quinta-feira, 21 de abril de 2011

Reflexão do dia – Raimundo Santos

É possível a CONTAG e o MST habitarem uma mesma formação social que tenha por fim justamente a “reforma agrária dos nossos tempos” (a constituição de agricultores familiares na generalidade do país), vista em um contexto de amplo renovamento do mundo rural em moldes progressistas e democráticos, como salienta bibliografia já alentada.

SANTOS, Raimundo. Cf. Introdução a O Congresso nacional camponês, Luiz Flávio de Carvalho Costa (org.), editoras Muad e Universidade Rural (UFRRJ), Rio de Janeiro, 2010.


Juros sobem mais uma vez; inflação, também

Na terceira reunião seguida deste ano, o Comitê de Política Monetária(Copom) do Banco Central subiu os juros. Num encontro bem mais longo do que o habitual, por cinco votos a favor e apenas dois contra, os diretores do BC decidiram elevar a taxa em 0,25 ponto percentual, para 12% ao ano. Segundo uma fonte da equipe econômica, a decisão foi um claro sinal de que o BC está mirando o centro da meta da inflação em 2012, já admitindo que, para este ano, o custo de vida vai mesmo encostar no teto, ou seja, em 6,5%. Dessa forma, o Copom teria dotado uma estratégia de subir juros de maneira prolongada, moderada e persistente. Sendo assim, não haveria necessidade da alta de 0,75 ponto agora, o que só aumentaria as despesas com encargos da dívida. Ontem, o IBGE divulgou que a prévia do índice oficial de inflação (IPCA-15) ficou em 0,77%, em abril, muito influenciado por combustíveis. Em 12 meses, a alta é de 6,44%.

Alta lenta e gradual nos juros

Copom eleva taxa básica em 0,25 ponto, de olho no controle da inflação em 2012

Vivian Oswald

Em sua terceira reunião este ano, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) rachou e surpreendeu o mercado, ao aumentar os juros em 0,25 ponto percentual, levando a Taxa Selic a 12% ao ano. No comunicado após o encontro, bem mais longo do que o usual, o colegiado sinalizou que o atual ciclo de aperto monetário vai continuar pelos próximos meses. A decisão confundiu a maior parte dos analistas, que contava não só com uma alta de meio ponto, como também com o fim do aperto monetário. O governo admitiu a mudança de postura do BC, comandado por Alexandre Tombini.

No texto do comunicado, o colegiado alegou incertezas nos mercados doméstico e internacional para justificar a opção pelo ajuste de mais longo prazo. Mas não houve consenso na diretoria do BC: cinco diretores votaram pela alta de 0,25 ponto, mas dois queriam meio ponto. A última vez em que o BC votou dividido foi em março de 2010.

"Considerando o balanço de riscos para a inflação, o ritmo ainda incerto de moderação da atividade doméstica, bem como a complexidade que ora envolve o ambiente internacional, o Comitê entende que, neste momento, a implementação de ajustes das condições monetárias por um período suficientemente prolongado é a estratégia mais adequada para garantir a convergência da inflação para a meta em 2012", diz o comunicado.

A explicação do BC após a reunião, que durou pouco mais de três horas, não esclareceu as dúvidas do mercado, que viu sinais claros de mudança na postura da autoridade monetária.

- É estranho que, no Relatório de Inflação, o BC indicasse que poderia atingir o centro da meta de 2012 com juros em 11,75% ao ano e, de repente, anunciar que manterá o ciclo de aperto por um prazo mais longo - afirmou o economista sênior para a América Latina do Banco WestLB, Roberto Padovani. - O BC vinha mostrando que estava menos preocupado com risco de inflação do que o próprio mercado. Então, por que precisa de um ajuste mais longo?

Para o economista da Tendências Silvio Campos Neto, a divisão dos membros do Copom mostra que eles não ficaram confortáveis com a mudança de postura entre uma reunião e outra - nos últimos dois encontros, o aumento dos juros foi de meio ponto percentual -, e que ainda existe dentro do BC a percepção de que é preciso agir com mais força.

Para o economista-chefe da Confederação Nacional de Comércio, Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do BC, o discurso do BC está confuso:

- Pode ter sido um sinal desnecessário para o mercado, que vai querer antecipar a alta dos juros e pode fazê-lo de forma mais forte do que gostaria o BC. Continua existindo uma falha de comunicação - alerta Carlos Thadeu, para quem o BC corre o risco de não conseguir domar as expectativas, e trazer a inflação para o centro da meta, nem 2012 ou 2013.

Governo admite mudança de postura

Apesar de o governo ter dito algumas vezes que a inflação perderia a força a partir de março e abril, o IPCA vem surpreendendo a equipe econômica. No acumulado de 12 meses já se aproxima dos 6,5%, limite da meta de inflação.Nos bastidores, o governo admite que houve uma mudança de postura do banco em relação à reunião anterior. A avaliação é que os sinais esperados para confirmar o cenário de convergência da inflação ao centro da meta de 4,5% em 2012 - notadamente a desaceleração da atividade econômica e da concessão do crédito - estão aparecendo, mas ainda não de forma consistente. Considerou-se ainda que persistem as incertezas quanto ao cenário internacional (escalada da cotação do petróleo, recuperação das economias ricas e comportamento dos preços das commodities).

Desta forma, a autoridade monetária precisará de mais tempo para auferir os resultados dessas variáveis e, por isso, a estratégia mudou de elevações da Selic mais fortes e por período mais curto para um ciclo mais longo e com altas menores.

- Trazer a inflação para o centro da meta em 2012 exigirá um esforço prolongado, moderado e persistente - afirmou uma fonte da equipe econômica.

O BC também não abandonou o centro da meta de inflação em 2011, mas reconhece ser inviável alcançá-lo até o fim do quarto trimestre. Este ano, afirmou a fonte, a política monetária pode apenas fazer "o melhor possível" para garantir o controle do ritmo de reajuste de preços. A nova estratégia, acrescentou a fonte, não excluiu a adoção de novas medidas macroprudenciais, como as que restringiram o crédito de longo prazo em dezembro.

A decisão de ontem reforça a posição do Brasil de país com os maiores juros reais do mundo (já descontada a inflação projetada em 12 meses), com 6,2% ao ano, segundo a Cruzeiro do Sul Corretora. Além disso, a terceira elevação seguida da Selic deve custar de R$3 bilhões a R$4 bilhões ao ano para os cofres públicos, ou cerca de 0,1% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo estudo de Felipe Salto, economista da consultoria Tendências, Felipe Salto. São de R$7,5 bilhões a R$10 bilhões a mais de encargos em um ano, considerando todo o aperto monetário de 2011, de 1,25 ponto percentual.

A decisão do BC foi lamentada por empresários e sindicalistas. Paulo Skaf, presidente da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), disse que a medida causa indignação, pois mantém o Brasil na contramão da economia mundial:

- O Brasil dá mais um passo atrás no estímulo de seus setores produtivos e da geração de empregos. Quem defende uma taxa de juros nesse patamar não está defendendo os interesses do Brasil.

Em nota, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) afirma que, embora em ritmo menor que na reunião anterior, a alta de juros de ontem mostra "uma perspectiva de combate de aumento dos preços centrada unicamente na política monetária, sem o peso devido da política fiscal".

Colaborou: Ronaldo D"Ercole

FONTE: O GLOBO

Minha Casa para baixa renda ameaça ruir

Lançado em abril de 2009, o Minha Casa Minha Vida completa dois anos sem atender as famílias de baixa renda. As construtoras dizem que os altos preços dos terrenos inviabilizam as obras. Em Minas, um conjunto inaugurado há um ano por Lula e Dilma Rousseff foi construído em cima de um lixão e parte das casas pode desabar.

Minha Casa... mas minha vida?

