quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Reflexão do dia – Luiz Werneck Vianna

A própria retórica encrespada de que fazem uso importantes dirigentes sindicais em defesa de suas posições indica que as tensões contidas nessa matéria não são triviais. Anote-se que a pesada qualificação - política nefasta -, usada por um deles, foi destinada ao governo Dilma, embora tenha sido o de Lula que, em seus últimos dias, condenou ao veto qualquer aumento acima do teto de R$ 540. Aí, talvez, uma pista para elucidar um novo estado de coisas no sindicalismo.

VIANNA, Luiz Werneck. Os sindicatos e a política. Valor Econômico, 31/1/2011.

Partidários de Mubarak enfrentam manifestantes nas ruas do Cairo

Egípcios leais ao presidente rompem cerco e entram em confronto com opositores na praça Tahrir


CAIRO - Manifestantes contrários e favoráveis ao presidente do Egito, Hosni Mubarak, se enfrentam desde a manhã desta quarta-feira, 2, na praça Tahrir, no centro do Cairo. É a primeira vez que partidários do ditador saem às ruas, onde opositores há nove dias pedem sua renúncia.

De acordo com a rede de TV Al-Arabya, alguns dos manifestantes favoráveis a Mubarak receberam pagamento de 200 libras egípcias (US$ 34) para participar dos protestos. Os partidários de Mubarak romperam um cerco e derrubaram faixas e entraram em confronto com os manifestantes que estavam na praça. Imagens de televisão mostraram pessoas feridas e sangrando.

Uma testemunha disse à agência Reuters que paus e pedras foram usados nos confrontos. Segundo ela, dez pessoas ficaram feridas. "São esses capangas do partido de Mubarak. Estava na entrada da praça fazendo um bloqueio humano e uma pedra me atingiu", disse.

Ainda de acordo com manifestantes presentes na praça Tahrir, partidários de Mubarak usaram camelos e cavalos nos confrontos. Montados nos animais, eles brandiram chicotes contra os opositores. Depois de observar o confronto por quase duas horas, o Exército interviu, disparando tiros ao ar para dispersar os manifestantes.

Após Mubarak anunciar na noite de terça-feira que não ia disputar a reeleição grupos de manifestantes leais a ele saíram às ruas com facas e porretes. O confronto começou horas depois de um porta-voz do Exército ir à televisão estatal para pedir que os manifestantes deixem as ruas. Durante os enfrentamentos, soldados das Forças Armadas não intervieram.

Em cima do muro:: Merval Pereira

Há um descompasso evidente entre o que acontece nas ruas do Egito e a reação dos governos ocidentais. Tanto quanto os Estados Unidos, os governos europeus estão muito cautelosos no tratamento diplomático da crise política que já derrubou o ditador da Tunísia e está colocando num aparente beco sem saída o ditador egípcio Hosni Mubarak, que piscou ao anunciar que não se candidatará a mais uma reeleição.

Não houve uma manifestação oficial da União Europeia, e os países tratam da questão com a prudência de quem ainda não sabe para que lado o vento está soprando.

Os governos da França, da Inglaterra e da Alemanha soltaram uma nota conjunta muito cautelosa, ainda procurando um papel para a ditadura de Hosni Mubarak.

Os europeus destacam o papel "conciliador" sempre exercido pelo governo do Egito na região para desejar que também agora na crise Mubarak se porte como um conciliador.

O presidente francês Nicolas Sarkozy esteve na reunião da União Africana em Adis Abeba, mas não se aprofundou na questão egípcia.

Disse apenas platitudes sobre a violência como uma maneira errada de buscar a solução de problemas.

Sem as amarras políticas que impedem uma explicitação de posição, nos debates no recente Fórum Econômico Mundial, houve um consenso de que o Egito seguirá o modelo da Tunísia, embora as situações sejam bastante diferentes.

A situação de desemprego maciço, um alto nível de pobreza e uma juventude em ebulição formam um quadro no Egito muito favorável a uma verdadeira revolução que não terá Mubarak à frente.

A juventude egípcia acredita na democracia nos termos ocidentais, e por isso é improvável um novo ditador ou um golpe militar, pois eles já viram esse modelo falir através do mundo árabe.

Os primeiros movimentos de Mubarak para amenizar a situação, indicando o vice-presidente e alterando seu Ministério não foram suficientes, assim como de nada valeu sua promessa de antecipar as eleições e não se candidatar.

Os egípcios querem uma mudança completa, querem ser tratados como cidadãos e ser ouvidos.

Dois ministros tunisianos, Yassine Brahim, ministro da Infraestrutura e Transportes, e Mustapha Kamel Nabli, presidente do Banco Central, fizeram parte do debate em Davos, que foi intermediado por Raghida Dergham, correspondente diplomático e colunista do "Al Hayat", dos Estados Unidos, e teve ainda a participação de Khalid Abdulla-Janahi, dos Emirados Árabes Unidos, Moncef Cheikh-Rouhou, professor de Finanças Internacionais da Escola de Administração da França, e Nkosana D. Moyo, vice-presidente e chefe de operações do Banco de Desenvolvimento da África com sede na Tunísia.

A dúvida era se os protestos nas ruas resultariam em uma saída negociada de Mubarak ou se haveria um banho de sangue.

Diante da posição dos militares de não atacar a população, tudo indica que está superada a possibilidade de um enfrentamento sangrento.

A revolta política na Tunísia, o país mais urbano e educado do Magreb, é considerada um ponto de partida para uma mudança no Oriente Médio e no Norte da África.

As sementes de mudança deixadas pela chamada "Revolução de Jasmin" estão já se enraizando e crescendo na região.

A revolução lançada pelas redes de relacionamento como Facebook tinha um campo fértil para se espalhar: uma classe média importante, com taxa de possuidores de casa própria de 80%, sem problemas étnicos ou religiosos, uma tradição de ser um estado robusto e bem organizado.

Houve desde o início na Tunísia, e parece estar acontecendo o mesmo agora no Egito, uma colaboração entre os militares e a população revoltada.

Um exemplo dessa integração foi a denúncia, através de mensagens de texto, diretamente para o site das Forças Armadas, da existência de franco-atiradores em alguns edifícios.

De posse da informação, os militares enviavam helicópteros para prender os atiradores.

Assim como no Egito, é a juventude que esteve à frente do movimento de revolta na Tunísia, utilizando-se das redes sociais e do twitter para se organizar.

No dia seguinte da queda do ditador Ben Ali, um dos novos ministros despachava através do twitter. Nas paredes era possível ler palavras de ordem oriundas dos movimentos estudantis de 1968 em Paris: "Democracia é um bom investimento".

A "Revolução de Jasmim" derrubou um mito que serviu para sustentar ditaduras em todo o mundo árabe, o de que haveria "ou uma ditadura ou o Talibã", ou a " Irmandade Muçulmana" no caso do Egito.

Pelo menos na Tunísia, e tudo caminha para que seja assim também no Egito, a revolução veio respeitando as instituições, e a mudança de regime foi feita dentro das regras da lei.

As instituições governamentais estão intactas e existe a previsão de convocar eleições dentro de seis meses.

Mubarak tentou um acordo com base na convocação de eleições para setembro, e os governos ocidentais que o apoiaram esses anos todos ainda estão na posição de defender uma "transição pacífica", o que significaria que ele controlaria o processo de sua substituição, o que não parece estar de acordo com o pensamento da maioria da população, que quer sua saída imediata do poder.

Mas tudo indica que esteja no fim a ditadura de Hosni Mubarak no Egito, e é previsível que daqui por diante as declarações dos países ocidentais serão cada vez mais distante de uma posição neutra como a atual.

FONTE: O GLOBO

Por água abaixo:: Dora Kramer

Nesta hora em que a base governista oficializa que o Congresso é um híbrido de almoxarifado do Palácio do Planalto com cartório para despachos de interesses específicos, caberia à oposição fornecer um discurso para a sociedade.

No mínimo para informar que não compactua com certas práticas, que está atenta às agruras do Parlamento. Dizer que é minoria, perdeu a eleição, mas não perdeu o juízo, o discernimento, a compostura nem a capacidade de perceber o que acontece debaixo do seu nariz e à vista de todos: a ruptura do Legislativo com a realidade do País que supostamente representa.

No lugar disso, PSDB e DEM vêm a público afagar os respectivos umbigos, ignorando os 43 milhões de eleitores que acabaram de atribuir à oposição a tarefa de denunciar os erros e propor as correções.

Quem está interessado em discutir o Brasil? Pelo visto até o momento, ninguém. Inclusive porque o ambiente não é propício. Se alguém propõe um tema, logo é acionado o porrete de matar debate materializado na desqualificação do debatedor mediante a justificativa de que seus interesses são meramente táticos ou estratégicos visando a um objetivo eleitoral.

