quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Reflexão do dia – Luiz Werneck Vianna

Entre os intelectuais, o movimento do modernismo traz à cena a presença da nossa paisagem social e física, em uma ida ao povo que vai amadurecer na obra, entre tantos, de um Mario de Andrade, Tarsila, Anita Malfatti, Di Cavalcante, talvez sobretudo em Villalobos. Embora tênue, há comunicação entre esses mundos, que o decurso do tempo prometia incrementar. Astrojildo Pereira, o líder dos comunistas, frequenta os tenentes, frequentados também por intelectuais modernistas, alguns deles, poucos anos mais tarde, como Oswald de Andrade e Pagu, terão fortes ligações com os comunistas.


(Luiz Werneck Vianna, no artigo ‘A caveira de burro e a democracia’, Valor Econômico, 27/9/2010)

Mudança de vento:: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

As atitudes erráticas do presidente Lula nesses últimos dias de campanha eleitoral denotam que os estrategistas da candidata Dilma Rousseff estão tentando digerir as informações contraditórias que chegam com as últimas pesquisas, mostrando uma perda contínua de votos em 15 dias. Ao mesmo tempo em que recuou nos seus ataques à imprensa em determinado momento, diante da constatação de que o clima de animosidade por ele deflagrado estava provocando reações negativas em setores da sociedade, o presidente retornou ao início da campanha, quando valorizar o passado de guerrilheira de Dilma era importante para garantir o apoio da esquerda do partido à neófita política escolhida para ser a "laranja" eleitoral de Lula.

Se os ataques aos meios de comunicação para tentar desqualificar as denúncias que provocaram a demissão da chefe do Gabinete Civil Erenice Guerra produziram inicialmente efeito negativo no eleitorado mais escolarizado e de maior renda, esse efeito hoje já se espalha por todos os setores da sociedade, segundo a mais recente pesquisa do Datafolha, demonstrando que as questões morais e a radicalização política afetam diretamente o setor do eleitorado mais preocupado com o equilíbrio institucional do país.

O elogio da radicalização política que Lula fez no comício de segunda-feira em São Paulo, exaltando o lado guerrilheiro de sua candidata, também incomoda essa classe média, especialmente a ascendente.

O objetivo imediato do presidente parece ser conter uma debandada de parte do eleitorado de esquerda que, desiludido com mais uma leva de escândalos envolvendo a gestão do PT, e mais uma vez no Gabinete Civil no Palácio do Planalto, estaria engrossando as fileiras da candidata verde Marina Silva.

É interessante constatar como a questão moral, que parece nunca atingir o presidente Lula diretamente, alcança inapelavelmente o PT nas últimas campanhas eleitorais.

Em 2006, quase que Lula não encontra ambiente político para se recandidatar por conta do mensalão. No auge do caso, em 2005, a popularidade do presidente caiu vertiginosamente, e as repercussões chegaram até a campanha no ano seguinte.

O caso dos "aloprados" veio apenas relembrar o escândalo do mensalão na reta final da campanha de 2006, provocando a ida da disputa para o segundo turno. Mais uma vez Lula recuperou-se do baque e conseguiu levar sua campanha a uma vitória vigorosa, ainda mais que o candidato tucano Geraldo Alckmin acabou tendo menos votos no segundo que no primeiro turno.

Agora, quando o marasmo da campanha eleitoral parecia levar a uma vitória tranquila no primeiro turno de Dilma Rousseff, dois novos escândalos trouxeram os debates políticos para um campo menos amorfo, fazendo com que setores da sociedade acordassem para o debate político. O presidente Lula escolheu a maneira errada de tentar desqualificar as denúncias contra Erenice Guerra, que pegam diretamente em Dilma Rousseff, sua protetora.

Ao levar para os palanques críticas aos meios de comunicação e garantir à população que as acusações eram mentirosas, Lula incentivou seus "aloprados" a desferir uma guerra contra a imprensa dita tradicional, e uma resposta imediata a favor da liberdade de expressão e da democracia foi articulada por representantes da sociedade civil do calibre de D. Paulo Evaristo Arns e Hélio Bicudo.

O manifesto, que protesta contra diversos indícios de autoritarismo do governo, inclusive a quebra de sigilos fiscais de pessoas ligadas ao candidato oposicionista José Serra, teve uma aceitação alta da sociedade e já tem mais de 50 mil assinaturas pela internet.

A confirmação, ontem, de que também o sigilo bancário do vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge Caldas, foi quebrado no Banco do Brasil remete a métodos utilizados anteriormente por membros do governo contra o caseiro Francenildo Pereira, que teve seu sigilo bancário na Caixa Econômica violado a mando do presidente da instituição na ocasião, Jorge Matoso, para conseguir dados que, supunha, poderiam ajudar na defesa do então ministro da Fazenda Antonio Palocci.

O conjunto da obra é nada edificante para o PT e demonstra publicamente como o aparelhamento da máquina estatal por sindicalistas e filiados ao PT e a partidos aliados ao governo significa, na prática, muito mais que a simples ineficiência do Estado, uma ameaça para os cidadãos. É esse quadro que está mexendo com os votos do eleitorado, em todas as regiões do país e em todas as estruturas sociais.

A candidata oficial, Dilma Rousseff, ainda vence, mas está vendo sua vantagem sobre a soma dos dois outros concorrentes ser reduzida a cada dia nas últimas duas semanas.

Já está caracterizada uma tendência de queda de sua candidatura, ao mesmo tempo em que a candidata do Partido Verde, Marina Silva, tem uma ascensão na mesma proporção, começando a ganhar a simpatia dos indecisos e partindo para ganhar fatias do eleitorado que hoje está com Dilma.

Marina acredita que a onda verde seja forte o suficiente para levá-la para o segundo turno, superando o candidato tucano José Serra.

Para tanto, porém, terá que arrancar do eleitorado de Dilma os pontos necessários, o que a levará a atacar mais fortemente a candidata oficial no último debate, amanhã, na TV Globo.

A reta final de uma eleição que até agora é a mais modorrenta dos últimos tempos tem ingredientes para ser muito excitante.

A diferença de Dilma para Serra ainda é muito grande, mas a subida de Marina pode levar o tucano ao segundo turno, frustrando o eleitorado que a escolheu.

Parte desse grupo é de petistas desgostosos que podem, porém, retornar ao seio governista, como aconteceu em 2006. Se realmente conseguir ir para o segundo turno nessas condições, Serra terá que fazer um amplo acordo com o Partido Verde para viabilizar a vitória.

Terá ainda a seu favor uma mudança de situação nos dois maiores colégios eleitorais, São Paulo e Minas.

Se, como tudo indica, a eleição para governador se resolver no primeiro turno a favor dos tucanos nos dois estados, a máquina governamental dos estados não terá constrangimentos para ajudar o candidato do PSDB, ao contrário do que acontece neste momento.

Que lição tirar? :: Zuenir Ventura

DEU EM O GLOBO

Se Dilma Rousseff for eleita presidente da República, como as pesquisas ainda indicam, muitas crenças sobre comportamento e tomada de decisão dos eleitores terão que ser reavaliadas. A primeira é se é possível saber o que leva alguém a escolher um candidato e de que é feita essa fidelidade - se é um processo exclusivamente emocional ou se a racionalidade tem também um peso na escolha.

O que faz a nossa cabeça: imprensa, família, amigos ou um pouco de tudo? Ou, em vez disso, é o bolso, ou seja, o acesso ao consumo? Em matéria de entretenimento cultural - filmes, peças, livros, shows - parece que o boca-a-boca funciona mais do que a crítica impressa. Mas em meio às paixões de uma campanha eleitoral não é fácil entender a situação, mesmo quando se pretenda ser mais testemunha do que juiz e se persiga uma posição de equilíbrio e equidistância.

Aparentemente, a principal formadora de opinião de um país é a chamada mídia: jornais, revistas, TV, rádio, internet. Mas se é assim, como é que a candidata do PT mantém seu favoritismo, ainda que em queda, quando a maioria dos veículos está contra ela? E se não é assim, se a imprensa não tem todo esse poder de influenciar, por que Lula se revoltou tanto, desqualificando o seu papel? Quais são as razões pelas quais um líder esperto como ele, no auge da popularidade, capaz de transferir votos e eleger a sucessora, desnorteou-se na reta de chegada e iniciou uma desenfreada escalada de ataques? Por desconhecimento é que não foi. Uma das melhores explicações para a relação poder x imprensa, é dele: "Notícia é o que o governo quer esconder; o resto é propaganda."

Pode-se alegar que é da natureza de todos os governantes maldizer a mídia e tentar controlá-la quando são contrariados. Inclusive os mais liberais. Até o tolerante JK, que aboliu a censura logo após chegar à presidência ("Quero a imprensa desatada, mesmo para ser injusta comigo"), proibiu Carlos Lacerda de falar no rádio. O próprio FHC, também um democrata, saiu do governo queixando-se e insinuando que um ou outro jornal queria o seu impeachment. Lula talvez tenha sido o que mais xingou e foi xingado pelos jornais e revistas (é impressionante o ódio que desperta em algumas pessoas). O presidente cometeu a besteira de acusar a imprensa de golpista e recebeu a classificação, também injusta, de fascista, quando na verdade falou mais bobagem do que fez - até porque nessa matéria, quando pensou fazer, com o "controle social", a sociedade reagiu.

Não se sabe se alguma lição vai ser tirada dessas eleições. Especialistas em pesquisa disseram que o eleitor não gosta de tiroteio, de troca de acusações. Se isso é verdade, há o que aprender com essa campanha.

De Severino a Tiririca:: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Ditos políticos não são necessariamente sábios nem confiáveis. Na maioria são apenas frases bem sacadas que, por traduzirem bem uma determinada situação, acabam tidas como verdades absolutas sem que haja uma preocupação de cotejá-las com a realidade e principalmente com a evolução dos tempos.

Há exceções. Aquelas que começam a circular com jeito de piada, mas terminam por se revelarem legítimas profecias.

Uma delas adapta o velho lema segundo o qual o Congresso seguinte é sempre pior que o anterior e tornou-se bordão do deputado Luís Eduardo Magalhães - promessa política interrompida por um enfarte fatal em 1998.

"Não há a menor chance de melhorar", repetia Luís Eduardo, mal entrado nos 40 anos (morreu aos 43), com uma sagacidade de Matusalém.

De fato, em 2011 pelo que se vê nas projeções das eleições parlamentares, sobretudo para a Câmara dos Deputados, não há a menor chance de melhorar a atuação do Poder Legislativo, cuja desmoralização gradativa ganhou especial velocidade nos últimos anos.

Mais exatamente na última década, a primeira do século 21.

Não que antes o Congresso fosse composto apenas de flores que se cheirassem. O último bom momento mesmo foi há mais de 20 anos, na Assembleia Nacional Constituinte.

