terça-feira, 30 de novembro de 2010

Reflexão do dia – Luiz Werneck Vianna

Um reputado sociólogo, há algum tempo, em um exercício meramente conceitual sobre categorias presentes na sociologia da religião de Max Weber, avizinhou o homem cordial, personagem típico do iberismo, construção teórica de Sergio Buarque de Holanda em "Raízes do Brasil", ao tipo de homem recortado pelo padrão confuciano. Vale, agora, torcer para que esse experimento abstrato não escape de uma situação de laboratório, com o risco de ser arrostado pelos últimos balanços das ondas do tsumani de 2008, e assim nos levando de roldão do extremo Ocidente, lugar que os heróis da nossa história escolheram para nós, ao mais remoto Oriente, onde perderíamos o caminho de casa.

(Luiz Werneck Vianna, no artigo, ‘Alexandre,Confúcio e outros heróis’, Valor Econômico, ontem)

A polícia e o estado de direito :: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

Os relatos que começam a surgir de abusos de poder por parte de policiais na ocupação do Complexo do Alemão têm que ser investigados e reparados o mais rapidamente possível pelas autoridades responsáveis pela segurança pública no Rio, para que não se quebre o clima de solidariedade entre a população e as forças da lei, a principal razão do sucesso da operação.

Houve uma mudança fundamental na atuação das forças de segurança nesse episódio, com os limites da lei sendo respeitados e os direitos dos cidadãos, até mesmo dos traficantes, norteando a ação de repressão. Desvios eventuais têm que ser reparados.

No domingo, a Globo News colocou no ar diversos depoimentos de estudiosos que destacaram em uníssono o que fez a diferença desta ação policial das anteriores.

O psicanalista Joel Birman, professor da Uerj e da UFRJ, considera que a população sentiu que a polícia deixou de ser ambígua, o que a motivou a sair da inércia.

"A polícia se firmou como sujeito de um estado de direito. O imaginário das pessoas faz com que elas se sintam protegidas por uma autoridade e saiam do medo paralisante que até então os dominava", comenta Birman.

O recorde de telefonemas para o disque-denúncia demonstra, segundo ele, que quando os cidadãos passam a acreditar na ação das autoridades, no momento em que fazem a denúncia acham que estão trabalhando para ajudar a limpar a comunidade de elementos nefastos.

"Foi a maneira decidida de agir que deu à população a sensação de segurança", diz Birman, ressaltando que não só a polícia não se deixou intimidar pelos traficantes como se apresentou com uma força muito maior, e não negociou para entrar na favela.

O recado dado aos traficantes e à própria população foi: "Nós vamos entrar e prender vocês. Nós estamos do lado do bem e vocês do lado do mal. Nós estamos do lado da lei e vocês do lado do crime. O Estado vai recuperar esse território". Para Joel Birman, a imagem da fuga dos bandidos "foi como se a gente sentisse a reconstituição da sociedade do Rio".

Uma sociedade é uma associação de pessoas, lembra Birman, e com a operação "surgiu a possibilidade de uma população fragmentada, assustada, cada um tratando de sobreviver no seu canto, de repente reconstituir os laços sociais e participar com solidariedade através do disque-denúncia, através das redes sociais, do Twitter".

Para Joel Birman, o fato de a TV Globo ter transmitido ao vivo os primeiros momentos da ocupação deu maior transparência à operação e evitou que qualquer excesso eventual fosse cometido.

O sociólogo Ignácio Cano, da Uerj, preocupa-se com o reforço da lógica da guerra, e ficou aliviado por não ter havido um banho de sangue.

Ele temeu que tivéssemos um retrocesso com a ação da polícia meramente reativa às ações dos bandidos, deixando de lado o planejamento estratégico que rege a instalação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs).

"Há centenas de comunidades no Rio de Janeiro ainda dominadas pelo tráfico e pela milícia, e não há sentido em cantarmos vitória", ressalta.

Para ele, o mais importante é a retomada do território, e, para isso, as forças de segurança terão que continuar no Complexo do Alemão até que se instale uma UPP.

Diante de um comentário meu, Cano ressalvou que não é possível punir as comunidades que estão sob o domínio do tráfico com a falta de obras públicas.

Eu me referia às bandeiras hasteadas no teleférico do Complexo do Alemão que, se por um lado sinalizam uma vitória das forças legais, também relembram que as obras do PAC estavam sendo feitas com a favela dominada pelo tráfico, o que demonstra que havia um acordo com os traficantes.

A própria rota de fuga pelas tubulações subterrâneas e os túneis que os operários teriam sido obrigados a construir mostram que não há possibilidade de fazer acordo com bandidos sem se envolver com algum tipo de desvio.

Francisco Carlos Teixeira, professor de história contemporânea da UFRJ, classifica de "uma vitória" não ter acontecido a grande explosão de violência, o banho de sangue que se temia.

A operação, destaca, mostrou que as forças policiais e militares tiveram uma boa atuação dentro do estado de direito. "Vimos que é possível ser duro, manter a ordem, sem violação dos direitos civis, do direito da população. Também vimos que há eficiência, há competência".

Ele destaca, no entanto, a importância de o governo federal agir. "Não se trata de colocar à disposição do estado carros blindados e tropas, por que isso é uma exceção. Tem que agir é no cotidiano: a Receita Federal tem que controlar a lavagem de dinheiro, a Polícia Federal tem que tomar para si a missão constante de controle de fronteira, não apenas na crise, e a Polícia Rodoviária Federal não pode deixar chegar cocaína, maconha e armas ao Rio de Janeiro".

Ele acha que houve nitidamente uma diferenciação na ação, destacando que "infelizmente nos lembramos claramente que as incursões da polícia nas comunidades populares no Rio eram movidas pela vingança e culminava em coisas lamentáveis como Vigário Geral e outras tantas até recentemente".

Jacqueline Muniz, antropóloga, professora da Ucam e da UFRJ, diz que a diferença desta vez "foi a qualidade da ação do governo. Diante da incerteza, da imprevisibilidade, do temor, responderam com superioridade de método, regularidade".

Também demonstraram, ressalta, uma capacidade de ação coordenada, integrada, e, portanto, "uma ação de natureza federativa".

Jacqueline Muniz também acha que foi importante a prestação de contas regular que foi feita à população. "Na normalidade democrática, as forças da lei dependem da cooperação da população. Como fazer busca e rastreamento sem mandado de busca e apreensão? As próprias casas são geminadas, umas se ligam às outras. É preciso fazer isso com a cooperação da população. Quanto menor o nível de resistência da população à polícia, menor é o risco em operações especiais", destaca.

Ela destacou dois aspectos importantes na operação do fim de semana: o centro de triagem e identificação, para minimizar a possibilidade de erro nas detenções, e a montagem de centros de socorros.

Antes tarde:: Dora Kramer

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Entusiasmo é material perecível, assim como senso crítico é matéria prima indispensável ao desenvolvimento da humanidade. Agora, desqualificar o trabalho das forças estadual e federal no combate ao poder do tráfico no Rio de Janeiro na última semana é, além de uma atitude retrógrada, um exercício de crítica à deriva. Um equívoco, sobretudo.

São poucos, mas ainda há focos de resistência ao reconhecimento de que o que houve no Rio significou um avanço incontestável em relação ao que estávamos acostumados a ver.

Principalmente nos últimos 20 anos, quando o crime já havia consolidado suas posições e as autoridades ainda resistiam - por incompetência, compadrio ou indiferença - ao enfrentamento.

Embora seja pertinente o questionamento sobre as razões pelas quais não houve antes uma atuação semelhante às retomadas dos territórios de Vila Cruzeiro e do Complexo do Alemão, na região da Penha, zona norte da cidade, a mera repetição dessa pergunta não leva a lugar algum.

Melhor que perguntar por que o Estado não agiu antes é cobrar das autoridades a continuidade desse tipo de ação. No País todo. Já ficou demonstrado que o poder público, quando quer e se empenha, ganha sempre.

É mais forte que o crime. Detém a legitimidade da força e, a despeito de enfrentar a "desvantagem" da obrigação de atuar dentro da lei frente a um inimigo livre dos ditames legais, é infinitamente superior a ele.

Portanto, não há mais daqui em diante nenhuma justificativa para que não se prossiga nesse combate. Muito menos existem quaisquer explicações para que o governo federal em conjunto com os governadores não elabore e institua uma política de segurança pública de caráter nacional e com sentido prioritário.

Essa é uma tarefa que se impõe ao governo de Dilma Rousseff. Depois de 16 anos consecutivos de fracassos na área, nos governos Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio da Silva, é hora de a sociedade aplicar o critério da tolerância zero em relação à responsabilidade dos governantes no cumprimento do dever constitucional de garantir o direito à vida aos cidadãos.

Isso abrange a inclusão de diferentes áreas: legislativa, judicial, trabalho de fronteiras, posição do Brasil em relação aos países que exportam drogas e não fazem o combate necessário à exportação de armas, combate duro aos barões da criminalidade, o expurgo da corrupção (da polícia, da política, do Judiciário), sem prejuízo também de se revelar responsabilidades sobre décadas de omissão.

A população que não sofre na pele a escravidão pelos traficantes no cotidiano parou de considerar o bandido um herói e, de um modo geral, a mentalidade em relação à defesa dos direitos humanos está se alterando: há o viés social, mas não há que se desprezar o poder da repressão.

A cultura do protesto vão - passeatas da elegantzia e da intelligentzia que o ex-chefe de polícia Hélio Luz denunciava por "protestar de dia e cheirar à noite" - deu lugar à participação objetiva e mais que efetiva por intermédio do Disque-Denúncia.

A polícia, por sua vez, começou a atuar como aliada do cidadão, substituindo a arbitrariedade pela inteligência e o planejamento estratégico, sob um comando sério e integrado.

Nada está resolvido, mas está provado que o Estado sabe o caminho. Se não enveredou por essa trilha até hoje, a hora é agora. Sem recuos, pois as condições estão postas e o rumo da recuperação da soberania do Estado está dado. Sem margem para ambiguidades.

Dona da casa. De Lula a FH, muitos se arvoram o direito de dar conselhos públicos à presidente eleita. Não fica bem.

Mais não seja no que tange ao ex-presidente, porque ele pertence à oposição. Derrotada e "eleita" para se opor.

No Twitter. @DECUBITO: "Que a polícia tire os bandidos das ruas e o povo tire os bandidos da política."

O dia seguinte:: Míriam Leitão

DEU EM O GLOBO

É emblemático que o símbolo da conquista seja uma bandeira brasileira numa obra do governo.

O teleférico é do PAC, o PAC é do governo. A bandeira ser o retrato da reconquista exibe a ambiguidade da situação. Mas nunca tivemos tanta chance de enfrentar nossas contradições e vencer uma forma de organização da economia do crime no Rio que incluía o controle territorial.

