necessários. Se faltar unzinho que seja, não tem reação. É como acidente de avião. Um monte de coisa tem que dar errado junto. E de modo aparentemente imperceptível, antes do desastre.

Isso entretanto não elimina a necessidade de tentar identificar retrospectivamente, em cada processo, os primeiros passos. Quando no futuro a América Latina estiver em plena corrida nuclear será interessante analisar como ela começou.

Uns responsabilizarão a Venezuela, por recorrer à bomba como suposto meio de defesa contra os Estados Unidos. Outros culparão os Estados Unidos, pelas ameaças à soberania da Venezuela.

Outros olharão para o que fez o Brasil. Nós tínhamos duas opções: intervir decisivamente para demover nossos vizinhos ou pegar uma carona na instabilidade, para reavivar as brasas das nossas próprias ambições.

O Brasil está vocacionado para liderar a América do Sul, pelo peso geopolítico. Mas essa liderança não será exercida sem levar em conta a existência dos Estados Unidos, pelo peso geopolítico deles. Como conduzir a contradição?

O lógico seria cuidar preliminarmente da nossa soberania. É nosso principal ativo. Sem ela, o projeto de liderança vira fumaça. Todos os discursos incendiários de Sadam Hussein, bem como os vídeos e fotos dele empunhando armas, ou saudado pelas multidões, dormem num arquivo empoeirado e esquecido. Pois o Iraque deixou, na prática, de existir como nação independente.

Sadam está para o Iraque como Solano López esteve para o Paraguai. Se o objetivo era passar à História como heroi derrotado, mártir do império, tudo bem. Se era construir um grande país, deu errado.

Como defender melhor a soberania? Como calibrar as doses de confronto e cooperação com os Estados Unidos para o resultado final ser um Brasil mais forte? E não mais subordinado, ou isolado (no fim dá na mesma)? A nuclearização da América do Sul vai nos conduzir à hegemonia ou dará a Washington a legitimidade e o argumento necessários para construir um cordão sanitário?

Difícil acreditar que o Brasil vá deixar a Venezuela ter a bomba antes. E como reagirá a Colômbia a uma eventual bomba brasileira ou venezuelana? Neste caso ela vai ver a novidade como risco decisivo a sua soberania, dado o potencial desequilíbrio interno de forças em favor da guerrilha.

E a Argentina, com quem construímos lá atrás uma paz baseada precisamente na renúncia mútua a armas nucleares? Aceitará deixar o destino dela nas nossas mãos, sob o nome de fantasia de Conselho de Defesa Sul-Americano? Ou vai chamar gente de fora para a festa?

Os defensores do Brasil nuclearizado têm um argumento, recorrente. Os Estados Unidos invadiram o Afeganistão e o Iraque, mas não invadiram a Coreia do Norte.

É um lado da verdade. O outro? A bomba protege o establishment político norte-coreano, mas a República Democrática e Popular da Coreia é um país completamente isolado, desprovido de relações estáveis com os vizinhos e cada vez mais dependente do poderio chinês para contrabalançar as pressões de Washington.

As vantagens de uma América do Sul desnuclearizada são evidentes. Diminuem os motivos para a ingerência extracontinental. Fica mais tranquilo e natural construir um mercado comum. Continua aberto o caminho para a ampla cooperação coletiva. Elimina-se uma barreira à política comum de Defesa, o meio mais eficaz de garantir a soberania regional.

No cenário pacífico, democrático e plural, a liderança do Brasil é indisputável. No outro, não é. A Alemanha conseguiu em meio século de paz o que não obtivera em um século de grandes guerras: mandar na Europa. E Berlim não tem a bomba.

Os defensores do artefato brasileiro gostam de falar por códigos. Escondem-se atrás de comportamentos enigmáticos e sofismas. São os especialistas do deixa comigo que eu sei o que estou fazendo, ou do vocês não têm moral para nos criticar.

Seria bom se viessem a público defender suas posições abertamente.

Para que o país possa se defender delas a tempo.

Um quixote no PT:: Fernando de Barros e Silva

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - Como não deu certo a patética manobra para fazer de Ciro Gomes o candidato ao governo de São Paulo apoiado pelo PT, Lula apontou o dedo para Aloizio Mercadante. Nunca o partido serviu de modo tão escancarado aos caprichos de seu líder autocrático. A chapa está definida: Mercadante para o governo, Marta para o Senado.

Obedientes a Lula, os demais petistas que sonhavam com o Bandeirantes já se curvaram. Todos, menos ele: Eduardo Suplicy. O senador, com mandato até 2014, insiste em manter seu nome na disputa. O lulismo transformou a "democracia partidária" em conversa fiada, mas Suplicy finge acreditar que ela tem validade: recolhe assinaturas, invoca o estatuto, participa de plenárias.

Será, como tem sido, derrotado pela máquina do partido. Mas seu quixotismo não deixa de ser didático para todos. As restrições da cúpula petista a Suplicy têm muitas vezes a mesma origem de seu prestígio para além do PT.

Em 2005, ele assinou o requerimento da CPI dos Correios, contrariando a decisão do partido de boicotá-la. Delúbio Soares, em represália, o retirou da chapa que concorria ao Diretório Nacional.

No ano passado, Suplicy apresentou o cartão vermelho a José Sarney na tribuna do Senado. Duas horas depois, encontrou o então presidente do PT, Ricardo Berzoini, que lhe virou a cara, negando-se a cumprimentá-lo. Mais recentemente, Suplicy disse ao chanceler Celso Amorim que Lula deveria rever sua posição e atuar publicamente pela liberdade de expressão em Cuba.

São episódios emblemáticos, que jogam luz sobre o lado sombrio do PT. Entre os princípios e as conveniências, entre a democracia e a corrupção dos amigos, o partido de Lula fez suas opções.

Com sua fala vagarosa e exasperante, com seu ar naïf, para muitos de falso tolo, Suplicy se tornou uma figura meio folclórica. Há no PT até quem o compare ao personagem Forrest Gump.
Soa quase como um elogio num partido com tantos aspirantes à família Corleone.

Os nanicos:: Fernando Rodrigues

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - Uma dúvida importante tem passado ao largo das análises da atual disputa presidencial: quantos serão os candidatos de partidos pequenos?O número de postulantes ao Planalto tem relação direta com a possibilidade de haver segundo turno.

O desempenho dos nanicos é ainda uma incógnita. Juntos, no papel, representam um fator real a ser considerado nas previsões sobre a eleição de outubro.

