quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Valério já pega 12 anos de cadeia em regime fechado


Cálculo se refere a apenas três de nove crimes já analisados

Ministros decidem ainda absolver réus nos sete casos de empate. Com isso, três deles terminam sem condenação

Na primeira sessão dedicada à estipulação das penas de 25 condenados, os ministros do STF não conseguiram terminar de calcular a punição do primeiro réu analisado: Marcos Valério. Mesmo assim, já é certo que ele pegará ao menos 11 anos e oito meses, o suficiente para colocá-lo em regime fechado de prisão. A Corte também decidiu pela absolvição nos sete casos de empate. Com isso, os ex-deputados Paulo Rocha e João Magno, além do ex-ministro Anderson Adauto, saem do julgamento sem condenações, pois não foram punidos por nenhum outro crime.

Prisão à vista para Valério

Operador do mensalão já está condenado a 11 anos e 8 meses por apenas um terço dos crimes

Carolina Brígido, André de Souza

UM JULGAMENTO PARA A HISTÓRIA

BRASÍLIA - Depois de considerar culpados 25 réus do mensalão e absolver 12, o Supremo Tribunal Federal (STF) começou ontem a calcular as penas dos condenados. Na primeira sessão dedicada à dosimetria, os ministros não conseguiram terminar de calcular sequer a pena do primeiro réu: o operador do esquema, Marcos Valério. Foram imputadas penas a somente três dos nove crimes pelos quais ele foi condenado. Mesmo assim, Valério já tem sobre os ombros 11 anos e oito meses de reclusão, o suficiente para colocá-lo no regime fechado de prisão. Ele também já foi condenado a pagamento de multa de R$ 978 mil. A cifra foi fixada em valores da época dos ilícitos e será corrigida na época da execução.

Em nenhum dos casos examinados Valério pegou pena mínima, mas também não recebeu a máxima. Hoje, os ministros retomarão o cálculo das penas dele. Só no fim, formalizarão a decisão sobre o regime de cumprimento. Pela lei brasileira, penas de prisão superiores a oito anos devem ser cumpridas em regime inicialmente fechado. O STF também deixou para decidir no fim se o réu restituirá aos cofres públicos o dinheiro desviado.

Antes de começar a calcular as penas, os ministros decidiram que quem absolveu um réu por determinado crime não pode participar da dosimetria. Ricardo Lewandowski, revisor do processo, autor do maior número de absolvições, concordou com a solução. Dias Toffoli discordou. Queria participar do cálculo da pena dos réus que absolveu. O presidente da Corte, Carlos Ayres Britto, e Gilmar Mendes concordaram com Toffoli, mas a maioria venceu.

- Como é que o magistrado que absolveu pode, depois, se pronunciar sobre agravantes ou atenuantes (da pena)? É uma contradição lógica, além de ser um gravame para a própria consciência do magistrado - disse Lewandowski.

- Não vejo razões para quem absolveu não participar da dosimetria - afirmou Toffoli.

Foi o relator, Joaquim Barbosa, quem decidiu começar a dosimetria pelo chamado núcleo publicitário. Para Valério, líder do grupo, Barbosa sugeriu pena de dois anos e 11 meses pela condenação de quadrilha - um crime para o qual o Código Penal determina pena de um a três anos. Ele também sugeriu o pagamento de multa, mas os colegas lembraram-lhe que não há multa prevista no Código Penal para quadrilha.

Para chegar ao número, o relator levou em conta o grau de culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade, os motivos, as circunstâncias e as consequências do crime, bem como o comportamento da vítima. Barbosa considerou intensa a culpa do réu, mas ponderou que Valério não tem antecedentes criminais:

- Há ações judiciais em tramitação contra Marcos Valério, mas, enquanto o plenário não resolver essa pendência (sobre a influência de ações não concluídas nos antecedentes de um réu), não vejo condições de aplicar maus antecedentes.

O ministro considerou graves os motivos e as consequências do crime, a compra de apoio político no Congresso. As circunstâncias também, já que tudo foi combinado com a cúpula do PT. Sobre as consequências do crime, afirmou:

- A compra de apoio político no Congresso pôs em risco o regime democrático, a independência dos poderes e o sistema republicano, em flagrante ofensa à Constituição.

A pena foi aumentada, ainda, porque Valério tinha posição de liderança em relação aos sócios, que também integravam a quadrilha. Para o relator, não houve atenuantes. O voto de Barbosa foi acompanhado por cinco ministros. Só não participaram Lewandowski, Rosa Weber, Toffoli e Cármen Lúcia, por terem absolvido o réu.

Pelo crime de corrupção ativa no episódio de pagamento de propina ao então presidente da Câmara João Paulo Cunha, Barbosa fixou a pena em quatro anos e um mês de reclusão, mais 180 dias-multa. O total ficou em R$ 432 mil. O voto foi seguido por todos os sete ministros aptos a votar.

"Palavra emprestada da medicina"

O passo posterior foi votar as penas de Valério referentes às práticas de peculato - que pode gerar de dois a 12 anos de prisão. O primeiro peculato analisado foi o ocorrido na Câmara: a SMP&B embolsou dinheiro público em troca de serviços não prestados. Barbosa fixou pena de quatro anos e oito meses de reclusão, mais 210 dias-multa (R$ 546 mil). Para Barbosa, o motivo do crime influenciou negativamente na fixação da pena:

- Marcos Valério pretendeu não apenas enriquecer ilicitamente, mas também obter sua remuneração pela prática concomitante de outros crimes em proveito do PT.

Barbosa disse que o dinheiro desviado, quase R$ 1 milhão, também influenciou na pena.

- Considero que quanto mais alto o desvio, mais reprovável a conduta e mais grave as consequências para o bem jurídico protegido - afirmou, recebendo o apoio de sete ministros. Lewandowski e Toffoli tinham absolvido e não votaram.

Os ministros não concluíram a votação sobre corrupção ativa por Valério ter subornado o ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato em troca da liberação de R$ 73,8 milhões do fundo Visanet para a SMP&B. Barbosa fixou a pena em quatro anos e oito meses, mais o pagamento de 210 dias-multa (R$ 504 mil).

Foi a primeira vez que Lewandowski divergiu do relator. Ele propôs três anos, um mês e dez dias de reclusão, mais R$ 108 mil. Houve discussão.

- A palavra dosimetria é interessante, ela é emprestada da Medicina, é como a dose de um remédio. Esse remédio não pode ser menor ou maior que o necessário, tem que ser na dose certa - argumentou Lewandowski.

- E não pode ser barateado também - respondeu Barbosa.

Fonte: O Globo

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