Na CPI do PC e depois no processo de impeachment de Fernando Collor houve muito de oportunismo em jogo. Com aquelas acusações (graves), o então presidente poderia muito bem ter se sustentado no poder caso não fosse um analfabeto político e tivesse metade das habilidades do governo atual para enfrentar acusações (gravíssimas).

Até na Constituinte houve a notória instituição oficial do fisiologismo ("é dando que se recebe") deslavado como instrumento fiador da "governabilidade".

Mas a derrocada mesmo, a perda total do respeito, uma espécie queima de vestes em praça pública começou no Senado em 2000, quando Jader Barbalho e Antônio Carlos Magalhães (pai de Luís Eduardo) pela primeira vez disseram umas verdades um ao outro da tribuna e com transmissão direta pela TV Senado.

Os dois trocaram desaforos nunca vistos naquele ambiente tido por Darcy Ribeiro como o paraíso na Terra.

Foi um choque. Depois disso, nunca mais um senador eleito passou incólume sem escândalos - salvo os eleitos temporariamente, escolhidos exatamente por causa dos escândalos - o mandato inteiro.

A começar por Jader, que, eleito depois da briga com ACM (também presidente), precisou renunciar por causa de denúncias de corrupção.

Na Câmara é difícil estabelecer um marco, tantos são os casos, mas a eleição de Severino Cavalcanti no início de 2005 para a presidência da Casa é o mais impressionante.

Assinala o início do império do baixo clero, da era dos líderes de bancada desconhecidos, da cessão de destaque e postos importantes a deputados mais conhecidos pelas atividades extracurriculares, da transformação do Legislativo num ambiente de quinta em que perderam espaço os que têm vocação política.

Sim, há uma diferença entre aqueles cujo negócio é a política e os que transformam a política num bom negócio. Estes é que passaram a dar as cartas.

Muitos voltarão. A eles vão se juntar os arrivistas, os oportunistas, os famosos e mais a estrela de todos com a expectativa de se eleger com 1 milhão de votos: o rapaz chamado Tiririca, que aluga sua ignorância para espertalhões que se valem da estupidez de milhares que, se achando espertos, são feitos de bobos.

Manobra decorrente de um sistema eleitoral falido, único no mundo e que a nenhum dos partidos, grandes ou pequenos, nunca interessou genuinamente mudar, bem como não parece realmente interessar ao eleitorado renovar os ares que ficarão ainda mais irrespiráveis.

É uma mistura nefasta: de um lado a patifaria e de outro a alienação. A receita perfeita para formação de um Congresso pronto a confirmar o velho lema da piora gradativa do Parlamento e a acrescentar que a sociedade, conivente, anda muito sem moral para reclamar.

Por que os escândalos não tiram Dilma do topo :: José Nêumanne

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Causa perplexidade geral ter a chefe da Casa Civil da Presidência da República sido demitida na reta final da campanha eleitoral sem que isso haja produzido a consequência natural de um escândalo dessas proporções na popularidade do presidente, que a nomeou, nem feito cair do topo da preferência eleitoral sua candidata, que a patrocinou. A falta de proporção de causa e efeito em episódio dessa relevância não se deve apenas à credulidade popular, capaz de aceitar que Lula não assuma a responsabilidade dos atos de sua principal assessora e que Dilma Rousseff se exima de culpa pela ascensão de uma funcionária incapaz de subir na vida por méritos próprios, que ninguém imagina quais possam ser.

É o caso de buscar outras razões para a baixa interferência na preferência do eleitor de notícias de recebimento de propinas ("taxas de sucesso") pelo filho de Erenice Guerra em gabinete a poucos metros do de Dilma, no Palácio do Planalto, onde o chefão dá expediente. Será o caso de admitir que o pleito de 2010 esteja decidido há muito tempo e que será quase impossível mudar tais desígnios? Afinal, a gravidade das acusações que emergiram contra o clã Guerra, que não teriam como não macular a imagem da favorita, supera, com larga vantagem, a das que derrubaram Richard Nixon nos Estados Unidos e Fernando Collor no Brasil e levaram à prisão José Roberto Arruda, que ainda provocou o naufrágio de seu partido, o DEM, da aliança de oposição.

Se assim for, isso se deverá à percepção de Luiz Inácio Lula da Silva sobre a realidade social e o panorama eleitoral no Brasil real, que domina. Ele mesmo foi a primeira vítima de uma avalanche que, em 1989, se identificou nos dois eles de Collor em verde e amarelo e inverteu as ancestrais relações de hierarquia da política nacional, ao promover aquilo que o último coronel mineiro, Chichico Cambraia, definiu como "estouro da boiada": ao votar no "caçador de marajás", o rebanho pulou cerca e porteira do curral e, para não perdê-lo de vista, os "pastores" saíram correndo atrás. Nesta e em mais duas eleições seguidas perdidas depois, Lula aprendeu que é quase impossível ser eleito presidente da República brasileira sem alianças de peso. E, se extraordinariamente isso ocorrer, nunca será possível governar sem a adesão de grupos poderosos que mandam desde antanho e para sempre nos hoje repovoados currais de votos. Prova-o a defenestração de um dos raros que realizaram a proeza: Collor tentou presidir sem o Congresso, que logo reagiu depondo-o.

Tendo participado da derrubada do adversário que o derrotara, o presidente foi aprendendo ao longo dos anos que ganhar e governar um país deste tamanho exige partilha do butim. Tentou, antes, sem sair da própria esquerda, ao atrair Leonel Brizola para sua chapa, mas deu com os burros n"água. Aceitou, em 2002, por sugestão de José Dirceu, aliar-se a gatos gulosos do PMDB que traíram Serra, cuja vice, Rita Camata, era do partido. Depois, em nome da "governabilidade", loteou o governo para não ser mais um a ganhar e não levar. Como o Fausto da lenda, vendeu a alma aos diabos que antes exorcizava e se deu muito bem. Foi aí que aprendeu a vencer a disputa eleitoral de baixo para cima: abrigou no ninho do poder lideranças locais, prefeitos municipais, deputados estaduais e federais, senadores e governadores. Aí, quando resolveu lançar o "poste" Dilma por achar mais fácil manipulá-la do que se desgastar na luta pelo terceiro mandato, já tinha as bases todas sob controle.

Muita gente boa percebeu a jogada genial do uso eleitoral da Bolsa-Família. Mas nem todos enxergaram o simultâneo fechamento de cofres que irrigam as campanhas políticas com os recursos necessários, favorecendo de banqueiros a empreiteiros de obras públicas, que passaram a ter nele o novo Messias. E ninguém observou que ele tirou do caminho para o palanque adversários que incomodavam. Foram os casos de Cássio Cunha Lima, o tucano da Paraíba, e Jackson Lago, o pedetista do Maranhão, que perderam seu mandato, condenados por crime similar ao de que foi acusado o petista Marcelo Déda, governador de Sergipe, que, no poder, é favorito na disputa por sua sucessão.

Ao contrário de Lula, seu principal adversário, José Serra, não deu sinais de ter aprendido as lições da derrota de 2002. Ao se negar a disputar a indicação em prévias, como pretendia o ex-governador mineiro Aécio Neves, deu-lhe a justificativa de que este precisava para ficar fora da ingrata rinha presidencial. A não insistir com o partido e o próprio Aécio para formar chapa com este, deu outra mostra de que pretendia alcançar o inalcançável: ganhar a disputa pela Presidência sem dever favores. Ao manter fora da campanha um tucano que vencera duas vezes a eleição federal sem disputar segundo turno, Fernando Henrique, emitiu, a quem fosse capaz de entender, o sinal de que não se dispunha a buscar ajuda nem mesmo do próprio passado, e o renegou.

Dilma, cujo currículo desautorizava a aventura de disputar contra um político bafejado pela vitória nas urnas nos maiores município e Estado do País, contou com a ajuda esperada, embora absurda, do adversário. Onze entre dez interlocutores alertaram Serra de que a chave para sua vitória seria manter o presidente popular fora da campanha. Mas ele expôs o retrato de Lula em seu primeiro programa de propaganda na TV e apelidou-se de Zé chamando-o de Silva (de quem terá sido a ideia tola?) no primeiro jingle para rádio. Fez ainda aos adversários o favor de deixar que o atrapalhado presidente nacional de seu partido, Sérgio Guerra (PE), pedisse a impugnação da adversária porque a Receita havia quebrado o sigilo fiscal da filha Verônica.

A possibilidade, aventada pelo Datafolha, do segundo turno pode abalar a empáfia palaciana, mas em nada alterará os fundamentos das evidências citadas. A experiência de 2006 deve ter ensinado aos tucanos que provocar o segundo turno é uma coisa. Mas vencê-lo é outra!

Jornalista e escritor, é editorialista do "Jornal da Tarde

A via sindical para o poder :: Leôncio Martins Rodrigues

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

"Eu sou torneiro mecânico e é a única coisa que eu sei fazer... Não tenho pretensões políticas; não sou filiado a partido político e tenho certeza de que jamais participaria da vida política porque eu não sirvo para político." Essas frases são de Lula e foram pronunciadas numa entrevista ao Programa Vox Populi, da TV Cultura, de maio de 1978, quando era ainda presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo. O presidente estava sendo modesto na avaliação de sua capacidade para a política. Para a sorte de alguns e azar de outros, não voltou para a fábrica nem para o sindicato.

A trajetória de Lula não é incomum na história do sindicalismo mundial. Quando os sindicatos eram frágeis e frequentemente clandestinos, a atividade sindical era mais uma missão do que uma profissão, missão que poderia dar cadeia e perda do emprego. Mas, na maioria dos países capitalistas, os sindicatos transformaram-se em poderosas, ricas e complexas organizações de massa. Como uma das mais bem-sucedidas instituições das sociedades capitalistas, transformaram-se numa via de ascensão social e econômica e, em alguns casos, de ascensão política para seus dirigentes.

No Brasil, antes de Lula, outros sindicalistas haviam tentado entrar para a classe política. A maioria o fazia pela via do PTB ou do PCB, portanto, de um modo subordinado às chefias partidárias. O caso do PT inverteu o processo: foram os sindicalistas que criaram o partido. Apesar da presença de outros segmentos sociais que ajudaram a viabilizar o PT - como a ala progressista da Igreja Católica e da intelligentsia de esquerda -, os sindicalistas constituíram sempre a facção dominante do partido. Controlavam a Articulação, considerada de direita pela esquerda petista. Dessa facção, à qual Lula pertencia, saíram os principais dirigentes do PT para as diferentes instâncias da estrutura de poder: Presidência da República, Ministérios, governadores, prefeitos e os vários níveis do Poder Legislativo.

