quarta-feira, 16 de março de 2011

Mais incertezas:: Celso Ming

Um dia antes do terremoto que abalou o Japão, o Banco Central do Brasil alertava para "a volatilidade e a aversão ao risco que se elevaram nos mercados internacionais". A mesma ata do Copom avisava que "prevalece nível de incerteza acima do usual". E, no entanto, a economia global ainda não havia sido estremecida pelo terremoto no Japão.

O começo de pânico visto ontem nos mercados (veja o gráfico) reflete o desapontamento com o acúmulo de incertezas. A superação disso depende da rapidez e da eficiência com que esse início de crise nuclear for contido.

O ambiente da economia mundial vinha capengando, ainda não recuperado da crise de 2008. E mais problemas, diretamente ligados à crise ou independentes dela, estão se sobrepondo.

A fragilidade dos fundamentos fiscais e políticos do euro está mergulhando a velha Europa numa crise múltipla e sem perspectiva de redenção a curto prazo. A dívida consolidada do bloco ultrapassa os US$ 14,6 trilhões, sem recuperação imediata - os rombos seguem crescendo. O déficit orçamentário dos Estados Unidos, por sua vez, é de US$ 1,3 trilhão no exercício fiscal terminado em setembro e sua dívida pública ultrapassa os US$ 14 trilhões. O mundo rico enfrenta uma crise fiscal com desdobramentos pouco claros. O risco maior é o de que seja desencadeada uma rejeição dos títulos dessas dívidas.

Mais a curto prazo, não dá para desprezar a recuperação da atividade econômica, que é de 3,3% nos Estados Unidos e de 1,7% na área do euro. Mas o desemprego continua enorme, sem perspectivas imediatas de reversão. É de 8,9% nos Estados Unidos e de 9,9% na área do euro.

O segmento dos países emergentes, onde se insere o Brasil, apontava vigoroso crescimento econômico. Mas enfrenta agora certa carga inflacionária reforçada neste primeiro trimestre do ano pela alta do petróleo e das commodities alimentares. É o que exigirá certa desaceleração da produção por parte dos governos, com impacto nas exportações.

Os mercados seguem encharcados pela liquidez da política monetária flácida da maioria dos grandes bancos centrais, elevada pelas emissões de emergência do Banco Central do Japão. Essa política é a maior responsável pela forte entrada de recursos nos emergentes, sobretudo no Brasil, que, só em 2011, já registrou mais de US$ 25 bilhões em afluxo de capitais líquidos. Essas emissões são a maior causa da guerra cambial denunciada pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega. São as moedas fortes se desvalorizando em consequência dessas emissões e os demais países - como o Brasil - respondendo com restrições à entrada de capitais.

A essa paisagem sem definição se juntaram neste início de ano as incertezas provocadas pelas revoltas populares em países da comunidade islâmica, de onde ainda provém a maior parte do petróleo consumido no mundo. São convulsões políticas que se sabe como começam, mas não deixam indicações de como terminam.

O terremoto, o tsunami e o pesadelo nuclear dos últimos quatro dias acrescentaram mais incertezas ao acúmulo anterior de incertezas e provocaram medo. Como das outras vezes, recuperar a confiança depende da qualidade da resposta das autoridades globais - não só das do Japão.

CONFIRA

Falta de sintonia

Na edição de 11 de março, esta Coluna apontou falta de sintonia dos bancos oficiais, especialmente Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal, com a "moderação da política de crédito" do Banco Central e suas medidas macroprudenciais.

Vem mais

Em mensagem, o Banco do Brasil reconhece que sua carteira de crédito imobiliário deve dobrar neste ano e que examina pedidos de crédito para investimentos de R$ 65 bilhões.

Por que só para eles?

O Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Coureiras de Goiás e Centro-Oeste reclama da política privilegiada de crédito que o BNDES vem dando ao frigorífico Mafrig Alimentos S/A. Embora documento da Serasa acuse 21 anotações de duplicatas não honradas, o Mafrig recebeu desde 2009 R$ 232 bilhões em financiamentos do BNDES. "As pequenas e médias empresas de Goiás e do Centro-Oeste não conseguem tal façanha", reclama o diretor financeiro do sindicato, Ismael Gonçalves Nunes.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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