PROMESSA E REALIDADE

Em Minas, empreendimento do programa do governo corre o risco de desabar

Thiago Herdy

Depois de ser inaugurado com pompa e circunstância, em fevereiro de 2010, pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva e pela então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, que àquela altura já era a candidata extraoficial à Presidência da República, o conjunto de casas do Programa Minha Casa Minha Vida em Governador Valadares, Minas Gerais, transformou-se em síntese do descaso e do desperdício de dinheiro público. O condomínio de 96 casas ficou quase sete meses com mais da metade das habitações desocupadas, apesar da numerosa lista de candidatos a moradores em poder da prefeitura da cidade. Portas e janelas foram arrombadas, paredes acabaram pichadas e a fiação foi roubada.

Depois de uma rápida reforma, as casas restantes acabaram entregues no fim do ano passado. Mas, apesar do alerta recorrente de políticos da região e da imprensa, os problemas só se agravaram: 14 imóveis acabaram condenados pelos bombeiros e pela Defesa Civil, que denunciou o risco de desabamento das casas. O motivo é simples. Na hora de escolher um terreno para o conjunto, o governo federal aceitou que a construção fosse feita num morro instável, que no passado abrigou parte do lixão de Governador Valadares, às margens da BR-116.

Treze meses depois da inauguração, oito das 14 casas condenadas já foram desocupadas por moradores. Agora, a prefeitura pena para convencer outras seis famílias, que vivem sob tetos que pode desmoronar a qualquer momento, por causa da erosão que avança no subsolo do conjunto.

- Não deixa de ser irônico que famílias em áreas de risco tenham sido transferidas para casas em outra área de risco. É um problema de aplicação de recursos, mas também de escolha do terreno e projeto, realizados na gestão passada - se esquiva o secretário de Planejamento da prefeitura de Governador Valadares, Jaider Batista.

PF chegou a paralisar o projeto

O projeto começou a ser concebido na gestão do ex-prefeito e atual deputado estadual Bonifácio Mourão (PSDB), e foi paralisado depois que investigação da Polícia Federal divulgou a suspeita de desvio de verbas por políticos envolvidos na Operação João de Barro. A obra foi retomada e concluída na administração da atual prefeita, Elisa Costa (PT). Por sua vez, Mourão culpa a atual gestão por não agir a tempo contra os problemas do empreendimento:

- A área foi fiscalizada e aprovada no fim de 2007 pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A duplicação da BR-116 modificou as condições do terreno e surgiu um assoreamento que não existia anteriormente - diz o ex-prefeito.

Para posar para fotos e celebrar a inauguração do conjunto, Lula e Dilma escolheram uma casinha vermelha. Lá já estava a nova moradora, a dona de casa Luciene Pereira, de 46 anos. A dupla visitou os cômodos e ainda prometeu bancar melhorias na casa, como a colocação de cerâmica no piso e um muro. Meses depois, parte das melhorias foram realizadas, mas em vão. Isso porque a casa modelo é uma das que correm o risco de desabar.

- A prefeitura me dá R$300 para pagar um aluguel. Não consigo nada, porque o custo é R$450. Aquela casa era minha, essa aqui onde estou tenho que pagar. Nem preciso falar o quanto é pior, não é? - reclama a mulher.

O conjunto, do Bairro Palmeiras, custou R$18,8 milhões e foi concluído com parte da verba do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). As contínuas trapalhadas envolvendo o empreendimento são investigadas pelo Ministério Público Federal.

A prefeitura finaliza um diagnóstico para decidir o que fazer. O mais provável é que as 14 casas sejam demolidas neste semestre. Responsável pela liberação da verba, o Ministério das Cidades informou que a metodologia de escolha de projetos ficou mais rigorosa nos últimos anos.

FONTE: O GLOBO

CAp-UFRJ terá uma semana de paralisação

Docentes entram em greve na segunda-feira para protestar contra salários atrasados de professores substitutos

Lauro Neto

Os professores do Colégio de Aplicação da UFRJ (CAp-UFRJ) decidiram, em assembleia realizada ontem, paralisar as aulas por uma semana a partir da próxima segunda-feira. Com o estado de greve, as atividades só devem ser retomadas no dia 2 de maio. A extensão da paralisação, que já ocorreu ontem, é decorrente da situação incerta dos professores substitutos, que compõem 60% do quadro docente do colégio. Segundo Cristina Miranda, vice-presidente do AdUFRJ, 28 estão sem receber salários desde fevereiro.

Os docentes reivindicam a imediata regularização da situação funcional dos professores substitutos contratados em 2011, com constituição das respectivas matrículas e pagamento dos salários atrasados com a devida correção e a homologação dos contratos dos 20 professores concursados de 2010.

- Vamos fazer uma paralisação de uma semana, que vai ser avaliada na próxima terça, em nova assembleia. Faremos reunião com os pais e várias atividades de mobilização. A interrupção vai depender da resposta da UFRJ e do MEC - explica Cristina Miranda, professora efetiva de artes visuais. - Embora a reitoria tenha apresentado uma medida paliativa de incluir esses professores como profissionais terceirizados, a UFRJ não pode inclui-los na folha de pagamento sem autorização do MEC.

MEC diz que portaria autorizará contratação

No fim da tarde de ontem, a assessoria de comunicação do Ministério da Educação (MEC) publicou no portal do órgão a notícia de que os institutos federais de educação, ciência e tecnologia estão autorizados a contratar docentes e técnicos administrativos para as escolas federais de educação profissional em funcionamento no país. A portaria interministerial do MEC e do Ministério Planejamento, Orçamento e Gestão será publicada no Diário Oficial da União, mas não se estende aos colégios de aplicação.

Segundo a assessoria do MEC, uma nova portaria interminesterial que contemple a autorização da contratação de professores nos CAps será publicada até terça-feira no DOU. Apesar disso, os professores do CAp-UFRJ decidiram manter o estado de greve até a próxima assembleia, no mesmo dia. Os docentes reivindicam, ainda, mais vagas para professores efetivos e que a reitoria da UFRJ se manifeste contra a minuta de portaria de regulamentação dos CAps.

- Há duas semanas, a direção do CAp-UFRJ mandou uma minuta que fere a autonomia universitária e transfere a responsabilidade da administração para as esferas estadual e municipal. Queremos uma audiência emergencial com a Secretaria de Educação Superior (Sesu), do MEC, para apresentação da pauta de reivindicações - diz Cristina.

O GLOBO procurou o reitor da UFRJ, Aloisio Teixeira, para comentar o assunto, mas não conseguiu localizá-lo. A universidade está em processo eleitoral e escolhe seu novo reitor, em segundo turno, na próxima semana.

FONTE: O GLOBO

Uma questão política:: Merval Pereira

O rebaixamento para "negativa" da perspectiva de classificação dos Estados Unidos pela agência de riscos Standard & Poors, embora mantendo a nota de AAA na dívida soberana da ainda maior economia do mundo, é "um chamado, não resta dúvida, mais para o lado político que econômico", na opinião do economista Paulo Vieira da Cunha, ex-diretor do Banco Central atualmente trabalhando no mercado financeiro em Nova York.

Segundo ele, desde antes da crise, estava claro que a trajetória do déficit americano era insustentável. A crise piorou o quadro, mas não o alterou fundamentalmente. O déficit é hoje maior, mas não a ponto de questionar seriamente a sustentabilidade da relação Dívida/PIB.

Vieira da Cunha está entre os que acreditam que o PIB potencial dos EUA caiu e que a economia não vai experimentar grandes crescimentos no futuro próximo. "O que se perdeu em PIB perdeu-se e não vai ser recuperado", afirma. Ele acha que o PIB nominal vai continuar se expandindo a 2,5/2,8% nos próximos anos, possivelmente desacelerando para 1,9/2,2% a partir de 2015-16.

"O impacto é tremendo, e o custo social da rede de proteção social aumenta proporcionalmente." Embora seja uma situação ruim, Vieira da Cunha considera que "não tem muito que ver com a perspectiva de rebaixamento".

O que conta para o ajuste fiscal, diz ele, é o custo futuro e já contratado dos compromissos sociais, que levaria o déficit em 2021 para 6,6% do PIB, com receitas de 18,5% e gastos de 25,1% do PIB, segundo o Escritório de Orçamento do Congresso.