Esta será a primeira disputa presidencial pós-ditadura militar sem um eixo organizador chamado Luiz Inácio Lula da Silva. Em certa medida, será um cenário parecido com 1989, com muitos candidatos e só algumas certezas esparsas.

Há um lumpensinato equivalente a cerca de 5% a 10% do eleitorado que pode se sentir à vontade para protestar ao seu modo. Por exemplo, apoiando alguns candidatos com ideias esdrúxulas. Não ganham a eleição, mas levam a decisão para o segundo turno.

Neste ano, depois de dois pleitos seguidos (2002 e 2006), não haverá verticalização. Era a regra que engessava os partidos na hora de fazer alianças, obrigando-os a repetir ou a respeitar uma mesma coalizão em todos os Estados e na disputa presidencial. Sem essa amarra, pelo menosoito microssiglas já anunciaram candidatos próprios ao Planalto: PCO,PHS, PRTB, PSDC, PSL, PSOL, PSTU e PT do B. O PCB também estuda entrar na corrida.

Em 1989, a mais desarranjada eleição recente, os nanicos tiveram 5,5% dos votos válidos. Foi um recorde. A verticalização esterilizou um pouco essa onda. Em 2006, só quatro candidatos de partidos pequenos disputaram -somando 2,9%. É lícito agora imaginar esse percentual sendo dobrado.

Tudo somado, os candidatos exóticos propondo aerotrens e a busca da felicidade -há também um Obama brasileiro- podem acabar tendo um protagonismo inesperado. É mais um aspecto curioso da jovem democracia brasileira.

Política externa, de novo:: Fábio Wanderley Reis

DEU NO VALOR ECONÔMICO

De repente, como assinalei aqui algum tempo atrás, temos a política externa como assunto “relevante". As perplexidades que o assunto envolve me têm levado a evocar certa sequência de um desses filmes americanos sobre brancos vivendo entre índios ("Um homem chamado cavalo", se não me engano), em que o herói e narrador, a propósito da experiência de participar com seus hospedeiros, em duro combate, da resistência ao ataque de outra tribo, comenta, não sei mais exatamente em que termos, o sentimento produzido pelo fato de tratar-se de defender a família e a comunidade, no sentido mais concreto e primordial, da ameaça imediata e dramática do grupo estranho - o "inimigo", sem ambiguidades. Essa situação extrema é talvez o caso mais simples de "política externa": trata-se quase da mera autodefesa pessoal, envolvendo em grau mínimo a dilatação ou expansão do "amor próprio" de que fala Leopardi em algum de seus escritos.

Comunidades mais amplas e complexas, incluindo as cidades-estados clássicas da Grécia antiga e a Roma republicana, transformaram esse sentimento na virtude "cívica" do cidadão solidário e disposto, no limite, a dar a vida pela coletividade. Aí já estava presente, porém, a mescla em que a coerção difusa ou direta por parte da coletividade se mistura com a demanda de lealdade e das disposições subjetivas adequadas por parte do cidadão. O nacionalismo moderno exacerbou, de maneira com frequência trágica, essa mescla e seus efeitos, produzindo guerras em que as vidas de milhões foram solidariamente, ou ao menos disciplinadamente diante da coerção, dadas em nome de desígnios definidos como sendo os da coletividade nacional como tal.

De todo modo, em livro recente sobre a Europa do pós-guerra, Tony Judt, como outros autores bem antes dele, aponta na expansão do "welfarestate" a motivação de reparação a populações solidárias das quais havia sido "civicamente" exigido tudo e que passam a receber e a desfrutar “civilmente" (essas não são expressões de Judt) de direitos mais e mais amplos. O que leva a pensar no caso do Brasil. Apesar do longo escravismo e da herança elitista, e do papel cumprido pelo Estado quanto a esses traços negativos, é tênue entre nós a memória (ou a ideia) de um Estado empenhado em cobrar o dever cívico levado ao ponto de dar a vida em guerras. Temos claramente o predomínio inconteste de uma concepção "civil" de cidadania, em que o cidadão não é senão o titular de direitos, e mesmo o que possa existir de senso de dever cívico não se aproxima sequer remotamente da ideia de morrer em guerra. Concepção que provavelmente tem mesmo conexão importante com a crise ética de que tanto falamos na atualidade brasileira, com suas manifestações em diferentes níveis.

Se Jacomo for, como ver a questão da política externa? De repente, como disse, tomamos consciência (alguns mais do que outros...) de que somos internacionalmente relevantes, ou assim nos contam, e é preciso ter uma política externa. De que se trata, que objetivos buscar?
Nas manifestações desencontradas e confusas do debate a respeito, há quem diga, por exemplo, que é preciso separar diplomacia de ideologia, o que redundaria em separar política de ideologia e reclamar tratamento burocrático, presume-se, para a fixação das políticas a serem perseguidas em diferentes áreas: será isso possível ou desejável? (Em estudo recente de Amaury de Souza sobre a política externa brasileira, a questão de decisões democráticas a respeito dos problemas é inteiramente substituída pelo levantamento das opiniões de uma tecnocrática "comunidade brasileira de política externa" amplamente composta de peritos...) Mas a política e a ideologia irrompem inconsistentemente, como é fatal, de diversos modos: veja-se, a respeito de Bolívia e Petrobrás, a cobrança de atenção "realista" (vale dizer, egoística) aos "interesses nacionais" (ou se trataria então de “solidariedade" nacional?); que, contudo, convive com a cobrança “idealista" de atenção para os "direitos humanos" a propósito de Cuba e do Irã... Por outro lado, como acomodar a eventual postura afirmativa ou agressiva sobre os direitos humanos com a postura relativa a supostos valores como os envolvidos nas ideias de soberania e autodeterminação?

Isso aponta para o miolo enovelado das dificuldades. O respeito aos direitos humanos, entendidos amplamente, é, sem dúvida, um muito bom motivo para que se reexaminem os princípios de soberania e autodeterminação, como aliás vem ocorrendo incipientemente diante de casos de genocídio e “limpeza étnica". O reexame se ajusta, além disso, ao problema geral das relações entre autonomia coletiva e autonomia individual, no qual sobressai, se a autonomia é um valor, o absurdo de se pretender assegurar a autonomia coletiva (de um país, estado ou entidade coletiva qualquer) em circunstâncias em que ela se torna a garantia de que será possível justamente privar os membros individuais da coletividade em questão (ou parte deles) da autonomia e dos direitos correspondentes. Mas é preciso lembrar que a postura supostamente atenta aos direitos humanos envolve com frequência a responsabilização de uma entidade coletiva como tal pelos crimes de seus ditadores: além do que nos lembram de forma mais imediatamente trágica, por exemplo, os milhares de civis iraqueanos mortos na guerra a Saddam Hussein, a líder civil iraniana Shirin Ebadi, Prêmio Nobel da Paz, nos advertia há pouco deque sanções mais fortes contra o Irã atingiriam a população iraniana -como acontece há muito no caso de Cuba.