O DEM, que havia se anunciado como um partido disposto a assumir a sua face clara, liberal, conservadora ou de direita, retrocedeu da discussão ideológica para a lavação de roupa suja pura e simples.

O PSDB, que proclamara a intenção de fazer jus ao seu eleitorado, se enfurna em questiúnculas regionais, numa disputa pelo comando do partido repleta de inutilidades, golpinhos, telefonemas ambíguos, mágoas de comadres, editoriais encomendados a jornais de província e pretensas demonstrações de força dos grupos aliados a José Serra e Aécio Neves.

Enquanto o partido estiver refém dessa disputa tola com todos os gestos de seus integrantes referidos nos interesses dessa ou daquela ala, a legenda vai continuar sem rumo, sem comando, sem horizonte, sem projeto nacional, caminhando de volta à origem.

Nessa trajetória fratricida, regionalista, sem discurso nem identidade o PSDB vai ficando cada vez mais parecido com o PMDB de origem.

Partido de onde Mário Covas, Franco Montoro, Fernando Henrique Cardoso, José Richa e tantos outros saíram para criar um partido de quadros qualificados para pensar o Brasil.

A ideia era se distanciar dos anacronismos e deformações que naquela altura, em 1988, já descaracterizavam a legenda capitã da luta pela redemocratização.

Infelizmente para a democracia restaurada há 26 anos, o projeto não resistiu ao tempo nem à ação dos que não souberam capitalizar o poder conquistado prematuramente - apenas seis anos após a fundação do partido com a eleição de Fernando Henrique em 1994 - e agora só fazem demonstrar que não sabem como recuperá-lo.

Visão de fora. Novato nas lides federais, o deputado Alfredo Sirkis (PV-RJ) tomou posse ontem depois de quatro mandatos como vereador, estranhando o clima de júbilo consigo mesmos reinante entre os nobres colegas.

"Sinceramente, não entendi o motivo de tanta celebração, já que o momento de comemorar é na eleição. Hoje (ontem) seria o primeiro dia de quatro anos de trabalho, mas a Câmara dos Deputados parecia em transe de injustificado regozijo. Achei muito esquisito", disse ele, que ainda terá muito com o que se espantar.

Até tu. Se é verdade o que dizem aliados do governador Sérgio Cabral sobre a influência dele na indicação do novo ministro (Luiz Fux) do Supremo Tribunal Federal, é de se registrar a adoção do critério de "cotas" também para o Poder Judiciário.

Um loteamento expandido.

Releitura. No caso de José Sarney a (quase) unanimidade de burra não tem nada. Excessivamente esperta, porém, pode ser que um dia vire bicho e coma o dono.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

O tempo da política:: Fernando Rodrigues

Por direito constitucional, o novo Congresso tem quatro anos para trabalhar em conjunto com a presidente Dilma Rousseff. Mas a história recente indica ser mais exíguo o tempo disponível.

Por costume e preguiça dos políticos, e sobretudo pela modelagem da democracia brasileira, só o primeiro ano dos mandatos é de fato útil no Poder Legislativo.

Embora os 12 meses iniciais estejam longe de representar um idílio entre o Planalto e o Congresso, é inegável o ainda baixo nível de envenenamento das relações políticas. O caminho se torna menos pedregoso na hora de enfrentar temas relevantes e polêmicos.

A presidente da República está fresca no cargo. Pode propor leis sem ser acusada de casuísmo. Não há restrições no calendário. O mesmo se passa com os congressistas. Já em 2012, tudo se contamina pelo processo eleitoral nas cerca de 5.600 cidades pelo país.

Daqui a 12 meses, o darwinismo político ditará a regras. Interesses paroquiais ganharão importância. Se hoje deputados e senadores se digladiam por cargos e por liberação de emendas ao Orçamento, em 2012 essa fisiologia miúda se torna dramática. Uma questão de sobrevivência.

Muitos disputam as eleições ou apoiam candidatos a prefeito, os futuros e indispensáveis cabos eleitorais mais adiante.

Passado o pleito municipal de 2012, vem o hiato de 2013. Um ano sem eleições. Em tese, seria o momento das discussões de interesse para o país.

As sempre faladas reformas política, tributária, da Previdência e dos direitos trabalhistas. Ocorre que as disputas nas cidades deixam feridas abertas.

Perde-se metade de 2013 recompondo relações. Quando os machucados começam a dar sinal de cicatrização, a cabeça de todos estará em 2014 -e na sucessão presidencial.

Os congressistas e a presidente da República conhecem bem esse "tempo da política". Ou fazem algo agora ou tudo fica para 2015.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

O Congresso põe seus blocos na rua:: Cristian Klein

O Congresso se mobilizou ontem para a eleição dos presidentes da Câmara e do Senado. José Sarney (PMDB-AP) segue para seu quarto mandato à frente da Casa Alta. No Parlamento, está há 35 anos. Supera, como ressaltou em discurso, até Ruy Barbosa, que ficou de 1890 a 1921 no Senado. Ex-presidente da República, deve sua sobrevivência, nos últimos anos, ao apoio do agora também ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que o defendeu, certa vez, dizendo não se tratar de um "cidadão comum". Na Câmara, o favorito Marco Maia (PT-RS) recebia críticas pela possibilidade de ser um 38º ministro de Dilma Rousseff - ou seja um preposto, à frente de um Legislativo submisso ao Executivo.

Sobre o Congresso Nacional sempre pairam as maiores desconfianças. Privilégios, sinecuras e dúzias de escândalos recorrentes colaboram para que o Parlamento não tenha boa imagem diante da opinião pública. Perto dos outros dois poderes - Executivo e Judiciário -, o Legislativo é, de longe, o que tem a reputação mais arranhada. Individualmente, poucos avanços têm sido feitos por deputados e senadores para mudar o quadro de descrédito. No entanto, em meio ao cenário desolador, há um arcabouço institucional favorável e mudanças recentes que têm agido no sentido de fortalecê-lo.

O funcionamento do Congresso brasileiro em torno de linhas partidárias razoavelmente rígidas tem se consolidado, o aproximando cada vez mais do modelo europeu e o distanciando do americano. Enquanto nos Estados Unidos o Congresso é quase sempre considerado o reino do individualismo dos parlamentares, eleitos para atender aos interesses paroquiais de seus distritos, o Parlamento brasileiro é capaz de barrar incentivos personalistas da arena eleitoral - graças à Constituição e aos regimentos internos das duas Casas legislativas.

"Todo poder aos líderes" poderia ser o dístico a ornar a entrada do Congresso Nacional. A delegação de poderes à Mesa Diretora e aos líderes partidários - e daí a cobiça pelos cargos distribuídos ontem na Câmara e no Senado - é o mecanismo pelo qual o Parlamento encontrou, durante a Constituinte, para resolver os problemas de ação coletiva numa Casa apinhada de 594 representantes com tantos interesses contraditórios.

Legislativo tem em seu tamanho uma desvantagem

Afora os conhecidos desvios de conduta de seus integrantes - o que, por outro lado, também reflete o caráter mais aberto do Congresso - reside aí uma das maiores desvantagens do Legislativo em relação aos outros poderes. O Executivo é hierárquico e, no limite, se move a partir de uma única cabeça, presidencial. A Suprema Corte do Judiciário é composta pelo restrito comitê de 11 ministros. Para que o Legislativo tenha um mínimo de coesão e agilidade, a solução foi concentrar o poder na Mesa Diretora e nos líderes.

As candidaturas avulsas de Sandro Mabel (PR-GO), Jair Bolsonaro (PP-RJ) e Chico Alencar (PSOL-RJ), na eleição de ontem à Presidência da Câmara, neste sentido, refletem o anacronismo do poder parlamentar individual numa Casa regida pela linha partidária. Ou pela lógica que a move. A formação, em cima da hora, de cinco blocos partidários que atuarão na nova legislatura é resultado ainda mais evidente deste cálculo político. A melhor estratégia de pressão - seja interna ou voltada para fora - é a articulação em grupo. Se partido não basta, formam-se blocos.

O fato de a formação dos blocos ter se originado à revelia da presidente Dilma Rousseff é sinal de que o Legislativo pode encontrar espaços de independência. A aglutinação começou com PV e PPS (26 deputados), foi imitada por PR e partidos nanicos (60) e depois chegou aos médios e grandes. O PT e o PMDB formaram o maior bloco, ao lado de PP, PDT, PSC e PMN, com 257 parlamentares, no limite para a maioria governista. Também da base aliada, PSB, PTB e PCdoB reuniram seus 71 deputados. E as maiores siglas da oposição, PSDB e DEM, criaram bloco com 96 (19% do total).

