quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

OPINIÃO DO DIA – Norberto Bobbio: “etiqueta”

Lendo Gramsci, dávamo-nos conta de que era muito mais importante aquilo que ele dizia do que como o dizia (isto é, com qual método), como também sob qual “etiqueta ” dever-se-ia colocá-lo. Em segundo lugar, era um marxismo não escolástico, não dogmático e não exegético: não-escolástico porque não repetia fórmulas, mas estudava problemas reais, ainda que à luz daquilo que havia apreendido de Marx de Engels e de Lênin; não dogmático porque não acreditava a que pudesse resolver os problemas reais citando Marx, mas estudando a história e levando em grande conta aquilo que haviam dito autores diferentes de Marx, e não-marxistas (como de resto havia feito Marx, com a diferença de que Marx, para fazer a crítica da economia política, havia estudado os clássicos da economia, e Gramsci, para fazer a crítica da política estudou o clássico da política por excelência, Maquiavel); não exegético porque nas raras vezes em que introduz no seu discurso uma citação de Marx ou de Lênin, não está torturado pelo falso problema da interpretação genuína de Marx, que atormenta tantos marxólogos de hoje, como se o marxismo fosse uma idéia platônica e não um produto histórico, como se somente aquele que correspondesse à idéia fosse o” verdadeiro” Marx que apenas alguns poucos videntes estão em condições de ver.

Norberto Bobbio (18/10/1909-9/01/2004), filósofo italiano. “Ensaios sobre Gramsci”, págs. 112-3. Paz e Terra, Rio de Janeiro, 2002.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Estandarte é da Vila
O samba do paulista doido
Chávez vai ser operado de novo no local do câncer
Grécia aceita supervisão externa

FOLHA DE S. PAULO
Justiça anula prova da PF em inquérito sobre emptreiteira
Grécia abre mão de parte de soberania em troca de ajuda
Chávez afirma que fará cirurgia para tirar novo tumor

O ESTADO DE S. PAULO
Vexame do carnaval paulista
Ajuda à Grécia é vista com pessimismo
Chávez tem outro tumor e vai passar por 2ª cirurgia

VALOR ECONÔMICO
Cosan está perto de entrar no bloco de controle da ALL
Alívio passageiro
Compra da Garoto pela Nestlé deve voltar ao Cade
Soja atinge 25% do valor da safra
Estagnada, Alagoas perde o boom nordestino

CORREIO BRAZILIENSE
A quaresma de Dilma
Remendo Europeu à Grega
A doença de Chávez reaparece

ESTADO DE MINAS
Classe média no sufoco
Sem cheque em branco
Chávez fará nova cirurgia

ZERO HORA (RS)
União cobrará R$ 911 mil de prefeitos gaúchos cassados
Dívida da Grécia cai à metade até março

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
O frevo é do mundo
Quebra-quebra na apuração
Depois da folia, a hora da verdade

Os verdadeiros mentirosos:: Merval Pereira

O caso da doença do presidente venezuelano Hugo Chávez é exemplo dos transtornos que um regime quase ditatorial pode causar na sua tarefa cotidiana de esconder os fatos e manipular informações.

O jornalista Nelson Bocaranda, com prestígio consolidado na Venezuela depois de ter dado no ano passado o furo jornalístico sobre o tratamento do câncer de Chávez em Cuba, foi atacado ferozmente por ter postado em seu blog e divulgado pelo twitter na segundafeira que Chávez havia retornado a Cuba, acompanhado de vários parentes, inclusive sua mãe.

A notícia de que o estado de saúde de Chávez havia piorado foi negada pelo governo de maneira peremptória, e o ministro da (des) Informação, Andrés Izarra, disse que a notícia fazia parte de uma "guerra suja da escória".

O líder governista no Congresso, Diosdado Cabello, chegou a afirmar que Chávez estava saudável, dizendo também pelo twitter que "Bocaranda está doente na alma".

Da mesma maneira, depois que na quinta-feira publiquei no meu blog (http://oglobo.globo.com/blogs/ blogdomerval/) que o quadro de saúde de Chávez havia piorado, com informações de médicos brasileiros que haviam analisado exames do presidente da Venezuela indicando a possibilidade de metástase em direção ao fígado, Maximilien Arvelaiz, pomposamente intitulado "embaixador da República Bolivariana da Venezuela no Brasil", enviou carta ao GLOBO afirmando que "o tratamento contra um câncer, ao qual o presidente Hugo Chávez foi submetido em 2011, foi exitoso, estando o presidente gozando de boa saúde".

O embaixador bolivariano chega a ser inadvertidamente irônico ao afirmar a certa altura de sua mensagem que via na notícia "uma falta de transparência no texto ao reproduzir o falso diagnóstico creditado a "médicos" que não possuem nem identidade".

Além de demonstrar que nada conhece sobre o jornalismo em um país democrático, onde se pode preservar o sigilo da fonte, chega a ser risível o representante de um país que esconde todos os fatos relacionados à doença de seu presidente falar em "falta de transparência".

Ainda mais quando se sabe que Chávez deixou de se tratar no Brasil por que não foi possível aceitar suas exigências de sigilo absoluto.

O presidente venezuelano, com o espírito ditatorial que lhe é próprio, queria interditar dois andares do Hospital Sírio e Libanês em São Paulo e colocar o Exército para tomar conta do hospital, revistando todos os visitantes. E ainda proibir a divulgação de boletins médicos.

A rejeição de Chávez ao Hospital Sírio e Libanês se justifica, do ponto de vista autoritário, justamente pelo sistema aberto de informações, que fez com que fosse revelada até mesmo a presença do paranormal João de Deus no hospital, para um tratamento espiritual a Lula paralelamente ao tratamento oficial.

A falta de transparência na Venezuela é tanta que até o momento não se sabe oficialmente em que local do corpo de Chávez está localizado o primeiro tumor. Sabe-se que poderia estar na "região pélvica", talvez no colo do reto, mas não há mais detalhes.

Da mesma maneira, as informações sobre o segundo tumor, que obrigará Chávez a fazer uma outra operação em Cuba — em São Paulo, sendo as exigências as mesmas, continua impossível, mesmo que as condições técnicas sejam melhores — saíram até agora apenas da boca do interessado, o próprio Chávez.

Na véspera de viajar para Cuba para os exames que confirmaram que ele tinha um novo tumor, Chávez apareceu em público para negar a notícia que eu havia divulgado pelo blog, e depois no GLOBO de papel, afirmando que o câncer "se fora" de seu corpo. Assim como, quando regressou de Cuba depois da primeira operação, declarou-se "curado".

Quando o presidente venezuelano diz que não se trata de uma metástase, mas de um novo tumor encontrado no mesmo local do anterior, não temos nenhuma evidência médica para comprovar.

Pode ser o que os médicos chamam de uma "recidiva local", quando um tumor surge no mesmo lugar do que foi extirpado, ou pode ser um efeito do processo de metástase.

Há outras hipóteses, como a levantada pela agência de notícias Reuters, de que Chávez sofre também de síndrome da lise tumoral (SLT), complicações metabólicas que podem ocorrer após o tratamento de um câncer, mais comum em linfomas e leucemias, que podem causar, entre outras coisas, insuficiência renal aguda.

A quimioterapia pode precipitar a síndrome, mas o tratamento com esteroides também pode ter como consequência a SLT.

O jornalista venezuelano Nelson Bocaranda disse em seu blog que o presidente Hugo Chávez estava usando esteroides ultimamente para mascarar os sintomas da doença, tentando uma aparência mais saudável.

Os esteroides atacam também o fígado, podendo até mesmo provocar câncer. Todas essas especulações se devem apenas à falta de transparência com que o governo venezuelano, à maneira de todas as ditaduras, trata a doença do presidente, como se ela não fosse um assunto de interesse público.

A maneira mais fácil para um governo democrático acabar com as especulações sobre a saúde de um presidente é a divulgação integral dos exames médicos, o que dissiparia quaisquer dúvidas.