Parece claro que a autodeterminação soberana que rege o sistema internacional desde Westfália tem de ser qualificada e mudada. O diabo é que isso requer que sejamos capazes de entronizar com vigor apropriado princípios legais transnacionais (viva a OMC!), o que envolve penosa construção institucional (e ideológica...) mundial.

Fábio Wanderley Reis é cientista político e professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais. Escreve às segundas-feiras

Intervenção, já!:: Ricardo Noblat

DEU EM O GLOBO

Bizarra a decisão do Tribunal Regional Eleitoral de cassar José Roberto Arruda, eleito governador do Distrito Federal pelo DEM e preso há quase 50 dias pela Polícia Federal, acusado de desvio de dinheiro público. Por quatro votos a três, o tribunal aceitou a tese do Ministério Público de que Arruda foi infiel ao DEM quando o abandonou.

No País onde Paulo Maluf tem livre trânsito, bate ponto no Congresso e confraterniza com o presidente da República, embora seja procurado pela Interpol e possa ser preso em 181 países, louve-se o rigor do tratamento dispensado pela Justiça a Arruda. Tem sido exemplar. E educativo, espero.

Nunca um governador fora preso no exercício do cargo. Arruda foi porque tentou subornar uma testemunha do escândalo do mensalão do DEM. Nada a ver com o vídeo onde aparece recebendo dinheiro. Se não tivesse atrapalhado as investigações cumpriria seu mandato até o fim. A Justiça é lenta para condenar.

A defesa de Arruda impetrou habeas corpus para soltá-lo logo. O pedido de liminar foi negado. Depois o Supremo Tribunal Federal examinou o mérito do habeas corpus e o indeferiu por nove votos contra um. Como Arruda enfrenta problemas de saúde, a defesa pediu para que ele ficasse preso em um hospital. Pedido negado.

A decisão da Justiça Eleitoral de Brasília de cassar o mandato de Arruda por infidelidade partidária está alinhada com a severidade das decisões tomadas pelas instâncias superiores da Justiça mas nem por isso está certa, segundo advogados, ex-ministros e até um ministro do Supremo consultados por mim.

Por que Arruda desligou-se do DEM? Porque a direção nacional do DEM exigiu que o fizesse. O deputado Rodrigo Maia (RJ), presidente do partido, admitiu em entrevista à imprensa que Arruda seria expulso caso não se desfiliasse. E adiantou que ele fora informado a respeito em tempo hábil.

Arruda obedeceu ao DEM até quando o largou. O Ministério Público, no entanto, desprezou os fatos, preferiu entender que ele fora infiel e pediu seu mandato de volta. De volta para quem, cara pálida? De volta só pode ser para o DEM, que nada havia pedido à Justiça porque sabe muito bem como agiu.

Uma resolução do Tribunal Superior Eleitoral diz que o mandato pertence ao partido e não a quem o exerce. Um político só pode preservar o mandato depois de se afastar do partido pelo qual se elegeu se provar que foi vítima de perseguição. Ou que o partido mudou de ideologia. Arruda foi ou não perseguido? Foi. E por razões de sobra.

A Câmara Legislativa do Distrito Federal está pronta para eleger um governador-tampão daqui a pouco mais de 20 dias. Ele deverá completar o mandato de Arruda que termina em 31 de dezembro próximo. Se Arruda foi infiel e se o mandato é do DEM, a Câmara só poderá eleger algum filiado do DEM. Não parece lógico e elementar?

Mas vem cá: essa Câmara não é aquela contaminada pelo pagamento de propina a deputados? Aquela cujo presidente escondeu dinheiro dentro das meias? São 24 deputados. O Ministério Público acusou de corrupção26 parlamentares, entre titulares e suplentes. E pediu à Justiça que os impedisse de votar o impeachment de Arruda.

Como imaginar que uma Câmara podre será capaz de produzir algo sadio? Apressa dos deputados para escolher o sucessor de Arruda decorre do medo de que a Justiça acate o pedido de intervenção federal em Brasília formulado pelo Procurador Geral da República, Roberto Gurgel. A intervenção alcançaria também a Câmara.

Gurgel acumula provas para convencer o Supremo de que a intervenção é a única saída possível diante da metástase dos Poderes Executivo e Legislativo do Distrito Federal. Os ministros do Supremo estão divididos a respeito do assunto. Lula é contra a intervenção. Seu ministro da Justiça é a favor.

Jamais houve intervenção em qualquer Estado. Mas jamais um caso de corrupção em larga escala foi tão bem documentado.

Tucano dividirá Gabeira com Marina no Rio

DEU EM O GLOBO

Serra aparecerá no horário do PV

Rafael Galdo

MACAÉ e RIO. Na composição das alianças políticas para as eleições2010, a propaganda eleitoral gratuita do deputado federal Fernando Gabeira (PV) ao governo do Rio terá dois candidatos à Presidência: Marina Silva (PV) e José Serra, do PSDB, partido que integra a coligação de Gabeira no Rio. Segundo Gabeira, esse entendimento foi alcançado antes mesmo que Serra falasse, na sexta-feira, pela primeira vez como postulante à Presidência.

Pelo mesmo acordo, ficou decidido que, nas ruas, ele fará campanha primordialmente ao lado de Marina, enquanto seu candidato a vice, provavelmente o também deputado federal Márcio Fortes (PSDB), apoiará Serra.

No programa eleitoral gratuito, tanto Marina quanto Serra vão aparecer. Mas (na imagem da TV) haverá sempre um registro da Marina como candidata a presidente pelo PV explicou Gabeira, durante visita, no sábado, a duas favelas em Macaé, no Norte Fluminense.

Já os candidatos a deputado dos outros partidos da coligação no Rio, o DEM e o PPS, além do próprio PSDB, darão apoio a Serra. Definições que, de acordo com Gabeira, não impedem novas conformações políticas num possível segundo turno, nem eventuais encontros com Serra: Na rua, vou ficar mais coma Marina. Mas nesse tipo de campanha você encontra até com seu adversário.