Constitucionalmente, a distribuição dos valiosos postos das Mesas Diretoras pode seguir a divisão por partidos ou por blocos. Seja como for, o incentivo é em direção à lógica que põe as organizações partidárias como protagonistas do processo decisório. Se o auge do personalismo na política brasileira geralmente ocorre em situações de sobrevivência eleitoral, o ápice do partidarismo se dá no Congresso e na eleição de suas Mesas Diretoras.

A difundida imagem de parlamentares que, por meio de barganhas individuais, fazem do(a) presidente um refém indefeso não condiz com a realidade. A pressão só é eficaz pela ameaça crível, e esta só ocorre por meio de um líder que controle os votos de seu grupo.

Não é à toa que até uma legenda considerada pouco coesa, fisiológica, como o PR, tenha ameaçado de expulsão Sandro Mabel, que insistiu e manteve sua candidatura avulsa. A possibilidade de auto-indicação à Presidência da Câmara - como fizeram Mabel, Bolsonaro e Alencar - é, assim, uma provisão contraditória na engrenagem do Parlamento.

Para a cientista política e pesquisadora do Ipea Geralda Miranda seria um resquício do poder parlamentar individual. Em artigo intitulado "A delegação aos líderes partidários na Câmara dos Deputados e no Senado Federal", Geralda mostra como duas mudanças institucionais recentes reforçaram o comportamento partidário no Congresso.

A primeira foi a resolução, em vigor a partir de 2007, que estabeleceu que a correlação de forças entre os partidos no ato da diplomação, sobre a qual se baseia o critério de proporcionalidade, vale até o fim da legislatura. Isso tornou menos atraente aos partidos, geralmente os governistas, a cooptação de parlamentares com o objetivo de ganhar melhores postos numa recomposição da Mesa Diretora. A segunda mudança, também em 2007, foi a decisão do TSE de que os mandatos pertencem aos partidos.

"São medidas que apontam para o fortalecimento dos partidos, especialmente os de oposição, e tornam o Legislativo um espaço mais independente em relação ao Executivo", afirma a cientista política. Geralda lembra que a candidatura avulsa também favorece a oposição, mas sob o signo da incerteza e do descrédito, como foi a eleição surpreendente de Severino Cavalcanti, em 2005.

Cristian Klein é repórter de Política. A titular da coluna, Rosângela Bittar, está em férias

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Apesar de você:: Fernando de Barros e Silva

O PSDB exibe amanhã à noite um programa de dez minutos em cadeia nacional de rádio e TV. Não parece que seja o melhor momento para falar ao país.

O partido exibe sinais de fadiga de material:

1) Vem da terceira derrota consecutiva à Presidência;

2) tem dificuldade de formular um discurso alternativo ao do PT;

3) vive hoje uma guerra interna pelo seu comando;

4) não tem um líder óbvio a quem confiar seu futuro (Aécio, quem sabe);

5) e deixou mal resolvida sua relação com o legado de FHC, escanteado por Serra. Desse limão, como fazer uma limonada?

Sem disputa eleitoral à vista, o partido decidiu transformar FHC no grande personagem do programa.

Durante cinco minutos, ele responde a perguntas variadas de um auditório composto por 120 jovens.

FHC comemora a presença de duas mulheres na eleição presidencial. Critica a tolerância de Lula com a corrupção e a voracidade com que aderiu à política fisiológica (que ele também admite ter praticado, com mais pudor).

Mas elogia a mobilidade social e as oportunidades criadas na gestão petista.

Na metade convencional do programa, Geraldo Alckmin fala em nome dos oito governadores tucanos e Sérgio Guerra faz uma breve menção elogiosa (ou protocolar) ao desempenho de Serra na eleição.

O que fica do conjunto, no entanto, é um grande desagravo a FHC. Lembra algo de uma sessão de psicanálise, na qual o partido procura trazer à tona seus traumas e olhar de frente a sua história. Mas o programa também pode ser visto -para seguir com Freud- como um sintoma do que permanece recalcado entre os tucanos. Serra e Aécio só aparecem em imagens de arquivo...

Durante a gravação, FHC foi questionado por uma garota sobre Chico Buarque, principal apoio de Dilma entre os artistas. Elogiou o compositor e disse que sua canção predileta é "Apesar de Você". A cena não vai ao ar e só estará disponível no site do PSDB. Quem, entre os tucanos, vai vestir a carapuça?

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Onde o governo Dilma faria a diferença :: Antonio Paim

O empenho em propalar a suposição de que a presidente da República, recém-empossada, estaria buscando diferenciar-se do governo precedente corresponde muito mais a uma aspiração (legítima, sem dúvida) do que a inferências com base na realidade, a partir do período transcorrido desde a posse. Antes de mais nada, pelo fato de que na campanha eleitoral a candidata Dilma não fez outra coisa senão enfatizar que daria continuidade ao governo Lula, seu grande inspirador.

Até prova em contrário, teremos um novo governo Lula. O mais plausível em relação ao comportamento de Dilma Rousseff, nestes primeiros dias de governo, quando não imita Lula, com os sucessivos discursos que o caracterizavam, seria admitir que, prudentemente, não se disporia a disputar com ele a inconteste liderança que desfruta. Seria, aliás, uma insensatez.

O frequente aparecimento na mídia fora a forma escolhida pelo ex-presidente para marcar presença junto a seus liderados. Esperemos para ver qual vai ser a sua opção. Seria ingênuo de nossa parte admitir que iria permitir concorrência logo nesse plano.

A prova em contrário, a meu ver, não pode consistir num corte de gastos, por mais extenso que possa parecer, a partir dos números que têm sido divulgados extraoficialmente. No curso da campanha eleitoral, Dilma afirmou reiteradamente que não via nenhuma necessidade de ser efetivado o ajuste fiscal reclamado pela oposição. Este corresponde ao reconhecimento de uma realidade recusada pelo governo Lula: não cabe apenas restaurar a capacidade de investimento do Estado - o que tornaria imprescindível retomar a privatização interrompida -, mas simultaneamente permitir a adoção de novas prioridades.

Examinando, serenamente, a massa de compromissos assumidos pelo Estado no governo Lula, não podemos deixar de lembrar os tempos do milagre econômico dos governos militares, quando o crédito farto disponível no mercado internacional foi utilizado para efetivar a revolução industrial brasileira (reclamada por sucessivas gerações), sob a égide do Estado. Sabemos muito bem aonde nos conduziu: hiperinflação, década perdida em matéria de crescimento, até "cairmos na real", como se diz, em meados do decênio passado, no governo Itamar e no primeiro de FHC. Além do Plano Real, o bem-sucedido programa de privatizações, interrompido no segundo governo FHC e não só arquivado, mas satanizado e renegado sob Lula.

No último governo Lula criou-se clima completamente artificial no que se refere à capacidade de investir do Estado. Atuou basicamente em duas frentes, sendo a primeira a interrupção dos programas que levariam o Estado a dividir encargos com a iniciativa privada, liberando-o para atuar onde não há quem supra as lacunas: desordem urbana, em consequência da radical mudança (ocorrida em tempo recorde) no que respeita à distribuição da população, a insegurança generalizada e o descalabro no setor de transportes, ali onde o Estado deverá estar presente por muito tempo, que não corresponde à generalidade dos portos, das estradas ou dos aeroportos.

O governo Lula praticamente interrompeu o programa de concessão das rodovias cujo tráfego justifica cobrança de pedágio; tornou uma farsa os leilões para ampliação da oferta de energia, ao atuar preferentemente no fortalecimento da presença estatal na geração; mudou o marco regulatório da exploração de petróleo para transformar a Petrobrás numa das "sete irmãs" (a conversa é de que, apenas na fase inicial de exploração do pré-sal, a empresa investiria US$ 150 bilhões, em meio a manobras fiscais para tapar buracos muito menores, no presente).

A pose do "grande investidor" aparece com mais clareza no segundo aspecto: acenar com a perspectiva de transformar o País num "canteiro de grandes obras", sob a égide do Estado (como nos tempos áureos dos governos militares): trem-bala, Copa 2014/Olimpíada 2016, Belo Monte, e por aí vai.

Um único exemplo do que seria a verdadeira diferenciação entre o governo Dilma Rousseff e o precedente: em face do apagão aéreo de 2006-2007, a Fundação Liberdade e Cidadania, do DEM - na época presidida pelo então senador Jorge Bornhausen -, patrocinou um seminário, estritamente técnico, para balancear a situação dos aeroportos, ante o crescimento da demanda. Além dos principais especialistas brasileiros, contou com a colaboração do renomado consultor inglês Norman Ashford, que havia estudado especificamente o assunto, inclusive por incumbência da Infraero. A principal resolução consistiu em recomendar a concessão dos aeroportos, agrupados em três grandes blocos, devendo evitar-se a possibilidade da concessão de unidades isoladas.