Nos casos do ex-presidente Lula e da presidente Dilma, as informações médicas foram dadas com a transparência possível até o momento. Mesmo os médicos brasileiros que tiveram acesso aos exames de Chávez, alguns a pedido do próprio Lula, não tiveram permissão para ver todos eles e analisaram peças isoladas, como se montassem um quebra-cabeça.

Na Venezuela, o twitter não para com gozações sobre "os verdadeiros mentirosos", o ministro da Comunicação Social Andrés Izarra e o líder no Congresso Diosdado Cabello, "os chavistas desinformados". Mas é surpreendente como temos "chavistas desinformados" também aqui no Brasil.

FONTE: O GLOBO

A nêmesis do PT :: Fernando Rodrigues

Hoje recomeça a novela sobre o tucano José Serra ser ou não ser candidato a prefeito de São Paulo. Do outro lado da cerca, uma parte da cúpula do PT difunde um raciocínio fantasioso sobre Serra ser o melhor adversário na disputa de outubro. Balela.

Esse cenário só seria bom para os petistas se fosse possível prever o futuro e ter certeza de uma derrota de Serra. O tucano ficaria quase liquidado para tentar se lançar ao Planalto em 2014. Seria também um revés enorme para a oposição.

Ocorre que eleições são bichos de comportamento imprevisível. Ninguém hoje arrisca com muita segurança um prognóstico para a sucessão de Gilberto Kassab no comando da maior cidade do país.

O cenário oposto ao desejado pelo PT, com Serra sendo candidato e vencendo, robusteceria a oposição. Se ocorrer, significará que a alta popularidade do lulo-petismo ainda não fincou raízes definitivas entre os eleitores paulistanos mais conservadores, moderados e alguns órfãos renitentes do malufismo.

Se vencer, Serra teria, por óbvio, dificuldade de sair novamente da Prefeitura de São Paulo para se candidatar a outro cargo em 2014. Em contrapartida, ele se firmaria como protagonista para conduzir outros processos eleitorais pelo país na condição de líder do PSDB.

Muitos já tentaram encarnar o papel, mas só Serra continua sendo a nêmesis do PT. Sua entrada na disputa paulistana mais atrapalha do que ajuda os planos hegemônicos de Lula e de seu partido. Já a ausência de Serra facilita a vida do atual grupo no poder federal, que cobiça como nunca entrar em São Paulo.

Não é uma decisão fácil para o tucano. Ele está entre duas possibilidades principais, ambas arriscadas. Uma é priorizar seu antigo projeto de um dia ser presidente. O outro caminho seria cumprir uma missão para tentar segurar as pontas dos combalidos partidos de oposição.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

O pessimista entre a anarquia e o poder :: Eliana Cardoso

No território da bandidagem e da violência, a discussão da origem do Estado não se assenta na República de Platão, mas na lenda hobbesiana da vida curta e brutal. E - lamenta-se o señor Juan, protagonista de Coetzee no Diário de um Ano Ruim - Hobbes nos esconde que a entrega do exercício da força ao Estado é irreversível e impede para sempre a volta ao estado natural. Entretanto, se o estado natural era a barbárie, porque haveríamos de querer voltar para lá? Você não quer. Nem eu. Mas ao señor Juan interessa demonstrar a solidez da opinião anarquista: o que está errado com a política é o poder em si.

Para ilustrar seu argumento o señor Juan comenta a "ingenuidade" do filme Os Sete Samurais, no qual Kurosawa oferece sua versão da origem do Estado. Uma aldeia japonesa, durante um período de desordem política - quando o Estado praticamente deixara de existir -, sofria invasões de uma tropa de bandidos, que roubava mantimentos, estuprava mulheres e matava quem resistisse. Aos poucos, os bandidos - mutantes de predadores em parasitas - sistematizaram as visitas, comparecendo à aldeia apenas uma vez por ano para cobrar tributo.

O filme começa com a decisão dos camponeses de contratar um bando de durões (sete samurais desempregados) para proteger a aldeia. Os samurais derrotam os bandidos e, tendo visto como o sistema de extorsão funciona, oferecem aos camponeses uma proposta: pagamento anual em troca de proteção permanente. Como Kurosawa é um sonhador romântico, quando os camponeses recusam a oferta, os samurais vão embora em paz.

Coetzee desacredita do final feliz do filme de Kurosawa, mas é exatamente um final feliz que desejamos na solução dos conflitos iniciados pela Polícia Militar que ocupou a Assembleia Legislativa da Bahia, durante a segunda semana de fevereiro. Por isso, vários analistas tentaram entender o que se passou e perguntar como evitar que o motim se repita no futuro.

Vale começar passando em revista o susto da população brasileira, quando o movimento articulado por grevistas espalhou o pânico para forçar a aprovação da PEC 300, que cria piso nacional para o salário de policiais e bombeiros. Os homens do Exército e da Força Nacional fecharam o cerco aos policiais militares acampados dentro do prédio da Assembleia Legislativa em Salvador, transformado em quartel-general dos grevistas. Fracassada a primeira tentativa de negociação, o Exército endureceu. O clima ficou tenso. Helicópteros deram rasantes sobre o prédio. De dentro da Assembleia, um dos líderes do movimento ordenou atos de vandalismo. A greve provocou uma onda de crimes. Houve relatos de mendigos assassinados e ônibus invadidos por supostos policiais. O Exército reforçou a tropa que cercava a Assembleia. Suspendeu a entrega de comida. Cortou a energia e a água. A ocupação terminou.

As greves policiais são comuns no Brasil, declarou um defensor dos grevistas, no suplemento Aliás de O Estado de S. Paulo, como se o clichê do "todo mundo faz" pudesse justificar a não justificável violação dos direitos humanos da população, sujeita a assassinatos e saques.

A maioria dos analistas concordou que a reivindicação salarial era justa. Mas a maioria também argumentou que uma reivindicação justa deixa de sê-lo quando vem vinculada a técnicas de intimidação e extorsão. A discussão então se voltou para a regulamentação do direito de greve do setor público e a omissão do Congresso Nacional na aprovação desse disciplinamento.

Mas a nossa Constituição inclui os policiais e os bombeiros na categoria de militares, porque a eles cabe preservar a ordem e garantir a segurança. Os profissionais que portam armas estão, segundo a Constituição, barrados da sindicalização e da greve. A esses servidores públicos, portanto, não se aplica a necessidade de regulamentação do direito de greve, pois a proibição já existe.

Nenhuma democracia conta com organizações simétricas para todos os seus grupos. Por exemplo: os desempregados, os consumidores e os contribuintes não se encontram organizados. A consequência é que grupos organizados e poderosos (como o dos trabalhadores sindicalizados ou o dos banqueiros) tendem a ignorar as perdas para os grupos não organizados. As forças do mercado não são suficientes para garantir comportamentos que beneficiem igualmente todos os grupos sociais. Entende-se, portanto, que os policiais precisam reivindicar ajustes, mas terão de fazê-lo por meio de atos de suas associações ou esperar que o Estado lhes dê cobertura legal para realizarem um movimento reivindicatório disciplinado e com mobilização parcial, sem ação violenta, sem ocupação de prédios e sem vandalismo.

Aqui entra a inação do Congresso Nacional e dos governos estaduais e federal. A sociedade pergunta-se por que a PEC 300, que tramita na Câmara desde 2008, ainda não foi discutida nem se votaram emendas para harmonizar salários levando em consideração as condições e o custo de vida nas diferentes regiões do País. Por onde andavam nossos representantes todos esses anos?

A explicação parece ser a de que os políticos acreditam que não têm mandato para se anteciparem aos problemas e o público não reage à inação de seus representantes. A consequência é que problemas que parecem pequenos acabam se transformando em tragédias. A Câmara só age sob pressão.

O señor Juan - personagem de Coetzee que abriu este artigo - declara-se anarquista-quietista-pessimista. Anarquista porque o que está errado com a política é o poder em si. Quietista porque a vontade de se pôr a mudar o mundo se encontra, ela também, infectada pelo desejo de poder. E pessimista porque não acredita que coisas possam mudar. A posição parece intelectualmente sofisticada. E, com certeza, é cômoda. Mas se todos pensarmos como ele, estaremos entregando o Brasil aos bandidos.