De acordo com o presidente regional do PV e coordenador nacional da pré-campanha de Marina Silva, Alfredo Sirkis, a presença de Serra no programa eleitoral de Gabeira estava acertada desde o acordo de apoio do PSDB.

Pelo combinado, os três primeiros e os três últimos dias da campanha serão exclusivos da Marina. O vínculo entre o candidato a governador e a candidata a presidente tem que ser claro.

No entanto, o que o Gabeira falou não está fora do que foi acertado.

Sem Aécio, DEM articula para ''emplacar'' vice na chapa de Serra

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Setores do PSDB, no entanto, resistem à indicação em razão do desgaste do aliado com a crise no Distrito Federal

Marcelo de Moraes

O presidente nacional do DEM, deputado Rodrigo Maia (RJ), confirmou ontem que o partido apontará um candidato a vice-presidente para a chapa encabeçada pelo governador de São Paulo, José Serra, caso o governador de Minas, Aécio Neves, não aceite a tarefa.

Setores do PSDB resistem a essa indicação, avaliando que o escândalo político envolvendo a queda do governador cassado do Distrito Federal, José Roberto Arruda, causou grande desgaste à imagem do DEM e poderia prejudicar a candidatura de Serra, caso o partido ocupe uma vaga tão importante como a de vice-presidente. Maia confirmou que uma das possibilidades de indicação para a vaga de vice é a senadora Katia Abreu (TO), presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), como revelou a coluna Direto de Brasília, de João Bosco Rabello, na edição de domingo do Estado.

"Se Aécio Neves for o candidato a vice, não haverá qualquer discussão da parte do DEM. Mas acho pouco provável que isso vá acontecer porque o próprio governador tem dito que não será o vice. Nesse caso, não tenham dúvidas que o DEM aprovará um nome para vice na sua convenção, em junho", avisa.

Para o presidente do partido, o problema envolvendo Arruda, que se desfiliou do DEM para não ser expulso, não serve como desculpa para impedir a presença do partido na chapa. E cita o tempo de propaganda eleitoral que o DEM poderá oferecer como principal motivo para que a aliança se concretize com a divisão da chapa.

"O PSDB tem 66 deputados. O DEM tem 65. Ou seja, os tempos de propaganda eleitoral dos dois partidos são praticamente idênticos. Sem o tempo do DEM, a campanha não se viabiliza. Não vejo como essa parceria não seja feita sem que o posto de vice seja discutido diretamente com o DEM", diz.

Velha parceria. Apesar desse movimento, é improvável que as relações entre DEM e PSDB azedem a ponto de os dois partidos caminharem separadamente na sucessão presidencial. Desde a primeira vitória de Fernando Henrique Cardoso, na eleição nacional de 1994, os dois partidos têm sido parceiros eleitorais e atuam dentro do Congresso na oposição. Nesse caso extremo, a própria Kátia Abreu poderia ser a opção para entrar na campanha eleitoral como candidata do partido à Presidência. Mas PSDB e Serra já deixaram claro que não abrem mão da parceria.

Para fortalecer a campanha presidencial, os tucanos contam com a coligação não só com o DEM, mas também com PPS e PTB. Sonham ainda em avançar na negociação com o PP, do senador Francisco Dornelles (RJ). Mas essa aliança se tornou cada vez mais improvável, dada à participação intensa do ministro das Cidades, Márcio Fortes (PP), nas inaugurações de obras do PAC, ao lado da pré-candidata do PT, ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff.

Patuscada Internacional:: Roberto Freire

DEU NO BRASIL ECONÔMICO


Há algum tempo a nossa política externa tem incomodado os especialistas e a opinião pública por conta de inegáveis consequências negativas para o nosso país. Um país que há décadas vinha sendo considerado nas disputas internacionais como dotado de uma concepção e um corpo profissional de diplomatas afinados com o espírito que norteia as ações da ONU, passa a ser olhado com desconfiança.

E da desconfiança para o isolamento é um passo, digo isolamento em relação às nações democráticas.

Desde que se tornou uma obsessão de Lula e seu governo colocar o Brasil como titular do Conselho de Segurança da ONU ou ele próprio secretário-geral da ONU, nossa política externa sofreu uma importante inflexão marqueteira, em busca de feitos inéditos e da simpatia de regimes de caráter discutível.

Em nosso continente, assume uma política marcadamente ideológica, aliando-se aos devaneios voluntaristas do assim chamado socialismo bolivariano do coronel Chávez, da Venezuela, chegando a subordinar nossos interesses de nação soberana aos interesses deste, como ficou claro no desentendimento havido entre Venezuela e Colômbia, quando se chegou à ameaça de confrontação armada.

No mesmo diapasão, assistimos a embaixada brasileira em Honduras, contrariando os mais elementares procedimentos diplomáticos, postar-se a serviço de um presidente afastado pela Justiça de seu país, Manuel Zelaya, e intrometendo-se nos destinos de uma nação soberana.

Não contente com essas e outras proezas, em visita a Cuba, quando um dissidente político, Orlando Zapata, foi morto por conta de uma greve de fome, Lula acusou o morto por ter radicalizado sua forma de protesto, silenciou sobre a falta de liberdade naquele país, e se recusou a intermediar apelos dos dissidentes.

Numa inadmissível insensatez, chegou a comparar presos políticos ou de consciência de lá com criminosos comuns de cá.

Enquanto protagoniza essa patuscada internacional, a representação do Brasil na ONU mantém um silêncio constrangedor na condenação a violação dos direitos humanos seja de que latitude for, mas especialmente se for de regime ideologicamente simpático.

Tal silêncio obsequioso do Brasil frente a países que atentam contra a dignidade humana representa um apoio velado a governos autoritários, muitos condenados pela consciência democrática da comunidade internacional.

Como agora, no Irã, com a proibição da Frente da Participação Islâmica do Irã, do ex-presidente Mohammad Khatami, e a detenção de centenas de reformistas, julgados, alguns condenados à morte, em meio à repressão contra manifestações iniciadas em junho, após suspeitas de fraude na eleição presidencial.

O que haveria por trás dessa relação fraternal com Mahmoud Ahmadinejad? Talvez seja esta a demonstração cabal da subordinação de nossa chancelaria a pressupostos que nada têm a ver com a defesa dos interesses nacionais e dos valores democráticos expressos na nossa Constituição.

* Roberto Freire é presidente nacional do PPS.