Tomemos como exemplo a Câmara dos Deputados. Refletindo o fortalecimento do sindicalismo e dos partidos de esquerda, a bancada sindical cresceu. Na legislatura de 1991-1995 (pelos dados do Diap) havia 25 ex-diretores de sindicatos no Congresso. Na legislatura seguinte, o número foi para 36. Passou em seguida para 44. Na legislatura que resultou da eleição de 2002 (primeira eleição de Lula) chegou a 74. Para o Senado da República, cinco sindicalistas foram eleitos, todos do PT. Pode-se, de outro ângulo, perceber a forte vinculação do PT e do PCdoB com a estrutura sindical no fato de metade dos deputados desses dois partidos ter sido de diretores de sindicatos (53.ª legislatura, 2007-2010).

Mas na eleição de 2006, contrariando a tendência até então observada, nenhum sindicalista foi eleito para o Senado. Para a Câmara o número caiu para 56: 41 eram do PT, seis do PCdoB e três do PDT. Os demais dividiram-se entre PPS, PV (dois cada), PMDB e PSB (um cada). Um dos fatores que explicam esse declínio da bancada sindical foi a queda da votação no PT. Na eleição anterior, 91 petistas tinham sido eleitos. O PT transformara-se no maior partido da Câmara. Contudo, na legislatura seguinte, o PMDB, com 89 deputados, ultrapassou o PT, que ficou com 83. Uma vez que o PMDB está longe de ser um partido de sindicalistas, seu crescimento, acompanhado do pequeno declínio do PT, provavelmente foi uma das razões da diminuição da bancada sindical.

A manutenção da estrutura corporativa, juntamente com o fim dos controles antes exercidos pelo Ministério do Trabalho, transformou a instituição sindical numa via de entrada "por cima" na classe política. Na 53.ª legislatura (eleição de 2006), quase a metade dos parlamentares do PT e do PCdoB que foram diretores sindicais começou a carreira política elegendo-se diretamente para a Câmara. Apenas cerca de um terço teve uma trajetória mais sofrida, começando pela vereança.

Em princípio, a considerar a denominação oficial dos sindicatos brasileiros, além de representantes do povo, todos os ex-sindicalistas seriam representantes dos "trabalhadores". O termo comumente leva a pensar no operário manual. Na década de 1960, a figura que mais comumente o representava era o João Ferrador, que trazia estampada em sua camisa a frase ameaçadora: "Hoje eu não tô bom."

Mas a composição social das classes assalariadas mudou. E também a do sindicalismo. Os sindicatos em que predominavam trabalhadores manuais do setor privado perderam força. Os sindicalistas na Câmara são em sua ampla maioria de classe média, não manuais, do setor público, em que se destacam professores e bancários. Quase 70% dos membros da bancada sindicalista têm curso superior completo.

Não seria possível analisar mais detidamente a influência desse "fator sindical" na política brasileira, mas avancemos sumariamente duas observações. De um lado, ele aumenta o peso político dos segmentos assalariados das classes médias sindicalizáveis, que no momento, em aliança com o PT, empreendem a colonização do aparelho de Estado. Pode, desse ângulo, ser entendido como um fator de democratização social relacionado a uma mudança na elite política e social e na popularização da classe dos políticos profissionais. De outro lado, uma vez que os ex-sindicalistas vêm das estruturas corporativas, num movimento de retroação, a bancada sindical tende a reforçar o peso das instituições, dos interesses e valores corporativos na sociedade brasileira. Ao fim e ao cabo, se todos os demais fatores permanecerem iguais, o fator sindical tende a enfraquecer a democracia representativa, que sempre convive mal com a política de massas e os impulsos populistas que nela despontam.

Ex-professor titular dos Departamentos de Ciência Política da USP e da UNICAMP, é autor de "Destino do sindicalismo"

O tom do recado:: Míriam Leitão

DEU EM O GLOBO

A pergunta feita a um empresário, numa conversa com várias pessoas, foi: "É verdade que emissários do PT telefonam para empresas avisando que sabem quem não está fazendo doações para a campanha?" O empresário respondeu: "Para mim, telefonaram e foram pessoalmente dizer que notaram que eu não tinha feito doação na última eleição nem tinha feito ainda nesta."

Eu ouvi essa conversa estarrecedora. Esse tipo de encaminhamento do pedido de doação, se estiver generalizado, é uma forma de ameaça. A frase: "Notamos que você não fez doação na última eleição e ainda não fez nesta" pode ser entendida pelo que está embutido: estamos de olho em você.

O Estado, hoje, é quem concede a maioria do crédito; o BNDES aumentou de forma extravagante suas concessões de empréstimo subsidiado e a arbitrariedade de suas escolhas dos "campeões", que o faz negar créditos a alguns e conceder em excesso a outros que, na visão do banco, estão mais aptos a vencer a competição global. A mistura é explosiva: de um lado, um Estado com poder de vida e morte sobre as empresas; de outro, emissários do partido do governo com uma ameaça embutida na formulação do pedido.

Hoje, um dos grandes riscos que a sociedade brasileira corre é exatamente esse poder excessivo do Estado, controlado como donataria pelo partido do governo. O Estado é o grande comprador, o grande financiador, o grande sócio em qualquer empreendimento. Como ficar contra ele? Por outro lado: ficando a favor dele, que grandes vantagens se pode ter! Os empresários só falam mal do governo se seus nomes não aparecerem; todos eles estão sendo beneficiados por alguma grande obra, algum grande contrato, alguma licença; ou sonham ser beneficiados no futuro. Um dos maiores empresários do país foi chamado para uma conversa cheia de ameaças indiretas por ele ter feito declarações contra uma das polêmicas obras que promete ser sorvedouro de dinheiro público.

O governo cooptou movimentos sociais, sindicalistas, parte do movimento cultural, através da distribuição de benesses, patrocínios, contratos e financiamentos. Mas a cooptação dos empresários é mais direta. Algumas empresas não têm capacidade alguma de bancar os empréstimos que recebem, ou outras são viabilizadas por aderirem aos grandes projetos em que todo o risco é público.

Nas sombras de um Estado gigante, tudo viceja, como os intermediários de negócios, mesmo que eles não tenham delegação para entregar o que prometem. Com um Estado todo poderoso, qualquer espertalhão pode dizer que é a ligação direta com quem decide e pedir uma comissão para isso. Mesmo que não houvesse casos de corrupção, comprovadamente ligados ao governo, ainda assim, seria o ambiente certo para a propagação dos casos nebulosos de pedidos de propina.

A redução do tamanho do Estado faz esse favor ao país: diminui os guichês nos quais se oferecem favores com dinheiro público e se pedem em troca comissões para enriquecimento pessoal ou para o partido que está no poder. A privatização tirou do Estado um sem número de cargos de distribuição política em empresas siderúrgicas, concessionárias de serviços de energia e de telefonia. As empresas que o país decidiu manter estatais deveriam ser isoladas das pressões políticas e concederem mais acesso às suas contas e aos critérios de decisão. Essa seria uma forma de reduzir o risco que o contribuinte e o consumidor dos serviços correm hoje com problemas como os dos Correios. Já houve tantos casos nebulosos nos Correios no governo Lula - dos indicados do ex-aliado Roberto Jefferson até os indicados da ex-primeira-amiga Erenice Guerra - que não resta dúvida a esta altura: a melhor forma de produzir um colapso postal no país é continuar entregando os cargos de direção da estatal na mão dos políticos e seus afilhados e evitar a administração profissional da empresa. É um espanto que se consiga em tão pouco tempo provocar tanto extravio numa empresa centenária e que sempre teve reputação de eficiência.

Há quem considere que a melhor forma de evitar constrangimentos como o vivido pelo empresário que cito no começo dessa coluna é o financiamento público exclusivo de campanha. Como ser ingênuo a ponto de achar que, se o Estado der ainda mais dinheiro para os partidos, os que estão hoje viciados em caixa dois fecharão o balcão de pedidos impróprios aos empresários? O que ajuda a resolver o problema é, como tenho escrito aqui, a trindade: punição, fiscalização, transparência.

Nada é panaceia contra a corrupção, mas há formas de reduzi-la e outras de aumentá-la. O gigantismo do Estado é o caminho mais curto para aumentar a corrupção. Quando ele se torna o parceiro inevitável em qualquer negócio, tudo pode acontecer. Quando seu poder é usado para amedrontar as empresas, qualquer doação para campanhas políticas pode ser extorquida. E o que houve nos últimos anos no Brasil foi o crescimento descomunal do Estado, primeiro, à sombra do Plano de Aceleração do Crescimento e, depois, sob o pretexto de que era preciso evitar a crise econômica mundial. Conter esse gigantismo é fundamental hoje, não apenas por razões econômicas, mas para melhorar a qualidade da democracia brasileira.

Programa eleitoral na TV é ficção:: Rosângela Bittar

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Se há marca do primeiro turno, foi a ausência da política

Por mais que se procure nos discursos, nos programas de governo, nas entrevistas, nas reuniões partidárias e nas exibições de televisão do horário eleitoral gratuito, desta campanha eleitoral que se encerra em primeiro turno esta semana, não se encontra a política. Foi uma campanha de pouca, ou nenhuma política.

Dos três principais candidatos a presidente foi José Serra (PSDB) quem mais cuidou de lançar ao seu eleitorado algumas ideias - começou em março - sobre o que vem pensando ser importante hoje, para o Brasil. Aí apareceram, antes de outros, considerações em torno de uma política sobre uso drogas e atenção a deficientes físicos, uma reflexão mais abrangente sobre a segurança pública, indicações de programas específicos para melhorar a qualidade dos serviços públicos no país, da educação à saúde, alguns dos flagelos nacionais que persistem. Entre outros.

Foi o primeiro a propor - lá naqueles idos - e insistir, até para viabilizar sua candidatura, que a campanha se desse em torno da discussão de propostas e soluções. Queria que o eleitor comparasse a qualificação dos candidatos. Não encontrou eco, e recuou quando a campanha entrou na sua fase formal.

A candidata Marina Silva (PV) quis tanto fugir das críticas sobre o fato de ser monotemática que fez sumir de seu discurso as questões de fundo relacionadas ao ambiente. Repetir exaustivamente a palavra prioridade, tudo sendo prioritário, nada é, e a divulgar, ela sim, a única, um programa de governo completo e extenso com avalanches de prioridades, ao TSE. Quando mencionou uma preocupação específica, com o uso abusivo do crack no país, e o governo Lula lançou imediamente um programa nessa área, no afogadilho da campanha, recolheu suas ideias para evitar plágio.

A candidata favorita, em primeiro lugar em todas as pesquisas de intenção de voto, Dilma Rousseff (PT), defendeu, em síntese, a continuidade. O governo Lula é bem avaliado, popular, e quer continuá-lo. Continuar o quê? Preferiu não entrar em detalhes certamente por ser óbvio que, como candidata do presidente, continuaria tudo que o eleitor aprova, mas não poderia anunciar descontinuidade do que pretende corrigir para não ser indelicada com seu criador.