* Eliana Cardoso, ph.D em Economia pelo MIT, é autora de "Mosaicos da Economia" (Saraiva, 2010).

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Lições da Perestroika na economia:: Luiz Carlos Mendonça de Barros

O debate sobre os efeitos da abertura da economia na sociedade brasileira em geral - e na indústria em particular - pode se beneficiar de algumas lições da Perestroika na Rússia ainda comunista. Explico a seguir o porque dessa minha afirmação.

Em ambos os casos trata-se do processo de reação de uma sociedade complexa diante da distensão de regras restritivas à liberdade de indivíduos e grupos sociais impostas pelos governos nacionais. No caso russo o aspecto dominante foram as liberdades políticas do cidadão e da sociedade; no caso brasileiro de agora é a busca da liberdade econômica por parte de consumidores e empresas produtoras de bens e serviços que está no centro das mudanças.

Na Perestroika me interessam suas lições sobre a impossibilidade do governo de controlar a velocidade e a intensidade com que a liberdade política voltou ao espaço social russo. Uma vez iniciada a abertura, a complexidade do que se seguiu não estava prevista nos planos dos dirigentes comunistas, e os acontecimentos na Rússia e em outros países comunistas fugiram totalmente do controle.

A abertura da economia brasileira nos últimos anos acontece com tintas muito semelhantes. Reconheço que a dramaticidade e a influência sobre a vida do cidadão soviético da Perestroika foi muito maior do que o processo que temos hoje no Brasil. Por isso quero deixar claro que me interessam apenas algumas semelhanças que existem entre eles.

A primeira delas é o encadeamento dos ajustes que passam a ocorrer quando, uma vez liberadas as restrições externas, forças naturais passam a agir na sociedade. No caso brasileiro trata-se da liberdade do consumidor de escolher entre produtos e serviços disponíveis no mercado interno e outros que são oferecidos a partir do exterior. E aqui estamos falando não apenas de bens físicos, como televisores e automóveis, mas de serviços como férias em Miami ou mesmo Paris.

Durante décadas foi negado ao consumidor brasileiro esse direito de escolha. Até 1990 esse impedimento era de natureza legal, pois leis e regulamentos criados ao longo do regime militar criminalizavam a importação de bens e os gastos em moeda forte no exterior. A partir do governo Collor essas restrições foram aliviadas, mas o consumidor brasileiro continuou confinado ao mercado interno pelas inseguranças associadas à taxa de câmbio. Com a elevada volatilidade de nossa moeda, os canais de distribuição de bens e serviços necessários para o consumidor ter acesso às importações não se desenvolveram de forma sistêmica. Essa limitação, na prática, significou a manutenção de uma economia fechada no Brasil.

Esse quadro mudou drasticamente com a entrada da China no mercado de bens primários. Entre o início do século XXI e o segundo mandato do presidente Lula, os preços de nossas exportações cresceram mais de 30% em relação aos das importações. Essa melhora em nossos termos de troca transformou o real em uma moeda forte e incrivelmente estável no médio prazo. Com a habitual rapidez com que as empresas brasileiras se adaptam a novos tempos, nos últimos anos montou-se no Brasil uma sofisticada e eficiente rede de distribuição de produtos e serviços importados. E o consumidor passou a ter, pela primeira vez em muitas décadas, a liberdade de escolha.

Essa busca por parte do consumidor brasileiro trouxe os holofotes da opinião pública para outra restrição à liberdade econômica que prevaleceu no Brasil por mais de quatro décadas: a liberdade para as empresas brasileiras de trabalhar e produzir com custos compatíveis com os de seus concorrentes em outros países. Essa descoberta é mais recente e só agora começa a ser percebida - e exigida - por muitas delas. Dou um exemplo dramático e recente: as empresas brasileiras são hoje obrigadas a comprar o gás natural de petróleo da Petrobras por um preço quatro vezes superior ao que prevalece nos Estados Unidos. O mesmo ocorre com outros insumos de produção como energia elétrica, custos de logística e taxas reais de juros nas operações de crédito.

Outro exemplo dessa contradição é o nosso sistema tributário. Com uma carga de impostos sobre a produção pelo menos 10 pontos mais elevada, esse aleijão competitivo ficou mascarado por décadas por ser a economia insulada das importações e nossa moeda muito desvalorizada. Outro foco gravíssimo desse problema de competitividade - embora este de natureza conjuntural - é hoje o mercado de trabalho. Com as taxas de desemprego em níveis muito baixos, o custo da mão de obra para as empresas brasileiras vem crescendo muito acima de seus concorrentes em outros mercados.

Neste ponto de minha coluna talvez a minha comparação com a Perestroika comece a ficar mais clara para o leitor do Valor. O processo de abertura às importações, em um tecido econômico e social com liberdades individuais restauradas no campo econômico, está criando um complexo processo de mudanças na sociedade. Como aconteceu no mundo comunista, os acontecimentos de agora se encadeiam e rapidamente criam novos desafios a serem enfrentados mais a frente. Por isso, tratar os problemas atuais na economia brasileira como uma mera crise na indústria provocada pelo real valorizado é uma simplificação perigosa.

Luiz Carlos Mendonça de Barros, engenheiro e economista, é diretor-estrategista da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Sombras na economia:: Míriam Leitão

Há uma coincidência infeliz: os países mais dependentes do petróleo do Irã são os mais encrencados na crise da Europa. A Itália e a Espanha importam do país 13% do que consomem. A Grécia - sempre ela - é a que mais importa: 14%. O acordo fechado ontem com os gregos dará um alívio, enquanto o mundo contrata outro problema para perturbar a economia de 2012. A cotação do petróleo bateu no pior nível do ano passado.

O Irã começa a tomar a decisão que se sabia que tomaria, antecipar-se às sanções e suspender o fornecimento de petróleo à Europa. Começou pelo Reino Unido e França, o que tem apenas valor simbólico. Os dois países compram pouco do Irã: 11 mil e 49 mil barris/dia, respectivamente. Os 27 países da União Europeia compram do Irã apenas 4% do que consomem. O risco fica com os países mais dependentes. Da perspectiva do Irã, o continente absorve 18% do que o país exporta. É um importante mercado para os iranianos.

No ano passado, após a sucessão das revoltas árabes, principalmente a guerra civil que tirou a Líbia do mercado, o petróleo superou US$ 120 o barril; nível ao qual volta agora. A elevação do ano passado acabou atrapalhando processos de recuperação de economias mais expostas ao preço do petróleo, como a dos Estados Unidos. As famílias americanas perderam parte da renda disponível porque lá o preço é imediatamente transferido para as bombas. Esse dinheiro deixou de ser gasto em bens de consumo e também no pagamento de dívidas.

A Agência Internacional de Energia (AIE) informou que os estoques mundiais estão no nível mais baixo em 15 anos, por causa da guerra civil da Líbia. Mesmo assim, abastecimento não é problema porque a Arábia Saudita continuará acudindo o Ocidente, em troca do silêncio sobre o governo ditatorial e repressivo da família Saud.

Consultorias internacionais avaliam que o ambiente econômico mundial perderá força ao longo do ano exatamente por essas dificuldades, apesar de o mundo estar respirando aliviado desde a longa reunião de 13 horas em Bruxelas que acabou selando um acordo com a Grécia. Os bancos terão que dar desconto de 53,5% na dívida bancária dos gregos. Ainda não está muito claro se isso valerá para o Banco Central Europeu (BCE), que também é um dos carregadores dos títulos da dívida grega. O empréstimo de 130 bilhões é bem menos sólido do que parece. É empréstimo plurianual, será liberado em parcelas, está condicionado a uma série de requisitos que terão que ser cumpridos para que novas parcelas sejam liberadas. Se a Grécia fizer todo o ajuste exigido, chegará a 2020 com 120,5% de dívida/PIB. Nunca tantos emprestaram tanto por tão pouco.

O mais relevante sobre o acordo grego é que não se pode garantir que este seja o começo do fim da crise europeia. O governo a ser eleito na Grécia em abril pode não cumprir o acordo. Não está afastado o cenário do contágio de outros países da região.

