segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Melhor para todos - Wilson Figueiredo


O brasileiro não estava nem aí quando o domingo se  apresentou como  cartão de visitas do verão e logo ficou sabendo  da entrevista de teor equivalente ao bilhete em que Jânio Quadros avisou que estava deixando de ser o Presidente da República, com sete meses de governo,  por se sentir impedido  de exercer os poderes a que tinha direito.

A semelhança se esgotou na entrevista em que Marcos Valério fazia, mas deixou de fazer,  uma antologia de razões servidas tarde demais a uma  opinião pública cansada de versões insatisfatórias como saldo republicano. De resto, tarde demais para alterar a ordem dos fatores conhecidos e deixar mal o produto posto à  disposição dos cidadãos, sob o insuficiente nome de mensalão.  O que seria a versão final de Marcos Valério ficou para outra oportunidade, quem sabe melhor, e que não faltará na próxima curva da história.

No domingo as circunstâncias eram outras, e não estavam em causa  as tentações  da reeleição. Pairava no ar expectativa indefinida. Ninguém ficou sabendo, nem por intermédio de quem, a entrevista voltou ao ponto de partida. Deixou de haver. Se é que não faltou alguém, com senso de oportunidade e faro mineiro, para reviver o papel de José Maia Alkimim quando, entre a manhã e a tarde do 25 de  Agosto de 1961,  dirigiu-se ao senador Auro Moura Andrade, então  presidente do Senado, e lhe perguntou se era verdade ter em mãos  “um documento capaz de mudar o destino do Brasil” e,  diante da confirmação, pediu para conhecer o teor. Leu sem pressa e, guardando os óculos,  perguntou o que Moura Andrade estava  esperando para lhe dar curso. (A versão é do próprio autor mineiro e nunca foi posta em dúvida.) A História guarda o essencial, e deixa pormenores para o varejo. Seja como tiver sido, a entrevista de Valério foi recolhida e deixou na manhã de domingo o teor de um episódio que passou de mensalão a Ação Penal 470. Melhor para todos.

As conseqüências não se fizeram de rogadas em agosto de 1961, mas em setembro de 2012 o personagem principal, modéstia à parte, é mais cuidadoso. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que não figura no elenco da Ação Penal 470, mas opera por trás dos demais – para não se incompatibilizar como candidato em 2024, -, não cuidou da Ação Eleitoral 7 desde que se interessou pela eleição municipal, como terapia ocupacional para, na oportunidade, habilitar-se mais uma vez  à presidência, a seu ver incapaz de viver sem ele. Este é, até segunda ordem, problema que só diz respeito à presidente Dilma Rousseff, com prioridade para aceitar a reeleição, desde que a República se sentiu em condições de manter esse desafio amaldiçoado. Mas aí o problema passa a ser de Lula.

No caso da entrevista de domingo, tenha ou não sido concedida, pessoalmente ou por tabela, Marcos Valério pingava os pontos nos iis: tudo que disse já era do conhecimento de boa parte do público interessado ou não. Lula sabia  de tudo e, se não soubesse, pior para seu saldo negativo. Falou mais firme a sensação  de que se trata exatamente do que se sabia. O Supremo mastigara com vagar para que a opinião pública não engasgasse com a própria fome de escândalos  acumulados  ao longo do percurso para tornar realmente digeríveis as conclusões finais.

Se não estava, como devia estar, previsto que não poderia terminar bem o método que encalacrou  PT,  a conclusão só pode ser que a  ameaça de Valério antecipou a primavera à espreita da oportunidade no eterno jogo de  empurra que é razão de ser da política.

FONTE: JORNAL DO BRASIL

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