Aí chegaram os programas de televisão no horário eleitoral gratuito e, neles, salpicados aqui e acolá, uma rede de creches, duas de ambulatórios, o aumento do percentual do PIB para uma área, ou outra. Relevância e credibilidade zero.

A política se esgotou nas preliminares, a formação das coligações. Que resultaram em definição do tempo de propaganda na televisão. Onde a política não apareceu.

Nesta campanha, se houve, ninguém percebeu uma discussão sobre o assunto mais momentoso do país, há dois anos na agenda, a nova proposta de exploração do petróleo. Ou se a capitalização da Petrobras deveria ter sido feita em um momento difícil como este, de campanha e a empresa perdendo parte do seu valor. Não se trata de não fazer, mas de discutir.

Onde se deu a discussão sobre o modelo de energia do país, que ainda submete o eleitorado a apagões sucessivos como nos últimos dez anos? E as medidas provisórias, que viraram instrumentos únicos de governo, distorcendo a relação entre os poderes? As reformas são assunto vetado em campanha eleitoral porque incomodam corporações, que têm e puxam voto, ficaram de bom grado ausentes.

O mesmo se dá com a criação de impostos, que oneram a classe média assalariada e nenhum candidato quer assumir sua intenção de recorrer a esta arrecadação fácil, subentendida na pseudo defesa de mais verbas para a saúde. Deixam o dilema na mão do eleitor. A corrupção política, um tema forte sempre presente até em sociedades mais desenvolvidas, foi agora atropelado pela interdição do debate, pela intimidação promovida por quem se sentiu mais atingido em suas perspectivas eleitorais.

Nem a internet, que ensaiou ser uma presença inovadora no início, principalmente pela repercussão em noticiários de meios de maior alcance, e poderia ser o veículo para a política, vingou até o fim. A campanha de primeiro turno, em 2010, foi o programa de TV, e, esse, tem sido ficção quase pura, até para ter alguma audiência.

Em seu livro "Emoções Ocultas - Estratégias Eleitorais", o sociólogo Antonio Lavareda havia previsto que neste, e nos próximos ciclos eleitorais, a televisão continuaria jogando as principais cartas. Hoje constata que no primeiro turno de 2010 foi mesmo absolutamente preponderante.

Mas acha que o bom senso dos envolvidos vai levar à mudança, numa reforma das normas de campanhas eleitorais, desses programas em bloco, por serem inócuos. "A audiência diminui sensivelmente quando entram na programação, são um transtorno para as pessoas, um estorvo para as campanhas porque constituem o principal item do seu orçamento e o menos útil". A audiência medida em pesquisas, diz Lavareda, anota as pessoas que estão com a TV ligada, sem prestar atenção, porque na verdade não chegam a 15% os que estão vendo, de verdade.

"Em grande medida essa audiência é composta de aficionados, assim como quem assiste jogo de futebol é torcedor de futebol. Não se conhece ninguém que tenha mudado de time assistindo o jogo de futebol pela TV". Em sua opinião, uma reforma simples das normas de campanha poderia fragmentar esses blocos, diluir a propaganda nos comerciais, que teriam ampliado o tempo de sua exibição, inclusive para durar todo o período de campanha legal, que começa em julho. Como os comerciais são mais frequentes, o registro de memória é maior. As campanhas seriam não só menos caras, mas mais úteis.

Profissionais que trabalham em campanha adversária à do ex-presidente Fernando Collor, em Alagoas, que disputa o governo, estão impressionados com o percentual de jovens entre seus seguidores. São pessoas que, em 1991, tinham acabado de nascer, e para quem, hoje, com o título de eleitor em mãos, um Fiat Alba é o carro da namorada. Collor, como fez quando candidato a presidente, trabalha orientado por pesquisas, e apostou nesta faixa etária. O Rap pontua toda a sua propaganda.

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

Marolinha vermelha:: Marco Antonio Villa

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Campanha sem ideologia é o que sempre quis o governo; caso ocorra segundo turno, o artifício deverá ter vida curta

A soberba faz mal a política. A eleição não está decidida. A onda vermelha, parece, não passou de uma marolinha.

A avidez dos apoiadores, que já estavam dividindo os cargos do futuro governo, foi contida. A comemoração da vitória, antes do apito final do juiz, pode explicar a violência dos ataques à liberdade de imprensa e à oposição em geral.

É importante para o país uma discussão de programas e propostas. Até o momento, a campanha ficou resumida ao protagonismo de Lula e às graves denúncias envolvendo ministros e aliados do governo. É preciso muito mais que isso.

Os debates entre os presidenciáveis foram inúteis. Viraram monólogos. O enfrentamento democrático entre candidatos acabou se transformando numa repetição enfadonha de promessas, recheadas de números, sem sentido algum.

Ninguém aguenta mais debates que não são debates, onde as grandes questões nacionais são ignoradas. Até os ataques aos adversários são mal elaborados. O cronômetro, indicando que o tempo para a resposta do candidato está terminando, é o melhor aliado do telespectador.

O desinteresse popular é evidente. A ausência de política empobreceu a eleição. A repetição das velhas fórmulas esgotou a paciência do eleitor.

A falsa euforia do corpo a corpo nas ruas, que serve simplesmente para obter imagens para a TV, é a melhor representação de uma campanha pobre de ideias e recheada de marketing vazio.

Para a estratégia do governo é essencial despolitizar a eleição. Transforma-la em um plebiscito. As diferenças políticas devem ser diluídas.

Daí que não causa estranheza a aliança oficial combinar o apoio do empresariado, com os beneficiados pelos programas assistencialistas e os dirigentes sindicais amarelos.

Nesse coquetel infernal deve ser acrescentado o apoio dos oligarcas estaduais. Barbalho, Sarney, Calheiros e Collor servem para obter votos nos burgos podres. Mas é o típico apoio envergonhado: nos grandes centros seriam hostilizados.

Uma campanha sem ideologia sempre foi o desejo do governo. Até este momento conseguiu o seu intento. Caso ocorra um segundo turno, o artifício deverá ter vida curta.

A polarização, com a apresentação de dois projetos para o país, é tudo o que Lula não quer. Os candidatos terão tempos iguais na televisão. E nos debates o confronto será inevitável.

A oposição vai ter um teste de fogo. Terá de apresentar um programa de governo. Mostrar unidade e combatividade. E realizar algo que tinha esquecido nos últimos tempos: fazer política.


Marco Antonio Villa é professor do Departamento de Ciências Sociais da UFSCar

Últimas semanas:: Wilson Figueiredo

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Ao fim de uma semana em que os fatos prevaleceram sobre as versões oficiais e ameaçaram deixá-lo em posição insustentável diante do escândalo na edícola em que se transformou sua Casa Civil, o presidente Lula, enfim, se deu conta da conveniência de melhorar a situação criada com os jornais. Não demora, a contagem regressiva estará nos seus calcanhares. Dispõe de três meses para fazer as malas e desfazer situações que não pode deixar como estão. Não quer, ao por os pés fora do governo, que o tempo possa piorar e ele tenha esquecido o guarda-chuva em casa.

No dia seguinte à passagem do poder a outras mãos, o presidente não escapará de experimentar a sensação desagradável de que a famosa roda da história passou a girar ao contrário. Nem sentir o chão fugir-lhe aos pés antes de fazer uma revisão geral da engrenagem que o levou ao poder sem lhe garantir o terceiro mandato. As incógnitas pela frente precisam ser resolvidas.

O primeiro tranco, dado pelo mensalão na Casa Civil, não foi assimilado em toda a extensão. Pela mão de denúncias terceirizadas, o presidente precisou de novo vir a público, no segundo mandato, para se declarar, uma semana depois, enganado pela ex-ministra Erenice Guerra. Já deve ter percebido que perdeu uma das melhores oportunidades de ficar calado quando disse cobras e lagartos dos jornais, sem considerar a precedência histórica do jornalismo, que já existia muito antes dos jornais. Põe tempo na distância. Jornais não existem para louvar governos e muito menos para poupá-los. A prova é que o próprio PT não quis se valer de jornais petistas para servir aos governos com que operou. O cemitério de jornais não tem espaço para mais nenhum periódico que venha a morrer de governismo anacrônico. A Ultima Hora inovou no jeito de servir ao governo de Getúlio Vargas, que foi seu padrinho: Samuel Weiner criou o modelo de expor os ministros e distanciar de fatos desabonadores o presidente. Nem assim. O jornalismo oficial não tinha vacina para imunizá-lo contra o vírus da notícia a favor. Entende-se perfeitamente a razão pela qual, não tendo disposição de investir em jornal próprio, o PT tente cercear a liberdade de informação e as demais dela decorrentes. Freud sempre explica.

Na Casa Civil, na opinião presidencial, “se alguém acha que (...) pode se servir, cai do cavalo”. Evidente que Lula estava falando em tese, pois ali ainda não existem cocheiras, cavalos ou cavaleiros. Quem trabalha com ele sabe que “a pessoa pode me enganar um dia, mas não engana todo mundo todo dia”. Ele pode. Mas omitiu o autor da frase e não citou o pensamento completo do presidente Lincoln, que não quis enganar ninguém nem depois de morto.

Mas o que importa mesmo, além da exportação, é que Lula fala cada vez mais: “Não foi a oposição que derrubou Erenice, mas os indícios de que ela tinha errado no cargo”. Aquele “ela tinha” deixou mal tanto um quanto a outra. A oposição acabou bem. O presidente estava certo quando ressalvou que não foi a oposição que passou o pente fino na Casa Civil, mas injusto com os jornais, por não reconhecer, nas denúncias, contribuição dos empresários à moralidade pública. Aquela pequena história do rapaz que, no segundo dia de trabalho, encontrou sobre a mesa um pacote com 200 mil reais e cometeu a imprudência de perguntar a razão do presente adiantado, é das arábias.

E, insatisfeito com o que diz, Lula propôs outra obrigação ao jornalismo: “os meios de comunicação devem anunciar seus candidatos e partidos”. Alguém por perto poderia tê-lo prevenido de que a maneira indireta e elegante por parte dos jornais é, tanto quanto possível, repartir com equidade o espaço do noticiário de campanhas eleitorais. A preferência fica implícita. Alguns já adotam o modelo dos grandes jornais internacionais e, na véspera da eleição, comunicam em editorial as razões pelas quais recomendam um dos candidatos. Em respeito aos eleitores, o Jornal do Brasil adotou (e se deu bem ) o método de apresentar as razões de contribuir para atender à diversidade de opiniões em proveito da democracia.