No caso do Irã, o mais relevante é que de novo o mundo flerta com o abismo. Seria trágico abrir-se uma nova frente de guerra que pode ter como consequência conflitos no Estreito de Ormuz, fundamental para a logística do petróleo. Para Israel, uma nova frente de guerra é conveniente para o governo de extrema-direita, que precisa alimentar a sensação de que o país está sempre sob ameaça. A paz duradoura pode significar o fortalecimento de grupos mais moderados do país e a redução da ajuda bilionária do Ocidente.

Nos Estados Unidos, a cúpula militar, que está vendo seu orçamento ser cortado com a redução do aparato e das tropas nas guerras do Afeganistão e Iraque, ganharia novo apoio e mais nacos dos gastos públicos. Um novo conflito favoreceria o discurso belicista do Partido Republicano.

Para o próprio Irã esse é o cenário que fortalece Mahmoud Ahmadinejad, que não por outro motivo gosta tanto de vincular o programa nuclear iraniano à sua liderança. Um conflito no Golfo Pérsico seria muito interessante para muitos. Aí é que mora o perigo.

A consultoria inglesa Capital Economics acha que a alta do preço do petróleo não tem a ver necessariamente com a instabilidade no Oriente Médio, mas sim com o excesso de dinheiro em circulação, que foi resultado da ação de vários bancos centrais no combate à crise econômica. Acredita ainda que a recuperação mundial alimenta o otimismo que permite a recuperação dos ativos. Tanto que o gráfico abaixo mostra isso: os índices das bolsas do mundo acompanham a elevação do preço do petróleo. A Vitol, uma das maiores empresas que comercializam o petróleo no mundo, estima que o preço do barril pode subir até US$ 150 caso haja um conflito armado com o Irã.

Há novas sombras de incerteza sobre a economia.

FONTE: O GLOBO

Nem gestão, nem poupança:: Rolf Kuntz

O governo promete para este ano um crescimento econômico de pelo menos 4% puxado pelo investimento. Beleza: a promessa é de mais construções, mais estradas, mais centrais elétricas, mais portos e aeroportos, mais equipamentos e máquinas para aumentar a produção e tornar a economia mais eficiente. O País deverá investir o equivalente a 20,8% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo projeção oficial divulgada este mês. 

A meta para 2014 é 24%, taxa só alcançada há muitos anos, durante o chamado milagre brasileiro. Nos últimos quatro anos essa relação ficou entre 18,1% e 19,5% e há muito tempo não se atinge a barreira de 20%. Parece pouco, para uma economia grande e destinada, segundo as autoridades, a se alinhar em breve entre as cinco maiores do mundo. Será possível chegar aos 24% sem depender excessivamente do capital estrangeiro? Mantida a taxa de poupança observada nos últimos anos, cerca de 16% do PIB, um terço do investimento dependerá de recursos do exterior e, portanto, da disposição dos poupadores estrangeiros.

A permanente escassez de investimentos parece estranha, porque o Brasil, segundo o governo, dispõe de 4 dos 16 maiores projetos de transportes do mundo - dois de ampliação das ferrovias, um ligado ao sistema metroviário e outro à construção de rodovias. Também de acordo com dados oficiais, 6 dos 15 maiores projetos do setor elétrico estão localizados no País, "com destaque para a construção da Usina de Belo Monte", como se afirma no último boletim Economia Brasileira em Perspectiva, produzido pelo Ministério da Fazenda.

A maior parte do investimento brasileiro é realizada pelo setor privado e por uma grande estatal, a Petrobrás. Até 2016, a maior parte do valor investido em infraestrutura será destinada ao setor de óleo e gás, segundo levantamento da Associação Brasileira de Tecnologia para Equipamentos e Manutenção (Sobratema), resumido em reportagem do Estado desta terça-feira. Nenhuma surpresa nessa informação. A Petrobrás tem sido responsável por uns 90% - há pequenas oscilações em torno desse número - do chamado PAC das estatais, a parcela do Programa de Aceleração do Crescimento atribuída às empresas controladas pela União.

As limitações normais do setor privado são conhecidas. Empréstimos de longo prazo dependem quase exclusivamente de uma fonte, o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Daí o uso frequente de recursos próprios para as compras de máquinas e para os planos de expansão. Além disso, paga-se imposto pesado para investir. Quando há crédito fiscal sobre o investimento ou sobre a exportação, o resgate demora anos.

Quanto aos governos, investem pouco, segundo se afirma, porque o dinheiro é curto - estranha afirmação, quando se pensa na carga tributária, maior que a dos outros emergentes e até superior ou igual à de vários países desenvolvidos, como Estados Unidos, Canadá, Japão e Suíça. A tributação brasileira é praticamente igual à da média dos países da OCDE, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (34,8% em 2008). Se a carga de impostos e contribuições é tão pesada, não há como atribuir o baixo investimento dos governos à escassez de recursos.

A resposta deve estar em dois outros fatores. Um deles, evidente, é a baixa capacidade de elaboração e execução de projetos, evidenciada pelo baixo grau de desembolsos em cada ano. Raramente o Tesouro Nacional desembolsa para investimentos metade das verbas autorizadas para cada exercício. A escassez, nesse caso, é de competência gerencial, não de dinheiro. Outro fator é o baixo nível de poupança do setor público. Segundo alguns estudiosos, isso resulta de uma escolha política do povo brasileiro. Essa escolha está refletida, por exemplo, nos gastos previdenciários e nos programas sociais. Estes foram os principais fatores de crescimento das despesas públicas nos últimos dez anos, segundo cálculos correntes. De acordo com esses cálculos, os gastos com pessoal diminuíram de 4,8% do PIB, em 2002, para estimados 4,4%, em 2012.

Há uma falácia nesses números. Uma despesa pode ter crescido em termos reais - isto é, a uma taxa superior à da inflação - e ao mesmo tempo ter diminuído como porcentagem do PIB. Os gastos federais com pessoal e encargos aumentaram bem mais que a inflação e não foram compensados por um ganho proporcional de eficiência e qualidade. Se o governo não economizou nesse item, foi por uma decisão sua, e não do povo.

Também é discutível a tese da opção popular por um modelo de baixa poupança. Nos Estados Unidos e na Inglaterra - para citar exemplos notórios - gastos públicos e opções fiscais são temas eleitorais importantes. Quando se propôs no Brasil, pela última vez, uma clara discussão eleitoral sobre a importância da poupança e sobre as opções de política fiscal?

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Mentira e colonização da Grécia:: Vinicius Torres Freire

Plano de "ajuda" coloniza o país, o destroça e serve apenas para dar tempo para a elite europeia se arranjar

Faz algumas semanas, era piada dizer que a Grécia seria reduzida à condição de república bananeira, ocupada por estrangeiros que vinham cobrar dívidas, como os americanos faziam na América Central no início do século 20.

Agora é oficial: inspetores da União Europeia e/ou FMI vão ter uma cadeira no departamento de contas a pagar e a receber do governo grego, praticamente dizendo o que pode e o que não pode. Haverá ainda uma conta especial para canalizar o dinheiro dos credores (o que sobrar, fica com os gregos).

Se implementado, o "plano de socorro" reduz a Grécia à condição de colônia: sem moeda, sem autonomia orçamentária, sem crédito, sem nada.

Para completar o cenário, faltariam apenas canhoneiras ancoradas no Pireu (o porto perto de Atenas) e agentes estrangeiros recolhendo dinheiro na alfândega.

Em termos econômicos, o "plano de socorro" é uma mentira cínica que as lideranças europeias contam a fim de ganhar tempo.

Vazou para os jornalistas um documento oficial e confidencial sobre a possibilidade de sucesso do "plano de ajuste" grego. Na hipótese mais otimista, a Grécia ainda deverá uns 130% do PIB em 2020.

Mas a hipótese mais otimista é alucinada. Depende de um cronograma irrealista de redução de deficit, de privatizações e de expectativa de crescimento econômico.

Como o próprio documento observa, um atraso na aplicação inicial do plano explode as demais e seguintes projeções irrealistas de "progresso". Isto é, se a Grécia não cresce, se não faz superavit primário suficiente ou não privatiza no preço e na velocidade projetados, o plano irá rapidamente para o vinagre.

