terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Cofre trancado e pé no freio do consumo

DEU NO CORREIO BRAZILIENSE

Além de fechar a torneira para R$ 30 bilhões previstos no Orçamento e de restringir gastos de ministérios, ajuste fiscal pensado pelo Executivo pretende conter compras e dívidas da população

Luciano Pires


O corte no Orçamento 2011 é apenas uma das medidas de impacto que o governo Dilma Rousseff pretende baixar para convencer o mercado e a oposição de que está comprometido com o saneamento das contas públicas e com o controle inflacionário. Internamente, a área econômica avalia que o ajuste fiscal a ser anunciado precisa ser duro, convincente e eficaz. A estratégia é trancar o cofre e combinar ações que desestimulem as pessoas a comprar e se endividar. Detalhes do “cavalo de pau” que será dado na economia foram discutidos ontem por Dilma e os ministros que fazem parte do núcleo de coordenação política.

Cálculos do governo apontam para a necessidade de um contingenciamento de R$ 30 bilhões na peça orçamentária aprovada em 22 de dezembro pelo Congresso Nacional. O Palácio do Planalto também cogita bloquear de forma preventiva todo o Orçamento, permitindo aos ministérios gastar apenas o necessário para manter os programas em atividade. Enquanto isso, técnicos dos ministérios da Fazenda e do Planejamento vão revisar receitas e despesas.

Deputados e senadores inflaram a previsão de receitas da União em R$ 25,3 bilhões e é justamente esse o motivo da mobilização do Executivo. A ministra do Planejamento, Miriam Belchior, tomou posse ontem e anunciou que seu primeiro compromisso será uma reunião hoje com a secretária de Orçamento Federal, Célia Corrêa. “Contingenciamento tem todo ano. Neste ano, também vai ter porque a receita está bastante superior àquilo que acreditamos que vá de fato ocorrer. Qual o tamanho é uma coisa que a gente deverá decidir”, disse a ministra.

Na mira da tesoura do governo estão diárias com viagens de servidores públicos, gastos com aluguéis de carros e imóveis, além de contratos de manutenção predial e compra de materiais de escritório. O corte em estudo livra as verbas destinadas ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o Bolsa Família e preserva boa parte dos recursos voltados à educação e à saúde. As pastas mais atingidas pela retenção de recursos deverão ser o Turismo e o Esporte. “Vamos ter de discutir com cada um dos ministros como é que eles podem fazer mais com menos”, disse Miriam. Ainda conforme a ministra do Planejamento, não é justo “satanizar o custeio”. “Quero lembrar que Bolsa Família é custeio. Atendimento de saúde é custeio. Não posso satanizar esse tipo de gasto. Isso é diferente dos gastos internos da máquina. Temos de tomar cuidado para não colocar tudo no mesmo saco”, advertiu.

Entre as ações com repercussão direta no bolso das famílias estão novas restrições ao crédito. O Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) se reunirá nos dias 18 e 19 deste mês e deverá aumentar a taxa básica de juros (Selic) — atualmente em 10,75% ao ano — como forma de conter o apetite do brasileiro por consumir. O núcleo de coordenação do governo acredita que se o aumento dos juros vier combinado com a ação efetiva das lideranças da base de apoio na Câmara e no Senado para tentar aprovar pelo menos parte da reforma tributária será possível melhorar a qualidade do gasto público e dos tributos cobrados da sociedade ainda durante o primeiro semestre. Nas palavras da ministra Miriam Belchior, é possível trabalhar com os dois pés: no acelerador e no freio.

Defesa

O ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, defendeu ontem as ações do governo Luiz Inácio Lula da Silva na área fiscal e os incentivos concedidos aos setores que foram mais prejudicados pela crise econômica de 2008 e 2009. Bernardo participa ativamente das discussões que envolvem o corte orçamentário que será anunciado em breve. “Às vezes, as pessoas não entendem, ou tentam fazer que não entendem, mas tivemos muito rigor na área fiscal. Salvo no período de 2009 e 2010, onde, por conta da crise, fizemos de forma acertadíssima uma inflexão e mudamos as metas, o presidente Lula registrou os maiores superavits primários (economia de recursos para o pagamento dos juros da dívida pública) nos seis primeiros anos”, justificou.

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