Estratégia de Serra precisará mudar, diz Aécio

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Para Aécio Neves, a campanha de José Serra (PSDB) precisará de um "freio de arrumação" se ele passar ao segundo turno. O ex-governador de Minas defende maior participação de líderes regionais e adoção de propostas do PV.

Serra precisa mudar no 2º turno, diz Aécio

Favorito ao Senado, ex-governador mineiro afirma que PSDB deve incorporar propostas do PV para atrair Marina

Tucano afirma que, num eventual segundo turno, a campanha do PSDB terá de ouvir mais as lideranças regionais

Fernando Rodrigues
Enviado especial a Belo Horizonte (MG)

"Vou colocar um blaser", diz Aécio Neves, 50, antes de falar ao UOL e à Folha ontem em seu apartamento em Belo Horizonte. De calça jeans, ele transmite tranquilidade. Está com 67% de intenção de votos para o Senado. Seu candidato ao governo de Minas Gerais, Antonio Anastasia (PSDB), lidera as pesquisas.

Animado com o Datafolha indicando possibilidade de haver segundo turno na disputa presidencial, ele sentencia sobre o que fazer após 3 de outubro na campanha de José Serra: "Teremos de dar um freio de arrumação".

Como assim? Para Aécio, é preciso usar mais líderes regionais na campanha -como o paulista Geraldo Alckmin e o mineiro Anastasia. Num segundo turno entre Serra e Dilma Rousseff (PT), Aécio julga essencial atrair o apoio de Marina Silva: "Não é apenas o apoio formal da candidata. É o PSDB se aproximar e incorporar algumas propostas do PV". Leia trechos da entrevista, cujo vídeo pode ser visto no UOL (uol.com/aneves):

Folha - PSDB errou ao não fazer prévia para escolher o candidato a presidente?

Aécio Neves - Gostaria que tivesse havido. Mas como não houve, seria incorreto voltar ao assunto agora. Hoje sou parceiro do Serra. A diferença é abissal entre a história e a qualidade do Serra e a da Dilma, sem demérito para ela. Mas as histórias são muito distintas. Serra é um líder, suas ideias são conhecidas. Dilma ainda é só o reflexo de um líder.

Fernando Henrique Cardoso disse que a eleição já estaria decidida a favor de Dilma. Por que ele fez essa afirmação?

Ele me disse que o sentido foi outro. Fernando Henrique é um líder importantíssimo do partido e eu faço "mea culpa". Acho que deveríamos ter sido mais afirmativos na defesa do governo dele.

O que o PSDB deve fazer se Serra for ao 2º turno?

Nós teremos de dar um freio de arrumação. O fato de nós, lideranças políticas regionais, estarmos com nossas situações solucionadas, espero que para o bem, nos permitirá um tempo maior e uma participação maior, inclusive nas decisões políticas da campanha. Cito dois Estados. Uma vitória em São Paulo com o Geraldo [Alckmin] e uma vitória aqui em Minas com o Anastasia. São os dois principais colégios eleitorais e têm efeito prático no segundo turno. Além de desmobilizar as oposições regionais, há uma vinculação natural dos prefeitos e dos líderes políticos em torno do governador eleito. Esses governadores terão um poder político eleitoral maior. Isso pode ser uma alavanca vigorosa para o Serra no segundo turno.

O que sr. chama de freio de arrumação?

Uma politização maior da campanha. Um diálogo mais permanente da campanha. Eu não culpo o Serra por isso. A campanha tem sua dinâmica. O Serra está se desdobrando. Quem acompanha o Serra tem de reconhecer o esforço pessoal que ele está fazendo. Com a cara boa, por mais que alguns achem que isso seja difícil, mas com a cara boa onde ele vai. Estivemos agora em Diamantina, num evento espetacular. Ele está muito à vontade. Passa um disposição enorme. Mas tem faltado tempo para que a gente discuta mais politicamente. Porque determinado discurso no Sul não é o mesmo que cola no Nordeste.

Quais seriam os discursos?

É preciso que nós regionalizemos um pouco o discurso. Não dá para ter o mesmo discurso, a mesma construção política de comunicação para um Brasil tão diferente com este. A primeira iniciativa seria uma conversa com as principais lideranças que nós temos no Nordeste. Por onde ir? Como enfrentar essa questão do Bolsa Família?

Se houver segundo turno entre Dilma e Serra, o sr. acha possível atrair Marina Silva?

Ela tem sido muito crítica a Serra. Ela também tem sido crítica em relação a Dilma. Mas não é apenas o apoio formal da candidata. É o PSDB se aproximar e incorporar algumas propostas do PV. Isso não será difícil até em função das alianças regionais. Aqui em Minas PSDB e PV governaram juntos oito anos. Mas vamos respeitar a Marina, que ainda está postulando.

Por que o PSDB nunca se organizou de forma profissional como PT?

Esse é um grande desafio. O PSDB pode ser um partido mais nacional do que é hoje, renovando o seu discurso. A meta principal da ação política do PSDB era o fim da inflação, que ocorreu. Mas o Brasil e o mundo mudaram. As prioridades deixaram de ser aquelas. O PSDB, ganhando ou não as eleições, tem que renovar-se. Há uma sucessão geracional clara dentro do partido. É preciso que revisitemos o nosso programa e apontemos para o futuro.

A revista "Carta Capital" afirmou que o sr. deseja trocar de partido no ano que vem. O sr. vai mudar de partido?

Disse ao diretor da revista que aquilo era um absurdo. Não me ouviram.

"Sangria" de Dilma chega a 6 mi de votos

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Nova classe C concentra a maioria dos eleitores que desembarcaram da candidatura do PT nas duas últimas semanas

Marina Silva foi a maior beneficiada pela queda da petista e conquistou 4 mi de eleitores; Serra ganhou cerca de 2 mi

Fernando Canzian

DE SÃO PAULO - A candidata do PT à Presidência da República, Dilma Rousseff, perdeu cerca de 6 milhões de votos nas duas últimas semanas.

Mais da metade dessa "sangria" (cerca de 3,6 milhões de votos) se concentrou exatamente na parcela da população mais beneficiada pelas políticas social e econômica do governo Lula: a chamada nova classe C.

Segundo o Centro de Políticas Sociais (CPS) da FGV-RJ, quase 30 milhões de brasileiros ascenderam à classe C a partir de 2003.

A candidata do PV à Presidência, Marina Silva, foi a maior beneficiada por essa migração de votos. Ela conquistou cerca de 4 milhões de eleitores no período. Serra ganhou cerca de 2,3 milhões.

Os números foram calculados com base em pesquisa Datafolha divulgada ontem. Nela, Dilma tem 46% das intenções de voto. Serra fica com 28%; e Marina, 14%.

A pesquisa tem margem de erro de dois pontos percentuais, para mais ou para menos. Isso explica diferenças nos resultados conforme os cortes feitos, por renda ou escolaridade, por exemplo.

As duas últimas semanas foram marcadas pelas denúncias de quebra de sigilos fiscais de tucanos e de seus familiares, pela queda da ex-braço direito de Dilma na Casa Civil, a ex-ministra Erenice Guerra, e por uma profusão de críticas da petista e do presidente Lula à imprensa.

A perda desses cerca de 6 milhões de eleitores (em um total de 135 milhões) não garante mais a vitória de Dilma no primeiro turno.

Esse era o cenário mais provável no início de setembro. Agora, ela tem 51% dos votos válidos de que precisa. Para não haver segundo turno, Dilma necessita ter 50% dos válidos mais um voto.

Considerando os limites da margem de erro, ela pode ter hoje 49% ou 53%.Nas duas últimas semanas, Dilma perdeu eleitores ou oscilou para baixo em todos os estratos da população.

No geral, o maior desembarque de sua candidatura se deu entre os eleitores com renda familiar mensal entre 2 e 5 salários mínimos (R$ 1.020 e R$ 2.550). Cerca de 34% dos eleitores estão incluídos nessa faixa.

A classe de renda entre 2 e 5 salários mínimos é mais representativa no Sudeste (40%) e no Sul (37%). Ela é bem menor no Nordeste (21%) -onde Dilma ainda lidera com enorme vantagem.

Para o CPS/FGV, fazem parte da nova classe C os que têm renda familiar mensal entre R$ 1.126 e R$ 4.854.

"Os que ascendem em termos econômicos tendem a ficar mais conservadores, assim como passam a conquistar mais escolaridade", diz Marcelo Neri, coordenador do centro da FGV.

"O Brasil vem apresentando o melhor desempenho econômico em termos relativos e absolutos dos últimos tempos. O impacto sobre Dilma é algo que vem de fora do bolso", afirma Neri, em referência às denúncias e casos de corrupção no governo.

Para Alessandro Janoni, diretor de pesquisas do Datafolha, é nessa "classe emergente" que Dilma perde mais em números absolutos.

"Pois ela é bem maior do que a classe média tradicional, com alta renda e escolaridade, mas de tamanho bastante limitado no Brasil."

Em termos de escolaridade, a maior perda para Dilma se deu entre eleitores que têm ensino médio (38% do total). Dilma perdeu cerca de 2,5 milhões de votos aí.

Desse total, cerca de 2 milhões de eleitores migraram em proporções iguais para as candidaturas Serra e Marina. Os demais engordaram o bloco dos indecisos.

Chance de 2° turno altera estratégias das campanhas

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Petistas preparam reação à queda de Dilma, Serra prefere cautela, e Marina ataca os dois na reta final

A quatro dias da eleição, pesquisa Datafolha que aponta a possibilidade de a disputa presidencial ser levada para o segundo turno alterou a estratégia das campanhas, que se intensificaram. No comitê de Dilma Rousseff, dirigentes reconhecem que ela sofreu um revés - segundo a pesquisa, a vantagem da petista sobre a soma dos demais candidatos caiu de sete para dois pontos porcentuais, e ela teria, agora, 51% dos votos válidos. O presidente Lula se reuniu com a cúpula da campanha para dar o tom da reação. Já entre os tucanos, a intenção agora é que José Serra seja cauteloso, para não interferir na aparente tendência de queda de Dilma. Para eles, um eventual segundo turno não será resultado da campanha de Serra, mas de fatores externos, e ela terá de ser modificada. Marina Silva (PV), por sua vez, passou a atacar tanto Dilma quanto Serra, embalada por seu crescimento nas pesquisas. O comando da campanha quer caracterizar os dois como iguais e Marina como alternativa.

Pesquisa que aponta chance de 2º turno faz candidatos adaptarem estratégias

Serra evita polêmicas e torce pela queda de Dilma, que continua à frente nas pesquisas; Marina, ao contrário, engrossa críticas aos rivais

A divulgação, ontem, de mais uma pesquisa Datafolha deu novo ânimo à corrida presidencial. A quatro dias das eleições e a dois do final da campanha em rádio e TV, os números indicam que a vantagem de Dilma Rousseff (PT) sobre seus rivais foi reduzida de sete para dois pontos, abrindo-se a possibilidade de a disputa ser levada ao segundo turno. Segundo a pesquisa, Dilma caiu de 49% para 46%, José Serra (PSDB) manteve seus 28% e Marina Silva (PV) oscilou de 13% para 14%. A petista teria, agora, entre 49% e 53% dos votos válidos.