Governo infla números da nova versão do PAC

DEU EM O GLOBO

Alicerce do projeto eleitoral da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, o PAC-2, que será lançado no próximo dia 29, prevê R$ 1 trilhão em investimentos no período de2011 a 2014. O governo chegará a esse número usando estratégia semelhante à utilizada na primeira fase do programa: na conta, serão incluídos contratos de compra de imóveis e até empréstimos para reforma concedidos a pessoas físicas pela Caixa Econômica Federal. Hoje, esse total é de R$ 137 bilhões, que entram no cálculo do governo como esse total. Uma parcela dos investimentos da Petrobras, turbinados coma exploração dos campos do pré-sal já licitados, também será incorporada ao PAC. A oposição criticou ontem a baixa execução orçamentária da primeira fase do programa. O presidente Lula deixará para seu sucessor conta estimada em R$ 35,2 bilhões, conforme publicou O GLOBO ontem.

Com o pé no acelerador

ELEIÇÕES 2010

Carro-chefe da campanha de Dilma, PAC-2 terá R$1 trilhão em investimentos

Gustavo Paul

Planejado para dar o suporte à plataforma eleitoral da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff à Presidência, a segunda fase do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC-2) nascerá no dia 29 de março inflada por natureza, prevendo cerca de R$1 trilhão em investimentos no período 2011 a 2014. Esse volume de recursos - o dobro da estimativa inicial do PAC-1, de R$504 bilhões, em janeiro de 2007 - já está sendo ventilado entre parlamentares e assessores do governo, e incluirá recursos orçamentários, das estatais e da iniciativa privada. No entanto, mesmo lançando o PAC-2, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixará para o próximo uma conta estimada em R$35,2 bilhões, conforme publicou O GLOBO no último domingo. A conta é referente a obras do PAC contratadas entre 2007 e 2010 e que não serão executadas nem pagas na atual gestão.

Para chegar a um número tão redondo - e ao mesmo tempo emblemático -, o governo deverá lançar mão de parte da estratégia usada no PAC original. Segundo fontes ligadas às discussões na Casa Civil, serão incluídos os contratos de compra de imóveis novo se usados e até os empréstimos para reforma financiados a pessoas físicas pela Caixa Econômica Federal e por bancos privados. Atualmente, esses financiamentos somam R$137 bilhões, contabilizados como obras concluídas. O PAC-2 deve começar assumindo uma meta de R$250 bilhões em financiamentos.

Também será incorporada ao programa uma parcela considerável dos investimentos previstos pela Petrobras, vitaminados com a exploração dos campos do pré-sal já licitados e de novas áreas. Só o projeto piloto de produção no campo de Tupi, em curso, está orçado em cerca de R$8 bilhões. Nos próximos anos, campos como Iara e Júpiter deverão começar a produzir. Também deve entrar no PAC-2 a construção das refinarias Premium de Maranhão (estima-se que não sairá por menos de R$30 bilhões) e do Ceará.

Projeto prevê mais de dois milhões de casas

Pelo menos metade dos investimentos previstos no PAC-2 será herdada das obras não concluídas do PAC original. Desde 2009, o governo federal já previa que o PAC deixaria um rastro de R$502,2 bilhões após 2010, além-dos R$646 bilhões previstos até este ano. Os projetos não iniciados deverão migrar ao novo programa, como a construção de uma fábrica de fertilizantes no Mato Grosso do Sul e o Ferroanel de São Paulo.

Se forem licitadas este ano, obras como a usina de Belo Monte (no Pará) e o Trem de Alta Velocidade, ligando o Rio a São Paulo, não migrariam obrigatoriamente ao novo programa. A ideia será monitorá-las como parte do PAC original.

A lógica do novo programa será a mesma do anterior. Serão três vetores: infraestrutura social e urbana, logística e energia. O foco principal, porém, serão os investimentos sociais, como educação infantil, saúde e transporte urbano - incluindo recursos para assistência técnica às companhias estaduais de saneamento com o objetivo de melhorar as gestões financeira e operacional.

Em pleno ano eleitoral, a palavra chave do lançamento e que vai permear sua trajetória, diz uma autoridade, será "criança". As creches serão o alvo da área de educação, consideradas o "grande buraco" existente nesta área. Por isso, o PAC deve anunciar a construção de seis mil creches, em parcerias com estados e municípios. O governo diz que vai investir ainda na construção de mais escolas técnicas e de Unidades de Prestação de Atendimento à Saúde (UPAS).

Nos projetos sociais, o governo federal quer entrar como indutor de investimentos. Boa parte dos custos, diz uma autoridade, serão gastos de custeio, ou seja, manter os projetos em andamento. Para a construção de creches e postos de saúde, o investimento é considerado bem barato.

-O gasto maior é custeio, é salário, equipamento, manutenção. O Brasil não tem problema fiscal e se a economia crescer 4,5%, 5% ao ano dá para pagar tranquilamente - afirma um integrante do primeiro escalão do governo.

O PAC-2 promete novidades, entre elas está a 2ªetapa do Programa Minha Casa Minha Vida, com a meta de construção demais dois milhões de casas, o dobro da proposta em vigor. O governo deverá incluir ainda a promessa de investir R$10 bilhões por ano em saneamento e R$3 bilhões na área de armazenamento de grãos.

Estuda-se a expansão da malha ferroviária dos atuais 29 mil quilômetros para 40mil km até 2020. Dos 11 mil novos km, 6 mil km já deverão estar prontos em 2015. Na área de energia, deve ser anunciada a construção de cinco novas hidrelétricas na Bacia do Rio Tapajós, no Pará.

Na prática, os ministérios querem transferir para o novo PAC os projetos que querem ver enquadrados no Plano Plurianual (PPA) 2012-2015. Trata-se de uma exigência da Constituição que serve de parâmetro para os próximos quatro Orçamentos e cujo projeto deve ser apresentado no ano que vem pelo presidente eleito em outubro.

Na guerra dos royalties a farsa do "me engana que eu gosto":: Pedro Profirio*

"Outro fato, ainda mais grave, ocorreu na tramitação dos projetos: uma emenda desastrosa que o Deputado Henrique Alves introduziu no projeto do Governo. É o § 2° do artigo 42: ele estabelece que o consórcio receba de volta, em petróleo, o valor que vier a pagar pelos royalties. Ou seja, além de não pagar esse imposto, o consórcio ainda recebe de volta um bem altamente estratégico. Não existe esse absurdo em nenhum lugar do mundo".

(Fernando Leite Siqueira, presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás.)