E o cerne da questão é político, ressalta o economista brasileiro: reduzir benefícios, o que os democratas não querem; aumentar impostos, o que os republicanos não querem. "Ninguém se lembra de um ambiente político tão carregado e polarizado", diz Vieira da Cunha, situação que assusta o mercado financeiro.

Para ele, se nada for feito, será um desastre, mas também será um desastre, embora menor, se algo for feito apenas quando induzido pelo mercado, minimamente, para atender a problemas de curto prazo na rolagem da dívida. Na sua definição, a proposta de Obama "é um começo razoável". A contraproposta do líder republicano Paul Ryan, "um descalabro", como o pessoal do Macroeconomic Advisors escreveu, após esmiuçá-la.

A perspectiva mostra-se mais complicada ainda, diz Vieira da Cunha, pela quase certeza de que nas próximas décadas o dólar deixará de ser a moeda de reserva - mesmo havendo ajuste fiscal.

"O problema é que as alternativas ao dólar são igualmente ou mais incertas", analisa. A Europa, depois de tudo, será uma área com dívida europeia e não sub-regional. Em 20 anos pode ser uma alternativa muito mais competitiva; nos próximos cinco anos, dificilmente. Idem o Japão com a perspectiva lá de que nem em 20 anos a questão fiscal se resolveria. Sobram os emergentes, que ainda não inspiram confiança suficiente.

O historiador Niall Ferguson, no auge da crise financeira em 2008, previu que "os Estados Unidos poderiam perder a facilidade conveniente de ser capaz de pegar emprestado do exterior a juros baixos na sua própria moeda" e via se aproximando o fim da era em que o dólar era a única moeda de reserva internacional.

Ele lembrou a crise da libra inglesa, provocada por duas razões: "A principal razão foram as grandes dívidas que a Inglaterra fez para financiar suas guerras pelo mundo. E a segunda razão foi a desaceleração do crescimento da economia nas décadas do pós-guerra."

Mas o processo da transição da hegemonia da Inglaterra para os Estados Unidos levou décadas, e houve a concorrência entre a libra e o dólar como moedas de reserva por quase 60 anos.

Vieira da Cunha acha que, nesse particular, nada muda muito. "A compra de bônus do Tesouro pelos estrangeiros continua e, bem ou mal, continuará." A verdade, diz, é que, repetindo Ragu Rajan (economista assessor do governo indiano, professor em Chicago), há falta no mundo de "bens de qualidade com liquidez".

Ele admite que a China e outros países, como o Brasil, estão diversificando reservas e vão continuar a fazê-lo. A China é o segundo maior comprador de bônus do Tesouro americano, só perdendo para o Japão.

Mas lembra que, mesmo assim, "a China acumulou US$600 bi nos últimos nove meses", confirmando que "não há oferta de bonds que chegue".

Por outro lado, diz ele, há uma certeza no mercado de que em dez anos a China vai ter déficit, e provavelmente desacumulará reservas. "Entretanto, se em dez anos os EUA não apresentarem um programa coerente de ajuste fiscal, a nova crise global já terá acontecido e nivelado tudo por baixo."

Tudo indica que a maior virtude por ora do rebaixamento da S&P é chamar a atenção para a forma pouco articulada com a qual o sistema político está tratando do assunto em Washington.

Há quem ache que o investidor, provavelmente, tem menos para se preocupar com um potencial default do que com a possibilidade de os EUA passarem a considerar a inflação como o único caminho para diluir essa dívida.

A eleição de 2012, em vez de ajudar na solução, tem o potencial de se radicalizar em torno do tema e agravá-lo. É razoável admitir, também, que os credores externos usarão os fóruns existentes, tipo G-20 e FMI, para pressionar Washington a fim de evitar o pior.

Vieira da Cunha acha que, se a dinâmica da dívida vier a provocar inflação, isso acontecerá pelo resultado político: a total falência do sistema de governo e, portanto, o questionamento dos EUA como nação coerente e responsável. A consequência seria a perda de confiança no ativo e a incapacidade do governo americano de se financiar, mesmo pondo papéis atrelados à inflação.

Nesse sentido, a advertência da S&P ajuda a que o Congresso americano chegue a um acordo.

FONTE O GLOBO

Exercício de liderança:: Dora Kramer

O cientista político brasileiro Cesar Zucco disse uma coisa em entrevista recente ao Estado que só quem está longe do País como ele, atualmente dando aulas na Universidade Princeton (EUA), diz sem receio das patrulhas que tanto idiotizam o debate político.

Falava sobre a influência eleitoral de programas assistencialistas e lá pelas tantas resumiu a ópera: os pobres de um modo geral são governistas.

Votaram em Fernando Henrique Cardoso quando ele encarnava a solução de um problema que atingia mais cruelmente quem tem menos, a inflação. Votaram em Luiz Inácio da Silva e depois em Dilma Rousseff pela ampliação das políticas sociais que ambos representam.

O professor avisou que se tratava de uma simplificação. Claro que a questão contém variáveis mais complexas, mas o resultado prático no tocante ao ponto em destaque, a disputa de votos, é aquele mesmo.

Estivesse Cesar Zucco por aqui, perto da arenga produzida pelos esportes clubes tucanos e petistas, talvez fosse acusado de sórdido preconceito ao ousar pensar na hipótese de que a ideologia mãe dos pobres é a garantia da sobrevivência.

Distante, matou a charada que o PT já resolveu ao decidir partir para a conquista de setores de renda média, mas que o PSDB e área de influência ainda hesitam em compreender ao apontar equívoco no diagnóstico de Fernando Henrique sobre a necessidade de a oposição se organizar para disputar o mesmo público no lugar de se ater à batalha perdida junto ao "povão".

Eleitorado cuja recuperação só é possível, nas condições atuais, mediante a reconquista do poder e a posse dos instrumentos de decisão que possibilitam o acesso às camadas dependentes do Estado.

Enquanto os oposicionistas elaboram o exercício da dúvida permanente, o PT exercita liderança: com Lula à frente toma providências, orienta o partido a buscar o eleitorado economicamente ascendente, a ampliar alianças, a vencer resistências, a desbravar searas nunca dantes navegadas e hoje politicamente quase órfãs.

O confronto, nesse raciocínio, fica reservado ao adversário explícito, o PSDB, cujo principal território Lula e o PT se preparam para minar a partir da próxima eleição municipal mediante a incorporação de novos públicos aos seus domínios.

Exatamente o que propôs, com palavreado mais extenso e elaborado, Fernando Henrique ao sugerir um roteiro de ação aos correligionários.

A diferença é que Lula exerce liderança sobre o partido e FH não, atua como franco-atirador. E não só por responsabilidade do conjunto que não soube capitalizar as realizações da época em que governou.

Em boa medida por culpa do próprio FH, que à época da primeira eleição de Lula parecia mais preocupado em fazer as honras da casa ao sucessor operário do que em ir à luta para defender as mudanças que seu governo havia propiciado ao País.

Não trabalhou pela unidade do partido em torno da candidatura presidencial do PSDB e, com isso, autorizou a tropa a se dispersar.

O PT tem estratégia nacional que se sobrepõe às querelas regionais. Perseverou, conquistou o poder e faz de tudo para mantê-lo.

Já o PSDB, carente de comando nacional, é engolido por questiúnculas irrelevantes para o grande público. Chegou ao poder, não soube preservá-lo e desperdiçou o patrimônio amealhado.

Engalfinha-se em briga de vereador em São Paulo e não se ocupa de mais nada que possa lhe conferir o espaço que o PT ocupa discutindo eleições municipais e reforma política sem deixar que se disperse o capital acumulado por Lula em oito anos de poder.

Campo fértil. O MST é infrator, mas não é tolo. É só reparar: os Estados onde os governadores são tolerantes com invasão de terras e não garantem o cumprimento das reintegrações de posse são os alvos constantes das ações dos sem-terra: Alagoas, Pará, Pernambuco e Bahia.