O impacto desses números era visível, ao longo do dia, na rotina dos candidatos. A queda da petista acendeu um sinal amarelo em seu comitê de campanha, onde se discutiu a possibilidade de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fazer, nos dias finais, algum apelo ao eleitorado. É inegável a preocupação, no Planalto, com a divulgação de boatos que a prejudiquem ou com o risco de novas denúncias contra o governo. Serra, que passou o dia em Salvador, manteve a estratégia, adotada há vários dias, de evitar polêmicas, não "inventar moda", torcer para que Dilma continue em queda e evitar críticas a Marina, de olho no eleitorado do PV no segundo turno. E a candidata dos verdes, que está em alta, faz o caminho inverso: reduz os elogios aos governos Lula e FHC e tenta subir aumentando o tom de suas críticas aos dois rivais.

Serra: a ordem é 'não inventar moda' e 'não correr riscos'

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Líderes da oposição não aprovam a campanha e dizem que em um 2º turno discurso tem de ter foco e identidade

Christiane Samarco, Ana Paula Scinocca

BRASÍLIA - Não correr riscos de nenhuma natureza, "não inventar moda" e apenas "surfar" na onda que pode levar ao segundo turno o candidato tucano à Presidência, José Serra, aproveitando a tendência de queda nas pesquisas da candidata Dilma Rousseff (PT), e a subida consistente de Marina Silva (PV). "O Serra agora tem que pegar um veleiro e ir velejar", resume, bem-humorado, um dos principais dirigentes da oposição.

Os estrategistas da campanha tucana dizem que Serra "não tem nenhuma carta na manga" para virar votos de indecisos à última hora. A ordem é ser cauteloso e não atrair nenhum fato polêmico ou negativo.

Líderes tucanos e aliados advertem, no entanto, que, no eventual segundo turno, a campanha vai precisar virar de ponta cabeça. Eles querem discutir o conteúdo dos discursos e das promessas por acreditar que Serra está parado nas pesquisas (em torno de 30% das intenções de voto) e que, se conseguir chegar ao segundo turno, será "por obra e graça de fatores externos". Na avaliação geral dos líderes políticos, a campanha não teve "nem foco nem identidade".

A ideia de o candidato não inovar às vésperas de os eleitores irem às urnas não é, portanto, um aval ao que vem sendo feito, e sim o reconhecimento de que a eventual passagem para o segundo turno se dará muito mais por conta da trajetória dos adversários. E é por causa disso que um analista de pesquisas que orienta o partido recomendou ao tucanato que não faça nada. "Deixem que a tendência atual se encarregue de levar Serra ao segundo turno", aconselhou.

Problemas à parte, há pelo menos 20 dias a equipe de marketing do tucano aposta no segundo turno, tomando por base os levantamentos internos feitos logo depois da exibição dos programas do horário eleitoral no rádio e na televisão. O PSDB diz que ainda não planejou uma investida sobre o PV, para garantir uma eventual parceria para a disputa de segundo turno, com apoio declarado da candidata verde Marina Silva.

Entre mais instruídos, Dilma fica em 3º

DEU EM O GLOBO

Petista caiu em todas as regiões do país e, entre as mulheres, perdeu cinco pontos

SÃO PAULO. A queda dos índices de intenção de voto da candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, registrada na pesquisa Datafolha, foi mais acentuada em algumas parcelas do eleitorado. Entre os que declaram ter curso superior, por exemplo, a petista perdeu dez pontos em duas semanas, caindo de 38% para 28%. Nessa faixa, ela está em terceiro, atrás do tucano José Serra, com 34%, e da verde Marina Silva, com 30%. Entre os que ganham de dois a cinco salários mínimos (cerca de 33% do eleitorado), Dilma perdeu sete pontos no período, passando de 49% para 42%.

No segmento do eleitorado que ganha acima de dez salários mínimos, a candidato do PT perdeu seis pontos em duas semanas, e hoje tem 30%. Está atrás de Serra que, nesse período, ganhou sete pontos e tem 41%. Marina cresceu sete pontos e passou de 19% para 26%.

Nessa última pesquisa, realizada segunda-feira, Dilma tem 46%, uma queda de três pontos em relação à sondagem anterior, semana passada. Serra se manteve estável com 28% e Marina subiu de 13% para 14%. O número de indecisos passou de 5% para 7% e os de que votam em branco ou nulo, de 3% para 4%. A diferença entre o índice de Dilma e o os demais candidatos somados (44%) é hoje de dois pontos. Considerando-se apenas os votos válidos (sem votos nulos, em branco e indecisos) é de 51% para 49%.

No Norte e no Cento-Oeste, a maior queda de Dilma por região

A pesquisa Datafolha ouviu 3.180 eleitores em 202 municípios, com margem de erro de dois pontos para mais ou para menos. Está registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com o número 32.913/2010.

Dilma perdeu pontos em todas as regiões do país. Nas nas áreas metropolitanas foi registrada uma diminuição de quatro pontos da preferência do eleitor pela candidata petista. Por regiões, a maior queda de Dilma foi registrada no Norte e Centro-Oeste onde, em uma semana, Dilma perdeu seis pontos (50% para 44%), enquanto Serra cresceu um ponto (29% para 30%) e Marina mais do que dobrou seu índice, passando de 8% para 17%.

A candidata verde também teve um crescimento expressivo na Região Sudeste, subindo de 11% para 17%; Dilma perdeu três pontos (44% par 41%) e Serra perdeu um ponto (32% para 31%). Na Região Sul, Dilma está agora em situação de empate técnico com Serra. A petista caiu de 43% para 39%, enquanto Serra caiu um ponto e hoje tem 35%. Marina, que cresceu em todas as regiões, passou de 7% para 10%.

A queda de Dilma também é expressiva entre as mulheres (cinco pontos). Ela caiu também entre na parcela de eleitores entre 35 a e 59 anos (quatro pontos). Considerando o total de votos, cada ponto representa cerca de 1,38 milhão de eleitores.

Dilma chegou a ter 12 pontos percentuais a mais que a soma das intenções de voto de todos os candidatos, há duas semanas. A petista não havia sofrido qualquer abalo de popularidade por conta do escândalo do vazamento de sigilo fiscal de tucanos e de Verônica Serra, filha do candidato do PSDB. Pelo contrário. Chegou a subir um ponto naquela época. Mas, a partir do caso Erenice, a vantagem para os demais adversários somados acabou reduzida para dois pontos, no intervalo de duas semanas.

O Datafolha também simulou um confronto direto entre Dilma e Serra num eventual segundo turno. A vantagem da petista caiu três pontos nesse cenário, em relação à sondagem anterior, semana passada. Passou de 55% para 52% das intenções de votos, enquanto o tucano oscilou um ponto para cima, e alcançou 39%.

Dilma: 27% de rejeição, seu pior índice registrado no Datafolha

A petista também conheceu nesta pesquisa sua maior taxa de rejeição, desde o início das sondagens do Datafolha. Nos últimos cinco dias, o índice de eleitores que não votam em Dilma de jeito nenhum subiu três pontos percentuais, de 24% a 27%. No entanto, Serra continua sendo o candidato mais rejeitado pelos eleitores. O Datafolha registrou oscilação de 31% a para 32%. Marina permaneceu estável em 17%.

O Datafolha também verificou a intenção de voto espontânea (sem apresentação de nomes ao eleitor), na qual Dilma continua à frente, mas oscila negativamente dois pontos percentuais, de 39% para 37%. Já Serra ficou estável em 21%, e Marina ganhou dois pontos, passando de 9% para 11%.

Para especialistas, segundo turno mais próximo

DEU EM O GLOBO

Motivos apontados são o crescimento de Marina e a exigência do título com documento de identidade

Adauri Antunes Barbosa

SÃO PAULO. A queda no índice de intenções de voto da presidenciável Dilma Rousseff (PT) e a subida de Marina Silva (PV), conforme divulgado ontem pelo Instituto Datafolha, pode levar ao segundo turno, de acordo com a análise de especialistas.

- A tendência que as pesquisas mostram é o crescimento de Marina. Ela está convencendo mais a classe média, eleitores de mais escolaridade e renda, e está tirando votos de Serra e de Dilma. Isso depois das denúncias do caso Erenice - analisou Mauro Paulino, diretor do Datafolha, que acredita que o segundo turno ainda é uma "incógnita".

- A grande incógnita é se vai ter segundo turno e quem vai disputar com Dilma. Muito provavelmente será Serra, mas nada ainda está decidido.

A tendência mostrada pelo Datafolha faz com que o professor Emmanuel Publio Dias, diretor da ESPM e especialista em marketing político, tenha certeza de que haverá segundo turno.

- Com certeza teremos 2º turno. Mas faço duas ressalvas a isso: se acontecer alguma grande bobagem no debate da TV Globo ou se Lula montar um acampamento no Nordeste, no estilo messiânico, para convocar a população a votar na Dilma.

Eleitorado esperava oposição mais firme contra o PT

Sem tanta certeza, o cientista político Rubens Figueiredo, diretor do Centro de Pesquisas e Análises de Comunicação (Cepal), acha que o segundo turno é uma tendência, para a qual um fator inusitado pode ter importância decisiva:

- É preciso levar em conta a consequência dos dois documentos pedidos para o eleitor poder votar. Qual será o nível de abstenção? A gente sabe que isso pode afetar os eleitores de menos renda e escolaridade, o que pode prejudicar a candidatura de Dilma, contribuindo para o segundo turno.

Um dos motivos do crescimento de Marina, conforme análise de Emmanuel Dias, é a mudança do voto antipetista de José Serra (PSDB) para a candidata verde.

- Serra perde votos porque o eleitorado esperava um discurso oposicionista que ele não está fazendo. O discurso "eu também vou fazer melhor" não se coloca contra Lula. Isso deixa o eleitor frustrado. Muitos eleitores do Serra, descontentes com esse discurso, estão mudando para Marina. É o voto antipetista mudando.

Para o cientista político Rubens Figueiredo, faltou aos tucanos e a Serra uma identidade com a oposição.

- O PSDB parece que renegou o passado, de coisas tão boas como o Plano Real, a revolução nas telecomunicações, a Lei de Responsabilidade Fiscal... Parece que tem vergonha do que realizou. Nessa campanha ainda houve a situação do Serra elogiar o Lula de manhã e atacar à noite.

Olhando os números das últimas pesquisas do Datafolha, Mauro Paulino observa que os segmentos de maior escolaridade e maior renda são os mais frustrados.