A proposição foi completamente ignorada, embora se tivesse enfatizado o caráter técnico da iniciativa, levando em conta a gravidade do quadro. O modelo sugerido vinha sendo consagrado nos mais diversos países, achando-se desprovido de qualquer conotação ideológica. Os compromissos assumidos em relação à Copa e à Olimpíada a tornam da maior atualidade, em face dos riscos de perdermos a prerrogativa.

O mais grave nessa insistência no agigantamento do Estado é que a vida criou para nós, brasileiros, novas prioridades. O sucesso do Rio de Janeiro no combate ao narcotráfico fez renascer, na população e nas autoridades, a crença na possibilidade de vencermos essa batalha, que era dada como perdida. A par disso, a tragédia na Região Serrana tornou patente que a complementação da infraestrutura urbana não mais pode ser adiada. A maneira como os governos federal e estaduais venham a agir, em face da nova circunstância, será o grande diferencial em nosso futuro imediato.

Presidente do Conselho Acadêmico do Instituto de Humanidades.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Do ''rouba, mas faz'' ao ''fala, mas não faz''::José Nêumanne

O depoimento do então secretário demissionário de Políticas e Programas de Pesquisa e Desenvolvimento do Ministério de Ciência e Tecnologia, Luiz Antônio Barreto de Castro, em audiência da Comissão Representativa do Congresso Nacional, em 20 de janeiro, é um dos documentos mais relevantes e reveladores da incúria administrativa e do cinismo político no Brasil. E da forma como esses vícios foram levados a extremos do descalabro nas gestões petistas de Luiz Inácio Lula da Silva. Infelizmente, esse testemunho não teve a repercussão merecida nos meios de comunicação nem provocou em nenhum dos Poderes da República (se é que funciona de fato aqui um sistema tripartite de governo) e na sociedade o debate que deveria ter provocado para que os absurdos por ele indicados sejam evitados.

O primeiro absurdo já havia sido noticiado antes de o técnico ter sido ouvido em vão pelos congressistas, a convite da senadora Marina Silva (PV-AC), que foi ministra do Meio Ambiente do governo em questão. Os brasileiros que não tiveram o privilégio de acompanhar esse depoimento ou mesmo a audiência já sabiam que em 2005, quando um tsunami devastou praias asiáticas, o ex-presidente Lula tinha firmado um compromisso com outros 167 países-membros da Organização das Nações Unidas (ONU) para instalar, ao custo de R$ 115 milhões, um sistema de radares para prevenir desastres naturais. No entanto, não foi investido nenhum centavo e os cidadãos que pagam os impostos que bancam as despesas públicas só ficaram sabendo disso quando, em 17 de janeiro, a presidente Dilma Rousseff mostrou que não é tão loquaz como o antecessor, mas aprendeu muito bem alguns de seus mais caros truques de marketing, ao anunciar um tal Sistema Nacional de Alerta e Prevenção de Desastres Naturais para o País. Seria uma piada de mau gosto se não fosse uma tragédia amarga. Pois ela anunciou para daqui a quatro anos a instalação do mesmo equipamento com cuja aquisição pelo Brasil seu antecessor e padrinho se havia comprometido em documento oficial internacional havia seis anos. A caradura do anúncio do governo foi tal que o prazo para o funcionamento, que era de dez anos, passou a ser de quatro, considerado insuficiente por quem conhece o assunto.

O depoimento do especialista no Congresso tornou-se histórico por relatar como e por que a palavra empenhada por Lula na ONU virou titica de galinha na prática. O burocrata que deixou o posto por discordar da forma como a promessa foi triturada nos trâmites da máquina pública federal revelou, antes de entregar o abacaxi com casca e tudo ao substituto nomeado, Carlos Nobre: "Há dois anos fizemos um plano de radares para entrar no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC-1), não conseguimos. Fomos orientados a entrar no PAC 2, ficamos fora. E aí eu perguntei para meu ministério: E agora? O presidente disse que devíamos colocar no Plano de Ciência, Tecnologia e Inovação Governamental (PCTI), que não teria fôlego para financiar os R$ 115 milhões".

Tudo isso seria ridículo se não fosse mais doloroso. Domingo, O Globo constatou que os responsáveis pelos PACs, pelo PCTI e pelo Orçamento da União (inclusive os representantes do povo no Poder Legislativo) não encontraram meios de conseguir R$ 115 milhões para salvar vidas em 500 áreas de risco e 300 sujeitas a inundações no Brasil, mas autorizaram o pagamento de R$ 1,2 bilhão para construir ou alugar prédios suntuosos para repartições públicas. Na Região Serrana do Rio, na Grande São Paulo e em Santa Catarina, só para citar os casos mais recentes e urgentes, brasileiros morrem ao desamparo de seus representantes e mandatários, enquanto a elite funcional federal se refestela nas sedes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), da Polícia Federal (PF), do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e do Ministério da Cultura (MinC). Sem dinheiro para radares, para instalar varas federais no interior, para melhorar a saúde pública nem para construir aeroportos seguros, a União não enfrenta entrave algum para pagar contas de cerveja, chicletes de menta e bolas de futebol ou até para financiar eventos que afugentem o estresse da nata burocrática que na União Soviética era chamada de Nomenklatura. Tudo isso, porém, vira café pequeno se comparado com os desastres naturais: só a nova sede do TSE custará mais que o triplo do dinheiro que deveria ter sido, mas não foi aplicado nestes seis anos para salvar as vítimas dos temporais.

E não me venham com a conversa de que o excesso de precipitação pluviométrica pegou os maganões federais, estaduais e municipais com as barras arriadas das calças. A ONU, sempre a ONU, revelou em Genebra que, de 2000 a 2010, 7,5 milhões de brasileiros sofreram com 60 catástrofes naturais (sem contar as enchentes e os deslizamentos deste verão): 6 secas, 37 enchentes, 5 deslizamentos de terra, 5 tempestades, 1 terremoto, 3 incidentes provocados por excesso de calor e 3 epidemias.

Os leitores de Graciliano Ramos perceberão que houve seis vezes mais desastres provocados por excesso do que por falta de chuvas no País, acostumado a lamentar o flagelo da estiagem. Os observadores da cena política terão mais a aprender da frase do técnico federal em prevenção de enchentes Luiz Antônio Barreto de Castro, que resumiu exemplarmente o comportamento de Lula e seu popularíssimo governo de oito anos: "Falamos muito e não fizemos nada".

O flagelo das secas foi imerso sob a desgraça das cheias. E o país do "rouba, mas faz", ainda em plenos vigência e esplendor, ganhou agora outra dimensão trágica: é também a pátria do "fala, mas não faz". Falar menos do que Lula, Dilma já fala. Agora precisa fazer mais - muito mais do que anunciar o que foi prometido antes e nunca realizado.

Jornalista e escritor, é editorialista do Jornal da Tarde

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Sem truque e sem anjo:: Rolf Kuntz

Truque não vale, nem vale incluir nas projeções um novo golpe de sorte. O novo governo parece disposto a seguir regras desse tipo na condução da política econômica em 2011. Sem truque, as contas públicas do ano passado teriam sido fechadas com um resultado muito menos favorável. Dos R$ 101,7 bilhões de superávit primário registrados oficialmente, R$ 31,9 bilhões vieram da capitalização da Petrobrás. Por meio de um arranjo contábil, uma despesa virou receita. Sem o golpe de sorte - US$ 15 bilhões aplicados pelos chineses no fim do ano -, o investimento direto estrangeiro teria sido insuficiente para compensar o déficit na conta corrente do balanço de pagamentos - US$ 47,5 bilhões, 2,3% do Produto Interno Bruto (PIB). As contas oficiais são hoje muito mais claras e mais prontamente acessíveis do que eram há alguns anos. Essa mudança foi um importante ganho institucional. Por isso mesmo, receitas excepcionais e intervenções do anjo da guarda são identificáveis mais facilmente e quase em cima do lance. Também os truques da chamada contabilidade criativa são captados com rapidez pelos analistas. Não vale a pena tentar enrolar a opinião pública. Economistas do setor financeiro dispõem das informações básicas e de condições técnicas para montar as próprias contas e mostrar, por exemplo, se receitas extraordinárias de depósitos judiciais foram importantes para a maquiagem dos dados oficiais.