O Rio sonhou muito com este momento. Foi um avanço quando todos passaram a entender que os bandidos tiranizam as populações locais.

Parece simples agora que o conceito se firmou, mas por muito tempo havia desvios na forma de pensar o problema das áreas do Rio onde o crime se instalou. Os governos sempre pediram licença às “autoridades” locais para entrar, o que significava legitimá-las.

Por isso a palavra “libertação” se justifica. Depois da euforia, é hora de pensar com racionalidade os passos seguintes, os dias seguintes.

O que apareceu até agora foram os frutos do crime: um enorme volume de drogas e de armas apreendidas. Sabese pouco do paradeiro dos chefes. A Polícia e as Forças Armadas ocuparam o terreno para estrangular fisicamente o tráfico, mas os canais financeiros que alimentam o negócio continuam abertos. É uma atividade que gera muito dinheiro e muito desses recursos acaba circulando pelo sistema bancário.

O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) e o Banco Central foram importantes quando se combateu o PCC em São Paulo. As pessoas ligadas direta ou indiretamente ao crime precisam ter suas movimentações financeiras analisadas cuidadosamente pelo Coaf, cuja função é esta mesma. O órgão não faz trabalho de campo.

Ele analisa informações de movimentações financeiras suspeitas para evitar que dinheiro ilegal vire legal. Oficialmente, o Coaf tem que ser informado apenas de movimentações acima de R$ 100 mil. No caso do tráfico, há milhares de depósitos de pequeno porte numa mesma conta. É mais difícil de flagrar.

O órgão já está atento.

O tráfico é uma atividade econômica. Criminosa, bandida, mas que tem os mesmos elementos de qualquer outra: emprega, gera renda, tem uma logística de distribuição dos seus produtos, tem financiamento e mercado. Mesmo se por milagre todos os chefes do tráfico forem presos, outros tomarão seus lugares e a atividade econômica continuará. O economista Sérgio Besserman avalia que a vitória foi contra um dos absurdos, o maior deles: — Os Estados Unidos gastam US$ 15 bilhões por ano lutando contra as drogas e estão perdendo. O que houve neste fim de semana foi uma vitória contra a lógica de controle territorial do crime que existe no Rio. Mesmo que em Los Angeles ou São Francisco circule mais droga do que aqui, os criminosos não são donos de partes da cidade.

Quando o Estado aceita não entrar em uma área, ele passa a admitir tudo. Esse foi o sentido dessa vitória.

Como o Estado organizou as obras do PAC? Como as empreiteiras fazem seu trabalho? Que poder têm os bandidos sobre os trabalhadores contratados? Obviamente tudo foi feito com negociação ou anuência do tráfico, do contrário a Polícia não instalaria uma bandeira no teleférico como símbolo da libertação.

Nós vivemos agora a agradável sensação de alívio. Uma fortaleza que parecia inexpugnável foi conquistada com vários ineditismos, como a cooperação entre as forças do Estado. Foi um dia realmente histórico, mas para não perder a vitória é preciso dar os outros passos.

O secretário de Assistência Social, Ricardo Henriques, já tem pensado esse futuro. O PAC social tem projetos em andamento. Já beneficiou 2.700 famílias com novas casas e apartamentos, instalou uma escola de ensino médio de qualidade, fez uma UPA.

Aquele morro que foi visto por todo mundo com os bandidos fugindo da Vila Cruzeiro para o Alemão será reflorestado para ser área de preservação ambiental. Com a UPP, chegará também a UPP Social, que vai olhar antes a realidade local.

— Cada comunidade tem uma realidade diferente. Pavão- Pavãozinho, Chapéu Mangueira são diferentes do Alemão — diz Ricardo Henriques.

O economista André Urani confirma essa ideia, lembrando que em algumas favelas da Zona Sul há uma economia no entorno. No Alemão, não.

— Em volta do Alemão é um cemitério industrial. E não adianta pensar em novas indústrias, porque as grandes cidades estão se desindustrializando.

Lá, moram pequenos prestadores de serviços, pintor, a mulher que faz o sacolé (picolé em saco), o serralheiro. É um mundaréu de pequenas atividades órfãs. Não adianta querer formalizar tudo. Se a mulher do sacolé tiver que pagar pela luz do freezer — e o governo estadual ainda cobrar 40% de imposto sobre a luz — ela vai preferir a informalidade — diz Urani.

É preciso não esquecer que todas as favelas da Zona Oeste ainda estão sob o domínio das milícias, e que das 13 comunidades onde há UPP, só uma, a do Batan, foi tirada da milícia.

Os dados sobre o Alemão são pouco confiáveis, segundo Besserman, porque há uma subdeclaração. Moradores preferiam não dizer que são de lá pelo estigma do local. Agora, o Complexo será mais bem estudado.

Enfim, o desafio da vitória se multiplica e se bifurca como as ruelas do Alemão.

Há muito a fazer no dia seguinte a uma vitória como essa. Mas que bom que chegou o dia seguinte.

Do tráfico às milícias :: Fernando de Barros e Silva

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - Mais de 40 toneladas de maconha; 212 quilos de cocaína; granadas; metralhadoras; fuzis com mira telescópica; armas automáticas; trabucos high tec com nomes estranhos; coletes de uso do Exército... Mesmo que as quantidades divulgadas não sejam confiáveis, a relação de drogas e de armamentos apreendidos no Complexo do Alemão impressiona bastante.

Não foi Papai Noel quem levou tudo isso até lá. Nem as drogas nem as armas chegaram ao morro de trenó. Foram contrabandeadas. Por trás dos pés de chinelo presos ou mocozeados na favela, existe gente mais graúda alimentando e tirando proveito dos negócios do tráfico.

Veterana nos meandros dessa cadeia, a antropóloga Alba Zaluar perguntava ontem, em artigo para "O Globo": "Quando e como vão destruir as drogas e armas apreendidas em tamanha quantidade nos últimos dias, para que não percorram o caminho inverso?".

Sua preocupação faz eco ao que diz outro antropólogo, o ex-secretário de Segurança do Rio Luiz Eduardo Soares. Em seu blog, ele escreve que "não há nenhuma modalidade importante de ação criminal do Rio de que segmentos policiais corruptos estejam ausentes". O seu texto, chamado "A crise do Rio e o pastiche midiático", vai mais longe ao afirmar que o modelo do tráfico, tal como o conhecemos, está em franco declínio e tende a se eclipsar, incapaz de competir com as milícias.

A polarização que dá a tônica do discurso oficial encampado pela mídia -entre a polícia, de um lado, e o tráfico, do outro-, esconderia, segundo o antropólogo, o principal problema hoje: "Como, quem, em que termos e por que meios se fará a reforma radical das polícias, para que deixem de ser incubadoras de milícias, máfias, tráfico de armas e drogas, crime violento, brutalidade, corrupção? Como se refundarão as instituições policiais para que os bons profissionais sejam, afinal, valorizados e qualificados?".

Essa outra guerra nem começou. E, sem ela, ao pó retornaremos.

A história resolverá, mas com adjetivos:: Wilson Figueiredo

DEU NO JORNAL DO BRASIL (ONLINE)

A Impressão que ficou do primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva não convenceu ninguém de que a carta aberta ao eleitor, pedindo emprestado seu voto, tenha mudado o curso da história. Depois de ter tocado a campainha, por três vezes seguidas, com a mão esquerda, Lula assinou a carta com a direita e tirou a história do trilho. Com a exigência que enganou os dois lados, aceitou a candidatura. Nem tanto à esquerda, que o olhasse de lado, nem à direita, que o desautorizasse por excessos.

Nunca, nem antes nem depois na história deste país, alguém foi além de duas derrotas consecutivas. Brasileiro tem o hábito de não responder a cartas, mas não recusou o pedido de Lula como compensação pelos três insucessos anteriores. A originalidade do caso não ficaria por aí.

Quando o segundo mandato ficou à vista, Lula tratou de se esquivar aos efeitos do mensalão. Só confessou à Justiça que sabia de tudo, no segundo mandato, quando já estava imunizado às consequências (pois não poderia haver o terceiro). O Lula reeleito foi um novo personagem que entrou em cena num país com os dados apontando para cima. E não era sem tempo nem motivo, depois que a social-democracia, ainda recente no Brasil, se confundiu com a fantasia neoliberal que, de novo mesmo, tinha apenas o prefixo, e deixou o espaço social à disposição de quem o arrematasse. Foi a vez de Lula. Com a carta de crédito endereçada aos brasileiros em geral, Lula deixou para trás aquele socialismo que não deu certo e ofereceu o plano B, mediante bolsas de múltipla utilidade. Daí por diante, mostrou que tinha outro ângulo, menos agudo, em que via os homens e a sociedade em que nasciam, cresciam, e tudo acontecia ao deus-dará. Tinha ao lado, na Casa Civil, Dilma Rousseff, também credenciada pelo acaso.

A esquerda brasileira, que filma em câmara lenta, não tinha condições de competir com a social-democracia, mais pragmática do que teórica. Num país em que a direita se recusa a admitir-se como tal, e esnoba eleitoralmente, sem precisar assumir seu papel conservador, o Brasil não saía do lugar. E a democracia pagava a conta. A cabeça do presidente Lula não se ocupa de ninharias, e em nenhum momento precisou esclarecer que não era de esquerda.

Estava implícito. O problema dele era não ser enquadrado à direita.

Os estreantes na participação política não sabiam, nem por ouvir dizer, que a esquerda entra sempre em crise, e se divide ao aproximar-se do poder. O PT que chegava perto mas não vencia e o que se retraiu para sobreviver (mas continuou o mesmo) garantiram, com os seus e os votos adjacentes, a vitória de Lula. E mais não obteve porque a lei não comporta mais de uma reeleição, e o queremismo que cuidou do terceiro mandato não tinha expressão política.

O balanço entre o que o governo Lula achava que era e o êxito da terceira vitória do PT (por intermédio de Dilma Rousseff, com outros antecedentes políticos) só salvou as aparências de um socialismo à espera de um adjetivo que o defina no novo mandato. Com Lula no leme oculto, o governo seria diferente da campanha eleitoral. Mas não se explicaria o milagre do socialismo sem quebrar ovos. No máximo, caberia um neossocialismo, de conveniência e sem suficiente convicção, para esconjurar confusões. Graças à inauguração do social no que se firma como democracia, o neossocialismo bem pode ser considerado, por falta de melhor, apto para competir com o neoliberalismo. O resto, a história resolve com adjetivos.

Em nome da esquerda possível, o candidato que se apresentou com a carta aberta aos brasileiros deixou subentendido, aos que a leram com atenção, que o significado varia de acordo com o leitor. Podia ser assinada por Pirandello, criador da interpretação multifocal, segundo a qual cada um já entende o socialismo como lhe convier.

