O alvo da CPI
iniciada nesta semana no Congresso deveria ser a investigação da relação
promíscua estabelecida entre desvio de dinheiro público e bolsos privados. Se
seguirem nesta direção, em algum momento, as discussões vão desaguar na
necessidade de rever e reforçar os mecanismos de fiscalização e controle
existentes no país.
Do pouco que já
se conhece do esquema montado a partir dos negócios de Carlinhos Cachoeira,
depreende-se que os rigores da lei que rege a contratação de obras públicas
no país já não são capazes de constranger os contraventores. O turbilhão de
falcatruas parece infindável e é preciso achar novas maneiras de tentar
detê-las.
A lei que rege
a contratação de obras públicas no Brasil data de 1993. Lá se vão quase vinte
anos e urgem mudanças. Por um lado, a legislação estipula ritos e processos
muitas vezes excessivos, que acabam abrindo espaço para ações meramente
protelatórias, movidas por interesses derrotados. Quem sai prejudicada é a
sociedade, que demora a ter as melhorias.
Entretanto,
verifica-se, também, que a lei n° 8.666 não tem se mostrado capaz de coibir a
miríade de conchavos, malandragens e acertos entre empresas que, em tese,
deveriam competir entre si pelos contratos, oferecendo menores preços pelos
serviços prestados ao Estado. Isto é, a legislação não tem sido hábil em
resguardar os cofres públicos.
O submundo
conseguiu transformar as licitações num crime que compensa. As dificuldades
que a 8.666 impõe acabaram se transformando numa forma de autoridades e
funcionários públicos venderem facilidades. Desde o mensalão, já se sabe que
há muita gente disposta a pagar caro por elas.
O que fazer
diante disso? Há duas alternativas: partir para uma digna reforma da lei,
aperfeiçoando-a à luz de suas quase duas décadas de aplicação, ou sair pela
tangente buscando chicanas que afrouxem os controles, ao invés de
redefini-los em favor da preservação do patrimônio público.
O governo
petista optou pela segunda vertente, como era de se esperar. Nos últimos
dias, lançou-se numa cruzada para emplacar o modelo do "liberou
geral" previsto nas regras - ou seria na falta delas? - do Regime
Diferenciado de Contratações (RDC) em todas as obras do PAC. É o caminho mais
curto para reforçar os dutos da corrupção.
O RDC é aquele
sistema arquitetado pelo governo Dilma Rousseff para fugir do risco do fiasco
completo nos empreendimentos voltados à Copa de 2014 e à Olimpíada de 2016.
Entre outros aspectos, permite a contratação das obras sem projetos básico e
executivo, ou seja, sem que se conheçam seus detalhes, cuja definição cabe às
empresas vencedoras. Trata-se, em suma, de modalidade em que ninguém sabe ao
certo o que está sendo contratado - nem por quanto - com o dinheiro público.
O novo sistema
mal foi testado até agora. Foi empregado apenas pela Infraero em seis
licitações - do que se sabe, o melhor resultado teria sido encurtar o tempo
do processo, como informou O Globo.
Mas o governo do PT já almeja estender as facilidades a toda a carteira do
PAC e suas centenas de bilhões de reais em investimentos previstos.
É possível ver
pelos menos duas razões para o desejo petista. Uma é fugir do incômodo que a
legislação que rege os contratos de obras públicas no país oferece à maneira
sempre improvisada com que age o governo. Trata-se da reconhecida
incapacidade do PT de atuar de maneira eficiente dentro dos marcos legais.
Nesta ótica, a melhor saída é sempre rompê-los, e não reformá-los.
Outro motivo,
bem pior, é azeitar de vez os drenos de dinheiro público. Com o pouco
revelado até agora das conexões entre Carlinhos Cachoeira, Agnelo Queiroz,
Construtora Delta e afins já se vislumbra quanto pode ter sido desviado do
dinheiro do contribuinte para as teias da corrupção e quanto mais pode ter
sido originado dos polpudos contratos do PAC. Como ficaria isso com o RDC
disseminado nos contratos públicos?
Se a proposta
do governo prosperar, o boi que passou até agora tornar-se-á logo em boiada.
É do interesse do país que a contratação de obras públicas envolva total
lisura. É certo que os marcos legais que regem as licitações clamam por ser
modernizados, mas escancarar a porteira só servirá para liberar o rebanho
para uma verdadeira farra com o dinheiro público.
Fonte: Instituto Teotônio
Vilela
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Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
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