O jogo limpo é o melhor negócio para o novo governo. Pode ser uma escolha moralmente superior e politicamente muito respeitável, mas é também uma decisão pragmática. A nova administração precisa de credibilidade. Os próximos quatro anos deverão ser difíceis. Para as economias desenvolvidas prevê-se uma convalescença demorada, com desemprego elevado pelo menos por uns dois anos. A arrumação fiscal será lenta e penosa nos Estados Unidos e na maior parte da Europa. Tudo isso poderá afetar o comércio internacional. Além disso, em algum momento será indispensável aumentar os juros no mercado internacional e também isso afetará o Brasil. Internamente, o governo terá de enfrentar os investimentos programados para a Copa do Mundo e precisará combinar esse esforço com a manutenção dos programas sociais. Em suma, a agenda interna será pesada e o governo não poderá contar com o empurrão amigo da prosperidade global.

A nova administração parte de uma situação já desconfortável. Do lado fiscal, será preciso realizar um ajuste estimado por especialistas em pelo menos R$ 54 bilhões. Talvez não possa fazer um corte tão grande, mas precisará pelo menos apresentar um plano confiável para os próximos anos. Haverá resistência mesmo entre os aliados - ou principalmente entre eles. Ao mesmo tempo, o Banco Central terá de conter a pressão inflacionária. Seus dirigentes precisarão aplicar políticas duras. Do lado externo, há o risco de uma deterioração maior da conta corrente, formada pelas balanças de mercadorias e de serviços e pelas transferências unilaterais. O mercado financeiro e as principais consultorias elevaram para US$ 9,5 bilhões sua projeção de saldo comercial. Se estiverem certos, será menos de metade do superávit do ano passado, US$ 20,3 bilhões. Mas continuam prevendo um grande buraco na conta corrente (US$ 67,9 bilhões) e um investimento direto líquido de US$ 40 bilhões. De acordo com essas projeções, será preciso financiar mais de um terço do déficit em conta corrente com endividamento e com capitais aplicados em papéis. Não dá para incluir nessas contas um ingresso repentino de recursos chineses.

Há boas notícias na balança comercial de janeiro, divulgada ontem. O valor da exportação, US$ 15,2 bilhões, foi 28,2% maior que o de janeiro do ano passado. O da importação, US$ 14,8 bilhões, foi 22,8% superior ao de um ano antes. Durante a maior parte do ano passado a importação cresceu bem mais velozmente que a exportação. É cedo para falar em mudança de tendência. Essa seria a melhor novidade. Mas há também notícias menos entusiasmantes. Os preços dos minérios e alimentos continuam sendo a principal sustentação da receita comercial. No ano passado, os preços dos básicos aumentaram 30,4%, enquanto o volume exportado aumentou 11,4%. Em janeiro, a receita dos básicos foi 56,3% maior que a de um ano antes e isso se resultou principalmente das cotações. Não deve ser ambição do novo governo manter o País na dependência da fome chinesa de matérias-primas. É preciso recuperar o dinamismo comercial do setor manufatureiro. Uma política de competitividade não é apenas mais um problema - é a síntese dos desafios econômicos.

Jornalista

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

A estreita saída:: Míriam Leitão

Al-Arashi, no Norte do Sinai, no Egito, é terra dos beduínos e pouco habitada. Uma fonte diplomática me contou que, até lá, havia ontem milhares de pessoas nas ruas. Disse também que conversou com uma mulher da alta classe média do Cairo e ouviu que ela havia mandado os filhos para a manifestação. O movimento contra Mubarak atingiu o país inteiro e todas as classes sociais.

A resposta de Hosni Mubarak, ontem à noite, foi insuficiente. Ele disse o que já se previa: que aos 83 anos não vai se candidatar novamente. Já se dizia que ele prepararia a candidatura do filho Gamal. O que chamou mais a atenção no discurso de ontem foi a ameaça implícita no pedido de que a polícia restaure a ordem e a afirmação de que o movimento deixou de ser pacífico.

A pergunta mais feita no Ocidente é se não é o começo de um governo radical islâmico. Isso ninguém sabe ao certo. O que se sabe é que a Irmandade Islâmica é apenas uma parte do movimento, não assumiu a liderança, e as oposições se uniram em torno de um líder moderado e internacionalmente conhecido, Mohamed ElBaradei. Como todos os processos de revolta, esse movimento - que está sendo chamado de Revolução de Lótus, numa referência à Flor de Lótus - pode escapar ao controle e se radicalizar.

Se acontecer isso, o primeiro culpado será o próprio Hosni Mubarak, que governou com mão-de-ferro durante 30 anos e agora se aferra ao poder iniciando um banho de sangue; ontem, a ONU dobrou as estimativas de mortos, para 300. Toda ditadura produz seus radicais pela falta de alternativas; quanto maior for a repressão, maior o risco de radicalização. O segundo responsável será o governo americano, que durante esses 30 anos forneceu armas, recursos e bilhões de dólares que sustentaram o regime.

Até ontem, as TVs ocidentais, a Al Jazeera, e a TV iraniana que transmite em inglês mostravam cenas de manifestações pacíficas, em que quem protestava empunhava bandeiras egípcias. Como a revolução de Jasmin da Tunísia, a revolta demonstrou ser nos primeiros oito dias um basta eloquente da população do país inteiro a Mubarak.

O plano dos manifestantes ontem era ir até o palácio do governo. Mas o quartel-general de cada uma das três forças armadas fica em torno do palácio. Além disso, a sede do governo foi cercada de arame farpado. Os líderes do movimento, numa decisão sensata, decidiram manter a população na Praça Tahrir e desistir do plano original. O exército estava presente, mas em atitude amigável.

O que ainda segura Mubarak no poder? O governo americano, que evoluiu, mas não o bastante. Pediu transição, mas não retirou completamente o apoio ao presidente. Por outro lado, o exército dá todas as demonstrações de simpatia em relação ao movimento, mas não dá qualquer ultimato a Mubarak. Isso dá a ele uma sobrevida, apesar de a oposição ter estabelecido claramente a sua condição para sair das ruas: Mubarak sair do governo. Mas há informações de que o chefe do exército egípcio esteve em Washington nos últimos dias.

A única forma de um governo sobreviver a uma manifestação tão forte é trágica: uma dura repressão. Foi o que aconteceu na Praça da Paz Celestial, em Pequim, em 1989, quando o governo comunista massacrou estudantes inocentes. Em Teerã, o governo de Mahmoud Ahmadinejad resistiu, em 2009, porque teve apoio religioso e militar, mas até agora a matança dos líderes da oposição ainda não acabou. Por isso, a única boa saída é a queda do ditador. Ontem, o governo iraniano dizia que o "levante do Norte da África é sinal do fim dos governos impopulares da região." Falava como se não tivesse feito o que fez para reprimir sua oposição. O levante no Egito parece maior, mais disseminado do que o do Irã; e Mubarak tem menos em que se segurar.

Na economia, o estrago da teimosia de Mubarak de não ouvir o ensurdecedor som das ruas é enorme. As maiores empresas americanas e europeias fecharam seus escritórios e repatriaram os executivos. Simplesmente a produção parou. O comércio está quase todo fechado. Os bancos e a Bolsa não funcionam há uma semana.

O levante egípcio é mais uma demonstração de como é pouco conhecida a força das novas tecnologias de comunicação. Tanto na Tunísia quanto no Egito houve nos últimos anos um aumento impressionante do acesso à telefonia celular, como mostrou ontem o site Dot Earth, do "New York Times" (veja no meu blog a reprodução dos gráficos). Quem subestima a força das novas tecnologias costuma argumentar que é pequeno o acesso à Internet num país como o Egito. Se não tivesse importância, não teria sido cortada pelo governo. Apesar da censura, as informações continuam fluindo. E é bem diferente quando o mundo está vendo.

Outra grande questão é se o levante do Egito vai contaminar outros países da região. Pode ser que haja, sim, reações em outros países, mas cada um tem uma realidade própria. O Sudão, vizinho do Egito, já está vivendo um momento de instabilidade, após a votação consagradora da proposta de separação do Sul do país. Há uma infinidade de encrencas em cada um daqueles países e muitos governos autoritários.

Um dos mais autoritários é a Arábia Saudita. Mas pouco se fala da ditadura dos Saud, porque quem produz 10 milhões de barris/dia de petróleo, e é um aliado americano, é sempre poupado. Assim era o Egito: um aliado "confiável", como dizia até dias atrás o governo americano. A dinastia dos herdeiros de Abdulaziz al Saud, parece ter controle do país que governa desde os anos 1930, mas um dos fantasmas que ronda essa crise é qualquer instabilidade na Arábia Saudita.