- Por segmento, a frustração maior é das classes de maior renda e maior escolaridade. Marina empata com Serra e os dois ficam próximos de Dilma, numericamente empate técnico. Mesmo assim é improvável que Marina supere Serra - disse, levantando ainda uma dúvida sobre a continuidade do crescimento da candidata verde: - Outra dúvida é até onde Marina vai crescer entre os eleitores mais pobres, cativos de Lula.

Serra: 'Milhões farão a cabeça até domingo'

DEU EM O GLOBO

Em visita a Salvador, Serra se diz otimista com a possibilidade de a disputa ir para o segundo turno

Fábio Fabrini

SALVADOR. Em discurso na Câmara Municipal de Salvador, onde recebeu ontem o título de cidadão soteropolitano, o candidato do PSDB à Presidência, José Serra, criticou o PT e o presidente Lula e elogiou personalidades baianas, como o ex-senador e ex-governador Antônio Carlos Magalhães, já falecido. A princípio, Serra evitou comentar pesquisa Datafolha que indica a possibilidade de um segundo turno entre ele e a petista Dilma Rousseff. Mais tarde, acabou concordando em falar, e apostou no segundo turno, destacando seu desempenho em eleições passadas.

- Falta muito tempo ainda para a votação. Milhões e milhões de brasileiros farão a sua cabeça até domingo. Continuo trabalhando - afirmou Serra.

Depois de receber o título na Câmara Municipal, ele teve um encontro com o arcebispo de Salvador, Dom Geraldo Majella. Na saída, disse estar confiante num segundo turno, e confundiu a data do pleito:

- Acho que vamos ter segundo turno. Vamos ter uma batalha ainda até o fim de novembro. Eu não sei quando é a eleição.

Informado que o segundo turno é em outubro, continuou:

-- Ah é?! Achei que era 23, 24 (de novembro).

O tucano lembrou eleições das quais participou, como em 2002, quando se especulou um desfecho ainda no primeiro turno, o que não ocorreu:

- Nesta (sic) época, ninguém achava que eu iria para o segundo turno. Depois achavam que eu teria 30%, e eu tive quase 40%. Na eleição de prefeito achavam que a Marta (Suplicy, PT) ia ganhar no primeiro turno. Eu ganhei.

Serra disse que, apesar da perspectiva de segundo turno, sua tática não mudará.

- Vocês sempre acham que há grandes estratégias. É menos planejamento do que a imprensa imagina.

Questionado se será o principal beneficiário de uma possível onda verde, com crescimento da candidata Marina Silva (PV) nas pesquisas eleitorais, ele não quis falar a respeito.

- Não vou entrar neste tipo de análise. Se você estivesse no meu lugar compreenderia.

O tucano procurou dar destaques a propostas, como a recuperação do Porto de Salvador, o funcionamento do metrô da capital baiana e a criação de um milhão de vagas no ensino profissionalizante no Brasil.

A princípio irritado, Serra, mesmo perguntado várias vezes sobre a pesquisa, só decidiu falar quando questionado sobre sondagens que indicam empate com Marina em Salvador:

-- Não estou empatado. Já houve eleição? Quando é a eleição? O que diziam as pesquisas há duas semanas? E o que dizem hoje?

No discurso na Câmara Municipal, Serra citou o poeta Gregório de Matos, que viveu em Salvador no século XVII e era conhecido como "Boca do Inferno". O tucano fez alusão ao embate entre Lula e a imprensa.

- Como esquecer o grande poeta Gregório de Matos, que nenhuma censura conseguiu barrar. Afrontou os poderosos do seu tempo, exerceu com acidez a crítica política, pagou o preço de sua ousadia, mas deixou uma obra imortal. Desconfio que se Gregório vivesse ainda hoje, talvez alguns censores que andam por aí tentassem calá-lo.

Serra destacou a importância da Bahia em momentos históricos, como na transição para a democracia em 1985. E ressaltou a importância de Antônio Carlos Magalhães, que apoiou o regime militar, como um agente importante para a democracia:

- Sem o apoio da Bahia e a liderança naquele momento de Antônio Carlos, que fundou a Frente Liberal e ajudou a eleger Tancredo Neves, não teríamos um governo democrático nos últimos 25 anos. Lembremos que o PT foi contra este governo democrático.

Aécio: 'Abre-se perspectiva de 2º turno'

DEU EM O GLOBO

Segundo o ex-governador, em Minas a vantagem de Dilma em relação a Serra e Marina também diminuiu

Adriana Vasconcelos* e Cristiane Jungblut

BELO HORIZONTE E BRASÍLIA. Os números da última pesquisa do Datafolha, sinalizando a possibilidade de um segundo turno na disputa presidencial, levaram ontem otimismo aos tucanos de todo o país. O ex-governador mineiro Aécio Neves falou, por telefone, com o candidato do PSDB à Presidência, José Serra, que não escondia sua satisfação com a mudança no cenário. Segundo Aécio, agora há uma perspectiva real de segundo turno. Ele ressaltou que, assim como no cenário nacional, a vantagem da candidata petista, Dilma Roussef, em relação a Serra e à candidata do PV, Marina Silva, também diminuiu em Minas Gerais.

- Acho que agora abre-se claramente uma perspectiva de segundo turno. Inclusive em Minas, houve uma diminuição da diferença. Seria muito bom que o Brasil pudesse conhecer melhor os candidatos - afirmou Aécio, que foi convidado por Serra para acompanhá-lo no último debate entre os presidenciáveis amanhã à noite na Rede Globo.

Na avaliação do ex-governador, não só os votos de eleitores indecisos como também os de Dilma estariam migrando para Serra e Marina.

Aécio prometeu intensificar a campanha em favor do presidenciável tucano nesta reta final. Embora tenha havido um convite para que Serra fizesse uma última visita a Minas antes da eleição, o comando da campanha presidencial tucana ainda não havia fechado nada.

Diante dos números do Datafolha, a ordem no comando da campanha é aumentar o ritmo das atividades para tentar acelerar o crescimento de Serra, já que Marina foi a mais beneficidada com o desgaste de Dilma. O maior cuidado é para não atacar a verde - até porque, neste momento, seu crescimento é que está ajudando a viabilizar um segundo turno.

Há um consenso, entre os tucanos, de que o debate da Rede Globo será decisivo para consolidar o quadro.

(*) Enviada especial

Guerra diz que no 2º turno 'será outra campanha'

DEU EM O GLOBO

Na reta final, tucanos esperam que Serra acelere crescimento

BELO HORIZONTE E BRASÍLIA. Apesar do otimismo com os dados do Datafolha, a incógnita, tanto para aliados do tucano José Serra como da verde Marina Silva, é saber se o ritmo de queda da petista Dilma Rousseff, a menos de uma semana da eleição, será suficiente para queimar toda a "gordura" que ela tem de vantagem. Pesquisas internas da oposição indicam que Dilma continua perdendo pontos.

Os tucanos mais realistas gostariam que Serra tivesse acelerado seu crescimento - ele precisaria chegar a 35% dos votos válidos, para não contar apenas com o avanço de Marina. Na pesquisa Datafolha, ele oscilou de 31% para 32%.

- O movimento de queda de Dilma tende a se acentuar. No primeiro momento, a Marina é a favorecida, mas o fato é que o Serra não está perdendo votos, está até ganhando - disse o presidente nacional do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE). - No segundo turno, será outra campanha.

Para esse eventual segundo turno entre Dilma e Serra, o desafio dos tucanos é evitar que o eleitor que trocou Dilma por Marina - que já foi do PT -- decida voltar para a esfera do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua candidata. Para Sérgio Guerra, é preciso que Serra avance no eleitorado que é contra Dilma.

O presidente nacional do DEM, deputado Rodrigo Maia (RJ), também acredita que as chances de segundo turno crescem com a confirmação de que realmente Dilma perde pontos.

- Serra tem que acelerar o crescimento dele para poder chegar (ao segundo turno).

Acredito que ele possa chegar a 35% dos votos válidos. A Marina está tirando votos da Dilma, e os indecisos estão correndo para o Serra. Se houver segundo turno, será um resultado vitorioso para nós. A Dilma vai terminar em primeiro lugar, mas vai ser como se fosse derrotada. O importante é que ela está caindo - disse Rodrigo Maia.

- A tendência de queda de Dilma é muito clara em todo o país - acrescentou o líder do PSDB na Câmara, deputado João Almeida (BA), que ontem fez campanha ao lado de Serra, em Salvador.

Mais realista, o senador Álvaro Dias (PSDB-PR) ressaltou que é preciso ver o ritmo de desgaste de Dilma nesses dias que antecedem a eleição:

- Se a tendência for sustentada, teremos segundo turno.

BB admite 5 acessos à conta de tucano

DEU EM O GLOBO

Banco diz que consultas a informações de Eduardo Jorge foram legais, mas vice do PSDB questiona duas

Roberto Maltchik e Jailton de Carvalho

BRASÍLIA. Em ofício enviado à Polícia Federal (PF), o Banco do Brasil informou que dados da conta corrente do vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge Caldas Pereira, foram acessados cinco vezes, no primeiro semestre deste ano. No documento, o banco afirma, no entanto, que os acessos foram justificados e que os servidores responsáveis estavam habilitados para efetuar as operações. Apesar das justificativas do BB, Eduardo Jorge contesta dois acessos e já anunciou que vai pedir esclarecimentos adicionais ao banco.

A PF instaurou, em julho, inquérito para investigar a quebra de sigilo fiscal de aliados e familiares do candidato do PSDB à Presidência, José Serra. A apuração também contemplava a suspeita de quebra de sigilo bancário do dirigente tucano. Eduardo Jorge afirmou, em depoimento à PF, que foi confrontado por um jornalista da revista "Veja" com informações que só poderiam constar de documentos protegidos por sigilo bancário.

Dos cinco acessos identificados pelo Banco do Brasil, quatro ocorreram em Brasília e outro, em Maricá (RJ). Na capital federal, os registros de análise das informações bancárias de Eduardo Jorge são da agência Senado, onde ele tem conta.

Em Maricá, o dirigente tucano não tem conta corrente, mas é o responsável pelo inventário de um parente. Segundo informe do banco à PF, existe compatibilidade entre os acessos e as funções dos servidores. "Informamos que as funções exercidas pelos funcionários estão plenamente compatíveis com os acessos efetuados", afirma o banco no documento enviado aos investigadores.

Em Brasília, o banco afirma que três acessos ocorreram nos dias 11, 27 e 28 de janeiro. No caso, não há contestação de Eduardo Jorge. O dirigente tucano questiona, porém, o acesso feito na agência Senado em 11 de março.