Onde os governos são severos e pedem reintegração de posse até pela ocupação de áreas em margens de rodovias estaduais, como Mato Grosso do Sul e Tocantins, as ações dos sem-terra não prosperam.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Onde passa boi, passa boiada:: Eliane Cantanhêde

Há algo de realmente preocupante na articulação do governo para a Copa de 2014, quando o Ipea diz, por exemplo, que, ao mesmo tempo, a Infraero não conseguiu gastar 44% do orçamento previsto para as obras nos aeroportos e não conseguiu cumprir o cronograma. Se havia dinheiro e onde gastar, por que não foi gasto?

Há também algo estranho quando a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, anuncia a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) para 2012 e ali não há nadica de nada para agilizar as obras e garantir que a Copa saia a contento. Aliás, nem a Copa nem a Olimpíada.

A oposição suspeita que tudo isso embuta uma grande jogada, não no campo do futebol, mas em outros campos bem mais pantanosos. Seria um chute na Lei das Licitações, que chateia e atrasa, mas é um freio para ambições descabidas e roubalheiras em geral.

O pretexto seria, ou será, que é preciso tirar burocracia e adicionar agilidade para reformar ou construir aeroportos, estradas, metrôs. Mas é aí que mora o perigo. Você flexibiliza o processo e acaba afrouxando os mecanismos de controle. Onde passa boi, passa boiada.

A oposição também teme que, além de jogar a Lei das Licitações para o alto, governistas estejam maquinando algo muito pior: usar a Copa para fazer caixa de campanha para o PT e os partidos aliados.

Longe da gente pensar uma coisa assim, não é mesmo? Mas, por via das dúvidas, é bom lembrar que o detalhe mais atordoante de todo esse campeonato é que 2014 não é só ano da Copa, mas também ano das eleições gerais. O que estará em jogo será um novo mandato para Dilma (ou Lula), além de todos os governos estaduais, Câmara e boa parte do Senado.

Dilma deve ter o máximo de cuidado. Não apenas para se prevenir contra escândalos, mas também para evitar suspeitas, porque elas são como coceira: quando começam, não passam. Já está coçando.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Classes, ou falta dela :: Clóvis Rossi

Era uma vez uma coluna sobre o custo abusivo da avenida Água Espraiada no governo Paulo Maluf. Publicado o texto, logo de manhã toca o telefone em casa e um leitor que se identifica como malufista começa a reclamar.

"Como é que você critica uma obra tão importante? A avenida não está lá? O que você queria, que ela não fosse feita?", pergunta, indignado, o interlocutor.

Tento responder que queria, sim, que a obra fosse feita desde que o custo não excedesse o do túnel sob o canal da Mancha. Não consigo vencer a indignação do leitor que acaba decretando: "Ah, vocês jornalistas são todos petistas" (estamos falando de um tempo em que petismo e malufismo pareciam ser incompatíveis).

Retruco: "Só falta dizer que somos também todos bichas".

E o leitor fecha o educativo papo com: "Quer saber? São mesmo".

Não sou preconceituoso a ponto de achar que todo malufista tem a mesma cabeça de meu interlocutor de antanho. Mas uma parte importante do malufismo/quercismo com quem Lula quer casar seu partido está impregnada de uma mentalidade que, nos velhos tempos, Fernando Henrique Cardoso batizou de "lúmpemburguesia".

É inevitável, pois, que a aproximação à chamada nova classe média, defendida tanto por Lula como por FHC, caminhe para ser um reforço ao conservadorismo a que ambos se entregaram, em nome do acesso ao poder.

É bom ressalvar que essa história de classes sociais está mal contada, mas Vinicius Torres Freire, cada dia melhor, já pôs as coisas no lugar outro dia.

Voltemos, pois. No mundo todo, as classes médias estão se entrincheirando no conservadorismo em todos os aspectos. No Brasil em que o receio de uma recaída no lado D da vida deve ser maior, fico até com medo de imaginar como será o, digamos, ideário da aproximação.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Pagaremos mico?::Rubens Bueno

A década que começa promete ser muito boa para o Brasil. Nos próximos anos, estaremos sendo visitados por milhares de pessoas de todo o mundo por conta de dois grandes eventos de escala mundial que iremos hospedar: a Copa-14 e as Olimpíadas do Rio de Janeiro em 2016. E não só por isso. O Brasil está amadurecendo como um dos principais destinos da agenda turística internacional.

Os eventos, especificamente, representarão, entretanto, excelente oportunidade de negócios e de geraçao de emprego em vários segmentos da economia, com destaque para o Turismo. Aliás, estimativas do Ministério do Turismo preevem o desembarque, só para os jogos da Copa, de mais de 600 mil estrangeiros. Espera-se o deslocamento de 3,6 milhões de pessoas apenas no mês do Mundial da FIFA.

Apesar da boa expectativa que esses jogos trazem, um problema se agiganta sem que o governo federal se mexa. Refiro-me ao iminente apagão da mão de obra no país. Órgão do próprio governo, o Ipea prevê que em 2020 serão necessários, na área da infraestrutura, por exemplo, 1,1 milhão de engenheiros para atender o mercado.

Diante das previsões, torna-se imperativa a aplicação imediata de grandes recursos na qualificação de trabalhadores. Certo? Não para o governo do PT. Ao contrário do que as projeções poderiam sugerir, os recursos do governo para a capacitação profissional estão diminuindo ao invés de aumentando.

Para entender o que está ocorrendo, primeiro é necessário (tentar) explicar uma contradição. É que ao mesmo tempo em que o governo autoriza o pagamento de convênios para a capacitação na área do Turismo, ele aplica profundos cortes neste orçamento, sob o eufemismo de "contingenciamento".

Vamos aos exemplos. Nos últimos três anos, o conselho deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), tem aprovado a liberação de consideráveis recursos para a qualificação de trabalhadores. Em 2008, por exemplo, foram R$ 900 milhões. E em 2010, para serem injetados na capacitação este ano, o FAT autorizou o pagamento de R$ 1,2 bilhão.

Entre a autorização da aplicação dos recursos e as salas de aula, o governo aplica uma tesourada no dinheiro da qualificação profissional. Encarregado de afiá-la, o Ministério do Planejamento, órgão responsável por estabelecer os limites de gastos de cada ministério, tem removido aproximadamente 2/3 do dinheiro disponível para a capacitação dos brasileiros. Isso significa que o Brasil vem dispondo de pouco mais de R$ 300 milhões, nesses últimos tempos, para qualificar os trabalhadores no âmbito dos programas do Ministério do Trabalho.

O resultado é previsível. Segundo o jornal O Globo, o montante de recursos do FAT aplicado na capacitação, em todos os setores, despencou 68,6% em 15 anos. A queda obviamente impactou o número de beneficiados. Se na década de 90 foram 13 milhões os trabalhadores instruídos com dinheiro do Fundo, nesta década eles somam 1 milhão.

Está claro que é a vez de o Brasil ocupar a preferência do mundo nos próximos anos. A questão é saber se teremos suficientes camareiras, recepcionistas, cozinheiros, padeiros, garçons, agentes de viagem, operadores e organizadores de eventos. Está nas mãos, principalmente, do governo federal qual o papel que queremos desempenhar. Vamos "pagar mico" ou sairemos bem na foto?

* Rubens Bueno é deputado federal e líder do PPS na Câmara

FONTE: SITE AB NOTÍCIAS

Indecisão do BC:: Míriam Leitão

A decisão do Banco Central de aumentar os juros era a única possível, diante da elevação do risco inflacionário, mas fica a impressão de que recebeu uma autorização para a elevação menor possível. O BC ter um misto de políticas para conter o crédito e a demanda reforçará o movimento dado com a elevação dos juros. Mas o BC continua perdendo a batalha da comunicação.

Nos últimos meses, o país tem estado em pleno retrocesso na área da autonomia do Banco Central e da política anti-inflacionária. Há várias pressões, o problema é de natureza complexa, e o Banco Central tem de restabelecer a confiança em sua autonomia. As declarações conflitantes e, pior, as decisões contraditórias alimentam a sensação de que o BC não toma decisões técnicas, que está sempre pedindo licença em cada decisão.