Esclareça-se aqui o que é "otimismo" (dívida caindo a 130% do PIB em 2020): recessão de 4,3% em 2012, estagnação em 2013, redução média de salários em torno de 25% (sim, um quarto) até 2014. Um colapso.

O PIB grego encolheu uns 13% desde 2007. Na perspectiva otimista, a economia não voltaria ao nível de produção ("tamanho") de 2007 até 2022: 15 anos de estagnação. A essa altura, a renda per capita teria caído uns 15%, pelo menos. Se tudo der certo, pois, os gregos estarão, em 2020, 15% mais pobres do que o eram em 2007.

Obviamente ninguém está dando a mínima para a Grécia, e menos ainda para os gregos comuns. O que a elite europeia pretende é ganhar tempo, como o faz desde 2009.

Evita-se o calote grego, talvez até 2013. Nesse ínterim, tomam-se medidas para acolchoar o ambiente e proteger bancos e governos europeus de um "acidente" na Grécia (como uma revolução).

Em dezembro, o Banco Central Europeu emprestou meio trilhão de euros à banca da eurozona, a taxas de juros negativos (deu dinheiro, pois). No dia 29, terça que vem, pode emprestar outro meio trilhão.

A dinheirama atenuou o temor de quebra de bancos europeus, vários deles zumbis, mortos-vivos, reavivou um pouco de crédito interbancário e até permitiu que se usasse parte desse dinheiro na compra de títulos da dívida da Itália e da Espanha. O plano, enfim, põe a "Europa do Sul" na linha dura -a tortura grega fica como uma ameaça para recalcitrantes.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

É o dólar, deslizando:: Celso Ming

As cotações do dólar já caíram 8,4% nas primeiras sete semanas de 2012 e a tendência de queda continua aí.

Sexta-feira, o ministro Guido Mantega desmentiu informação da revista Veja de que o governo pretende taxar a entrada de Investimentos Estrangeiros Diretos (IEDs) que, no ano passado, atingiram o volume inédito de US$ 66,7 bilhões – e foram fator relevante de fortalecimento do real. Mas, em matéria cambial, o simples desmentido revela pelo menos a existência de profundo mal-estar com o problema.

Um dólar barato demais em reais tende a desestimular o setor produtivo, porque tira competitividade à indústria, eleva demais as importações e, assim, pode provocar desequilíbrios comerciais. Afora isso, quando associado a juros altos, como agora, incentiva aplicações especulativas com juros.

Até agora, o governo tem procurado reduzir a oferta de moeda estrangeira no mercado tanto por meio de taxação com IOF de certas aplicações estrangeiras como por compras pelo Banco Central. Mas a falta de opções de combate é consequência, também, de avaliações desencontradas a respeito da natureza do problema.

Há pelo menos quatro diagnósticos que tentam explicar o tal câmbio fora de lugar. O primeiro denuncia o populismo cambial. Trata-se de facilitar importações de bens de consumo para favorecer os segmentos da população que estão melhorando de vida no Brasil. Nada menos que 30 milhões de brasileiros (uma Argentina) ascenderam da classe E para a classe D ou daí para a classe C. O Ipea sugere esse entendimento.

O segundo diagnóstico é o da doença holandesa. É a avaliação de que o dólar está sendo pressionado para baixo porque o Brasil tem receitas em moeda estrangeira cada vez maiores com exportações de produtos primários (matérias-primas, alimentos e petróleo). O economista que mais vem insistindo nisso é o ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira.

Uma terceira avaliação tem a assinatura do ministro da Fazenda, Guido Mantega. Ele denuncia a chamada guerra cambial. São os Tesouros dos países ricos e, mais do que eles, são os grandes bancos centrais, especialmente o Federal Reserve (banco central dos Estados Unidos) e o Banco Central Europeu, que, a pretexto de combater a crise e o empoçamento do crédito, despejam trilhões de dólares e de euros nos mercados. Boa parcela dessa dinheirama acaba desembarcando por aqui e provoca o estrago conhecido no câmbio.

Finalmente, há aqueles para os quais a principal explicação para a baixa do dólar é a atuação do governo federal e também do Banco Central, que acionam a chamada âncora cambial. Ou seja, vêm usando o câmbio como ator coadjuvante dos juros no combate à inflação. Quanto mais baixa a cotação do dólar, mais baratas chegam em reais as importações e um produto importado barato contribui para segurar os preços dos produtos de consumo produzidos internamente.

Dizer que câmbio excessivamente valorizado é o resultado da atuação de todos esses fatores dificulta a adoção da terapêutica. E escolher um só foco pode ser ineficiente ou desastroso. Para o combate à tal doença holandesa, a recomendação seria a adoção de um confisco sobre importações, como sugere o professor Bresser-Pereira. Taxar investimentos externos, por sua vez, pode passar mau sinal quando o País mais precisa de poupança. Além disso, poderá bloquear a entrada de capitais de longo prazo, justamente quando o rombo nas Contas Correntes (sobretudo na área de serviços e renda) mais exige cobertura de capitais externos.

O ministro Mantega está certo nas suas denúncias contra a guerra cambial, mas, em contrapartida, pouco ou quase nada consegue fazer para evitá-la. Uma nova rodada de empréstimos de longo prazo aos bancos europeus pelo BCE está agendada para o dia 29. Pode ser a senha para um contra-ataque do governo.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

A economia brasileira é diferente? :: Paulo R. Haddad

Desde o início da atual crise econômica e financeira global, a economia brasileira tem apresentado um padrão de dinamismo diferente do que vem ocorrendo nas economias mais desenvolvidas. Cresceu, quando estas involuíam; persistiu investindo, quando estas entravam em desalento; e, mais recentemente, até mesmo desacelerou seu ritmo de expansão, quando estas estagnaram. Tudo isso num ambiente de relativa estabilidade econômica.

A economia brasileira é diferente? Tudo depende da profundidade e da duração da crise global. Quanto mais duradoura e mais intensa a recessão econômica mundial, maior será sua capacidade de homogeneizar seus impactos adversos e suas mazelas sobre as mais diversas economias nacionais dos cinco continentes.

Entretanto, quando se observa a evolução dos ciclos das economias de diferentes países, quando de uma crise econômico-financeira global que transmuta de uma recessão na direção de uma depressão, é possível verificar padrões diferenciados desses ciclos quanto ao seu início, sua intensidade, sua cadência, seu sequenciamento e sua reversão.

Em primeiro lugar, num ambiente de crise potencial, há que considerar o grau de flexibilidade de que as autoridades econômicas dispõem para manipular os instrumentos das políticas fiscal, monetária e cambial para preservar as condições de crescimento e de estabilidade da economia. Neste ponto, somos muito diferentes das economias da União Monetária Europeia, que não têm como promover política cambial ativa visando a expandir suas exportações para fins de crescimento. Somos diferentes também das economias desenvolvidas onde as políticas monetárias expansionistas levam tão somente ao empoçamento da liquidez ou à amortização de dívidas públicas e privadas acumuladas no passado.

Em segundo lugar, diferenças emergem também nas estruturas produtivas de cada país quanto às possibilidades de aproveitamento de suas potencialidades econômicas diante das demandas diversificadas de uma economia global com polos de crescimento policêntrico. O Brasil dispõe de uma base de recursos naturais renováveis e não renováveis exuberante que pode se transformar num espaço privilegiado de investimentos para atender às demandas de economias emergentes sedentas de alimentos, de minérios e metais, de bioenergéticos, etc. A exploração econômica dessas potencialidades não representa uma reespecialização regressiva da história da economia brasileira, uma vez que o conteúdo tecnológico das exportações primárias é cada vez mais intenso em suas cadeias de valor por força da competição e das especificações da demanda dos mercados globalizados.