O papel da oposição :: Rodrigo Constantino

DEU EM O GLOBO

Democracia não é a ditadura da maioria. O regime democrático requer condições básicas para funcionar, tais como liberdade de imprensa, limite constitucional ao governo, independência dos poderes e uma sólida oposição. Todos esses importantes pilares estão enfraquecidos no Brasil. O último deles será o foco deste artigo.

Mais de 40 milhões de brasileiros mostraram nas urnas que não estão satisfeitos com os rumos do país. Trata-se de um brado retumbante que garante legitimidade aos opositores do governo. Resta saber se a oposição vai cumprir com responsabilidade, união e coragem esta função delegada por tantos brasileiros. É o que se espera dela, e cabe às suas lideranças o papel de coordenar seus partidos nessa direção comum. Eximir-se dessa tarefa significa trair milhões de eleitores.

O papel da oposição é fundamental para fortalecer a democracia. Hibernar por quatro anos para reaparecer nas eleições é suicídio político. Compreende-se o receio de enfrentar um governo popular como o do presidente Lula, mas ter deixado de fazê-lo foi como dar um tiro no próprio pé. Com Dilma na Presidência, sem o mesmo carisma, esta negligência passa a ser indefensável.

Ao que tudo indica, a oposição terá uma excelente oportunidade para mostrar a que veio, lutando em defesa dos milhões de brasileiros que não suportam mais tantos impostos. Mal acabara a contagem das urnas, e a coligação eleita já falava em recriar a CPMF, com nome diferente para ludibriar o povo. Trata-se de um verdadeiro "estelionato eleitoral", uma vez que a própria Dilma chegou a afirmar que não aumentaria os impostos, já em patamares indecentes no Brasil.

Segundo Alberto Carlos Almeida, em "O dedo na ferida", o povo brasileiro sabe que paga muitos impostos e gostaria que eles fossem reduzidos. Almeida acredita que há o script pronto, mas falta o ator. Eis a chance da oposição. O povo brasileiro está mais atento, e dificilmente cairá na retórica do governo, de que é preciso mais recursos para a saúde. O povo entendeu que dinheiro não tem carimbo, e que seus impostos acabam desviados para destinos menos nobres, como corrupção e inchaço da máquina pública.

A questão da recriação da CPMF será um teste crucial para verificar se ainda há oposição de fato neste país. Em vez de o governo criar mais imposto, ele deveria focar na redução dos gastos públicos, que estão em trajetória explosiva. A pressão inflacionária já começa a incomodar, e usar somente a política de juros para combatê-la significa usar uma bazuca para matar uma formiga: o estrago é geral.

O presidente Lula, no afã de eleger sua candidata, mandou às favas a responsabilidade fiscal durante o final de seu governo. Não só a gastança pública saiu de controle, como o crédito estatal também foi estimulado de forma irresponsável. O resultado foi um forte crescimento econômico, fator extremamente relevante para decidir a eleição. Mas a fatura ainda terá que ser paga. Se o governo Dilma não reverter o quadro, demonstrando maior austeridade fiscal, o crescimento será insustentável, tornando-se mais um voo de galinha. Os "desenvolvimentistas", estes alquimistas da ciência econômica, terão que aceitar a realidade como ela é.

Além da CPMF, existem várias outras batalhas que a oposição deve lutar. Os escândalos do Enem, para começo de conversa, ou então o trem-bala, cujo orçamento está claramente subestimado, e mesmo assim já representa enorme desperdício de recursos públicos frente a tantas alternativas mais urgentes. Ou ainda o estranho episódio envolvendo a Caixa Econômica e o Banco PanAmericano. Há muito que explicar nesses casos. A oposição não pode deixar tudo por conta da imprensa.

Há também a postura neutra lamentável do governo, quando a ONU resolveu condenar a teocracia iraniana por desrespeito aos direitos humanos. Para o governo, "negócios são negócios". Cabe à oposição sustentar que essa não pode ser a postura de um país que ainda leva em consideração a questão ética. Milhões de brasileiros esperam esta reação da oposição.

Existem muitos outros pontos em que o papel da oposição se faz necessário para a construção de uma democracia mais sólida. O povo merece o contraditório, até para poder julgar melhor os atos do governo. Quando a oposição está fragilizada, desorganizada e passiva, a democracia corre perigo. A experiência mexicana mostrou como isso pode ser fatal. A oposição precisa resolver seus problemas internos e assumir seu papel legítimo em prol da democracia brasileira. Milhões de brasileiros contam com isso.

Rodrigo Constantino é economista.

Marcado pelo mensalão:: Raymundo Costa

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Um "mas" atrapalha os planos políticos imediatos do deputado João Paulo Cunha (PT-SP). Chama-se mensalão, o suposto esquema de compra de votos de deputados descoberto em 2005, no aguardo de julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF). Afora esse "mas", João Paulo atende às expectativas do PT e do governo que se inicia em janeiro de 2011 para presidir a Câmara.

João Paulo é do Campo Majoritário do PT, corrente atualmente denominada de Construindo um Novo Brasil. Entre seus concorrentes só Marco Maia (RS), primeiro-vice presidente da Câmara, integra os quadros da CNB. Arlindo Chinaglia (SP) é da tendência Movimento PT e Cândido Vaccarezza (SP), líder do governo e forte candidato à presidência da Câmara, é alinhado à Novo Rumo.

O deputado tem trânsito fácil no PT e no conjunto da Casa, inclusive oposição: presidente da Câmara nos dois primeiros anos do governo Lula, João Paulo Cunha criou a liderança da minoria, assegurou o rodízio das relatorias de medidas provisórias entre governo e oposição e criou o portal da transparência para dar divulgação à prestação de contas da verba de gabinete dos deputados federais.

A força que João Paulo acumulou pode ser medida pela votação da emenda constitucional que estendia o direito da reeleição aos presidentes das duas Casas do Congresso - praticamente sozinho, por apenas cinco votos não conseguiu reunir a maioria constitucional qualificada (308 votos) para que o projeto fosse aprovado na Câmara.

O futuro de João Paulo parecia promissor. Quando o deputado deixou a presidência da Câmara, em fevereiro de 2005, os sinais do esboroamento da base governista estavam no ar - com o PT dividido, a sucessão caiu no colo de um franco-atirador, Severino Cavalcanti (PP-PE). Mas João Paulo era reconhecido como um potencial candidato do PT ao governo do Estado de São Paulo. Três meses depois, o mundo do deputado estava de ponta-cabeça: ex-presidente da Câmara, era agora uma das estrelas do mensalão.

De acordo com as investigações realizadas à época, a mulher do deputado sacou do Banco Rural R$ 50 mil das contas do publicitário Marcos Valério, o operador do esquema do suposto mensalão. Surpreendido, a primeira reação de João Paulo foi declarar que sua mulher fora à agência bancária pagar a conta de TV a cabo. Mais tarde disse que o saque fora feito a mando de Delúbio Soares, o ex-tesoureiro do PT, para o pagamento de pesquisas eleitorais em quatro municípios do Estado de São Paulo que já visavam à campanha estadual de 2006.

Processado na Câmara, João Paulo Cunha foi absolvido por seus colegas deputados junto com um punhado de outros acusados de integrar o esquema do mensalão, mas sua candidatura já havia sido consumida no fogo das CPIs.

O deputado também foi denunciado pelo Ministério Público Federal ao STF. Está no lote dos 40, mas fora da espinha dorsal do processo, a formação de quadrilha denunciada pelo procurador-geral da República. Sua participação é lateral, o que leva seu advogado a crer, assim como seus aliados na Câmara, que João Paulo tem chances razoáveis de vir a ser absolvido também na mais alta instância do Judiciário.

Sabe-se que João Paulo Cunha já conversou sobre seus planos com Dilma Rousseff, a presidente eleita, e Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente mais que nunca confortável no cargo. Dos dois ouviu palavras de elogios e do quanto ele seria importante para o próximo governo, no comando da Câmara dos Deputados. Lula foi bem claro ao sugerir que o deputado avançasse com cautela - e em ressaltar o "mas". Um "mas" substantivo e não apenas uma conjunção.

A candidatura do deputado João Paulo Cunha a presidente da Câmara pressupõe o cumprimento de algumas etapas.

A primeira, nem por isso a mais fácil, é juntar o PT. Tarefa sempre complicada, como mostra a eleição de Severino Cavalcanti em 2005, quando o partido concorreu com dois candidatos. Atualmente, são quatro os pretendentes a um cargo que deve ser chave para a manutenção do equilíbrio da coalizão governista. Base, aliás, que já emite alguns sinais de desconforto com a composição ministerial do governo Dilma.

Acertado o PT, João Paulo - e este é um pressuposto que serve para qualquer candidato petista - precisa se acertar com os demais partidos que integram a coalizão governista e com as siglas da oposição. Precisa também ter a simpatia de Lula e de Dilma. Em resumo, não é uma candidatura fácil de ser construída, sobretudo quando a todas as virtudes relacionadas do aspirante ao cargo, segue-se um "mas" substantivo.

O presidente da Câmara também é o chefe de um poder, além de segundo na linha sucessória da Presidência, logo após o vice-presidente da República. No caso de João Paulo Cunha, como sua eleição seria vista pelo Judiciário, especificamente pelo Supremo Tribunal Federal, encarregado de julgar o processo do mensalão, no qual o deputado é um dos réus?

Se quiser efetivamente voltar a presidir a Câmara dos Deputados, a candidatura de João Paulo Cunha não pode parecer uma afronta ao Judiciário. Se João Paulo realmente acha que tem chances de absolvição, não seria mais prudente aguardar o pronunciamento do STF?

É algo que o deputado deve considerar, antes de se lançar num projeto que até pode ser viável, mas sem dúvida esbarra no "mas" que para o presidente Lula, em geral, não constitui empecilho, e que de fato e de direito somente terá uma arbitragem definitiva com a decisão do Supremo. Decisão que é esperada para dentro de 11 a 12 meses, em meio ao mandato do próximo presidente da Câmara.

Cresce no PT o sentimento de que o ministério do governo Dilma Rousseff tem prazo de validade. É certo que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ungiu a candidata e elegeu Dilma. O que não se esperava é que a montagem da equipe de governo não passasse de uma pequena "reforma ministerial".

Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras

Memória em disputa :: Dulce Pandolfi

DEU EM O GLOBO

Construir arquivos é uma prática que sociedades, grupos ou indivíduos utilizam para codificar seu passado, inventar tradições, reforçar suas identidades. Entretanto, os arquivos, ou melhor, os documentos que estão neles contidos, não são matéria-prima objetiva, inocente. Por isso, antes de fazer uso de um arquivo, cabe sempre a pergunta: de que modo, por que e por quem ele foi produzido?