FONTE: O GLOBO

Oposição nega saída honrosa a ditador egípcio e exige renúncia


Após os maiores protestos já realizados no Egito e uma mensagem do presidente Barack Obama, pressionando pela transição pacífica, o ditador Hosni Mubarak anunciou que não vai concorrer a seu sexto mandato, em setembro. Mas garantiu que não renuncia, como exige a oposição: "Este é meu país, onde vivi, lutei e defendi sua terra. Vou morrer neste território", disse ele. O Nobel da paz Mohamed ElBaradei deu um ultimato ate depois de amanhã para que ele saia. O pronunciamento de Mubarak desagradou e foi muito vaiado por manifestantes, que sacudiam sapatos no ar, prometendo nova marcha até o palácio presidencial, no que está sendo chamado de "sexta-feira da despedida". A família do ditador já deixou o país e está instalada em Londres.

Egípcios rejeitam plano de ditador

A REVOLTA DO MUNDO ÁRABE

Sob pressão dos EUA, Mubarak desiste da reeleição, mas se nega a deixar o cargo até o pleito

Fernando Duarte

Foram necessários oito dias de protestos, uma megagreve geral que mobilizou mais de 200 mil pessoas somente no centro do Cairo e, finalmente, uma mensagem direta do presidente americano Barack Obama para que o ditador do Egito, Hosni Mubarak, anunciasse formalmente que não vai buscar seu sexto mandato consecutivo nas próximas eleições presidenciais. Diante da resistência do povo egípcio em acabar com os dias de protestos que varreram várias cidades do país, a Casa Branca despachou um enviado ao Cairo para aconselhar Mubarak a sair de cena e abrir caminho para a democracia. Aparentemente convencido, o egípcio foi à TV fazer um pronunciamento - acompanhado por um telão por manifestantes que se recusavam a deixar a Praça Tahrir - e defendeu estabilidade para permitir a transferência de poder, mas advertindo que não deixará o Egito.

A estratégia irritou opositores e, num sinal de que não vão recuar, manifestantes já convocam a próxima grande mobilização popular: uma marcha em direção ao palácio presidencial na chamada "Sexta-feira da Despedida".

- O Hosni Mubarak que fala a vocês está orgulhoso das conquistas durante todos esses anos servindo o Egito e seu povo. Esse é meu país, onde vivi, lutei e defendi sua terra, soberania e interesses. Vou morrer neste território - afirmou o presidente.

Nos corredores da diplomacia internacional, fontes americanas asseguravam que o anúncio foi feito somente após a mensagem enviada por Obama através do ex-embaixador dos EUA no Cairo, Frank Wisner, amigo pessoal de Mubarak. Do lado de fora, no entanto, manifestantes agitando bandeiras do Egito vaiavam e sacudiam sapatos no ar, prometendo que não deixariam as ruas até o afastamento definitivo do presidente.

Mubarak deu, ainda, outro recado controverso: prometeu mandar a temida polícia de volta às ruas para assegurar estabilidade e identificar os responsáveis pela desordem. E, refletindo a insatisfação popular, a resposta da oposição foi rápida.

- Trata-se de uma manobra dele para tentar ficar no poder - disparou o ex-chefe da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) Mohamed ElBaradei, em entrevista à rede CNN.

Mais cedo, ElBaradei já havia dado um ultimato a Mubarak - alimentando rumores de que estaria negociando com militares de média patente os rumos do Egito pós-ditadura.

- O presidente tem até sexta-feira para deixar o poder e o país, para libertar o povo. Não creio que ele queira ver mais sangue derramado - desafiou o oposicionista.

Apesar de todas as dificuldades criadas pelo regime, como a suspensão dos transportes e da infraestrutura de comunicações, nada parecia intimidar os egípcios, que aderiram em massa, à maior manifestação dos últimos oito dias. Segundo cálculos informais do Exército, pelo menos 200 mil pessoas marcharam pela capital, rechaçando com um imenso coro a recente oferta do governo de dialogar com facções da oposição.

Crianças e mulheres aderem a protestos

Mesmo em outro dia sem internet e com outro toque de recolher, manifestantes desde o início da manhã já se aglomeravam nos arredores da Praça Tahrir. Além da presença ostensiva do Exército, a vigilância foi reforçada por milhares de voluntários, que tinham na camisa etiquetas, escritas à mão, com a inscrição "seguranças do povo". Juntos, montaram filas de revista, em que além de procurar por objetos suspeitos e saudar estrangeiros como o invariável "Welcome to Egypt", distribuíam panfletos reforçando o caráter pacífico dos protestos.

Se isso significava uma demora de pelo menos uma hora para chegar à praça, ao menos serviu de incentivo para que egípcios de várias idades e origens se sentissem seguros para participar. Para observadores ocidentais a visão de grupos distintos, caminhando em direções diferentes, não raramente cantando slogans distintos, poderia parecer confusa. A maior coordenação ocorreu em momentos de prece, quando linhas e linhas de muçulmanos se ajoelhavam no chão. Para um povo que durante décadas teve agrupamentos públicos proibidos e severamente reprimidos era a oportunidade de um desabafo, expresso em cartazes e no sorriso de crianças sentadas nos ombros dos pais e abanando bandeirinhas egípcias.

- Não tive medo de trazer meus filhos hoje, pois confio no desejo do povo de pedir democracia de forma pacífica. Os jovens e as crianças precisam aprender a soltar a voz que minha geração durante tantos anos teve presa na garganta - afirmou Ali Farouk, ao lado de dois meninos que repetiam o grito de "Fora Mubarak".

O Exército cumpriu a promessa de não intervir, e os manifestantes também encontraram maneiras originais para expressar repúdio: além de enforcamentos simbólicos de bonecos do presidente, um homem subiu no alto de um dos postes para dar repetidas sapatadas num paletó e numa fotografia de Mubarak. Houve até quem desenhasse o penteado e o bigode de Adolf Hitler sobre fotos do ditador.

Se a falta de maior estrutura para comícios fez com que líderes políticos evitassem a praça ontem, lideranças religiosas aproveitaram a oportunidade para desfilar junto ao povo. A presença do imã moderado Safwat Hagazi, por exemplo, causou histeria, mas em nenhum momento tirou o sorriso com que o homem conhecido pelos egípcios como ""O Doutor"", conversou com o público.

- Estamos aqui para relembrar que somos todos egípcios, não importando se muçulmanos ou cristãos. Todos estamos do lado da democracia - declarou.

Hagazi também não se esquivou de perguntas sobre os temores do Ocidente quanto a uma eventual ascensão do Islã político com a queda de Mubarak. Além de dizer que o Egito carece de uma liderança carismática de apelo nacional, como o aiatolá Ruhollah Khomeini no Irã revolucionário de 1979, ele criticou "a obsessão dos americanos":

- Os EUA e o Ocidente precisam entender que a ditadura não vai manter a estabilidade. Hoje o que temos é falso: Mubarak é um agente da Casa Branca, e os EUA deveriam apoiar o povo egípcio, que apenas deseja o mesmo já experimentado pelos americanos: liberdade e democracia.

FONTE: O GLOBO

Com apoio de 21 partidos, Marco Maia é eleito novo presidente da Câmara

Petista, que recebeu 375 votos, se diz confiante e promete ""boa pauta de votações""; Sandro Mabel, que desafiou governistas e seu próprio partido, obteve 106 votos; aliados avaliam que será preciso mapear focos de insatisfação na base

Denise Madueño e Eduardo Bresciani

A eleição do deputado Marco Maia (PT-RS) para a presidência da Câmara, ontem à noite, deu uma vitória para a presidente Dilma Rousseff ao mesmo tempo em que acendeu uma luz amarela na relação com a base. A operação montada pelo governo para eleger Maia não conseguiu evitar que o deputado Sandro Mabel (PR-GO) mantivesse sua candidatura e obtivesse mais de cem votos na disputa. O placar registrou 375 votos para Maia, 106 votos para Mabel, 16 votos para o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) e 9 para o candidato Jair Bolsonaro (PP-RJ). Foram 3 votos em branco.

Proclamado o resultado, Maia se disse confiante no desempenho da nova Câmara. "Não tenho dúvida de que vamos produzir uma boa pauta para que o povo brasileiro possa se orgulhar dos deputados que elegeram e que colocaram aqui para representar os seus interesses", disse.

A performance da candidatura Mabel, porém, causou preocupação nas hostes governistas. "Não há razão para essa quantidade de votos. São questões indecifráveis", afirmou um influente petista. O ministro das Relações Institucionais, Luiz Sérgio, amenizou. "Mabel é um deputado da base aliada e tinha uma proposta mais ampla do que só representar alguma insatisfação", observou.