Se o problema fosse essa distribuição dos royalties do petróleo na forma da Emenda Ibsen Pinheiro, não teríamos problema. Essa mudança, ferindo atos jurídicos consolidados, direitos adquiridos, não resiste a uma apreciação judicial, mesmo que o relator seja alguém da turma do ministro Gilmar Mendes.

Sérgio Cabral FILHO sabe disso. E foi sabendo disso que aceitou a tarefa de montar e protagonizar uma farsa, cujo objetivo é desviar as atenções do principal: está em gestação o projeto mais privatizante para a exploração do nosso petróleo, com o qual o bilionário Eike Batista pretende se transformar no Nelson Rockfeller tupiniquim, tendo a seu lado o competentíssimo "consultor" José Dirceu, que já lhe prestou serviços quando Evo Morales cortou as asas da sua siderúrgica na Bolívia.

Claro que, como governador atento para os interesses dos seus amigos (e seus) Cabral FILHO está juntando a fome com a vontade de comer. A possibilidade, ainda que remota, da mudança na distribuição, atingindo os contratos atuais, afetaria gravemente a implantação do Porto do Açu, em São João da Barra, município que veria os R$ 155 milhões dos royalties (70% do seu orçamento) reduzidos a R$ 620 mil, sustando todas as obras de infra-estrutura que darão suporte ao empreendimento de Eike Batista, em favor do qual o governador desterrou mais de 4 mil agricultores, cujas glebas estão agora anexadas à obra portuária do amigo. A simples possibilidade já mexe com a cotação das ações de Eike, cujos galopes fazem sua fortuna.

O chefe do protesto chegou mudo e saiu calado. Onde já se viu?

"Indignado" com a emenda fajuta, Cabral derramou-se em prantos diante dos calouros da PUC e convocou uma manifestação chapa branca tão manipulada que nela preferiu ficar calado, deixando à Xuxa e colegas deslumbrados os faniquitos de lamentos. (Onde já se viu investir num comício e não explicar o porque à multidão excitada?)

Não abriu a boca porque ouviu um chega pra lá do senhor Luiz Inácio Lula da Silva, este irritado com a forçação de barra do subalterno, que extrapolou o combinado, em função de seu desejo de fazer do evento o ponto de partida de sua campanha pela reeleição. ("Não quero ouvir gracinhas", advertiu Lula. Também pudera: como explicar uma "derrota" da acachapante maioria atrelada ao Executivo?).

Mesmo assim, embora o ato que uniu o Rio (segundo a máquina midiática dos Marinho) tenha juntado menos de 10% da última passeata gay, é fato incontestável que milhares de desavisados entraram na pilha do governador, com seus alarmes terroristas de falência do Estado e a inviabilização da Copa do Mundo, das olimpíadas, das aposentadorias e das unidades de polícia pacificadora (aquela intervenção que dá uma sensação de segurança no entorno de algumas favelas, embora não tenha registrado prisões dos traficantes nas respectivas áreas).

Em nenhum momento, o governador e a mídia amestrada informaram que as perdas alegadas (como já disse, na contra-mão da lei e da doutrina) representam pouco mais de 10% do orçamento total do Estado - R$ 47 bilhões 403 milhões em 2010.

Espalhafatoso e inseguro, dado recentemente a porres homéricos, o governador perdeu o controle da farsa e protagonizou o primeiro confronto federativo do Brasil republicano. Se agora essa "Batalha de Itararé" gerou efeitos colaterais inesperados, para o governador o importante é o sucesso em inibir qualquer outra discussão.

A devolução dos royalties aos oligopólios: essa não lhe contaram

Tanto que poucos conhecem o serviço sujo prestado pelo deputado Henrique Alves, do PMDB, relator do Projeto 5.938/09 (que Dispõe sobre a exploração e a produção de petróleo, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluidos sob o regime de partilha de produção, em áreas do pré-sal e em áreas estratégicas, altera dispositivos da Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997, e dá outras providências).

Pelo parágrafo 2º do Artigo 42 do seu substitutivo, os exploradores das nossas jazidas terão de volta em petróleo o valor que vierem a pagar como royalties. Entendeu, não?

Quer dizer, enquanto Estados e municípios brigam, o deputado (que nunca foi flor de se cheirar) tratou de garantir mais grana para os oligopólios numa manobra de deixar no chinelo os lobistas que pariram a Lei 9.478/07, que abriu as pernas para as multinacionais, testas de ferro e/ou novos ricos locais (por esse monstrengo, os concessionários só abrem mão de 25% da receita bruta, em contraste com a média mundial, que é de 84% retidos nos cofres públicos dos países produtores).

Isso não lhe disseram, como também ocultam o escopo da lei de partilha: por seu texto, a Petrobrás se transforma na grande financiadora da exploração terceirizada, pois tem que cobrir 40% dos investimentos em todos os poços, incluindo aí os hegemonizados pelas empresas privadas, convidadas para o banquete de R$ 10 trilhões (só do pré-sal) sem as agruras dos riscos: a "nega" já está lá dentro.

Uma guerra sob encomenda para não se falar de mais nada

Temos assim o sucesso da farsa diversionista. Estados e municípios vão para o proscênio e encenam uma guerra de fancaria, embora muito bem engendrada, com todos os condimentos emocionais que a receita prescreve. Governantes e governados esquecem antigas rusgas e vão para a guerra, segundo os figurinos medievais que excitam sentimentos de vida ou morte e levam oprimidos ao sacrifício por seus opressores.

Como os estados "produtores" são minorias no Congresso e como o governador fluminense jogou com bravatas, com desesperados objetivos eleitoreiros, tem-se como favas contadas a pulverização da parte dos royalties destinados a esses entes federados e seus municípios. (Isso no formato inconstitucional do deputado gaucho, correligionário de Cabral e em fim de carreira, que, de tão exagerado, inviabiliza qualquer discussão serena e qualquer distribuição consensual, mesmo só dos novos contratos).

Nesse movimento ensaiado, não se fala em mais nada, porque tudo o mais, devidamente detonado, some na penumbra letárgica, como uma espessa cortina de fumaça.

O conflito real - o que opõe os interesses do Brasil à sanha dos oligopólios privados - sai de cena e dos corações e mentes dos cidadãos. Como nos velhos tempos, o populacho manipulado compra gato por lebre.

Com isso, prevalece incólume o expediente dos truques e disfarces, marca indelével do governo camufladamente entreguista, montado pela super-ong de David Rockfeller, representado no topo do poder pelo banqueiro Henrique Meireles.