Há muito a fazer no Brasil para construir um Sistema Financeiro Nacional forte, inclusivo, com juros estruturalmente mais baixos, com uma regulação mais eficiente. O debate ficou prisioneiro dessa conjuntura e de uma dúvida que já parecia estar sanada: se o BC é ou não autônomo. E ficou parado exatamente quando poderia estar se preparando para novos passos mais ousados.

Um livro de vários autores que será lançado na próxima terça-feira no Rio chamado "Desafios do Sistema Financeiro Nacional", da Campus Elsevier, mostra bem o tamanho da tarefa a fazer para o país aproveitar melhor e colher os benefícios da estabilidade monetária. Organizado pelos funcionários do Banco Central Alessandra Dodl e José Renato Barros, o livro, no qual escrevi o prefácio, traça um panorama detalhado e precioso de avanços necessários em todas as áreas da organização do SFN.

Os juros precisam cair de forma estrutural para níveis muito mais baixos, é preciso ampliar a oferta através de outros mecanismos como o cooperativismo, o microcrédito. É preciso ampliar o sistema de pagamentos, tornando os meios, como cartões de crédito, mais baratos. É indispensável usar a nova tecnologia de informação para ampliar as formas de pagamento. O Brasil e o mundo precisam definir que tipo de regulação para o mercado financeiro é mais eficiente: se a mais rigorosa ou a mais flexível. O livro permite uma reflexão ampla sobre os desafios que o país tem pela frente para tirar o melhor proveito da estabilidade.

Para essas tarefas é que o país deveria estar olhando agora, e a sensação que se tem é que retrocedemos várias casas num jogo que já estava ganho para rediscutir se deveremos escolher entre ter mais crescimento com um pouco mais de inflação; ou se a inflação é ou não de demanda. Um debate que parecia já ter sido encerrado após as provas concretas que tivemos dos estragos que a inflação pode produzir.

Esse túnel do tempo nos levará a perder oportunidades. A inflação está alta, ela precisa ser combatida com uma política coerente, a dissonância na equipe econômica só aumenta o volume dos ruídos que alimentam a inflação. Essa dissonância não pode ser sanada com o Banco Central sendo mais leniente com a inflação, e sim, com a Fazenda executando melhor seu papel de controle dos gastos públicos.

Podem ser feitos truques contábeis para criar um falso superávit primário como o do ano passado; mas não se engana a economia. Ela sente os efeitos do aumento dos gastos, dos incentivos aos créditos, do aumento da parcela do crédito que não é afetada pela política monetária.

O IPCA-15 divulgado ontem mostrou uma inflação acumulada em 12 meses muito perto do teto da meta, em 6,44%. Combustíveis tiveram aumento de 5,26%, apesar de o governo estar segurando o preço da gasolina cobrado pela Petrobras das distribuidoras, causando diversas distorções, como foi mostrado ontem aqui na coluna. O acumulado no ano já passa de 3%, e o centro da meta é de 4,5%. O índice de difusão aumentou, isso quer dizer que há um percentual maior de produtos subindo, que a inflação está se espalhando na economia.

A maioria do mercado apostou num aumento de 0,25%, não por considerar que esse era o número adequado, mas porque acha que o Banco Central não teria liberdade para um número mais alto. E é essa impressão que o BC tem de vencer. Na nota de ontem, explicou que prefere doses menores por mais tempo.

A autoridade monetária precisa convencer os agentes econômicos quando toma suas decisões. O BC parece que está tentando agradar a presidente da República, evitar qualquer discordância com o falante ministro da Fazenda, perseguindo duas metas ao mesmo tempo.

No regime de metas de inflação, convencer é parte da política econômica. Para convencer, tudo tem de parecer coerente. A taxa de juros, as atas, os relatórios de inflação, as declarações públicas, as medidas anunciadas. Adianta pouco conversar com alguns dos formadores de opinião do mercado financeiro para que eles façam declarações amigáveis se, a cada momento, o Banco Central emite um sinal diferente.

A inflação em doze meses subirá, depois pode cair no final do ano, mas já tem um impacto forte contratado para o começo do ano que vem com a fórmula do salário mínimo que subirá de acordo com o crescimento econômico de 2010 e a inflação de 2011.

O Banco Central tem de trabalhar com um horizonte longo, como bem sabe o presidente da instituição, Alexandre Tombini, um dos formuladores da política de metas de inflação, quando ela foi implantada em 1999, que foi capaz de domar o descontrole que veio após um colapso cambial.

FONTE: O GLOBO

A crise dos países ricos:: Celso Ming

Como acontece em todos os processos históricos importantes, bons e ruins, os estudiosos se encarregarão de dividir em fases a grande crise financeira que eclodiu em 2008. Entre essas fases, registrarão as fortíssimas expansões monetárias colocadas em prática pelos principais bancos centrais com o objetivo de manter a liquidez, desobstruir os canais de crédito, garantir o consumo e o emprego.

Outra dessas fases será dedicada à deterioração fiscal. Também as autoridades administradoras dos Tesouros dos países ricos fecharam os ouvidos para reclamações de austeridade e, por vezes escoradas num falso keynesianismo, se encarregaram, elas próprias, de expandir as despesas públicas. Trataram prioritariamente de socorrer os grandes bancos (os grandes demais para afundar), de prover verbas especiais para reativar a indústria de veículos e, como acontece em toda grave crise, foram acionados os mecanismos automáticos cuja função é pagar seguros-desemprego.

Essa grande expansão das despesas não foi o único fator que estourou os orçamentos públicos. Os países ricos também distribuíram isenções tributárias e devoluções de impostos. E, mais do que isso, a própria retração da atividade econômica derrubou a arrecadação.

O desfecho da crise parece ter sido adiado graças à ação dos dirigentes. Mas o principal resultado líquido de todas essas providências é um estado generalizado de calamidade nas finanças públicas dos países ricos. Os rombos orçamentários estão aumentando e ameaçam sair do controle. Em consequência disso, a dívida pública deu um salto em toda parte a ponto de disparar sinais de alarme de risco de calote. (Na tabela, você tem uma foto da situação fiscal de um conjunto de 15 países. Em princípio, déficit orçamentário de mais de 3% do PIB e dívidas superiores a 60% do PIB constituem sinal de desequilíbrio.)

O cartão amarelo levantado segunda-feira pela Standard & Poor"s, agência de análise de risco, para a qualidade dos títulos de emissão do Tesouro dos Estados Unidos é apenas um episódio nesse afundamento fiscal generalizado que não dá sinais de reversão.

A área do euro sofre de mal semelhante, com a diferença de que atinge mais os países da sua periferia (Grécia, Irlanda e Portugal) do que seu centro duro (Alemanha e França). Nos países ricos, a inflação só não veio com mais força porque a atividade econômica segue em marcha lenta.

Como resposta natural, em toda parte, por caminhos e tensões diferentes, vai crescendo o apelo à austeridade. Na periferia da União Europeia, as populações relutam a aceitar os sacrifícios. Mas eles são inevitáveis, em pacotes variáveis de redução real de salários e de aposentadoria; e de aumento de impostos e fortalecimento da poupança.

Uma das novidades deste momento é que a diferença entre um país fiscalmente equilibrado e um fiscalmente desequilibrado não se limita às condições de saúde financeira. Transfere-se também para a área política.

A Alemanha, por exemplo, é o país da União Europeia que tem mais possibilidade de impor regras do jogo sobre os demais porque também é o que tem as finanças mais aprumadas. O mesmo se pode dizer dos emergentes cujas fichas cadastrais estão mais em ordem do que as dos países ricos. Ainda que não tivesse tomado nenhuma decisão importante, o primeiro encontro entre os dirigentes dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), realizado na semana passada, em Sanya, no sul da China, levantou indagações sobre o que estão tramando esses recém-chegados ao cenário geopolítico. E não é sem razão que a boa fase fiscal e mais seu invejável índice de poupança, de 51% do PIB, dão à China mais preparo para determinar seu próprio destino. Assim, a melhora das condições de player político se apresenta agora como consequência da melhor situação fiscal.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

A concentração partidária que se processa à margem de uma pífia reforma política:: Jarbas de Holanda

A coincidência de legítimas necessidades institucionais e da forte sedução do início de um governo propicia o desencadeamento de um rearranjo do quadro partidário que aponta para dois tipos de dividendos ligados, respectivamente, aos conteúdos díspares desses dois fatores. Os que têm dimensão institucional, buscando a simplificação do abusivo e irracional excesso de legendas existente. E os de caráter político conjuntural, estimulando a migração para a base governista, ou para portas de acesso a ela, de vários parlamentares eleitos por partidos de oposição.