Aliados de Dilma avaliam que será necessário identificar as insatisfações dos deputados para evitar surpresas futuras. Mesmo com a vitória tranquila de Maia em primeiro turno, setores da base manifestaram no início dos trabalhos legislativos sinais de parcial infidelidade.

O governo esperava uma votação maciça no candidato oficial, principalmente, por ele ter a seu lado diversas condições favoráveis - a força da presidente em início de mandato, o apoio formal de 21 dos 22 partidos com representação na Casa, incluindo a oposição, e a "obediência" dos deputados novatos.

Ao contrário, Mabel não teve sustentação nem de seu próprio partido. Entrou na campanha na metade do mês passado, resistiu às pressões do governo e está ameaçado de ser expulso da legenda por ter mantido sua candidatura mesmo depois de desautorizado pela direção do PR.

Expulsão. O líder do PR na Câmara, Lincoln Portela (MG), anunciou um prazo até as 10 horas de hoje para Mabel pedir desfiliação do partido. Caso contrário, a Executiva deverá abrir um processo disciplinar para a expulsão do parlamentar, ex-líder do partido na Câmara.

Mabel lançou seu nome na esteira da insatisfação de deputados da base, principalmente com a falta de compromisso do Palácio do Planalto com a liberação do dinheiro das emendas feitas pelos parlamentares ao Orçamento da União e com a distribuição de cargos no Executivo.

O deputado fez uma campanha praticamente solitária e de certa forma silenciosa, sem declarações públicas de apoio. Apostou na traição permitida pelo voto secreto. Petistas e principais aliados de Dilma consideravam que seria uma derrota caso Mabel conseguisse chegar a 100 votos - e ele obteve 106.

O desempenho dos outros dois candidatos era previsível. O PSOL lançou Chico Alencar para marcar posição. "Nossa proposta para a Câmara não é corporativista, não queremos construir prédio de gabinetes. Queremos aprovar o fim do trabalho escravo, o fim do voto secreto no Parlamento. Queremos a destinação de 10% do Produto Interno Bruto para a educação e temos propostas de transparência e de ética para a Câmara", afirmou o líder do PSOL, Ivan Valente (SP).

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

A Mesa Diretora da Câmara

Presidente: Marco Maia (PT-RS). Representa o poder, preside as principais sessões e reuniões de líderes.

Primeiro vice-presidente: Rose de Freitas (PMDB-ES). Substitui o presidente em sua ausência.

Segundo vice-presidente: Eduardo da Fonte (PP-PE). Acumula o cargo de corregedor-geral da Casa.

Primeiro-secretário: Eduardo Gomes (PSDB-TO) . Cuida das questões administrativas, folha de pagamento, obras.

Segundo-secretário: Jorge Tadeu Mudalen (DEM-SP). Uma das funções é emitir passaportes diplomáticos.

Terceiro-secretário: Inocêncio Oliveira (PR-PE) . É a secretaria responsável pelas passagens áreas a que têm direito os deputados.

Quarto-secretário: Júlio Delgado (PSB-MG). Secretaria responsável pelos apartamentos funcionais.

Suplentes de secretário (substituem os titulares nas reuniões da Mesa):

Carlos Eduardo Cadoca (PSC-PE), Sérgio Moraes (PTB-RS), Geraldo Resende (PMDB-MS), Manato (PDT-ES).

Sarney volta, 'com sacrifício', a presidir Senado

Peemedebista vai comandar a Casa pela quarta vez e promete o que não fez nos últimos dois anos: a reforma administrativa

Adriana Vasconcelos

BRASÍLIA. Sentindo-se superior a Rui Barbosa e prometendo ser seu último cargo público, o senador José Sarney (PMDB-AP) não teve dificuldades ontem para se reeleger, pela quarta vez, para a presidência do Senado. Num jogo pré-definido, com 70 votos ele atropelou seu adversário, o novato senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), que recebeu oito votos. No pronunciamento, Sarney prometeu que fará a reforma administrativa que não fez nos últimos dois anos e uma gestão independente e transparente. Foram registrados dois votos nulos e um em branco.

Embora tenha reiterado em seu primeiro pronunciamento após a vitória que não desejava a presidência e falando em sacrifício, Sarney quase chegou às lágrimas ao agradecer o apoio e lembrar a trajetória que lhe garante hoje o posto de mais antigo parlamentar da Casa.

- Não desejava o encargo, dele não pude fugir, tendo na carne o alto preço do exercício destas funções... Acredito que tenha predominado no exame que levou à escolha do meu nome a graça da vida que me fez o mais antigo parlamentar na História da República, com 56 anos de mandatos, dos quais cinco no Senado, onde passei 35 anos, o que mais tempo passou aqui, ultrapassando mesmo o nosso patrono, Rui Barbosa.

Mesmo identificado como um dos principais aliados da presidente Dilma Rousseff, Sarney defendeu a independência do Legislativo e cobrou a participação da Casa na formulação das políticas públicas.

- Tenho deveres de amizade, partidários e políticos, mas não será com o Senado que resgatarei qualquer dever de amizade, política ou partidário. Acima de tudo isso estão a independência, a autonomia, a dignidade e os grandes interesses da nossa Casa - disse, ao anunciar a intenção de não mais disputar novas eleições, como já fizera antes.

A senadora Marta Suplicy (PT-SP) acabou levando a melhor numa queda de braço dentro da bancada petista com o ex-ministro José Pimentel (CE). Foi eleita vice-presidente do Senado, mas com o compromisso de renunciar à função no fim deste ano para ceder a vaga para Pimentel. O senador Demóstenes Torres (DEM-GO) chegou a questionar em plenário o acordo informal acertado entre os dois parlamentares do PT.

Já o PSDB, como terceira maior bancada, garantiu o direito de indicar um representante para ocupar a 1ª. Secretaria. O escolhido para a vaga foi Cícero Lucena (PB). O PTB e o PT chegaram a se estranhar em plenário, quando o líder petebista, senador Gim Argello (DF), questionou o acordo pelo qual a bancada petista cedeu para ao PR a 2ª. Secretaria. Após apelo do líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), Gim recuou e aceitou a indicação de João Ribeiro (PR-TO) para a vaga.

O PTB indicou João Vicente Claudino (PTB-PI) para a 3ª Secretaria da Mesa. O PMDB cedeu a sua segunda escolha para o PP, que indicou Ciro Nogueira (PI) para a 4ª Secretaria.

FONTE: O GLOBO

Aécio é recebido no Senado como líder da oposição

O senador Aécio Neves (PSDB-MG) foi recebido ontem no Congresso Nacional como o líder da oposição. Previamente convocados, seus aliados -incluído o comando do DEM -montaram uma recepção pela manhã na entrada do Senado.

"Vamos formar uma turma boa", afirmava Aécio ao ser abordado por colaboradores.

A movimentação deixou explícitas disputas internas na oposição ao governo Dilma.

Hoje um dos maiores desafetos do ex-presidenciável José Serra (PSDB-SP), o presidente nacional do PSDB, Sérgio Guerra (PE), também participou da recepção.

A cúpula do DEM, por sua vez, um dia depois de derrotar o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), na disputa pela liderança do partido na Câmara, não só esperou por Aécio como posou para fotos ao seu lado.

Ao comentar por que o senador fora tratado como expoente, o novo líder do DEM na Câmara, deputado Antonio Carlos Magalhães Neto (BA), foi direto: "Ele é o líder da oposição".

Minutos antes de trocar sorrisos com a apresentadora Sabrina Sato, do programa "Pânico da TV", da RedeTV!, Aécio ensaiou um gesto de modéstia: "Não me julgo o líder da oposição. Serei uma das peças da oposição".

"É preciso uma oposição vigorosa até para que o governo possa corrigir rumos eventualmente. Não há governo forte sem oposição forte", afirmou o senador tucano.

PSDB

Sobre a disputa interna do PSDB, ele recomendou maturidade em defesa de uma esgarçada oposição.

Nesta semana, a divisão interna ficou evidente depois que aliados de Serra criticaram documento em favor da recondução de Sérgio Guerra à presidência nacional do PSDB.

O documento, na verdade um abaixo-assinado de deputados tucanos, foi articulado com aval de Aécio e após telefonema de políticos ao governador de São Paulo, Geraldo Alckmin.

Em sua reestreia no Congresso Nacional, após 16 anos de Câmara dos Deputados, Aécio também deixou as portas abertas para os governistas.

Flagrado numa conversa amistosa com o presidente nacional do PSB e governador de Pernambuco, Eduardo Campos, brincou: "Vamos dispersar que está todo mundo olhando".