Em terceiro lugar, há que considerar os ventos que sopram a favor da expansão econômica induzida pela dinamização do nosso mercado interno resultante das melhorias da produtividade total dos fatores de produção e da distribuição da renda e da riqueza nacional. Essas melhorias são impulsionadas também pelo desmonte de uma política monetária concebida para os anos de superinflação, o que tem levado à expansão das condições de crédito e de financiamento compatíveis com a realidade econômica de milhões de brasileiros até então excluídos dos mercados de bens duráveis de consumo e de imóveis residenciais.
Não há um descontrole do processo de endividamento público e privado; muitas das principais reformas de modernização das nossas instituições financeiras já ocorreram quando da consolidação do Plano Real; e a política fiscal está sendo conduzida de forma adequada com um olho nos indicadores de inflação e o outro nos indicadores de uma eventual estagnação econômica.

Todos esses fatores nos levam a afirmar que há grande chance de podermos ter liberdade para diferenciar o nosso ciclo econômico até mesmo no contexto da maior crise econômico-financeira mundial desde a depressão de 1929. Mas, como se dizia antigamente, o preço dessa liberdade é a eterna vigilância.

*Professor do IBMEC/MG. Foi ministro do Planejamento da Fazenda do governo Itamar Franco

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

A censura pela intimidação:: Mauro Malin

As ofensivas sofridas pelos jornalistas Lúcio Flávio Pinto, que edita em Belém o Jornal Pessoal, Emilio Palácio, do El Universo, de Quito, assim como o próprio jornal e seus três diretores, e pelo site Congresso em Foco têm duas características semelhantes: foram cometidas por intermédio do Judiciário e resultam em cerceamento das liberdades de manifestação do pensamento, de expressão em meio de comunicação e de exercício da profissão (art. 5o da Constituição brasileira).

Lúcio Flávio foi condenado a pagar R$ 8 mil de indenização aos sucessores do empresário Cecílio do Rego Almeida, falecido em 2008, por tê-lo denunciado, em 2000, como grileiro de vastas extensões de terras paraenses (ver “O Grileiro vencerá?”, “Lúcio Flávio e o Jornal Pessoal: jornalismo a serviço da cidadania” [vídeo, Observatório da Imprensa na TV] e “Somos todos Lúcio Flávio”). Esse valor é o da época em que foi impetrada a ação e subirá muito.

Os equatorianos foram condenados a três anos de prisão e multados em US$ 40 milhões, sob a acusação de terem injuriado o presidente Rafael Correa. Palacio pediu asilo nos Estados Unidos. Dos três diretores do El Universo, dois estão em Miami e um asilou-se na embaixada do Panamá em Quito.

Punição destrutiva

A Folha de S. Paulo, em editorial (“Rafael Correa, ditador”, 18/2), argumenta que a maneira mais infalível de aferir se existe democracia num país é “verificar se ali o governante se sujeita a críticas públicas — ainda que veementes, mesmo se injustas — sem que o autor seja punido por expressá-las”.

Não é bem assim. Crítica é uma coisa. Calúnia, injúria e difamação — para usar a terminologia jurídica brasileira —, outra. Qualquer pessoa que se sinta ofendida tem a possibilidade de recorrer aos tribunais para obter reparação.

O que torna antidemocrático o episódio do Equador é o despropositado valor da multa, que foge a qualquer sentido de justiça desde o surgimento da velha lei do talião. Aqui, não se trata de punir, mas de destruir.

Quando a Justiça aplica uma pena assim, pratica censura. A punição formal se dá a posteriori, mas o efeito se fará sentir a priori: quem, no Equador, se arriscará a ver uma crítica interpretada como injúria por juízes e tribunais? É um mecanismo que dispensa a utilização da censura prévia.

Dois atributos de modernidade

No caso do Congresso em Foco, servidores do Senado recorreram à Justiça contra a publicação do valor de seus vencimentos. Pretendem garantir juridicamente um privilégio que a própria presidente da República não tem — nem reivindica (ver “O direito à informação e o corporativismo no Senado”).

O Congresso em Foco é duplamente moderno. Moderno por utilizar a internet como canal de informação e análise, e moderno por expressar novos conceitos de cidadania cuja premissa é o direito de ter acesso a informações de natureza pública.

A jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) transformou o acesso à informação em direito humano fundamental, com o caso “Claude Reyes vs Chile”, em 2006, ao considerar que “para que as pessoas possam exercer o controle democrático é essencial que o Estado garanta o acesso à informação de interesse público sob seu controle”.

Os antagonistas do Congresso em Foco representam uma camada de cultura político-administrativa ainda não penetrada pelo espírito da Constituição de 1988 e seus desdobramentos. Pretendem ter franquia para promover apropriação privada da coisa pública. Talvez tenham concepções de vida pública excessivamente influenciadas pelas práticas que veem desfilar diariamente por salas e corredores do Senado.

Mauro Malin é jornalista.

Fonte: Observatório da Imprensa, 682 & Gramsci e o Brasil.

PDT e PR cobram mais espaço no governo

Cristiane Jungblut

BRASÍLIA e SALVADOR. A presidente Dilma Rousseff vai inciar, depois do carnaval, uma série de encontros com partidos da base aliada, em especial com as bancadas da Câmara. A promessa foi feita na reunião do Conselho Político, e os encontros devem ocorrer em março. As conversas servirão para resolver "contenciosos", como o espaço do PDT e até do PR no primeiro escalão do governo.

O PDT já não esconde mais a insatisfação com a demora na escolha de um nome da sigla para ocupar do Ministério do Trabalho, onde o interino Paulo Roberto Pinto está desde o início de dezembro, quando Carlos Lupi deixou o cargo. Na semana passada, o próprio Lupi disse que trataria do assunto com o Palácio do Planalto.

PDT ameaça votar contra fundo do servidor

O incômodo do PDT tem aparecido nas sessões da Câmara. O partido tem ameaçado votar contra o projeto que cria o Regime de Previdência Complementar do Servidor Público da União (Funpresp). Aliado ao PSDB, DEM, PSOL e ao PR, o PDT fez coro à proposta de adiamento da votação do Funpresp na primeira semana de fevereiro, o que irritou o Planalto.

Dentro do PDT, os nomes cotados continuam sendo do deputado Vieira da Cunha (PDT-RS), que foi colega de Dilma quando era pedetista, e o secretário-geral da sigla Manuel Dias. A presidente baterá o martelo sobre o escolhido, devendo pesar muito na sua decisão a proximidade que tem com Vieira da Cunha.

A presidente tem que resolver também o futuro do PR, que já tem promessa de voltar à Esplanada. Nesta semana o PR voltou, oficialmente, a frequentar o Palácio do Planalto.

No mesmo dia da reunião do Conselho Político, os líderes do partido na Câmara, deputado Lincoln Portela (MG), e no Senado, Blairo Maggi (MT), estiveram com a ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti.

Cauteloso, Lincoln evita falar em cargos, preferindo dizer que se trata de reaproximação, mas repete uma frase do colega Blairo Maggi:

— Se você me convida para o baile, é porque quer dançar comigo.

PR vota com governo, mas se diz independente

O PR tem votado com o governo, mas se autodenomina como "independente". Para Lincoln, eventuais espaços dentro da administração ocorrerão como "consequência" dessa volta do partido à base aliada:

— O governo vai querer que o PR dê a sua contribuição. Mas isso é consequência.

— A presidente vai receber os partidos da base a partir de março, para tratar das pendências — afirma o líder do governo na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), depois da reunião do Conselho Político.

Dilma volta hoje pela manhã para Brasília com a família, encerrando o descanso carnavalesco na Praia de Inema, área privativa da Marinha na Base Naval de Aratu, na Região Metropolitana da Bahia. Antes de embarcar, ela vai se encontrar com o governador Jaques Wagner (PT).

A assessoria da Presidência da República não confirmou que Dilma tenha aproveitado a terça de sol para um giro de lancha pelas ilhas da Baía de Todos os Santos. A presidente passou o carnaval em companhia da mãe, dona Dilma Jane, da tia, dona Arilda, da filha Paula, do genro e do neto Gabriel. (Com a agência A Tarde)

FONTE: O GLOBO

O silêncio de Marina

Erich Decat

À parte da polarização de boa parte da política brasileira na disputa entre PT e PSDB, uma das questões que se anunciam para as próximas eleições municipais diz respeito a como será utilizado o capital político construído pela ex-senadora Marina Silva (AC) no último pleito presidencial, quando ela atingiu a surpreendente marca de 19,5 milhões de votos em todo o país. Segundo aliados de Marina, o atual silêncio da política acreana é estratégico. "A Marina está num momento de 100% de controle da sua agenda", ressalta João Paulo Capobianco, coordenador de campanha da ex-senadora nas eleições de 2010.