Quanto aos dividendos do primeiro tipo, não tem mais nenhum sentido a multiplicidade de siglas partidárias – seja as chamadas de aluguel, seja as de grupelhos ideológicos radicais representativos de si mesmos, com tempo de rádio e televisão socialmente custoso, bem como espaço para a prática de barganhas nas três esferas do poder público. E a concentração do quadro, necessária e suficiente para combinar os imperativos de representação do pluralismo democrático e de melhores condições de governabilidade, deverá encaminhar- se por meio da proibição de alianças nas disputas de voto proporcional. Uma das poucas propostas viáveis entre as recomendadas pela comissão do Senado para a reforma político-eleitoral, até porque do interesse dos três maiores partidos – PMDB, PT e PSDB.

Relativamente aos dividendos do segundo tipo, o dado mais significativo é a transformação do que nasceu como um projeto pessoal do prefeito Gilberto Kassab (e que, ao final, ganhou o nome de PSD) para contrapor- se ao governador Geraldo Alckmin, na política paulista, num eficiente mecanismo usado pelo Palácio do Planalto e pelo petismo federal para o debilitamento do campo oposicionista. Agora reduzido a 96 membros na Câmara dos Deputados, o menor número de opositores ao governo em 16 anos, segundo cálculo de reportagem do Estadão de ontem. Como resultado, parcial, do processo de imigração acima referido, do qual a maior vítima é o DEM, ameaçado de inviabilização; que afeta também o pequeno e combativo PPS, com a perda de três deputados federais; e que gera desagregação no principal núcleo do PSDB, o do estado de São Paulo, a partir da defecção de seis dos 13 vereadores da capital, que priorizaram a vinculação a Kassab. Desagregação essa que a principal liderança petista, o ex-presidente Lula, se empenhará em potencializar tendo em vista uma derrota dos tucanos nos pleitos da capital em 2012 e estadual em 2014. Objetivo considerado relevante até por causa do histórico confronto do PT e do lulismo com o PSDB nas eleições paulistas (sempre com a vitória deste). E como parte do enfrentamento da provável candidatura presidencial de Aécio Neves por uma legenda que, também provavelmente, deverá somar aos tucanos os atuais DEM e PPS, em processos de fusão a serem promovidos após os pleitos municipais do próximo ano. O que, se confirmado, constituirá outro ingrediente importante da tendência de concentração partidária.

Quanto aos passos do Senado para a reforma política, a proibição das alianças partidárias nas disputas de voto proporcional foi praticamente a única proposta do senador Francisco Dornelles, incluída entre as recomendações da comissão por ele coordenada. Nem a proposta do distritão – lançada pelo presidente do PMDB e vice-presidente da República, Michel Temer, e acolhida pelo coordenador – foi inserida em tais recomendações. Dominando o plenário da comissão, os petistas conseguiram afirmar seus dois objetivos básicos: a lista fechada de candidatos proporcionais e o financiamento público. Os quais, se institucionalizados, deformariam ainda mais os processos eleitorais, subordinando antidemocraticamente a escolha de parlamentares ao controle da cúpula dos partidos, especialmente a do PT, e ampliando os gastos públicos (já enormes) com esses processos que não substituiriam mas se somariam ao financiamento privado. Felizmente, porém, a perspectiva predominante é que, até pela impopularidade dos referidos objetivos petistas, o Congresso não dê respaldo a eles. Isso num contexto em que, pela falta de entendimento entre os grandes partidos, pouca coisa – além da proibição de alianças acima destacada – venha a ser aprovada na tentativa, precária, que está sendo feita de uma reforma política.

Jarbas de Holanda é jornalista

FHC é opção de Serra para dirigir tucanos

Ex-presidente da República conta com o apoio do grupo do ex-governador, mas resiste à ideia

Julia Duailibi A cerca de um mês da eleição para a escolha do presidente nacional do PSDB, aliados do ex-governador José Serra começaram a se movimentar para convencer o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso a ocupar o cargo.

A movimentação vai na contramão do que o senador mineiro Aécio Neves tem articulado: a recondução do atual presidente, o deputado Sérgio Guerra (PE). O nome do novo presidente tucano será referendado durante a convenção do partido, que será no fim do mês que vem.

Nos últimos dias, parlamentares ligados a Serra levaram a sugestão a FHC, que resiste à ideia. A ponderação do ex-presidente tem sido basicamente a mesma: com quase 80 anos, não quer mais se envolver nos impasses da política interna partidária.

Nesta semana, FHC deu indícios de que não pretende abraçar a causa. Após reunião no seu instituto, o iFHC, foi questionado sobre o racha no PSDB municipal. Expôs o que tem dito reservadamente: "Não sei nada a respeito. Olha, vou fazer 80 anos, já não acompanho, há tempos, o dia a dia da vida partidária".

A ideia de lançar FHC é uma tentativa do grupo de Serra de aumentar a influência na cúpula do partido - os serristas veem o projeto de recondução de Guerra como, praticamente, a confirmação de que o senador será o candidato a presidente em 2014.

O projeto também ganhou força após naufragar a proposta de formar um conselho político, do qual Serra participaria. Mas a ideia minguou depois que os governadores reivindicaram espaço no conselho. Inicialmente, o órgão seria composto por cinco tucanos: FHC, Serra, Aécio, Guerra e o ex-senador Tasso Jereissati. Para os serristas, com mais de cinco integrantes, o órgão se torna muito grande e, portanto, pouco eficiente.

Apesar das negativas de FHC, serristas avaliam que o embate verbal recente com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é indício de que haveria disposição para o enfrentamento político e também para as causas partidárias.

Aliados do ex-governador passaram a resistir ao nome de Guerra depois que um abaixo-assinado a favor de sua reeleição, articulado com o apoio de Aécio, foi proposto para os deputados tucanos em janeiro. O episódio, visto como traição por serristas, levou ao rompimento entre Guerra e Serra. Apenas recentemente os dois voltaram a conversar.

Depois do racha no PSDB paulistano nesta semana, quando seis vereadores anunciaram a saída do partido, a cúpula tucana também começou a costurar a eleição do diretório estadual paulista.

O governador Geraldo Alckmin quer o deputado estadual Pedro Tobias na presidência. Mas não há consenso em torno do nome para a secretaria-geral do partido.

Colaborou Gabriel Manzano

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Mineiros acionam TV Brasil por Twitter que ataca Aécio

Bancada do governo Anastasia quer que Procuradoria Geral apure mensagem na internet contra o senador tucano

Eduardo Kattah / BELO HORIZONTE e João Domingos / BRASÍLIA

Uma mensagem postada no Twitter da TV Brasil chamando o senador Aécio Neves (PSDB-MG) de "mentiroso" causou revolta ontem entre os tucanos de Minas, que prometeram levar denúncia ao Ministério Público, e obrigou a Empresa Brasileira de Comunicação (EBC) a anunciar abertura de investigação interna. "Aécio Neves mentiu ao país. A sua habilitação para dirigir foi renovada em 31/5/2010", dizia o post no Twitter da TV Brasil.

A polêmica envolve o episódio em que Aécio, na madrugada de domingo, foi flagrado com a carteira de habilitação vencida e se recusou a fazer teste do bafômetro em uma blitz policial da Lei Seca no Rio de Janeiro.