A importância histórica dos chamados "arquivos da repressão" é indiscutível. Ainda hoje, no Brasil, a luta pela abertura desses arquivos, iniciada no final dos anos 1970, continua despertando muitas tensões. Mas, afinal, o que são os arquivos da repressão? Eles se compõem de anotações produzidas pela própria polícia, de documentos pessoais apreendidos arbitrariamente pelos órgãos de repressão e de depoimentos extraídos dos prisioneiros políticos em uma situação de extrema violação dos direitos humanos. Na maioria das vezes, esses depoimentos foram obtidos com brutais torturas e, além disso, muitos desses documentos foram totalmente forjados pelos agentes da repressão. Um caso bastante emblemático foi o de Vladimir Herzog, diretor da TV Cultura de São Paulo, preso em 25 de outubro de 1974 e que morreu em função de torturas sofridas nas dependências militares. A versão oficial, registrada inclusive através de fotos, e divulgada nos meios de comunicação, era de que o jornalista havia se suicidado na cela, dez horas após a sua prisão. Algum tempo depois a farsa foi desmontada, mas a documentação sobre a versão oficial permanece.

Isso quer dizer que devemos descartar essa documentação como fonte de pesquisa? Ou usá-la de forma crítica tanto para melhor entender o funcionamento da ditadura quanto para desvendar as diferentes estratégias presentes na estruturação dos próprios arquivos da repressão?

Certamente a construção desses arquivos está relacionada diretamente à maneira como a ditadura brasileira se constituiu. Como alguns estudos históricos têm demonstrado, naquele período, ao mesmo tempo em que vivíamos em um estado de exceção, de total desrespeito aos direitos humanos, de forma ambígua, havia uma preservação de alguns instrumentos da liberal democracia, o que implicava a manutenção de determinadas formalidades jurídicas.

Para atender a essas formalidades, a ditadura necessitava documentar provas para o julgamento e posterior condenação dos seus prisioneiros. Se num primeiro momento as pessoas eram submetidas às torturas e ficavam presas na mais absoluta ilegalidade, num segundo momento, as que sobreviviam iam responder a processos nos Tribunais Militares, onde a documentação extraída na primeira fase era utilizada como prova da acusação. Ali se produzia outro tipo de documento: ao responder às perguntas do Tribunal, muitos prisioneiros, mesmo correndo risco de represália, denunciavam as torturas. Dessa maneira, ficaram documentadas e arquivadas, em papel timbrado da Justiça Militar, denúncias das torturas, torturas essas que eram, sistematicamente, negadas pelo regime. Ou seja, ainda que "a ferro e a fogo", esses arquivos "da repressão" foram se constituindo e se transformaram em arquivos "sobre a repressão". Assim, para além das diferentes situações de produção de seus documentos, a abertura desses arquivos produziu novas informações sobre a repressão, sobre as torturas, sobre os desaparecidos políticos. A partir do seu uso foi possível realizar trâmites legais, formalizar separações, estabelecer estados de viuvez, conseguir atestados de óbito sobre alguns dos assassinados pela ditadura etc., etc.

Territórios da memória em disputa, esses documentos certamente ajudam a desvendar parte da nossa história. No entanto, usá-los sem explicitar os diferentes contextos em que foram produzidos pode ser ingenuidade ou má-fé, mas, sem dúvida, é violentar a nossa história.
Dulce Pandolfi é diretora da organização não governamental Ibase e professora da FGV.

PPS expulsa prefeito que apoiou Dilma

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Fernando Taquari De São Paulo

O PPS iniciou a caça às bruxas e decidiu expulsar o prefeito de Jaguariúna (SP), Gustavo Reis, por infidelidade partidária. Em reunião do diretório nacional, em Brasília, o partido optou pelo desligamento de Reis por ele ter declarado apoio para a candidatura de Dilma Rousseff (PT) à Presidência da República nas eleições deste ano.

A escolha contrariou o PPS, que se aliou ao PSDB, de José Serra, na disputa de outubro ao Palácio do Planalto. Na reunião do diretório, realizada no fim de semana, o PPS ressaltou que Reis foi primeiro filiado a ser desligado em meio ao início de um amplo processo de reestruturação da legenda, que tem como ponto de partida a punição e a expulsão de "infiéis" nas eleições de 2010.

A medida também irá valer para os diretórios regionais que contrariaram as decisões do PPS nas eleições. De acordo com o secretário-geral da legenda, deputado federal eleito Rubens Bueno (PR), a reestruturação será fundamental para a preparação do partido para as eleições municipais de 2012. Com o objetivo de fortalecer a "democracia interna", os diretórios estaduais vão ter que apresentar um balanço do resultado das eleições dentro de 30 dias.

"Essa medida sinaliza claramente que o PPS será reestruturado em todo o Brasil com aqueles que defendem o partido, seu programa e tem compromisso com nossos candidatos nas eleições. De nada adianta termos prefeitos, vereadores e deputados que, na hora de uma disputa eleitoral, apoiam candidatos de outros partidos", afirmou o secretário-geral do partido.

Na última eleição, aconteceram casos em que candidatos do PPS tiveram em um município menos votos do que o número de filiados.

"Isso mostra um descompromisso total com o partido. O PPS não é refúgio para oportunistas políticos que elevam seus projetos pessoais acima dos interesses da legenda. Sempre defendemos uma reforma política que valorize os partidos e não aceitamos esse tipo de postura", acrescentou Bueno.

Em nota, o prefeito disse que a decisão de expulsão foi unilateral e não houve qualquer comunicado oficial por parte dos dirigentes da legenda. "De tal decisão não me foi dado ciência nem assegurado o direito constitucional de ampla defesa, como também prevê o estatuto do PPS e nem sequer tenho notícia de instauração de prévio processo disciplinar", declarou Reis.

Eleito com quase 10 mil votos, o prefeito permaneceu no PPS por 12 anos, sendo a única partido pelo qual foi filiado.

PPS endurece e expulsa prefeito que apoia Dilma

DEU EM O GLOBO

BRASÍLIA. O PPS anunciou ontem que fará uma reestruturação interna, a começar pela expulsão de filiados ou detentores de mandato que apoiaram ou votaram na presidente eleita, Dilma Rousseff, ou em candidatos de outros partidos e coligações em outubro. Segundo a nota, o PPS já decidiu pela expulsão do prefeito de Jaguariúna (SP), Gustavo Reis, desligado do partido no último fim de semana, quando o diretório nacional se reuniu em Brasília.

Segundo o partido, o prefeito manifestou publicamente apoio a Dilma, inclusive em entrevistas. O presidente do Conselho de Ética do PPS, Renato Atílio, decidiu pela punição, diante da gravidade dos atos praticados pelo prefeito. O partido ameaça analisar outras condutas, mas não informou quais.

Sábado, em reunião, o PPS aprovou resolução definindo que é preciso se preparar já para as eleições de 2012. A resolução determina que dirigentes, candidatos, detentores de mandatos eletivos e filiados poderão, mediante processo no Conselho de Ética e Disciplina, serem punidos, se for comprovado descumprimento das regras internas.
Jornal do Commercio (PE): PPS expulsa prefeito infiel

O PPS desligou do partido o prefeito de Jaguariúna (SP), Gustavo Reis, por infidelidade partidária. A decisão foi tomada no último fim de semana, durante reunião do diretório nacional, em Brasília. Reis manifestou publicamente seu apoio à candidatura de Dilma Rousseff (PT) à Presidência, e contrariou assim a decisão do PPS de se coligar a José Serra (PSDB). O partido aprovou uma resolução pela qual vai iniciar um amplo processo de reestruturação da legenda, incluindo punição e expulsão de filiados que apoiaram candidatos de outras coligações nas eleições deste ano. Em nota, o prefeito disse que tomou conhecimento do seu desligamento pela imprensa.

Diário do Nordeste(CE): PS expulsa prefeito que deu apoio à petista

São Paulo - O prefeito de Jaguariúna (SP), Gustavo Reis, foi o primeiro a cair no quadro político do PPS, que passa por "amplo processo de reestruturação". Contra Reis pesou o apoio dado à então candidata do PT ao Planalto, Dilma Rousseff. Como integrava a coligação "O Brasil Pode Mais", do tucano José Serra, o partido entendeu que o prefeito cometeu "atos graves" ao desrespeitar decisão do comando da sigla.

O presidente do Conselho de Ética do PPS, Renato Atílio, decidiu pela expulsão de Reis por considerar que não restava "outra alternativa" a não ser optar pelo desligamento do prefeito.

Eleito em 2008, Gustavo Reis ressalta na página da Prefeitura de Jaguariúna que o PPS é "seu único partido de militância há 10 anos". Sua expulsão da legenda aconteceu por ferir a "questão da fidelidade partidária". E ele pode ser só o primeiro. A sigla aprovou, resolução que determina punição ou expulsão de quem desrespeitar "disciplina e fidelidade partidária".

Assinado pelo presidente do PPS, Roberto Freire, o texto se compromete a apertar as rédeas sobre filiados que não se alinharem ao estatuto do partido. Diretórios regionais considerados "infiéis", também na mira do partido, são ameaçados com reestruturação ou dissolução.

A decisão contrária ao prefeito de Jaguariúna, porém, foi tomada antes mesmo da aprovação da resolução. No último final de semana, líderes nacionais do PPS se reuniram em Brasília para aprovar uma resolução que visa combater as "atuais debilidades orgânicas".

Em um processo que busca fortalecer a "democracia interna", diretórios estaduais terão 30 dias para fazer um balanço do resultado das eleições de 2010.

O Estado do Paraná: PMDB e PPS querem fim dos infiéis

Roger Pereira

Em lados opostos em relação ao novo governo federal, PMDB e PPS decidiram enquadrar seus filiados para que obedeçam a posição política de seus partidos sob pena de punição via fidelidade partidária.

Enquanto o PMDB quer toda sua base apoiando o governo Dilma, o PPS, na oposição, promete abrir processo de expulsão de todos os filiados que apoiaram candidatos de outra coligação na eleição de outubro.

Cobrado pela presidente eleita pela divisão de seu partido, o vice-presidente eleito Michel Temer, presidente nacional do PMDB exigiu posição uniforme da legenda, que, em vários estados, esteve mais próximo do PSDB que do PT nas eleições de outubro.

Temer disse, no entanto, que ninguém será punido por posições anteriores, mas que, agora, "começa uma nova fase", posição estratégica para garantir ao PMDB os cargos que almeja no governo Dilma.

Já no PPS, a punição levará em conta o "esforço" de mandatários e diretórios municipais nas eleições deste ano. O partido editou resolução neste final de semana, determinando e expulsão dos infiéis na última eleição, ontem, o prefeito de Jaguariúna (SP), Gustavo Reis, que apoiou publicamente a candidatura da petista Dilma Rousseff à presidência, foi o primeiro expulso.

"Só estávamos esperando essa posição do diretório nacional, para começarmos a agir aqui no Paraná.

Temos muitos casos aqui, que serão provados com números. Mandatário que fez mais votos em 2008 do que os candidatos do partido fizeram em seus municípios neste anos poderão sofrer processo do conselho de ética", disse o presidente do partido no Paraná, Rubens Bueno, que é secretário-geral do PPS nacional.