O silêncio também coloca uma incógnita sobre o futuro partidário de Marina. O ingresso numa nova legenda está descartado, no momento. A criação de um novo partido não passa de um possibilidade distante, a ser materializada depois de outubro. "Ela poderá ter um peso muito grande nas eleições municipais, com os candidatos que aderirem à agenda da sustentabilidade urbana", acrescenta Capobianco.

Para os especialistas, ao privilegiar a agenda da sustentabilidade, a candidata se afasta da política partidária, o que pode confundir seu eleitorado. "Dentro desse contexto, vai ser muito eclético. Pode ocorrer apoio ao PT em um lugar e em outro ao PSDB. Isso pode confundir um pouco", avaliou o cientista político da Universidade de Brasília David Fleischer.

Em razão da falta de um palanque, Marina deve permanecer sob os holofotes em eventos como a Rio+20, prevista para junho. Em relação aos debates previstos no Congresso Nacional, Marina também deve ter destaque no debate do Código Florestal previsto para ser votado nesse semestre.

FONTE: ESTADO DE MINAS

Alianças dividem petistas

Apesar da rejeição por parte dos militantes, legenda deve priorizar projeto nacional para impor acordos durante as eleições municipais em estados como o Rio de Janeiro e o Paraná

Karla Correia

A costura de coligações com ex-adversários políticos tem causado "pesadelos" em petistas não só na capital paulista, onde a senadora Marta Suplicy (PT-SP) já declarou que teme um dia "acordar num palanque de mãos dadas" com o prefeito Gilberto Kassab (PSD). Ex-DEM, opositor de Marta no pleito pela Prefeitura de São Paulo em 2008, Kassab é tratado pela cúpula do partido como peça-chave na disputa pelo Palácio do Anhangabaú. E execrado pela militância petista – vide as sonoras vaias dedicadas ao pessedista na solenidade de aniversário de 32 anos do PT, comemorado no dia 10.

O modelo "adorado pela cúpula e odiado pela militância" se repete em Curitiba, onde caciques do partido articulam o apoio petista à candidatura de Gustavo Fruet (PDT) para a prefeitura da capital paranaense. A coligação tem defensores de peso, como os ministros da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, e das Comunicações, Paulo Bernardo. Mas está longe de representar um consenso. A vice-presidente do diretório municipal do PT em Curitiba, Miriam Gonçalves, renunciou ao cargo como protesto contra a aliança pró-Fruet. "Lá, o partido está dividido entre fruetistas e antifruetistas", reconhece o deputado Zeca Dirceu (PT-PR).

Para os antifruetistas, o eleitorado não assimila bem esse tipo de coligação entre ex-adversários políticos. "Mas já há uma maioria favorável à aliança, hoje", minimiza Dirceu, que atribui ao empenho do deputado estadual Tadeu Veneri (PT) em lançar sua candidatura o principal fator de rejeição da militância petista a Fruet. "As divisões do partido no estado são históricas, mas a militância é disciplinada, não vai comprometer uma eleição", avalia.

Caso semelhante se desenrola no Rio de Janeiro, onde o deputado Alessandro Molon (PT) lançou o movimento "Coragem para Mudar", em repúdio à aliança que dará suporte à reeleição do prefeito Eduardo Paes (PMDB). "Discordo frontalmente da aliança e vou batalhar até o último minuto pela candidatura própria do PT", diz o deputado. Assim como em São Paulo, a coligação tem como seus padrinhos o ex-presidente Lula.

Pressão Em situação próxima à de Curitiba, Paes tem um histórico de oposição e também foi algoz do PT durante a CPI dos Correios, quando ocupou a relatoria-adjunta. Mas a crise entre PT e PMDB no estado estourou quando o presidente do PMDB fluminense, Jorge Picciani, comunicou que seu partido não apoiaria candidaturas petistas em cidades estratégicas no estado, como Petrópolis e Niterói. Ato contínuo, parte do PT-RJ passou a defender a candidatura do senador Lindbergh Farias (PT-RJ) à sucessão estadual, em 2014.

A dissonância entre os interesses nacionais da legenda e os regionais é ponto em comum na maior parte dos problemas que o PT enfrenta na formação de alianças. Vice-presidente do diretório nacional do PT, o deputado José Guimarães (CE) aponta, entre os objetivos das coligações nas eleições municipais, a consolidação da base de sustentação política do governo de Dilma Rousseff e a prevenção de uma retomada de fôlego do PSDB e do DEM em regiões que o PT obteve crescimento em 2010, como o Nordeste. Os aliados preferenciais do partido vêm do PMDB e do PSB. "As candidaturas próprias são importantes para fortalecer o partido, mas as alianças são fundamentais na lógica nacional. Elas são uma forma de reforçar a rede de apoio ao governo e de isolar a oposição", avalia Guimarães.

Enquanto isso...

...Em belo horizonte

Se em algumas capitais, como São Paulo, alianças apoiadas pela cúpula nacional do PT despertam ódio na militância, o sentimento das bases em Belo Horizonte sobre possível reedição da união com o PSB e o arquirrival PSDB será conhecido no próximo mês. Por ora, a legenda segue dividida sobre o participação na reeleição de Marcio Lacerda (PSB). Se de um lado o presidente nacional do PT, Rui Falcão, já declarou apoio à aliança, inclusive com os tucanos, do outro, o vice-prefeito Roberto Carvalho garante ter conseguido 3.730 assinaturas de militantes em rejeição à união. Em março, os filiados elegem delegados para os representarem na decisão sobre a candidatura própria ou o repeteco da aliança.

FONTE: ESTADO DE MINAS

Definição dos petistas tem data marcada

Presidente do PT diz que o entendimento em torno da candidatura de João da Costa deve acontecer até o final de março

Gilvan Oliveira

Passado o Carnaval, começa a contagem regressiva no PT para a definição da candidatura do partido à Prefeitura do Recife. O presidente estadual da legenda, deputado federal Pedro Eugênio, confirmou que os petistas intensificarão a partir de agora as conversas na busca por um entendimento sobre o apoio à reeleição do prefeito João da Costa ou o lançamento de outro postulante ao seu principal espaço de Poder no Estado. “Queremos definir isso até o fim de março”, anunciou Eugênio, durante almoço oferecido ontem pelo prefeito, em sua residência, aos homenageados do Carnaval 2012 no Recife, o cantor e compositor Alceu Valença e o artista plástico José Cláudio.

O deputado afirmou que não pretende informar à imprensa a agenda de conversas. A intenção do diretório estadual petista, disse Pedro Eugênio, é levar o tema sucessão municipal do Recife à instância nacional do partido, ou mesmo ao ex-presidente Lula, já com as questões locais resolvidas e os entendimentos com os aliados, costurados. Ele também informou que o PT continuará a realizar pesquisas, para consumo interno, que vão medir a avaliação e a reprovação da gestão e os percentuais de voto dos pré-candidatos a prefeito, inclusive no Recife. Mas não precisou quantas serão feitas até o fim de março. Mesmo assim, enfatizou que os obstáculos para a confirmação de João da Costa na cabeça de chapa são mais de ordem política que administrativa. “A gestão vem melhorando seus índices de aprovação, mas o ‘xis’ da questão está na política”, reforçou.

O almoço oferecido pelo prefeito contou com as presenças do vice-prefeito Milton Coelho (PSB), de secretários, vários vereadores, deputados federais – Pedro Eugênio e Fernando Ferro (PT) – e estaduais – Teresa Leitão e Eriberto Medeiros (PTC) – artistas e jornalistas. Mas houve ausências notadas de caciques do PT e de partidos da Frente Popular, caso dos senadores Humberto Costa (PT) e Armando Monteiro Neto (PTB).

