domingo, 12 de agosto de 2012

A difícil maioria - Tereza Cruvinel

"A formação da maioria no presidencialismo brasileiro é um problema crônico desde a redemocratização, que respondeu ao bipartidarismo autoritário da ditadura com o multipartidarismo ilimitado que temos hoje"

No governo passado, o Senado foi o inferno de Lula. Por falta de maioria, sofreu ali a derrota que mais o magoou, a da emenda constitucional que prorrogava a vigência da CPMF. Na Câmara, a situação era mais confortável, antes e depois da denúncia de compra de votos com pagamentos mensais a deputados, que Roberto Jefferson batizou de mensalão. O governo Dilma, como o de Lula, e como os de FH, Itamar e Collor, continua enfrentando o problema da maioria, agora concentrado na Câmara. Formalmente, Dilma tem na Casa uma base formidável de quase 400 votos, mas, mesmo assim, a dificuldade para aprovar matérias do governo é permanente e voltou a se manifestar na semana passada.

Os ruralistas ligaram o trator na comissão especial mista da medida provisória que restaura o Código Florestal nas partes em que a presidente vetou as soluções ambientalmente insustentáveis por eles impostas, no voto, ao texto negociado no Senado pelo relator Jorge Viana. Diante da nova demonstração do poder avassalador deste bloco de interesses suprapartidário, o governo até cogita deixar a MP morrer pelo decurso de prazo. Trocar membros da comissão não resolveria nada. No plenário, o trator ruralista é imbatível. O governo não conseguiu também aprovar a MP 565, que trata da renegociação das dívidas dos pequenos agricultores do Norte e do Nordeste (não representados pela bancada do agronegócio, a ruralista), afora o empacado projeto de lei do novo regime previdenciário dos servidores.

A formação da maioria no presidencialismo brasileiro é um problema crônico desde a redemocratização, que respondeu ao bipartidarismo autoritário da ditadura com o multipartidarismo ilimitado que temos hoje. Um presidente que se eleja com mais de 60% dos votos válidos não terá, por força da dispersão dos votos entre 20, 30 partidos na eleição parlamentar, sequer 20% das cadeiras na Câmara. Terá de formar uma coalizão para governar. A moeda lícita será a partilha do governo, dos cargos e funções e a distribuição de recursos orçamentários através de emendas. Agora mesmo, o PSD está em estado de greve: ajudou a aprovar matérias recentemente, mas suas emendas não foram liberadas. Segundo o governo, por questões burocráticas e até por conta da greve de servidores em algumas pastas. Fato é que governar será também, ao longo de quatro anos, correr atrás da maioria.

No julgamento em curso no Supremo, a acusação e a defesa vêm mostrando, com objetivos distintos, que a busca da maioria e o financiamento de campanhas podem se aproximar ou se confundir. Se todo esse transe não servir para explicitar a necessidade e a urgência da reforma política, especialmente no que diz respeito ao financiamento de campanhas e ao modo de eleger representantes no parlamento, é porque temos mesmo uma notável incapacidade para aprender com a experiência.

Campanha e greves. Até onde se sabe, a presidente Dilma Rousseff ratificou, na conversa de quinta-feira com o presidente do PT, Rui Falcão, a decisão de não participar de campanhas municipais, exceto em Belo Horizonte. Nas duas outras disputas mais emblemáticas, as de Recife e São Paulo, ela vem dizendo que são problema do ex-presidente Lula. Na sexta-feira, numa incursão a Minas (embora bem ao norte da capital), ela enfrentou vaias e protestos de servidores e professores universitários em greve. Em Belo Horizonte, teria sido pior. Campanhas à parte, o governo Dilma parece ter errado na condução das greves federais: ou subestimou a força do movimento, inclusive na designação de uma interlocutora de perfil técnico como a ministra Miriam Belchior, do Planejamento, ou superestimou a blindagem do governo proporcionada pela alta popularidade da presidente.

Dilma tem dito cobras e lagartos dos grevistas, mas isso nada resolve. Ganhos na Justiça, como a ordem para que os fiscais agropecuários voltem ao trabalho, são pontuais. Os grevistas, de carreiras diversas, podem estar exagerando nos pleitos, e o governo pode não ter mesmo como atendê-los. É razoável o argumento do governo, de que a prioridade é preservar o emprego dos que não têm estabilidade, os trabalhadores das empresas afetadas pela crise. Mas parece óbvio que há uma escassez de diálogo e uma avaliação incorreta da força dos movimentos. Chamado para ajudar, Lula já advertiu a CUT: fogo amigo contra Dilma, não dá.

E ainda tem os caminhoneiros, que, quando param, desaceleram mesmo a economia.

Algumas. O governo reconhece problemas no relacionamento com os partidos da base na Câmara, mas acha também que o perfil do líder Arlindo Chinaglia não ajuda. Resta saber se Dilma, em algum momento, irá trocá-lo, como já fez em outra ocasião, apesar do desgaste.

O relacionamento PT-PSB vai de mal a pior e já se projeta sobre disputas futuras em 2014, também no plano estadual. O senador Rodrigo Rollemberg (PSB) dá todos os sinais de que pode concorrer com o atual governador petista do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, numa aliança com o senador Cristóvam Buarque (PDT).

Militares e diplomatas nunca se bicaram. O primeiro ministro da Defesa de Lula, embaixador José Viegas, comeu pão amargo no cargo. Celso Amorim, aliando habilidade e valorização da política nacional de Defesa, venceu o antagonismo. Anteontem, comandantes celebraram com ele, em Ponta Porã, seu primeiro ano no cargo. Amorim está na briga para aumentar os investimentos em defesa, de 1,5% para 2,5% do PIB, média dos outros países dos Brics.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

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