Em nota, a diretora-presidente da EBC, Tereza Cruvinel, admitiu que a mensagem no Twitter da empresa, dedicado exclusivamente a anunciar a programação da TV Brasil, pode ter sido feita por uma pessoa da própria emissora. "Se eventualmente a origem for interna, haverá apuração de responsabilidade e correspondente punição", disse Tereza. Na mesma nota, ela disse ter ligado para o senador e apresentado um pedido de desculpas em nome da TV Brasil. Antes, o próprio Twitter da emissora havia pedido desculpas pela mensagem, atribuindo-a a uma invasão em seu sistema de tecnologia.

Representação. Mesmo assim, o bloco de apoio ao governo Antonio Anastasia (PSDB) na Assembleia mineira anunciou que vai encaminhar à Procuradoria-Geral da República pedido de apuração do uso do Twitter da TV Brasil "para caluniar e difamar o senador Aécio Neves".

Em nota, o Departamento de Trânsito de Minas (Detran-MG) informou que a data citada no post da emissora se refere à emissão de uma segunda via da carteira de habilitação do senador. Segundo o Detran, a carteira de Aécio venceu no último dia 15 de fevereiro, data que corrobora informação dada anteriormente pela assessoria do senador.

Na representação que promete protocolar na segunda-feira, o deputado Bonifácio Mourão (PSDB), líder do bloco governista na Assembleia, lembra o caráter público da TV Brasil e ataca a "ilegalidade e imoralidade da utilização de sua estrutura administrativa para o ataque pessoal aos adversários políticos" do PT.

Mourão contesta a suposta violação da conta da TV Brasil no Twitter. "O que ocorreu é a evidente utilização da ferramenta para propósito escuso"

Potencial presidenciável da oposição em 2014, Aécio é o alvo declarado do PT mineiro, que lidera o bloco de oposição (com PC do B, PRB e PMDB) na Assembleia. Nos últimos dias, a oposição a Anastasia no Legislativo procurou explorar ao máximo o incidente com Aécio no Rio. Um e-mail com o conteúdo da mensagem postada pelo Twitter da TV Brasil chegou a ser encaminhado à imprensa pelo líder do bloco, deputado Rogério Correia (PT).

Os oposicionistas fizeram um requerimento questionando se o Estado anuncia na Rádio Arco-Íris, que tem como sócios o próprio Aécio e sua irmã Andrea - e em nome da qual está registrado o veículo Land Rover dirigido pelo senador no momento em que foi parado pela blitz no Rio.

Ontem, o líder da minoria, deputado estadual Antônio Júlio (PMDB), apresentou uma lista com 12 veículos - dos quais seis de alto luxo - que pertenceriam à rádio. E levantou a suspeita de "ocultação de propriedades".

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Em crise, DEM entra em guerra interna

Ronaldo Caiado acusa Jorge Bornhausen de articular destruição do partido

Maria Lima

BRASÍLIA. A notícia que o governador Raimundo Colombo, de Santa Catarina, deverá ir para o PSD do prefeito paulista Gilberto Kassab realimentou a disputa interna no DEM. Ex-líder do partido na Câmara, o deputado Ronaldo Caiado (GO) acusou o ex-presidente da legenda Jorge Bornhausen de manter articulações para destruir a sigla e construir o PSD para ser a ponte com o governo do PT. Bornhausen não respondeu ao colega.

Logo cedo Bornhausen foi bombardeado no Twitter por Caiado, que o acusou de sempre "se acomodar à sombra do poder" e agora trabalha para entrar no governo da presidente Dilma Rousseff. "Fracassaram, tentaram covardemente jogar a culpa em outros e saíram....Nós somos o partido da resistência democrática! Que os coveiros fracassados sigam o caminho adesista e de traição. As urnas darão a resposta", disse no Twitter.

Irritado com declarações do tesoureiro Saulo Queiroz - que anunciou sua saída do DEM rumo ao PSD -, Caiado culpa o tesoureiro e Bornhausen pela desastrosa mudança do nome do PFL para Democratas. Ele defenderá novo batismo: de DEM para Partido da Resistência Democrática, sobreviventes dos ataques do ex-presidente Lula, que declarou o desejo de ver o partido extinto e extirpado da politica. Para Caiado, a saída de Saulo não terá impacto, pois ele hoje é um politico sem votos e expressão. Saulo iria para a secretaria geral do PSD.

- O Saulo é um cão fila do Jorge (Bornhausen), está cumprindo ordens dele. Na posição de aposentado, de eminência parda, está agindo nos bastidores para minar o partido. Mas mesmo com 96 deputados (o novo tamanho da oposição), representamos 44 milhões de brasileiros que rejeitaram o fisiologismo e não vão aceitar ir na onda desses adesistas por interesses - afirmou Caiado.

Procurado, Jorge Bornhausen não quis responder a Caiado. Ele tem afirmado que está aposentado do partido. Seu filho, o secretário de Desenvolvimento Sustentável de Santa Catarina, Paulo Bornhausen, também não comentou as declarações.

- Não vou responder ao Caiado. Na vida a gente aprende a brigar para cima.

FONTE: O GLOBO

Fusão, só depois das eleições

Permanência do governador Raimundo Colombo (SC) no DEM adia discussão para junção com o PSDB

Ivan Iunes

Uma possível fusão entre PSDB e DEM, caso ocorra, somente será definida depois das eleições municipais de 2012. A avaliação de tucanos e demistas é de que a união das duas legendas agora seria tragada pela popularidade de início de governo da presidente Dilma Rousseff. A fuga de parlamentares do DEM para o PSD reacendeu a discussão sobre a criação de um terceiro partido a partir da junção dos dois maiores oposicionistas. A disposição inicial do governador catarinense, Raimundo Colombo, de permanecer no DEM pelo menos até 2012 deixou as articulações em banho-maria.

O futuro de Colombo é tido como um divisor de águas dentro dos planos do DEM para os próximos quatro anos. Com a iminente saída do governador, a legenda ficaria com cerca de 30 deputados e apenas o governo do Rio Grande do Norte, musculatura considerada insuficiente para influir no jogo eleitoral. Sem o governador, caciques do partido como o presidente, senador José Agripino Maia (DEM-RN), e o líder na Câmara dos Deputados, ACM Neto (DEM-BA), estariam abertos a possíveis articulações para antecipar os planos de fusão com o PSDB. “A avaliação dos líderes era de que, com a saída de Colombo, o partido teria como único destino a fusão, caso contrário viraria um partido sem força. O destino seria inexorável”, avalia um ex-dirigente demista, de malas prontas para o PSD.

Entraves regionais

Para os tucanos, no entanto, o mais interessante seria formalizar um acordo apenas em 2013 para tentar capitalizar a fusão nas eleições nacionais e estaduais do ano seguinte. Por isso, a legenda entrou nas conversas entre Colombo e o PSD para tentar esvaziar o acordo sobre uma mudança de partido do governador. Pelo acordo que está sendo costurado, o catarinense só mudaria de legenda depois das eleições municipais. Caso isso ocorra, o prazo servirá para que os tucanos consigam convencer a parcela mais relutante do DEM a unir as duas legendas. Embora aliados nacionais, os dois partidos não conversam em pelo menos cinco estados: Paraná, Rio Grande do Sul, Sergipe, Goiás e Rio de Janeiro.

Nesses locais, a palavra fusão é evitada a qualquer custo. “Não podemos ficar batendo cabeça. Independentemente de articulação de quem quer que seja, não vamos nos fundir”, defende o senador Demostenes Torres (DEM-GO). Para vários demistas, a desidratação do partido tem como principais articuladores o presidente de honra da legenda, Jorge Bornhausen, e o ministro da Casa Civil, Antonio Palocci. “Bornhausen faz trabalho subterrâneo, desleal, antiético. Assinou acordo de consenso em favor de Agripino e fez um jogo sujo, de descumprir palavras e riscar a sua biografia para aderir ao governo. O próprio Palocci ligou para as pessoas, e o governador de Amazonas (Omar Aziz) só assinou a filiação ao PSD depois que a presidente Dilma autorizou”, dispara o deputado federal Ronaldo Caiado (DEM-GO).