E, enquanto a turba grita crente que está abafando, a caravana da fortuna atropela e abocanha mais um bom pedaço das nossas riquezas, ensaiando a grande festa da pernada, movida a raios multicores que desenham no espaço o desiderato do ME ENGANA QUE EUGOSTO.

*Pedro Porfirio, jornalista, ex-vereador(PDT-Rio) nos anos de 1960 foi diretor da UBES e militante do PCB. Hoje é filiado ao PSDB.

Quem fez a gracinha? :: Alberto Dines

DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Jornalista experimentado, respeitado dirigente esportivo, o deputado Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) é um político brilhante. Comandou no Congresso a defenestração de Fernando Collor de Melo, logo depois foi enxovalhado e linchado por algo que não fez (a participação no escândalo dos Anões do Orçamento), provou a inocência, foi reabilitado.

Possuía todos os atributos para escapar da armadilha do "muda tudo em matéria de petróleo" quando o Executivo, eufórico, decidiu levar aos palanques eleitorais a exploração da camada submarina denominada pré-sal. Mordeu a isca do federalismo e, inspirado nos textos de James Madison, o quarto presidente americano, imaginou que a socialização dos benefícios dos royalties petrolíferos reforçaria a república, tornando-a mais equitativa e isonômica.

Não reparou no terreno minado e apresentou a emenda que altera drasticamente a compensação paga pelo Estado brasileiro aos Estados produtores de petróleo. Resultado: está sendo crucificado no Rio de Janeiro, a unidade federativa mais prejudicada, e corre o risco de passar à história como autor de uma crise política de grandes proporções quando, na realidade, foi apenas o seu deflagrador. O que não diminui suas responsabilidades.

Embora na distante Jordânia, o presidente Lula não esqueceu as manhas da ginga e tirou o corpo fora: nada tem a ver com o assunto, "eu sabia que, emano de eleição, todo o mundo quer fazer gracinha", explicou.

A coleção de gracinhas é impressionante, a maioria oriunda do mesmo script, da mesma matriz, marcada pela mesma palavra-chave cobiça. O tesouro do pré-sal é tão fantástico, tão fabuloso que pareceu aos seus atuais gerenciadores uma arrematada burrice manter a sua exploração dentro dos atuais paradigmas.

Caso clássico de inebriação coletiva, decretou-se que, em matéria de petróleo, tudo deveria ser revisto e refeito do marco regulatório à uma nova estatal, de um novo modelo de concessões para perfuração à famigerada redistribuição de royalties.

Fazer gracinha é uma das compulsões nacionais: raros são os que resistem a ela. A votação do pré-sal estava pré-carimbada pela urgência e pré-aprovada pela base aliada do governo.

Ninguém se deu ao trabalho de examinar efeitos perversos, nem tentou minorá-los. Foi aprovada por 369 a 72 votos. Goleada.

Gracinha da oposição, broma da base aliada ou embromação generalizada para melar tudo e começar da estaca zero depois das eleições? Mesmo que a reversão seja possível, as cicatrizes do episódio são indeléveis e as sequelas certamente serão inconfortáveis.

Pendura dona brocha, órfão, o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, mostrou que sabe utilizar a expertise da imprensa popular da antiga capital federal para mobilizar as emoções de uma cidade historicamente aguerrida.

Foi um ensaio de emancipação no terceiro maior colégio eleitoral do País, com a visível solidariedade dos outros dois. São Paulo também saiu prejudicado na redistribuição de royalties mas o seu governador por ora toca na clave baixa, enquanto o colega mineiro que não tem petróleo,vista para o mar e nada a perder, solidariza-se ostensivamente com o camarada carioca.

Esta gracinha na esfera eleitoral não deveria ser desconsiderada. Pode degenerar em estrepitosa gargalhada. Não adianta atribuí-la ao Congresso, foi armada pelos mesmos piadistas que só pensam "naquilo" eleições.

» Alberto Dines é jornalista

Congresso aprova a reforma da saúde e dá a Obama maior vitória

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Projeto que amplia a cobertura médica nos EUA era maior prioridade da agenda legislativa do presidente americano

Mandatário teve de negociar até os últimos momentos para convencer deputados reticentes, assinando lei que veda financiamento a aborto
Andrea Murta

Washington - Na maior vitória do governo Barack Obama até agora, a Câmara dos Representantes (deputados) dos EUA aprovou ontem a reforma do sistema de saúde, considerada a mais importante legislação social no país desde a criação da seguridade social, nos anos 1930. Nenhum republicano foi a favor da lei, já aprovada no Senado.

"Após mais de cem anos de frustração e décadas de tentativas, [...] provamos que ainda somos um povo capaz de grandes conquistas", disse Obama ao lado do vice, Joe Biden. "Esta é a imagem da mudança."

A expectativa é que o presidente sancione a lei nos próximos dias. A reforma torna obrigatória a aquisição de planos de saúde, sob pena de multa e com subsídio a indivíduos de baixa renda e pequenas empresas, e impede que seguradoras privadas neguem planos a pacientes com doenças preexistentes. Também cria um "pool" de planos privados com critérios mínimos estabelecidos pelo governo para oferecer seguros a não segurados.

Calcula-se que conseguirão acesso ao sistema de saúde estimados 32 milhões dos 46 milhões de pessoas que não têm plano de saúde no país. A transformação é a maior desde a criação dos programas públicos Medicare (para idosos) e Medicaid (para pobres) em 1965.

A negociação com a Casa Branca seguiu forte até poucas horas antes da votação.

Obama divulgou à tarde uma ordem executiva (equivalente à medida provisória) que será assinada para reiterar que fundos públicos não serão usados para abortos. Só assim foi garantido o voto de democratas antiaborto reticentes quanto à reforma -o texto foi aprovado por 219 votos a 212, com 34 votos contra de deputados governistas.

"A ordem executiva dá garantias adicionais de que restrições ao uso de fundos públicos para abortos não poderão ser contornadas", disse a Casa Branca em comunicado. Antes dessa última concessão, Obama já havia visto a diluição de várias de suas ideias originais, inclusive desistindo de promover a criação de uma agência pública de seguros em competição com planos privados.

Republicanos se mantiveram unidos contra a reforma e até o início da votação exortaram democratas a votar "não". À tarde, partidários da direita cercaram o Congresso em protesto. "Essa reforma vai aumentar o custo dos seguros aos indivíduos e os gastos do governo na hora errada", disse a deputada republicana Cathy Rodgers.