Segundo o Banco do Brasil, a operação serviu para apurar movimentação atípica, conforme determina a carta circular 3.461/2009 do Banco Central, que trata de regras sobre movimentações atípicas de correntistas. A circular determina, por exemplo, a identificação de movimentação financeira superior a R$10 mil e estabelece critérios para acompanhamento das operações de pessoas "politicamente expostas".

Segundo Eduardo Jorge, o Banco do Brasil não informou quais seriam as movimentações atípicas, limitando-se a informar que houve apontamentos que demandaram análise da conta corrente.

O outro acesso contestado foi o de Maricá. O Banco do Brasil informou à PF que um servidor com função de chefia, hoje lotado em Niterói (RJ), acessou a conta corrente de Eduardo Jorge para verificar possíveis "depósitos indevidos", em 26 de março. Para o dirigente tucano, não há motivação para esse acesso.

- A resposta do Banco do Brasil reforçou que houve acessos sem motivação de minha conta corrente. Cabe à Polícia Federal investigar - afirmou o tucano.

De posse das informações do Banco do Brasil, a PF continua investigando a suspeita de quebra de sigilo bancário. No entanto, por ora, nenhuma diligência adicional foi enviada ao BB. Em nota, o Banco do Brasil repudiou "qualquer afirmação de que a conta do sr. Eduardo Jorge Caldas Pereira tenha sido acessada sem motivos profissionais". Segundo o banco, até agora "não foi identificado fato que comprove violação de sigilo".

Atella volta a depor na PF

DEU EM O GLOBO

Contador faz novo exame grafotécnico

SÃO PAULO. O contador Antonio Carlos Atella Ferreira prestou, ontem, o seu quarto depoimento à Polícia Federal no inquérito que investiga a quebra de sigilos fiscais de pessoas ligadas ao candidato do PSDB à Presidência da República, José Serra. O advogado do contador, Alexandre Trindade, disse que Atella ofereceu material para exame grafotécnico.

O objetivo é identificar quem falsificou as assinaturas de Verônica Serra, filho do presidenciável tucano, e seu marido Alexandre Bourgeois, nas falsas procurações apresentadas na agência da Receita Federal de Santo André. Atella já havia sido submetido ao teste anteriormente, mas o resultado foi inconclusivo.

Ao deixar a PF em São Paulo, jornalistas perguntaram quem encomendou a violação dos sigilos do vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge, e outros tucanos. Atella respondeu:

- Quem encomendou? Investiga e me ajuda.

Atella, que é filiado ao PT, foi indiciado na semana passada pelos crimes de quebra de sigilo e uso de documento falso depois que afirmou à PF ter participado também da violação dos dados fiscais de Eduardo Jorge e outros tucanos.

Quícoli: responsabilidade é de Oliveira

DEU EM O GLOBO

À PF, consultor diz que foi ex-diretor que disse que propina era para campanha

Tatiana Farah

SÃO PAULO. Depois de prestar depoimento de quase sete horas na superintendência da Polícia Federal, Rubnei Quícoli, autor das denúncias de tráfico de influência na Casa Civil, transferiu ontem para o ex-diretor dos Correios Marco Antonio de Oliveira a responsabilidade pela afirmação de que a suposta propina de R$5 milhões - cobrada da empresa EDRB, que ele representa - serviria para cobrir despesas da ex-ministra Erenice Guerra e da candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff.

Ele confirmou que a empresa ligada à família de Erenice Guerra, a Capital Assessoria, foi usada para uma intermediação com o governo para construção de uma usina de energia solar pela ERDB. Mas disse não conhecer pessoalmente os filhos da ex-ministra, Israel e Saulo Guerra.

Quícoli acusa ex-integrantes do governo de tentar intermediar negócios e cobrar uma propina de R$5 milhões para a construção de uma usina de energia solar no Nordeste que custaria, segundo ele, R$9 bilhões. Segundo o BNDES, o empreendimento custaria R$2,5 bilhões e o empréstimo foi negado no final de março passado.

Após o depoimento, Quícoli disse que não partiu dele a afirmação de que os R$5 milhões seriam usados na campanha de Dilma. Mais adiante, quando questionado se a então ministra Erenice sabia das transações que ocorriam na Casa Civil, Quícoli voltou a afirmar:

- Eu não sei. Nunca posicionei uma informação dessa. A única informação que eu coloquei foi que Marco Antonio me pediu esse valor para poder acertar alguma coisa entre eles lá. Eu nunca disse que esse dinheiro era para PT, para a campanha da Dilma. Isso daí nunca foi relacionado. Essas perguntas muitas vezes relacionadas para favorecer uma parte ou outra não têm cabimento. Os documentos foram expostos para toda a mídia.

Quícoli disse ter reafirmado à PF as denúncias e entregado os documentos que já havia passado à imprensa, como e-mails trocados com empresários e, supostamente, integrantes do governo, como o ex-assessor da Casa Civil Vinícius Castro, que saiu do governo depois do escândalo.

- Tudo o que foi enviado para a imprensa foi o que foi declarado à PF. Nada mais.

A principal acusação de Quícoli recai sobre Marco Antonio de Oliveira. Segundo Quícoli, a empresa Capital Assessoria, dos filhos de Erenice Guerra e ligada a Vinícius Castro, sobrinho de Oliveira, seria usada para intermediar o negócio.

- Fiquei surpreso que o papel dele veio à tona agora, pela mídia agora. Não por mim. Eu não sabia quem era Israel, quem era Saulo.

Além de Quícoli, prestaram depoimento na PF os donos da empresa EDRB, que teria sido representada por ele no projeto de energia solar. Os empresários Aldo Wagner e Marcelo Scarlassara ficaram pouco mais de duas horas na Superintendência da Polícia Federal. Entraram e saíram do prédio sem dar entrevista.

Vitamina eleitoral anti-Chávez

DEU EM O GLOBO

Com mais votos que presidente pela 1ª vez em 11 anos, oposição ganha força para 2012

Janaína Figueiredo

Apesar de o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, ter modificado estrategicamente a lei eleitoral do país em 2009 para favorecer o Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) nas eleições legislativas de domingo passado, a oposição obteve, pela primeira vez em 11 anos, mais votos do que os candidatos chavistas. Segundo explicaram analistas locais ao GLOBO, a oposição venezuelana melhorou a quantidade e a qualidade de seus votos, já que cresceu em regiões antes dominadas pelo chavismo, como os estados de Táchira e Monagas, entre outros. Com este cenário, a possibilidade de derrotar o líder bolivariano nas presidenciais de 2012 com um candidato único, que surgiria de futuras eleições primárias, ganhou força.

De acordo com dados divulgados ontem em Caracas, a oposição unida (Mesa de Unidade Democrática e Pátria Para Todos) alcançou 5.642.553 milhões de votos (51% do total), e o PSUV obteve 5.399.574 (49%). Perguntado sobre a contradição entre a quantidade de votos e cadeiras no Parlamento, o presidente se irritou com os jornalistas e reforçou sua leitura vitoriosa dos resultados eleitorais. Longe de adotar um discurso conciliador, Chávez desafiou a oposição a convocar um referendo antes de 2012 para tentar derrubá-lo.

- Como dizem que são maioria, que convoquem um referendo. Por que esperar dois anos para se livrar de Chávez? - provocou.

"Foi um duelo entre Davi e Golias"

Para Nicolás Toledo, da Consultores XXI, o presidente venezuelano está vivendo uma nova etapa de seu governo, na qual representa uma minoria que, para recuperar a maioria perdida, deve manipular as normas eleitorais do país.

- O governo só obteve uma maior representação na assembleia porque modificou a lei eleitoral - assegurou Toledo.

Segundo ele, "em 2012 a mesma manobra não será possível, porque será uma eleição nacional, e Chávez não tem como alterar essas regras".

- Se a oposição consolidar sua união, tem chances de vencer. Há líderes opositores, como Henrique Capriles Radonski (governador de Miranda), com mais popularidade hoje do que Chávez - disse.

Na visão da jornalista Gloria Bastidas, do "El Nacional", a vitória da oposição foi contundente, sobretudo porque "este foi um duelo entre Davi e Golias. Um Estado todo-poderoso e uma oposição que não tem tantos recursos".

- Apesar de Chávez ter cometido abusos terríveis, a oposição conseguiu mais votos - destacou Bastidas.

De acordo com a jornalista, "a deterioração da situação social e econômica do país explica a perda de votos por parte do governo e o crescimento da oposição".

- Já não se trata de defender a liberdade, um conceito abstrato; os venezuelanos estão sofrendo consequências em sua vida cotidiana e buscaram um culpado de carne e osso, que é Chávez - afirmou Bastidas.

Para ela, "o resultado de domingo passado ameaça a popularidade do presidente e deveria ser a semente de uma vitória da oposição em 2012".

Cientes dos desafios que deverão enfrentar a partir de agora, governo e oposição já começaram a trabalhar para as presidenciais. Uma das hipóteses que circulavam ontem entre analistas locais era a de que Chávez poderia apelar para a mesma estratégia utilizada em 2004 e 2005, quando sua popularidade começou a recuar. Na época, o presidente lançou as chamadas missões bolivarianas - programas sociais de educação, saúde e alimentação, entre outros. Para os opositores, a principal preocupação é como manter a unidade conquistada e atuar de forma articulada na Assembleia Nacional a partir de janeiro de 2011 e, sobretudo, construir um processo capaz de eleger um candidato único nas próximas presidenciais.

Presidente se irrita com pressão de jornalista

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Roberto Lameirinhas
Enviado especial

CARACAS – Uma pergunta da jornalista Andreina Flores, correspondente em Caracas da Rádio France-Internacional e da Rádio RCN, da Colômbia, irritou na segunda-feira à noite, o presidente Hugo Chávez. A repórter perguntou a Chávez como se explicava que, com votações parecidas, o partido governista tinha conquistado quase 60% das cadeiras do Legislativo e a oposição, apenas 40%. "Você conhece essa Constituição, Andreina?", disse Chávez, acrescentando que a rádio francesa difundia "mentiras" sobre a "revolução bolivariana".

"Essa era uma eleição proporcional, Andreina", dizia Chávez, pronunciando o nome da jornalista entre os dentes. "Eu estou falando e você não está anotando... Se quiser um lápis, te empresto", prosseguia. "Me preocupo que você continue ignorando as leis desse país, Andreina."

A rádio francesa protestou contra o tratamento destinado à jornalista e negou que tenha divulgado informações falsas sobre o governo venezuelano.

Na mesma entrevista, Chávez anunciou um programa habitacional de US$ 1 bilhão e reiterou a intenção de dar início a um programa nuclear para fins de geração de energia elétrica.

Memória:: Carlos Drummond de Andrade

Amar o perdido
deixa confundido
este coração.

Nada pode o olvido
contra o sem sentido
apelo do Não.

As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão

Mas as coisas findas
muito mais que lindas,
essas ficarão.