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

Centrais contra juros altos

Sindicalistas reunidos protestaram em frente à sede do Banco Central em SP, na Avenida Paulista

Roberta Scrivano

O cheiro do churrasco de sardinha preparado pelas centrais sindicais em frente à sede do Banco Central em São Paulo, na Avenida Paulista, era sentido a alguns quarteirões de distância. "Sardinha é o símbolo da pobreza", gritava Paulinho, da Força Sindical.

O motivo da churrascada, acompanhada de uma tímida manifestação que, segundo a Polícia Militar reuniu 250 pessoas - mas aos presentes não parecia alcançar 100 -, era protestar contra a alta taxa de juro do País. "Não é mole não, juro alto provoca demissão", insistiam em coro os líderes sindicais. O gancho da manifestação foi a reunião ontem do Comitê de Política Monetária (Copom).

Paulinho, com o discurso afiado, disse que não vê motivo para uma taxa Selic tão alta. "E os burocratas do Banco Central estão fazendo a cabeça da presidente Dilma para subir mais o juro."

Questionado se o aumento da taxa básica é um meio eficiente para conter a inflação, Paulinho foi enfático e disse que não. "Temos uma inflação de commodities internacionais. É o preço das commodities que está subindo", justificou.

Para o líder sindical, é preciso reduzir a taxa básica de juro para estimular os investimentos no setor produtivo e, consequentemente, gerar empregos. "Temos que enfrentar os banqueiros e os especuladores", disse.

Paulinho considera que a Selic ideal é entre 7% e 8% ao ano. Para conseguir o recuo desejado, as centrais sindicais prometeram em discurso organizar manifestações similares sempre que o Copom se reunir para decidir o que fará com o juro (de 40 em 40 dias).

Nem todos os participantes da manifestação sabiam explicar o que é a Selic e qual o impacto que a alta taxa acarreta no bolso do trabalhador. "Não sei o que muda, não", disse Claudiana, que não quis que seu sobrenome fosse publicado.

João Gomes, assessor do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, era um dos que mostrava conhecimento sobre o assunto. "Se a Selic sobe, usar o cartão de crédito fica mais caro", explicou. "O juro sobe e o salário não. Isso diminui o nosso poder de compra", emendou.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Preços subiram de forma generalizada, diz analista

Leite pasteurizado, cebola e feijão foram, no grupo de preços livres, os produtos que tiveram as maiores altas

Francisco Carlos de Assis

Os preços ao consumidor na primeira quinzena de abril subiram de forma generalizada, conforme avalia a economista da consultoria Rosenberg & Associados Ariadne Vitoriano, com base no Índice de Difusão dos IPCA-15, que passou de 58,59% em março para 62,76% em abril.

Esse indicador mede o porcentual de itens dentro do indicador que são alcançados pela onda de reajustes de preços na economia.

A difusão das altas no IPCA-15 foi determinada pelo grupo dos preços livres, que, além de ser o maior componente dos indicadores de preços, subiu 0,73% em abril, depois de ter registrado 0,45% em março.

Alimentação. Dentro do segmento dos preços livres (que variam de acordo com tendências de mercado), o maior grupo, o de Alimentação e Bebidas passou de 0,46% para 0,79%.

Entre os Alimentos, contribuíram para a aceleração do grupo a cebola (de 3,67% para 22,56%), o leite pasteurizado (de -0,38% para 1,58%), a batata-inglesa (de 9,66% para 10,05%%), o feijão carioca (de -6,91% para 5,99%), os pescados (de 0,08% para 2,91%), ovo (de 4,22% para 4,43%), frango em pedaços (de 1,53% para 2,45%), e café moído (de 2,09% para 2,10%).

Preços administrados. A variação dos preços administrados desacelerou de março para abril no âmbito de IPCA-15, passando de 0,96% para 0,86%, mas permanecendo ainda em um patamar muito elevado, segundo Ariadne.

Dentro do segmento administrado, ela destaca a alta de 4,28% do preço pago por litro de gasolina pelo consumidor na bomba.

Esse aumento do combustível, segundo a economista da Rosenberg, impactou o grupo Transportes, que ampliou a alta de 1,11% em março para 1,45% em abril.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Romance XXI ou das idéias:: Cecília Meireles

A vastidão desses campos. A alta muralha das serras.
As lavras inchadas de ouro.
Os diamantes entre as pedras.
Negros, índios e mulatos.
Almocrafes e gamelas.


Os rios todos virados.
Toda revirada, a terra.
Capitães, governadores,
padres intendentes, poetas.
Carros, liteiras douradas,
cavalos de crina aberta.
A água a transbordar das fontes.
Altares cheios de velas.
Cavalhadas. Luminárias.
Sinos, procissões, promessas.
Anjos e santos nascendo
em mãos de gangrena e lepra.
Finas músicas broslando
as alfaias das capelas.
Todos os sonhos barrocos
deslizando pelas pedras.
Pátios de seixos. Escadas.
Boticas. Pontes. Conversas.
Gente que chega e que passa.
E as idéias.


Amplas casas. Longos muros.
Vida de sombras inquietas.
Pelos cantos da alcovas,
histerias de donzelas.
Lamparinas, oratórios,
bálsamos, pílulas, rezas.
Orgulhosos sobrenomes.
Intrincada parentela.
No batuque das mulatas,
a prosápia degenera:
pelas portas dos fidalgos,
na lã das noites secretas,
meninos recém-nascidos
como mendigos esperam.
Bastardias. Desavenças.
Emboscadas pela treva.
Sesmarias, salteadores.
Emaranhadas invejas.
O clero. A nobreza. O povo.
E as idéias.


E as mobílias de cabiúna.
E as cortinas amarelas.
Dom José. Dona Maria.
Fogos. Mascaradas. Festas.
Nascimentos. Batizados.
Palavras que se interpretam
nos discursos, nas saúdes . . .
Visitas. Sermões de exéquias.
Os estudantes que partem.
Os doutores que regressam.
(Em redor das grandes luzes,
há sempre sombras perversas.
Sinistros corvos espreitam
pelas douradas janelas.)
E há mocidade! E há prestígio.
E as idéias.


As esposas preguiçosas
na rede embalando as sestas.
Negras de peitos robustos
que os claros meninos cevam.
Arapongas, papagaios,
passarinhos da floresta.
Essa lassidão do tempo
entre imbaúbas, quaresmas,
cana, milho, bananeiras
e a brisa que o riacho encrespa.
Os rumores familiares
que a lenta vida atravessam:
elefantíase; partos;
sarna; torceduras; quedas;
sezões; picadas de cobras;
sarampos e erisipelas . . .
Candombeiros. Feiticeiros.
Ungüentos. Emplastos. Ervas.
Senzalas. Tronco. Chibata.
Congos. Angolas. Benguelas.
Ó imenso tumulto humano!
E as idéias.


Banquetes. Gamão. Notícias.
Livros. Gazetas. Querelas.
Alvarás. Decretos. Cartas.
A Europa a ferver em guerras.
Portugal todo de luto:
triste Rainha o governa!
Ouro! Ouro! Pedem mais ouro!
E sugestões indiscretas:
Tão longe o trono se encontra!
Quem no Brasil o tivera!
Ah, se Dom José II
põe a coroa na testa!
Uns poucos de americanos,
por umas praias desertas,
já libertaram seu povo
da prepotente Inglaterra!
Washington. Jefferson. Franklin.
(Palpita a noite, repleta
de fantasmas, de presságios . . .)
E as idéias.


Doces invenções da Arcádia!
Delicada primavera:
pastoras, sonetos, liras,
— entre as ameaças austeras
de mais impostos e taxas
que uns protelam e outros negam.
Casamentos impossíveis.
Calúnias. Sátiras. Essa
paixão da mediocridade
que na sombra se exaspera.
E os versos de asas douradas,
que amor trazem e amor levam . . .
Anarda. Nise. Marília . . .
As verdades e as quimeras.
Outras leis, outras pessoas.
Novo mundo que começa.
Nova raça. Outro destino.
Planos de melhores eras.
E os inimigos atentos,
que, de olhos sinistros, velam.
E os aleives. E as denúncias.
E as idéias.