Além de aprovar a lei de reforma que havia passado no Senado, os deputados aprovaram por 220 a 211, também sem voto republicano, um pacote de emendas orçamentárias que muda a multa a quem não tiver plano, aumenta o subsídio a famílias de baixa renda e adia o início de algumas regras.

Quando emendas versam apenas sobre orçamento, o Senado só precisa de maioria simples para finalizar o processo, conhecido como reconciliação. Democratas perderam a supermaioria (que evita obstruções) na Casa em janeiro e, por isso, não quiseram se arriscar a novo voto em políticas específicas.

A reforma em si, porém, não precisa esperar a aprovação das emendas orçamentárias para entrar em vigor -aguarda apenas a sanção de Obama.

As mudanças deverão custar US$ 938 bilhões em dez anos, segundo o Escritório de Orçamento do Congresso, e reduzir deficits federais futuros em US$ 143 bilhões.

Uma investida contra a OEA :: Jorge Castañeda

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O secretário-geral deverá defender a democracia dos ataques da Alba e preservar a unidade da organização

As últimas semanas não foram felizes para a América Latina. Além dos terremotos que sacudiram Haiti e Chile, a região foi abalada pela morte de um preso político em greve de fome em Cuba e por uma intensa repressão dos direitos humanos e da oposição na Venezuela. Para agravar mais a situação, os países da Alba (Aliança Bolivariana para as Américas) - Cuba, Venezuela, Nicarágua, Equador, Bolívia e Paraguai - decidiram criar, com a aquiescência de México, Brasil e Argentina, uma organização regional que excluiria EUA e Canadá. Seu objetivo é suplantar a Organização dos Estados Americanos (OEA).

Na quarta-feira, a OEA decidirá se reelege o diplomata chileno e político José Miguel Insulza para o cargo de secretário-geral. Deveria, pois Insulza é provavelmente o único político capaz de aprender com os erros da OEA nos últimos cinco anos e corrigi-los.

A repressão da liberdade de imprensa, do Estado de direito e do processo eleitoral na Venezuela - informam a Anistia Internacional, a Human Rights Watch e a Comissão Interamericana pelos Direitos Humanos, em um relatório de 300 páginas - tem-se agravado. A OEA só pode se envolver em questões eleitorais, políticas ou de direitos humanos nacionais se for investida pela maioria de seus membros deste poder, e países como México e Brasil temem arranjar atritos com a Venezuela. No entanto, o venezuelano Hugo Chávez tem motivos de sobra para estar nervoso. As eleições legislativas que se realizarão em setembro constituirão um desafio muito maior do que foram em ocasiões anteriores. Os apagões frequentes, a seca prolongada, a inflação e a escassez de todo tipo estão tornando difícil a vida dos venezuelanos comuns, e a posição de Chávez nas pesquisas de opinião está declinando.

Chávez sofreu recentemente vários revezes no plano regional, com repercussões no âmbito nacional. A morte do dissidente cubano Orlando Zapata, que estava em greve de fome em seu país, desencadeou uma onda de indignação contra os irmãos Castro nos EUA, Europa e América Latina (embora não entre seus governos, que se calaram). Chávez sabe que sua segurança pessoal depende da continuação da proteção dos serviços secretos cubanos. Qualquer mudança no governo de Havana o colocaria numa situação complicada. Como Chávez está preocupado com os rumores e os dissidentes em Cuba, os líderes da ilha estão preocupados com Caracas. Eles sabem que não poderão sobreviver sem o petróleo e os subsídios de Chávez. Por isso, os irmãos Castro despacharam o número 3 do regime, Ramiro Valdez, envolvido na segurança cubana desde 1959, para vigiar o que ocorre na Venezuela.

O círculo de amigos da Venezuela na região está se restringindo. Os novos presidentes de Honduras e Chile não são seus amigos. O fim da candidatura à reeleição do presidente Álvaro Uribe na Colômbia complicará a vida do caudilho de Caracas, que perderia este pretexto para perpetuar-se no poder. Também poderá abrir caminho em Bogotá a um presidente que defenda uma linha mais dura com Chávez do que a adotada por Uribe. Considerando tudo isso, e também a tendência de Chávez à farsa espetacular e a habilidade dos cubanos na ofensiva diplomática, os países da Alba poderão impor sérios problemas a algumas nações da America Latina.

Suspensão. Honduras foi suspensa da OEA no ano passado, quando o golpe de junho derrubou o presidente eleito Manuel Zelaya. O governo interino resistiu às pressões para que o presidente deposto voltasse ao poder, realizou as eleições marcadas anteriormente e entregou o poder a um novo presidente democraticamente eleito, Porfirio Lobo, que agora foi reconhecido pelos EUA, União Europeia e por vários outros governos. Chávez, os cubanos e seus aliados vetaram sua participação na cúpula de Cancún. Parece absurdo convidar Cuba, onde não há um presidente eleito desde a década de 50, e não convidar Lobo, eleito em uma votação limpa poucos meses atrás.

O problema é que a OEA realizará sua assembleia anual em junho no Peru, e vários países - Canadá, Costa Rica, EUA, Colômbia, Panamá, o próprio Peru e provavelmente o Chile - pressionarão pela readmissão de Honduras. Venezuela, Nicarágua, Bolívia, Equador, Paraguai e, possivelmente, a Argentina recusarão. É possível que estes países deixem a OEA, e procurem refúgio na nova organização. México e Brasil não os acompanharão, mas não se oporão à iniciativa. O fato de que a reunião de Cancún não tenha estabelecido recursos, local, carta ou pessoal para a nova organização não tem importância: os líderes latino-americanos estão acostumados a construir castelos no ar.

Mas mesmo uma estrutura retórica provavelmente significaria o toque de finados para a OEA. O principal desafio que a organização enfrentará - se sobreviver à saída da esquerda radical - será o fechamento das brechas existentes em seus documentos referentes à defesa da democracia e dos direitos humanos. Estas brechas consistem em não definir com precisão a interrupção das normas constitucionais - apenas a derrubada de um presidente eleito, ou também o fechamento do Parlamento ou de estações de TV? - e em dar à OEA poderes além da suspensão dos membros que violarem seus preceitos. Esta revisão deveria ser a principal tarefa do secretário-geral reeleito, além da preservação da unidade da OEA e da defesa da democracia latino-americana contra os ataques da Alba. / tradução de Anna Capovilla

Ex-chanceler do México (2000-2003), é professor emérito de política e estudos latino-americanos na Universidade de Nova York.