"Também criaremos um coeficiente mínimo e, nos municípios que esse mínimo não foi atingido, os diretórios ou comissões provisórias municipais serão dissolvidos", contou. Apesar de admitir vários casos no Paraná, Bueno não quis antecipar nenhum, "pois todos terão direito a ampla defesa".

A resolução do PMDB pode complicar o jogo de bancadas de situação e oposição na Assembleia Legislativa. O racha no partido, que não conseguiu manter unidade nem na eleição, é a aposta do PSDB de Beto Richa para conseguir maioria na Assembleia.

Se o recado de Temer atingiu diretamente os cinco diretórios estaduais que apoiaram oficialmente a candidatura de José Serra (PSDB) à presidência da República, também serve, segundo o deputado federal Rodrigo Rocha Loures (membro da Executiva Nacional do PMDB e ex-candidato a vice-governador derrotado nas eleições de outubro) para os deputados que ensaiam um apoio ao novo governador tucano.

"Disputamos a eleição no Paraná. O PMDB apoiou o Osmar. Infelizmente não fez na sua totalidade, mas essa foi a posição oficial do partido. O PMDB perdeu a eleição no Paraná. Os deputados estaduais foram eleitos para serem oposição e vamos fazer cumprir esse papel que as urnas nos impuseram", disse. "O presidente do nosso partido é o vice-presidente eleito. Não tem como não ter o apoio unânime do PMDB. Quem não estiver confortável para defender a bandeira do partido, estará livre para procurar outra legenda", concluiu.

Estadão: PPS desliga prefeito de Jaguariúna-SP do partido

O PPS desligou do partido o prefeito de Jaguariúna (SP), Gustavo Reis, por infidelidade partidária. A decisão foi tomada no último fim de semana, durante reunião do Diretório Nacional, em Brasília. Reis manifestou publicamente seu apoio à candidatura de Dilma Rousseff (PT) à Presidência, e contrariou assim a decisão do PPS de se coligar a José Serra (PSDB).

O partido aprovou uma resolução na reunião realizada em Brasília e informou que vai iniciar um amplo processo de reestruturação da legenda, incluindo punição e até expulsão de filiados e detentores de mandato que apoiaram candidatos de outras siglas e coligações nas eleições deste ano.

Em nota oficial divulgada pela assessoria de imprensa, o prefeito de Jaguariúna disse que tomou conhecimento pela imprensa hoje sobre o desligamento. Reis disse que a decisão do Diretório Nacional do partido foi unilateral e não houve qualquer comunicado oficial por parte dos dirigentes da legenda. O prefeito disse que não teve ciência do desligamento nem o direito constitucional de ampla defesa, previsto também no estatuto do PPS.

"Sempre adotei posição aberta, clara, ética e transparente em relação à melhor opção para o povo brasileiro que, na verdade, veio a ser amplamente consagrada nas urnas", afirmou. "Minha consciência neste ponto está serena, convicta e coerente com meus 12 anos de PPS, única legenda de minha vida pública e cujo estatuto sempre sustentou os princípios do pluralismo político, dos valores da liberdade e a radicalidade democrática", completou o prefeito.

O Tempo(MG): PPS promove caça aos ''infiéis''

O Diretório Nacional do PPS desligou do partido o prefeito de Jaguariúna (SP), Gustavo Reis, por infidelidade partidária. Reis, contrariando a legenda, manifestou em maio apoio à então candidata à Presidência da República Dilma Rousseff (PT). O PPS apoiou o adversário de Dilma, José Serra (PSDB).

Em nota divulgada ontem, o PPS anunciou que a partir do desligamento do prefeito vai promover um amplo processo de reestruturação da legenda. Para isso, aprovou resolução no último final de semana que estabelece todos os passos do processo contra os militantes que desrespeitaram o Estatuto e feriram a questão da fidelidade partidária.

"Além das punições individuais, diretórios do PPS considerados infieis poderão ser dissolvidos em todos os Estados e no Distrito Federal", afirma o texto do comunicado.

Minas

O presidente do PPS em Minas, Paulo Elisiário disse, ontem que até o momento, o partido não tem notícia de nenhum parlamentar, prefeito ou qualquer filiado que tenha cometido irregularidade semelhante.

"Como a definição do diretório nacional foi no fim de semana, ainda não tivemos tempo para realizar este levantamento dos prefeitos que teriam apoiado a campanha de Dilma", disse o dirigente.

Gazeta do Povo (PR): Faxina no PPS

O presidente do PPS, Roberto Freire, assinou uma resolução determinando aos diretórios municipais e comissões provisórias da legenda um balanço do resultado das eleições em um prazo de 30 dias. “Feito esse balanço, eventualmente constatado o não cumprimento dos dispositivos estatutários no que se refere à disciplina e fidelidade partidária, os diretórios municipais ou comissões provisórias ficarão sujeitos a dissolução e/ou reestruturação”, diz a resolução. Segundo o secretário-geral do PPS, Rubens Bueno – deputado federal eleito pelo Paraná –, a reestruturação é fundamental para a preparação do partido para as eleições municipais de 2012.
“Essa medida sinaliza claramente que o PPS será reestruturado em todo o Brasil com aqueles que defendem o partido, seu programa e tem compromisso com nossos candidatos nas eleições.
De nada adianta termos prefeitos, vereadores e deputados que, na hora de uma disputa eleitoral, apoiam candidatos de outros partidos.”

Aliás...

De acordo com o PPS, na última eleição ocorreram casos em que candidatos da legenda tiveram em um município menos votos do que o número de filiados ao partido. “Isso mostra um descompromisso total com o partido. O PPS não é refúgio para oportunistas políticos que elevam seus projetos pessoais acima dos interesses da legenda”, alega Rubens Bueno.
Fora daqui!

DEU NO JORNAL DO BRASIL- Informe JB (ONLINE)

O PPS expulsou ontem o prefeito de Jaguariúna (SP), que apoiou a candidatura de Dilma Rousseff (PT) em detrimento da do aliado do partido, José Serra.

Mais de 1/3 dos ministeriáveis participaram da atual gestão

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - Desde que Dilma Rousseff ganhou a eleição, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva repete que não irá se envolver na formação do novo governo e que o ministério tem de ser "a cara e a semelhança" da sucessora.

No entanto, das 37 pastas -além das quatro principais estatais-, mais de um terço dos escolhidos ou cotados são ou já estiveram na administração atual.

O presidente, inclusive, chancelou diretamente ao menos seis nomes: Guido Mantega (Fazenda), Fernando Haddad (Educação) Antonio Palocci (Casa Civil), Nelson Jobim (Defesa), Miriam Belchior (Planejamento) e Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral).

De todas as sugestões feitas por Lula, a petista só não manteve até agora no cargo o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles.

Dilma decidiu trocar o comando da instituição por Alexandre Tombini, hoje diretor de Normas do BC.

Alguns ministros lulistas serão remanejados. Outros, mantidos na mesma posição. No atual desenho, Paulo Bernardo, que está no Planejamento, comandará as Comunicações. Fernando Pimentel, ex-prefeito de Belo Horizonte, está cotado para Previdência ou Desenvolvimento, Indústria e Comércio.

Há, ainda, os casos de Miriam Belchior -hoje na Casa Civil- e Gilberto Carvalho -atualmente chefe de gabinete do presidente Lula-, que serão promovidos.

Ontem, ao discursar em cerimônia de inauguração de escolas técnicas, Lula voltou à já corriqueira frase de que Dilma tem que montar uma equipe do seu jeito. Em seguida, porém, desfiou elogios ao ministro Fernando Haddad, sinalizando que deseja que ele fique.

Na semana passada, Lula fez menção à permanência de Carlos Lupi no Ministério do Trabalho.

Dilma corteja Gerdau para seu governo

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Presidente eleita já fez três sondagens ao empresário, que também foi cotado por Lula no passado para ministério

Secretaria de Assuntos Estratégicos e comando do "Conselhão" são agora analisados para presidente de grupo

Natuza Nery

BRASÍLIA - A presidente eleita, Dilma Rousseff, está fazendo a corte para levar o empresário Jorge Gerdau para seu governo. Os dois são próximos desde que ela ocupava a Secretaria de Minas e Energia do RS.

A petista já fez três sondagens a um dos principais homens da siderurgia brasileira. Primeiro foi para o MDIC (Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio), mas o presidente do conselho de administração do Grupo Gerdau não se entusiasmou com a ideia, conforme interlocutores.

Dois outros destinos são agora analisados: a SAE (Secretaria de Assuntos Estratégicos) e o comando do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, conhecido por "Conselhão".

Gerdau já é um dos membros desse fórum de assessoramento do presidente, criado para discutir e formular políticas de desenvolvimento para o país.

No passado, Jorge Gerdau chegou a integrar uma lista de Lula para assumir o MDIC, proposta também recusada por ele por alegar conflito de interesses.

Pessoas ligadas a Dilma o definem como "o ministro de seus sonhos". Na campanha, pelo menos duas vezes em que passou por Porto Alegre, a então candidata se reuniu com ele.

Nos discursos, ela também cita com frequência uma frase atribuída a Gerdau: "Meta que se cumpre é meta errada".

Das opções cogitadas por Dilma, a SAE está hoje nas mãos do diplomata Samuel Pinheiro Guimarães, titular que deseja continuar à frente do cargo. Já o "Conselhão" funciona sob a chefia do ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha.

A negativa de Gerdau para o MDIC abriu espaço para que um outro nome despontasse como principal cotado para o cargo: o ex-prefeito de Belo Horizonte Fernando Pimentel (PT-MG).

Segundo a Folha apurou, Dilma está inclinada a nomeá-lo para a pasta, mas parte do PT resiste à sua indicação.

O eventual desembarque de Gerdau no Executivo traria para ao time alguém renomado fora do mundo político, uma "estrela" alçada para além das negociações partidárias, como muitos na transição gostam de definir.

Em 2002, Lula assumiu a Presidência com três nomes de peso em suas áreas de atuação.

Nomeou o cantor Gilberto Gil para Cultura; o empresário Luiz Fernando Furlan (Sadia) para o MDIC e o expoente do agronegócio Roberto Rodrigues para a Agricultura.

Dilma ainda não confirmou nenhum titular com o "perfil celebridade".

PT amplia guerra com PMDB para controlar Correios e Banco do Brasil

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Diante da perspectiva de assumir o Ministério das Comunicações, petistas iniciam discussão com Dilma para nomear também dirigente da estatal e pôr fim ao loteamento político

Vera Rosa / BRASÍLIA

Diante da perspectiva de comandar o Ministério das Comunicações, o PT planeja desalojar o PMDB da direção da Empresa de Correios e Telégrafos (ECT). O pedido será encaminhado pela cúpula do partido à presidente eleita, Dilma Rousseff.