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Peluso defende independência do Judiciário

Ao lado de Dilma, presidente do STF diz ainda que é preciso haver "convivência harmônica entre os Poderes"

Carolina Brígido e Jailton de Carvalho

BRASÍLIA. Ao lado da presidente Dilma Rousseff, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Cezar Peluso, defendeu em discurso a independência do Judiciário, mas ponderou que o Poder não pode fazer oposição sistemática ao Executivo. A afirmação foi feita na cerimônia de abertura dos trabalhos do Judiciário este ano. Para Peluso, a presença de Dilma no evento é indício de uma relação harmônica entre o STF e o Palácio do Planalto.

- Há duas inseparáveis dimensões republicanas: a independência do Judiciário, que não abre mão desse predicado que constitui a essência de suas atribuições constitucionais, e a convivência harmônica dos Poderes. Independência, está claro, não é submissão, mas tampouco pode significar oposição sistemática - disse Peluso.

O presidente do STF aproveitou para cobrar a terceira edição do Pacto Republicano, uma espécie de força-tarefa entre o Palácio do Planalto, Congresso Nacional e Judiciário pela aprovação célere de propostas de modernização dos tribunais. Neste ano, Peluso quer enfatizar os projetos de lei que estão no Congresso em prol da ampliação do acesso ao Judiciário e da maior rapidez na prestação dos serviços. Entre as prioridades estão as reformas do Código de Processo Penal e do Código de Processo Civil.

- Tomo a liberdade de lançar aqui, de modo formal, a ideia de firmarmos o terceiro Pacto Republicano para, em substância, dar continuidade ao processo de aprimoramento da ordem jurídica e consolidar o processo de modernização da máquina judiciária - anunciou Peluso.

A presidente Dilma não discursou na cerimônia, mas se comprometeu com a ideia do presidente do STF:

- O pacto está firmado - disse a presidente, em seguida, a Peluso.

FONTE O GLOBO

Mensagem de Dilma ao Congresso prega manutenção de austeridade fiscal

Paulo de Tarso Lyra

A presidente Dilma Rousseff vai afirmar hoje ao Congresso, na mensagem que marcará a abertura do ano Legislativo, que seu governo manterá a austeridade fiscal para garantir a continuidade do crescimento econômico vivido pelo Brasil nos últimos anos. Para isso, será fundamental que o Congresso aprove o salário mínimo de R$ 545 definido pela equipe econômica e condizente com a capacidade de gastos do governo federal. A presidente também vai sinalizar que pretende promover desonerações tributárias em alguns setores produtivos - sem comprometer-se com uma reforma tributária ampla - e estimular a competitividade entre as empresas brasileiras.

Dilma vai reforçar seu compromisso de campanha de erradicar a pobreza extrema no Brasil e deve conclamar os três entes da Federação - União, Estados e municípios - a se unir para evitar que tragédias como as ocorridas na região serrana do Rio de Janeiro voltem a se repetir.

Acusada de ser excessivamente técnica e sem jogo político, Dilma pretende fortalecer o debate político com o Parlamento. Por isso, decidiu que eventuais alterações no valor do salário mínimo serão negociados com o Congresso, e não com os representantes das seis maiores centrais sindicais do país. A segunda reunião do governo com os sindicalistas, marcada inicialmente para hoje, foi transferida para sexta-feira (ver matéria nesta página) em São Paulo.

Mesmo deixando clara a intenção de debater os novos valores com o Congresso, o tom da mensagem presidencial que será lida por Dilma vai mostrar a importância do comprometimento de deputados e senadores, especialmente da base aliada, com a estabilidade financeira do Brasil. A aprovação de um valor maior do que os R$ 545 significa um aumento de gastos do governo e, consequentemente, a necessidade de um corte mais profundo no Orçamento. Como um dos principais alvos serão as emendas parlamentares, o Planalto espera que o medo de perder recursos destinados às próprias bases eleitorais diminua o ímpeto dos políticos em reajustar o mínimo.

O pacote fiscal com o chamado "readequamento orçamentário" só deve ser anunciado na próxima semana. A ministra do Planejamento, Miriam Belchior, e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, têm se reunido com Dilma diariamente para definir o montante destes cortes. Segundo apurou o Valor, não existe ainda uma definição do total a ser tirado do Orçamento federal - estima-se algo entre R$ 25 bilhões e R$ 40 bilhões. De acordo com auxiliares da presidente, é necessária ainda uma avaliação mais precisa dos gastos do Executivo para se definir esse valor.

O governo deve mesmo abrir com as centrais a negociação para o reajuste da tabela do Imposto de Renda. Depois da primeira reunião com os sindicalistas, o secretário-geral da Presidência, ministro Gilberto Carvalho, admitiu que o governo pretende corrigir a tabela em 4,5%, tomando como parâmetro o centro da meta inflacionária definido pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Os representantes dos trabalhadores defendem uma correção maior - 6,46% - mas a justificativa do Planalto para negar esse percentual é que ele refere-se ao IPCA, índice de correção inflacionária que não é adotada pelo Executivo.

Na semana passada, um dia depois do encontro de Gilberto com os presidente das seis maiores centrais sindicais, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, deu entrevista negando que o governo estivesse pensando em corrigir a tabela do IR.

Para auxiliares da presidente, contudo, não foi uma desautorização a Carvalho e sim, uma declaração truncada de um ministro que estava chegando de férias e não acompanhou a reunião do dia anterior. O governo também deixou claro que, além de não alterar o valor proposto inicialmente, vai manter a regra que estabelece o reajuste - inflação do ano anterior mais PIB de dois anos atrás.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Battisti: para Gilmar, última palavra é do STF

BRASÍLIA e RIO. O ministro Gilmar Mendes, relator do caso Cesare Battisti no Supremo Tribunal Federal (STF), defendeu ontem que cabe à Corte dar a última palavra em processos de extradição. Em 2009, o STF autorizou a extradição de Battisti. Mas, no último dia de 2010, o ex-presidente Lula negou o pedido da Itália e manteve Battisti no Brasil. Em seguida, a defesa pediu a libertação de Battisti, mas o presidente do STF, Cezar Peluso, negou. Disse que o plenário do tribunal ainda vai analisar se a decisão de Lula foi correta.

- Eu destaquei (em 2009) que não fazia sentido o tribunal se pronunciar, uma corte com a elevação do STF, para produzir uma sentença lítero-poético-recreativa. Um tribunal desses tem que decidir com efeito vinculante. Continua a ser a minha posição, mas não foi a posição majoritária - disse Gilmar.

O ministro lembrou que, em 2009, o STF deu ao presidente o direito de extraditar ou não Battisti, desde que ele cumprisse as cláusulas do tratado entre Brasil e Itália. No novo julgamento, o STF vai analisar a legalidade da decisão de Lula à luz do tratado. Battisti foi condenado na Itália por participação em 4 homicídios na década de 1970. Atualmente, está preso na penitenciária da Papuda, em Brasília.

Gilmar estava em férias e só agora vai examinar o processo. Ontem, manifestantes foram ao Supremo com faixas pedindo a libertação de Battisti.

No Rio, a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal decidiu manter a condenação de Battisti pelo crime de falsificação de passaporte. A defesa havia recorrido contra a pena de dois anos de reclusão imposta pela Justiça Federal, alegando que Battisti portava um documento falso porque era a única forma de fugir da suposta perseguição política na Itália. A pena foi convertida em prestação de serviços à comunidade e multa de dez salários mínimos.

FONTE O GLOBO

Canto do meu canto:: Thiago de Mello

Escrevi no chão do outrora
e agora me reconheço:
pelas minhas cercanias
passeio, mal me freqüento.
Mas pelo pouco que sei
de mim, de tudo que fiz,
posso me ter por contente,
cheguei a servir à vida,
me valendo das palavras.
Mas dito seja, de uma vez por todas,
que nada faço por literatura,
que nada tenho a ver com a história,
mesmo concisa, das letras brasileiras.
Meu compromisso é com a vida do homem,
a quem trato de servir
com a arte do poema. Sei que a poesia
é um dom, nasceu comigo.
Assim trabalho o meu verso,
com buril, plaina, sintaxe.
Não basta ser bom de ofício.
Sem amor não se faz arte.

Trabalho que nem um mouro,
estou sempre começando.
Tudo dou, de ombros e braços,
e muito de coração,
na sombra da antemanhã,
empurrando o batelão
para o destino das águas.
(O barco vai no banzeiro,
meu destino no porão.)

Nada criei de novo.
Nada acrescentei às forma
tradicionais do verso.
Quem sou eu para criar coisas novas,
pôr no meu verso, Deus me livre, uma
invenção.