sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Intransigente defensor da democracia


No auge da ditadura, enfrentou até cães para denunciar arbitrariedades do regime militar

Cristiane Jungblut, Isabel Braga e Luiza Damé

Advogado de formação, Ulysses Guimarães era avesso a improvisações. Quando presidiu a Assembleia Nacional Constituinte, o ápice de sua vida pública, convocava assessores e o então deputado Nelson Jobim (PMDB-RS), da Comissão de Sistematização e seu pupilo, às 7h, para ensaiar as votações previstas para a tarde. Segundo Jobim, repetia duas frases: "Em política, até a raiva é combinada. Quem não leva em conta isso é amador". Outra era do político inglês Disraeli: "Nunca se queixe, nunca se explique, nunca se desculpe", para evitar que já começasse o jogo na defensiva.

Nessa época, Ulysses era um dos políticos mais poderosos do país. Chamado de tripresidente, comandava o PMDB, a Câmara e a Constituinte, no comando da qual surpreendia pela resistência: sentava-se às 14h na cadeira da presidência, no barulhento e lotado plenário da Câmara, e só saía por volta de 21h, sem ir ao banheiro. Era senso comum no Congresso que as votações só andavam sob o comando firme de Ulysses, que sabia ser gentil e ouvir a todos; mas, quando anunciava o início do processo de votação, não transigia.

- Para administrar 24 subcomissões, oito comissões e mais uma Comissão de Sistematização, só com a habilidade e a autoridade política do doutor Ulysses - relembra o tucano paranaense Euclides Scalco, um dos amigos do peemedebista.

Ulysses conquistou o reconhecimento nacional com sua luta pela democracia e um histórico de resistência à ditadura militar, além da correção no trato do patrimônio público. Entrou para a política em 1947, eleito deputado estadual constituinte pelo então PSD, partido do qual só saiu para fundar o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), em 1966, que ele preferia que se chamasse Ação Democrática Brasileira. Pelo MDB, e depois pelo PMDB, obteve 11 mandatos seguidos.

Em 1973, um dos períodos mais duros da ditadura, encampou a ideia do chamado grupo autêntico do MDB e percorreu o país divulgando a anticandidatura. Um gesto de enfrentamento da ditadura, que elegeria em janeiro de 1974, no colégio eleitoral, um militar da linha dura, o general Ernesto Geisel, como presidente da República. Acompanhado do vice, o jornalista Barbosa Lima Sobrinho, o anticandidato enfrentou os aliados da ditadura.

Em Salvador, na mais famosa imagem dessas andanças, foi atacado por cachorros da polícia baiana. No Rio, impedido de fazer campanha. Criticava a eleição indireta, denunciando o jogo de cartas marcadas, denunciava arbitrariedades e defendia a liberdade. A anticandidatura mobilizou brasileiros e, nas eleições parlamentares de 1974, o MDB elegeu 16 dos 21 senadores e passou de 87 para 160 deputados.

- Eu era suplente de senador, e me chamava a atenção a coragem do doutor Ulysses. Esteve três vezes no Paraná num período duro, nossos encontros eram acompanhados por agentes da Polícia Federal, mas ele não tinha medo - lembra Scalco.

A história do PMDB se confunde com a trajetória de Ulysses, que presidiu a sigla por 20 anos, de 1971 a 1991. Em 1977, na convenção do MDB que decidiu enfrentar o candidato da ditadura, general João Figueiredo, defendeu uma Assembleia Nacional Constituinte e eleição direta para presidente, governador, senador e prefeito.

Dois anos depois, Ulysses estava à frente da campanha pela anistia. Na década de 1980, liderou o movimento "Diretas Já", ganhando a alcunha de "Senhor Diretas". Na primeira eleição direta de presidente, insistiu em ser candidato, mas o PMDB o abandonou na campanha. Morreu sem realizar o sonho de ser eleito presidente.

O Santos era outra paixão. Foi diretor do clube e defendeu os interesses santistas no Congresso.

Fonte: O Globo

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