A ideia, no entanto, é passar um verniz de ‘desloteamento’ político nos Correios para apresentar a reivindicação como uma tentativa de profissionalizar a estatal, alvo de uma sucessão de crises nos últimos meses.

A direção do PT aposta que o futuro ministro das Comunicações será Paulo Bernardo, atual titular do Planejamento, e já começou a vasculhar uma das chamadas joias da coroa.

Há apenas quatro meses na presidência dos Correios, David José de Matos foi indicado pelo deputado Tadeu Filipelli (PMDB-DF), vice-governador eleito do Distrito Federal, mas também é amigo de Erenice Guerra, a ministra da Casa Civil que caiu em setembro, no rastro de acusações de tráfico de influência na pasta.

Mapa. Uma comissão formada por seis dirigentes do PT já começou a fazer o mapeamento dos cargos federais. A equação não é fácil de ser fechada porque o PT da presidente eleita Dilma Rousseff e o PMDB do futuro vice-presidente, Michel Temer (SP), dão cotoveladas em busca dos principais assentos para demarcar seus respectivos territórios.

O Ministério das Comunicações está sob controle peemedebista e a sigla só aceita abrir mão do pasta se levar Transportes, hoje capitaneado pelo PR.

O assunto foi avaliado na segunda-feira, 29, em reunião de Dilma com o presidente do PT, José Eduardo Dutra, e o deputado Antonio Palocci, futuro chefe da Casa Civil. Desde setembro Bernardo atua como uma espécie de interventor nos Correios e faz um diagnóstico dos problemas da empresa, que não são poucos.

Banco do Brasil. Além de ocupar a cadeira mais importante dos Correios, o partido de Dilma também quer trocar o presidente do Banco do Brasil, Aldemir Bendini. A maior instituição financeira do País tem ativos de R$ 725 bilhões. Sem levar em conta o PMDB, que está de olho na presidência do Banco do Brasil, uma ala do PT pretende emplacar ali o atual secretário de Política Econômica, Nelson Barbosa.

Em conversas reservadas, porém, interlocutores de Dilma admitem que a escolha será resultado de uma disputa de bastidores entre Palocci e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, mantido no cargo. Tanto Mantega como Palocci, ex-ministro da Fazenda de 2003 a 2006, têm influência no banco.

Bendini chegou à cúpula do BB na cota do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas até no Palácio do Planalto há quem defenda a sua saída, sob a alegação de que ele "não atende" as demandas políticas. Barbosa, por sua vez, tem cativado as tendências do PT.

Na sexta-feira, o secretário fez uma exposição sobre a conjuntura econômica durante seminário promovido pela chapa petista "O partido que muda o Brasil" e encantou os espectadores com seu discurso na linha desenvolvimentista. A portas fechadas, Barbosa disse que a maior preocupação, no governo Dilma, é como manter o processo de crescimento com o cenário internacional adverso.

Apesar da cobiça do PMDB, a presidente da Caixa Econômica Federal (CEF), Maria Fernanda Ramos Coelho, deve ser mantida no posto.

Escolha de ministros segue 'ritual' com bênção de Lula

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Nomes confirmados têm audiências com o presidente e Dilma no 'Triângulo dos Eleitos': Planalto, Alvorada e Torto

Leonencio Nossa/BRASÍLIA

Guido Mantega (Fazenda), Nelson Jobim (Defesa), Luciano Coutinho (BNDES), Fernando Haddad (Educação), Sérgio Gabrielli (Petrobrás), Alexandre Tombini (BC), Miriam Belchior (Planejamento), Carlos Lupi (Trabalho) e José Gomes Temporão (Saúde). Definidos ou não para compor o ministério da presidente eleita, Dilma Rousseff, esses nomes têm outra característica em comum: todos percorreram o caminho do "Triângulo dos Eleitos".

Todos eles passaram pela Granja do Torto, onde fica Dilma, e pelo Palácio do Planalto, onde trabalha o presidente Lula. E quando é preciso uma conversa mais discreta, o Alvorada vira o ponto noturno da reunião de avaliação.

Na quarta-feira passada, o economista Luciano Coutinho conversou com Dilma sobre a permanência no Banco de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Horas depois, estava no gabinete de Lula no Palácio do Planalto. É a "bênção presidencial", dizem os assessores do governo.

Desde o início do mês, Lula tem repetido em entrevistas que não dá "palpites" na composição do próximo ministério. Na prática, porém, os escolhidos de Dilma precisam conversar com ele antes de ter o nome anunciado por interlocutores da presidente eleita diante dos holofotes.

Assessores do Planalto dizem que a conversa dos escolhidos com Lula é apenas para discutir questões do atual governo e, no máximo, o atual presidente dá uma "bênção" ao escolhido. Também dizem que Dilma está sendo cuidadosa em demonstrar respeito e consideração pelo atual presidente, que ainda chefia boa parte dos escolhidos.

Seja para chancelar a escolha da eleita ou para benzer os futuros ministros, Lula recebeu, na véspera da confirmação dos nomes, todos os que vão compor o ministério e comandar estatais. Foi assim com Miriam Belchior, Tombini e Gabrielli. Na semana passada, Gabrielli saiu do Rio para um encontro com Lula no Planalto apenas para fechar sua permanência na estatal de petróleo.

Oficialmente, ele esteve com o presidente para fazer um balanço das ações e dos programas da estatal. O presidente da República disse em entrevista, após o encontro, que Gabrielli continuaria no comando da Petrobrás até 31 de dezembro, quando ele, Lula, deixa o governo. No ritual do Planalto, Gabrielli conseguia garantir a permanência no cargo.

Antonio Palocci, Gilberto Carvalho e Paulo Bernardo, os três fiéis aliados de Lula que vão integrar o governo Dilma, sendo os dois primeiros na "cozinha do Planalto", têm conversas com o presidente todos os dias.

Angústia. É grande a angústia na Esplanada dos Ministérios, onde atua boa parte dos 38 ministros do governo, diz um interlocutor de Lula. Receber um telefonema do Planalto para uma audiência com o atual presidente tem o mesmo valor que uma ligação da Granja do Torto, onde mora Dilma Rousseff, avalia o auxiliar de Lula.

Alguns ministros aguardam em silêncio um telefonema do Planalto. E até quem está de saída, como José Gomes Temporão (Saúde), não deixa de avaliar com Lula a situação do ministério e a escolha do sucessor.

Há ainda os que esperam sensibilizar o presidente. Foi o caso de Carlos Lupi, do Trabalho, que na semana passada conseguiu a façanha de levar Lula até a periferia de Brasília para inaugurar um posto do ministério batizado com o nome de Leonel Brizola.

Na festa ficou evidente o lobby para permanecer no cargo. Lupi rasgou elogios a Lula, mas não conseguiu arrancar dele um sinal de que continuará na pasta. Diante de câmeras, o ministro, porém, deixou claro que está à disposição de Dilma.

Lula impõe Haddad, mas diz que não manda

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Apesar de afirmar que 'Dilma tem de montar ministério à sua cara e semelhança', presidente sugere permanência de ministro da Educação

Lisandra Paraguassú/ BRASÍLIA

O ministro da Educação, Fernando Haddad, teve ontem um cabo eleitoral de peso e um palanque próprio na estratégia para continuar no cargo durante no governo de Dilma Rousseff: o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em três cerimônias diferentes e uma reunião privada, Haddad passou o dia com Lula.

Ouviu elogios, insinuações de que o presidente queria sua permanência e teve espaço para defender sua gestão, recentemente muito criticada pelos problemas no Exame Nacional de Ensino Médio (Enem).

Pela manhã, enquanto inaugurava com Haddad 30 escolas técnicas federais e 25 novos câmpus de universidades, Lula começou dizendo que não indica ministros para a presidente eleita. "Não cabe a mim indicar ministro. Vocês sabem que sou defensor da ideia de que ela (Dilma Rousseff) tem de montar um ministério à sua cara e sua semelhança. Ela tem de escolher o ministério que ela quer porque essa coisa é complicada. Se você monta um time de futebol e você não comanda os jogadores, jogador derruba técnico. Ministro é fácil de colocar. Para tirar é duro", disse o presidente.

Em meio a uma plateia, formada por reitores de universidades federais e institutos tecnológicos, o presidente voltou a tocar no assunto: "Eu estou aqui dizendo que eu não posso indicar ministro, não posso. Se eu pudesse pedir uma vaga ia pedir para mim, mas como eu não posso."

À tarde, em outro evento com Fernando Haddad - dessa vez a entrega do prêmio para as crianças que venceram a olimpíada da língua portuguesa - o presidente aproveitou para elogiar de novo seu ministro. "O Fernando Haddad me proporcionou grandes alegrias na área da educação", afirmou.

Balanço. O ministro teve espaço para defender sua gestão, citou números e realizações. "Não nos furtamos a enfrentar nenhum debate relevante. Nada foi colocado numa gaveta. Os enfrentamentos foram inúmeros. Quantos meses, quanto tempo, quantas reuniões, dezenas, envolvendo técnicos de mais de um ministério. É muita coisa, tem muito suor e lágrimas", disse. "Tivemos muitas vicissitudes, mas tivemos tranquilidade para enfrentar todas."

Ainda sem ter conversado com a presidente eleita sobre sua permanência, Haddad é nome dado como certo no próximo governo - justamente por ser um pedido do presidente Lula. Mas também porque é bem visto por grupos importantes envolvidos com educação.

Ontem mesmo ouviu um elogio do presidente do banco Itaú, Roberto Setúbal, que patrocina a Olimpíada de Português. "Eu tenho uma admiração pessoal pelo ministro Haddad", afirmou. Havia uma expectativa de que a presidente eleita, Dilma Rousseff, receberia Haddad ao final da noite de ontem.


Censo: população vai a 190,7 milhões, mas cai ritmo de crescimento

DEU EM O GLOBO

Um país de 190.732.694 habitantes

RETRATOS DO BRASIL

Censo 2010 mostra que crescimento populacional foi menor que o esperado

Cássia Almeida, Dandara Tinoco e Juliana Castro

A população brasileira está menor do que o esperado. Ontem o IBGE divulgou os primeiros números do Censo populacional de 2010, mostrando que há 190.732.694 brasileiros, uma população 12,3% acima da de 2000. Mas as projeções eram de um crescimento maior. Pelos próprios números de 2008 do IBGE, esperava-se encontrar 198 milhões este ano, como lembra o professor José Eustáquio Alves, da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (Ence), ligada ao próprio instituto:

- A taxa de crescimento esperada era maior. Isso foi o que mais surpreendeu os demógrafos. Os outros resultados confirmaram a tendência já mostrada em outros levantamentos.

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad/2010), também produzida pelo IBGE e divulgada em setembro último, projetava 191,8 milhões em 2009. Número acima do encontrado pelos 191 mil recenseadores um ano depois.

- Na década de 90, a taxa de crescimento era 1,6% ao ano e agora já está caindo para 1,17%. Já está caindo de maneira bastante expressiva ao se comparar com países mais desenvolvidos europeus e asiáticos, que também têm população envelhecida e ritmo de crescimento menor da população. Observamos que o padrão demográfico brasileiro é muito parecido ao dos outros países - afirma Eduardo Nunes, presidente do IBGE.

Segundo Alves, da Ence, pelas projeções do próprio instituto, a população brasileira para de crescer em 2040:

- O Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) prevê que isso acontecerá em 2030. Pelos números divulgados hoje (ontem), essa estagnação deve ficar mais perto de 2030 - destaca o demógrafo.

As tendências que já vinham sendo desenhadas por outros censos e pelas pesquisas anuais do instituto foram confirmadas. O Brasil está mais urbano: 84% da população vivem nas cidades. Em 2000, essa parcela chegava a 81%. Num movimento de migração que vem se dando desde os anos 1950, o meio urbano só ganha habitantes: em 1991 eram 35,8 milhões na área rural; este ano, são 29,6 milhões.

- A população na zona rural gira em torno de 30 milhões desde a década de 1950, mostrando que o crescimento populacional brasileiro acontece nas cidades - afirma o presidente do IBGE.

100 mulheres para 95,9 homens

A população brasileira está cada vez mais feminina. São 97,342 milhões de mulheres para 93,4 milhões de homens. Isso significa que há cem mulheres para 95,9 homens. E essa tendência demográfica vai se manter pelas próximas décadas, na avaliação de Alves:

- É um movimento inexorável. Apesar de nascer mais homens, eles sofrem mais com a violência. Vimos isso agora no Rio. Os homens são as grandes vítimas da violência. Porém, mesmo que diminua a violência urbana, só vai reduzir o ritmo de crescimento do superávit feminino.

Para encontrar mais homens, somente na zona rural. Em todas as grandes regiões brasileiras, esse fenômeno se repete. A região Norte é a única que apresenta mais mulheres em relação aos homens no total da população.

Outro movimento que se confirmou com os números do Censo 2010 foi o crescimento das cidades médias, que ganharam peso populacional nos últimos dez anos. São municípios que têm entre cem mil e cinco milhões de habitantes. Já o Rio de Janeiro, com 6,323 milhões de habitantes, perdeu participação - é a única cidade brasileira com mais de cinco milhões de habitantes. Assim como São Paulo, com 11,2 milhões de habitantes, também a única com mais de dez milhões de pessoas:

- É de se esperar. É o que chamamos de deseconomia de escala. Muito engarrafamento e alta população inviabilizam o crescimento dessas cidades. Desde a década de 1980, percebemos esse ganho de participação das cidades médias.

Cidades como Manaus e Brasília ganharam espaço. A primeira pela fronteira agropecuária e pela Zona Franca de Manaus. A segunda, pelo crescimento do funcionalismo público, com alta renda, o que faz crescer o setor de serviços e atrai população, explica Alves.

A pirâmide etária continua engordando no centro. A parcela de crianças de 0 a 9 anos vem diminuindo, enquanto a pirâmide está mais gorda entre 10 e 29 anos. É o que os especialistas chamam de bônus demográfico: a população em idade ativa, apta para trabalhar, é a maior entre as faixas etárias. E a pirâmide etária está esticando, com a população chegando aos 100 anos:

- O envelhecimento também é outro movimento que só deve crescer nas próximas décadas - diz Eustáquio Alves.

Assim, o Brasil se aproxima do padrão demográfico de países desenvolvidos mais maduros. Pelas projeções, o Brasil terá em 2050 o perfil populacional da França em 2005, com a população no mesmo número nas faixas etárias de 0 a 60 anos.

Exército pode ficar 7 meses no Alemão, até a nova UPP

DEU EM O GLOBO

Militares vão usar a experiência de Paz no Haiti para manter cerco e patrulhamento

Um dia após a ocupação do Complexo do Alemão, o governador Sérgio Cabral anunciou que já conseguiu do Ministério da Defesa a garantia de que o Exército poderá permanecer por sete meses no conjunto de favelas até que o Alemão e a Vila Cruzeiro ganhem Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs). Enquanto cerca de sete mil PMs forem treinados, militares do Exército serão responsáveis pelas operações de cerco, buscas e patrulhamento das favelas. Os soldados que estão nas duas comunidades passaram pelo Haiti e têm experiência em ocupações. Denúncias de saques nas casas de moradores durante as operações policiais levaram à criação de uma ouvidoria em caráter emergencial. A polícia estima que o prejuízo total do tráfico no Complexo do Alemão foi de R$ 50 milhões - entre 42 toneladas de maconha, cerca de 300 quilos de cocaína, armas, dinheiro em espécie, veículos e imóveis.

Exército no Alemão por 7 meses

Cabral diz que Defesa aceitou que militares permaneçam até instalação de UPPs

Renata Leite

O governador Sergio Cabral anunciou ontem, um dia após a ocupação do Complexo do Alemão e da Vila Cruzeiro (que faz parte do Complexo da Penha), que no prazo de sete meses as duas comunidades ganharão Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs). Até lá, enquanto cerca de sete mil PMs estiverem sendo treinados e formados para o projeto de pacificação, militares do Exército vão assumir as operações de cerco, buscas e patrulhamento na região. Segundo Cabral, a ajuda já está acertada com o Ministério da Defesa. De acordo com o governador, a integração entre as polícias Militar, Civil e Federal e o Exército vai permitir que o cronograma de instalação de UPPs planejado pelo governo do estado seja mantido, mesmo com a antecipação da ocupação do Alemão e da Vila Cruzeiro.

- As reconquistas do território, tanto da Vila Cruzeiro quanto do Complexo do Alemão, já foram efetivadas. Agora são os próximos passos. Nós não vamos dormir nos louros da conquista de ontem. Nós acordamos desde cedo com os desafios de hoje e dos próximos dias, semanas e meses, que é a reconquista efetiva dos territórios ainda ocupados pelo poder paralelo - disse Cabral ontem no Fórum Rio Cidade Sede, que debateu a infraestrutura urbana para os Jogos de 2016.

Os oficiais do Exército auxiliam as forças policiais não só no policiamento ostensivo das comunidades recém-ocupadas, como também revistando pessoas e vasculhando residências. Além do trabalho dos serviços de inteligência, Cabral agradeceu à ajuda da população, que vem colaborando significativamente com informações sobre o paradeiro de armas, drogas e bandidos escondidos dentro e fora dessas comunidades.

- Estamos na fase das tratativas técnicas, que não passam por mim, mas pelo secretário Mariano (José Mariano Beltrame, de Segurança) e pelos oficiais militares do Ministério. Isso está sendo feito desde domingo, para que se dê a garantia dessa transição no modelo UPP - acrescentou Cabral. - Tenho certeza de que as forças federais aceitarão a nossa solicitação de apoio, de suporte, porque conquistamos credibilidade.

O vice-governador Luiz Fernando Pezão acrescentou que há planos para ampliar as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) no Alemão. Deve haver novos investimentos em moradias, urbanização e saneamento do complexo.

- Já enviamos projetos (para aprovação) para a Vila Cruzeiro e para o Complexo do Alemão.

Favelas e militares: combinação de risco

Embora não seja a primeira vez que os militares deem apoio a uma ação de segurança na cidade, a experiência mostra que a participação dos soldados têm tido mais sucesso fora das favelas. Nas operações em que ficaram responsáveis pelo patrulhamento das principais vias, como na Rio-92 e durante a Cimeira dos chefes de estado em 1999, a cidade teve uma melhora na sensação de segurança. O mesmo não se repetiu quando o Exército entrou em favelas. Em 2008, três jovens moradores do Morro da Providência foram presos pelos militares e depois entregues a traficantes do Morro da Mineira, controlado por uma facção rival. Os três foram mortos pelos bandidos. Em março de 2006, a Providência também foi ocupada pelo Exército. Eles estavam em busca de dez fuzis e uma pistola roubados de uma unidade. Na missão, houve confronto com traficantes e um jovem de 16 anos foi morto. Em 2003, após uma onda de violência na cidade, os Exército foi chamado para participar de operações com objetivo de redução da criminalidade. Na operação, um professor de inglês foi morto ao passar por uma barreira militar. Na Operação Rio 1, em 1994, soldados foram acusados de torturar moradores no Morro do Borel.

Noel Rosa e Cartola, os bambas do samba

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Shows iniciam comemoração do centenário de Noel, no mesmo dia dos 30 anos da morte de Cartola

Lucas Nobile

A encíclica do samba reza que as obras de dois pilares da música popular brasileira sejam lembradas hoje. O centenário de Noel Rosa comemora-se apenas no dia 11 de dezembro, mas nesta terça-feira - mesmo dia em que se completam 30 anos da morte de Cartola -, as composições do Poeta da Vila serão homenageadas em releituras de um projeto no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB-SP).

Embora contemporâneos, eles revolucionaram o cancioneiro nacional em períodos diferentes. É bem verdade que se conheceram, conviveram e até compuseram juntos no início da década de 1930, mas cada um seguia seu caminho, naturalmente, por serem de origens distintas.

Ao passo que Cartola vivia no morro de Mangueira, em meio a trabalhadores pobres, no fim dos anos 1920, desfilando com o Grupo dos Arengueiros (no sentido de bagunceiros e arruaceiros), Noel vinha de uma família de classe média, foi aluno do colégio de padres São Bento, um ginásio de elite que o levaria posteriormente a estudar Medicina.


A formação diferente influenciou diretamente no estilo das composições dos dois. Noel de Medeiros Rosa sabia jogar com as palavras em seu conjunto Bando dos Tangarás e Angenor de Oliveira, o Cartola, criava sambas pela malandragem, com a mesma mentalidade de subúrbio dos autores do Estácio.

"Não se pode ignorar essa diferença de classe. O Noel nunca fez samba-enredo, como o Cartola, que compôs os primeiros da Mangueira, e ele trabalhou em cima de temas da classe média que são atuais até hoje. Há um samba dele (com Vadico), Pra Que Mentir, que se o Chico Buarque assinasse todo mundo diria que é dele", diz o jornalista e pesquisador José Ramos Tinhorão.

É importante a ressalva de que a primeira fase de Cartola era marcada por grande simplicidade, com sambas rasteiros. As maravilhas que o eternizariam como um dos maiores compositores da música popular brasileira viriam em sua retomada, a partir dos anos 1970. "Se você ouve as letras da primeira fase e compara com as da volta, vai pensar que foram feitas por outra pessoa. Ele conviveu com o Sérgio Porto, mas não foi fazer nenhum curso, tinha uma sofisticação natural, um exemplo raro, voltou como um poeta", diz Tinhorão.

Encontros inusitados do centenário de Noel

Na música, seguindo a máxima dos parnasianos, ainda hoje muita gente que não tem conteúdo abusa da forma. Até o início dos anos 1930, grande parte das composições brasileiras era marcada justamente por um rebuscamento exagerado. O quadro começou a mudar quando o coloquialismo deu um chega pra lá nos rococós e, temas, como o amor - e verdadeiras crônicas sociais, com descrições dos tipos da época -, passaram a ser tratados com uma linguagem mais simples e objetiva.

Muitos contribuíram com grande parcela, como os compositores do Estácio, entre eles, Ismael Silva, Bide, Mano Edgard e Brancura, além de Marçal, Sinhô e Joubert de Carvalho - muitos revelados ao público pelas vozes de Francisco Alves, Mario Reis e Carmen Miranda, na Era de Ouro do rádio. Inegavelmente, o nome de maior destaque foi Noel Rosa, responsável por fazer com que o samba do subúrbio e do morro vestisse o summer mais simples e elegante descesse aos salões da alta sociedade.

O centenário de nascimento dele é comemorado no dia 11 de dezembro, mas as homenagens a um dos nomes mais importantes da música popular brasileira tiveram início ainda no começo do ano. Depois do merecido tributo prestado pela Vila Isabel, no carnaval, com o enredo Noel: A Presença do Poeta da Vila, outros eventos pipocaram pelo País em 2010 e agora o compositor é lembrado em uma série de shows no Centro Cultural Banco do Brasil, em São Paulo.

Com curadoria de Luís Filipe de Lima, o projeto Noel Rosa - Um Novo Século é realizado com shows sempre às terças e teve início na semana passada, com apresentação de Jards Macalé e a banda performática carioca Brasov.

As misturas são sempre inusitadas e, nesta terça, será a vez de Paulo Miklos ser acompanhado pelo Quinteto em Branco e Preto. Depois, a série segue com Marina de La Riva e o pianista Benjamin Taubkin (7/12) e uma grande turma de talentos formada por Kassin, Moreno Veloso, Domenico Lancelotti, Pedro Sá e o próprio Luís Filipe de Lima (14/12). "A ideia foi reunir intérpretes menos próximos da matriz e da órbita imediata do Noel. Queremos mostrar que a obra dele está muito viva, com grande poder de comunicação até hoje. Homenageá-lo no centenário é praticamente uma obrigação cívica", diz Luís Filipe.

A curadoria, seguramente, está em boas mãos, já que a ligação dele com a obra de Noel existe há tempos. Além de se aproximar dos temas do compositor de Vila Isabel desde os tempos em que começou a estudar música, Luís Filipe foi o responsável pela direção musical da peça Noel Rosa - O Poeta da Vila e Seus Amores (1999), assinou a trilha do filme Noel - O Poeta da Vila (2006) e, com a de agora, já dirigiu 11 séries no CCBB, em homenagens a Lamartine Babo, Ismael Silva, Carmen Miranda, entre outros nomes.

Nas quatro apresentações, a intenção não é traçar um panorama biográfico e histórico sobre vida e obra de Noel com um espírito didático. A única exceção, que aparecerá no show de Marina de La Riva e Benjamin Taubkin, é um trecho em que é ressaltada a qualidade de Noel como melodista, com toda a influência exercida sobre o poeta por meio das parcerias com outro gênio, que também completaria 100 anos em 2010, mas infelizmente é pouco lembrado do público, o pianista e compositor Osvaldo Gogliano, o Vadico.

A principal preocupação foi não repetir o repertório, tarefa difícil diante de um cardápio de mais de 300 canções compostas em uma vida de 26 anos, interrompida pela tuberculose. "Eu conheço o Noel desde antes de formar os Titãs. Quando recebi o convite pensei em me orientar pelas gravações antigas, que são as que eu mais gosto. A princípio, pensei em cantar as canções mais obscuras do Noel, mas acabei equilibrando o repertório, tinha que saborear os clássicos, ele foi um grande hitmaker", conta Paulo Miklos.

Clássicos. Os clássicos a que ele se refere, presentes na apresentação da próxima terça, são, por exemplo, Fita Amarela, Com Que Roupa?, Feitio de Oração, Tarzan, o Filho do Alfaiate, Tipo Zero, Positivismo, Onde Está a Honestidade, Palpite Infeliz, Último Desejo, As Pastorinhas, entre outros.

A parceria de Miklos com o Quinteto em Branco e Preto não é nenhuma novidade. O cantor e compositor se encantou com o grupo de São Paulo no ano passado, quando foi acompanhado pelos rapazes ao aparecer cantando em uma churrascaria no premiado filme É Proibido Fumar. A partir dali, ele ficou maravilhado com o talento de Magnu Sousá, Maurílio de Oliveira e companhia e foi conhecer a fundo aquele universo musical, frequentando inclusive o reduto do Samba da Vela.

Aproveitando o novo encontro com o quinteto, Miklos convidou Alex Miranda, da Trator Filmes, e vai registrar as apresentações pensando em fazer um documentário. "O Noel é o centro da história e tem o registro do encontro com o quinteto. Ainda não está claro na minha cabeça o que isso vai virar, mas eu não gostaria de fazer algo biográfico, histórico, chato. Quero registrar isso com uma visão artística, mais aberta", conta Miklos.

Noel Rosa - Um Novo Século. CCBB. Rua Álvares Penteado, 112, Centro, 3113-3651. 3ª, 13h e 19h30. R$ 6. Até 14/12.


Trinta anos da morte de Cartola e seu eterno legado

De quase todos parceiros e amigos que conviveram com ele, a pergunta é a mesma: "Já faz tanto tempo assim? Meu Deus." A resposta é sim. Hoje, completam-se 30 anos da morte de Angenor de Oliveira, o mestre Cartola, e o espanto das pessoas próximas ao sambista é natural. A obra do fundador da Estação Primeira de Mangueira é tão atemporal que nem parece que ele se foi há três décadas.

Com um legado intangível não apenas para o samba, mas para a música brasileira em geral, ele teve temas regravados por uma lista infindável de artistas respeitados, como Elis Regina, Paulinho da Viola, Jair Rodrigues, Nelson Gonçalves, Zeca Pagodinho, Eumir Deodato, Joel Nascimento, Ney Matogrosso, Cazuza, Beth Carvalho, entre tantos outros.

Hoje ele tem muito mais reconhecimento do que em vida. Para se ter uma ideia, durante um período de sua carreira, sempre com seus típicos óculos escuros, praticamente anônimo, servia cafezinho no Ministério da Indústria e Comércio. Viveu um período de ostracismo no meio da década de 70, até voltar à tona com um sucesso arrebatador. "Em 74, ele estava sumido, muita gente pensava que ele tinha morrido. Eu fui até o morro da Mangueira, na casa dele, e perguntei se tinha músicas inéditas que eu queria gravar. Ele me mostrou inéditas como As Rosas Não Falam, O Mundo É Um Moinho e Corra e Olha o Céu. Eu gravei e logo depois saiu o disco dele com esses sucessos. Tivemos uma relação de pai e filha. O Cartola dizia que eu era a melhor intérprete das músicas dele", lembra Beth Carvalho.

Outro a ter uma convivência estreita com o sambista, "de padrinho e afilhado", foi o poeta, compositor e produtor Hermínio Bello de Carvalho. "Eu o conheci em 1962 e vi o Zicartola nascer. Era uma tentativa de amigos e admiradores de Carola e Zica de fazê-los sair da pobreza em que viviam. Minha amizade com o casal se estreitou, e fui convidado para ser o padrinho de casamento dos dois. Eu fui um ouvinte privilegiado de algumas inéditas feitas por ele, como Acontece, Autonomia, As Rosas Não Falam e O Mundo É Um Moinho", lembra o parceiro de Cartola e Carlos Cachaça na antológica Alvorada.

"Quando ele morreu, Zica fez chegar às minhas mãos o ‘anel de sambista’ que Cartola sempre usava e deixou com a instrução de que me fosse entregue. Hoje está, de empréstimo, na sede do Centro Cultural Cartola", recorda Hermínio.

Aliás, foi ele quem levou Paulinho da Viola ao bar e o apresentou a Cartola, em 1964. "Certa vez, em um programa de televisão, perguntaram a ele quem poderia ser seu sucessor. Ele disse que era eu. Para mim, foi uma honraria, não estou à altura de ser sucessor do Cartola. É voz corrente que ele era uma pessoa especial, com toda a obra que deixou, com muito lirismo e poesia. Eu agradeço muito ao Cartola por todo apoio, generosidade e incentivo que me deu", diz Paulinho da Viola.

O círculo de amizades não parou por ali e foi também no Zicartola que Paulinho conheceu Elton Medeiros, com quem faria belos sambas e que já era parceiro de Cartola em temas imortalizados até hoje, como O Sol Nascerá (A Sorrir) e Peito Vazio. "Eu me considero um aluno do Cartola. Já que a vida é feita de música, ele me ensinou a viver. Aprendi muito com ele, que deixou como legado o exemplo de como se construir uma música brasileira de qualidade. Isso tudo o transformou em um imortal do samba", diz Elton Medeiros.

Morte e Vida Severina – Introdução :: João Cabral de Melo Neto

— O meu nome é Severino,
como não tenho outro de pia.
Como há muitos Severinos,
que é santo de romaria,
deram então de me chamar
Severino de Maria
como há muitos Severinos
com mães chamadas Maria,
fiquei sendo o da Maria
do finado Zacarias.

Mais isso ainda diz pouco:
há muitos na freguesia,
por causa de um coronel
que se chamou Zacarias
e que foi o mais antigo
senhor desta sesmaria.

Como então dizer quem falo
ora a Vossas Senhorias?
Vejamos: é o Severino
da Maria do Zacarias,
lá da serra da Costela,
limites da Paraíba.

Mas isso ainda diz pouco:
se ao menos mais cinco havia
com nome de Severino
filhos de tantas Marias
mulheres de outros tantos,
já finados, Zacarias,
vivendo na mesma serra
magra e ossuda em que eu vivia.

Somos muitos Severinos
iguais em tudo na vida:
na mesma cabeça grande
que a custo é que se equilibra,
no mesmo ventre crescido
sobre as mesmas pernas finas
e iguais também porque o sangue,
que usamos tem pouca tinta.

E se somos Severinos
iguais em tudo na vida,
morremos de morte igual,
mesma morte severina:
que é a morte de que se morre
de velhice antes dos trinta,
de emboscada antes dos vinte
de fome um pouco por dia
(de fraqueza e de doença
é que a morte severina
ataca em qualquer idade,
e até gente não nascida).

Somos muitos Severinos
iguais em tudo e na sina:
a de abrandar estas pedras
suando-se muito em cima,
a de tentar despertar
terra sempre mais extinta,
a de querer arrancar
alguns roçado da cinza.


Mas, para que me conheçam
melhor Vossas Senhorias
e melhor possam seguir
a história de minha vida,
passo a ser o Severino
que em vossa presença emigra.