João da Costa e assessores mais próximos evitaram temas políticos no evento – a assessoria de Imprensa do prefeito informara previamente que ele não trataria do assunto. O petista concede hoje a entrevista coletiva de balanço do Carnaval.

Oposição

Apesar de toda a polêmica sobre a ausência de convites a vereadores da oposição para participarem do almoço de ontem – reclamada pelo decano da Câmara, Liberato Costa Júnior (PMDB) – nenhum oposicionista compareceu ao ato, e entre os governistas, a bancada do PTB não se fez presente. Liberato queixou-se do fato de oposicionistas serem excluídos de um evento oficial, levando o cerimonial da Prefeitura a consertar o erro às pressas.

FONTE: JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Alianças municipais desvinculam-se da aproximação entre Kassab e Serra

Cristian Klein, Raphael Di Cunto, Vanessa Jurgenfeld, Paola de Moura, Marcos de Moura e Souza, Sérgio Ruck Bueno, Marli Lima e Murillo Camarotto

SÃO PAULO, FLORIANÓPOLIS, RIO, BELO HORIZONTE, PORTO ALEGRE, CURITIBA E RECIFE - A possibilidade de coligação do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (PSD), com o PSDB, numa eventual candidatura do ex-governador José Serra à sua sucessão, não deverá levar a legenda que fundou a uma mudança na política de alianças para as eleições municipais de outubro. Apesar do receio de alas pessedistas de que a associação entre Kassab e Serra marcaria o partido com a pecha de oposicionista, o impacto da candidatura Serra nos arranjos que estão sendo feitos nas 26 capitais é praticamente nulo.

A situação é diferente da verificada quando Kassab abriu negociações com o PT e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para in dicar o vice na chapa do ex-ministro da Educação Fernando Haddad. A iniciativa provocou uma maior inclinação de seções regionais do PSD em direção ao PT, a despeito do histórico de rivalidades locais, como publicado pelo Valor em 24 de janeiro.

Com Serra, de acordo com novo levantamento, o efeito tende a ser residual. E se expressaria mais como uma retaliação de petistas a uma suposta traição ou desfeita de Kassab a Lula. É o caso de Porto Alegre.

Na capital gaúcha, o PSD, liderado pelo deputado federal e ex-goleiro Danrlei, já conversou com as três principais forças: o PT, cujo candidato é o deputado estadual Adão Villaverde; o PCdoB, que lançará a deputada federal Manuela D"Ávila; e o PDT, do prefeito José Fortunati. A decisão ainda não foi tomada e, segundo o líder da bancada na Câmara, Tarciso Flecha Negra, o PSD espera uma definição do quadro local até o fim de março. Mas o vereador afirma que uma aliança do partido com o PSDB em São Paulo dificultaria um acordo com o PT em Porto Alegre pela reação dos próprios petistas. Mesmo assim, isso não vincularia a decisão do partido na cidade.

Em Santa Catarina, a associação entre o PSDB e integrantes do PSD - uma enorme maioria oriunda do DEM - já é estreita. Diante desse quadro, o esforço do governador Raimundo Colombo (PSD) tem sido o de dar ao partido uma feição mais maleável e aproximá-lo dos petistas, ao estilo de Kassab, seu presidente nacional. As negociações em São Paulo ainda não interferiram em seus planos, que seguem sendo o de fazer alianças com legendas distintas, podendo apoiar o PT ou o PSDB, de acordo com a necessidade da disputa em cada município. Do lado do PT, a diretriz é a de não apoiar o PSD no Estado, mesmo que em algumas cidades uma coligação já seja considerada inevitável.

Ao Valor, Colombo disse que há chances, de fato, de uma aliança PT-PSD ocorrer, especialmente, em cidades menores. "Nós não somos preconceituosos, mas cada município tem sua relação de convivência, de identidade. Em alguns lugares, a coligação é de um jeito, em outra, é de outro. A autonomia será do diretório municipal", disse.

Ou seja, uma entrada de Serra em cena pouco deve alterar o cenário local. Prova disso é que há conversações com o PT em municípios de pequeno a médio porte, como Ibirama, Balneário Arroio Silva, Jacinto Machado, Imbituba e Criciúma. Em Criciúma, o PSD não terá candidato próprio e poderá apoiar a chapa PT-PMDB. Já em Imbituba, há chances de PT e PSD se unirem para enfrentar o PSDB.

No entanto, nos três maiores colégios eleitorais do Estado, Joinville, Florianópolis e Blumenau, a união não deve ocorrer. De acordo com o presidente estadual do PT, José Fritsch, a sigla tende a se coligar mais com o PMDB, como em Florianópolis.

No Rio, o PSD é comandado pelo ex-deputado federal Indio da Costa, que foi vice de José Serra na campanha à Presidência da República, em 2010. Uma aliança entre Kassab e Serra, no entanto, não mudaria seu posicionamento a ponto de se juntar a siglas da oposição, como o PSDB. O PSD fluminense é governista e está fechado com o grupo do governador Sérgio Cabral (PMDB).

No Nordeste, argumento de pessedistas é o de que a aliança Serra-Kassab é mais pessoal do que política

O partido apoiará a reeleição do prefeito Eduardo Paes (PMDB), que tem acordo com o PT para indicar o vice, apesar das recentes ameaças de rompimento. Indio da Costa afirma que a aliança com o governador e consequentemente com o prefeito se deve ao bom governo que ambos estão fazendo. "Eles são reconhecidos nacionalmente e internacionalmente pelos resultados que vêm apresentando. Por isso, não há porque brigar com o que está dando certo", diz Indio.

A fidelidade ao governador é grande. O dirigente afirma que nas cidades onde o PSD não lançar candidato próprio - as maiores apostas estão em 15 dos 92 municípios - a sigla não fará coligações com os adversários de Cabral, como PSDB, DEM ou PR.

Em Minas Gerais, o PSD faz parte da base do governador Antonio Anastasia (PSDB) e uma decisão de Kassab em apoiar Serra à Prefeitura de São Paulo colocará a legenda numa posição mais confortável na costura das alianças no Estado. É o que afirma o presidente estadual da sigla, Paulo Simão, embora parte do partido veja com muito desagrado uma coligação em São Paulo com os tucanos.

"Mesmo se o Kassab acabar decidindo pelo PT em São Paulo, nossas conversas com o PSDB não serão comprometidas aqui. Mas é claro que uma decisão do partido em São Paulo pelo PT, levará a pressões aqui nessa direção", afirma Simão, que conta que Kassab se comprometeu a decidir a situação em São Paulo até 15 de março.

Em Belo Horizonte, PT e PSDB fazem parte do governo do prefeito Márcio Lacerda (PSB), que tentará a reeleição. O PT, porém, ameaça romper o pacto e lançar o nome do vice-prefeito Roberto Carvalho.

Simão diz que qualquer que seja a decisão de Kassab ela trará efeitos sobre o PSD em todo o Brasil. "Em especial em Minas, porque temos aqui talvez o provável candidato da oposição à Dilma [o senador Aécio Neves]."

Parte dos integrantes do PSD em Minas, no entanto, consideram um equívoco o apoio aos tucanos em São Paulo.

"As pessoas com as quais conversei estão reagindo a essa possibilidade de o PSD apoiar o Serra com muito desgosto", diz o segundo vice-presidente do partido, o mineiro Roberto Brant.

"As principais lideranças do PSDB fizeram o possível e o impossível para impedir a fundação do PSD. Parlamentares e prefeitos que estavam com a gente tiveram de voltar para o PSDB por pressão dos governadores. Então o partido viu com naturalidade a aproximação com o PT", avalia ele. A crítica de Brant - que foi ministro no governo Fernando Henrique Cardoso - não é a Serra, de quem é amigo e admirador. Mas ao PSDB.

O temor de Brant e seus interlocutores no PSD é que, ao fechar uma aliança com o PSDB em São Paulo, seu partido venha a se desidratar politicamente, como ocorreu com o DEM. "O DEM sofreu muito com a submissão ao PSDB, e o PSD não veio para ser o DEM repaginado. Vai nos transformar numa sucursal do PSDB", critica.

No Paraná, o PSD também dá sustentação a um governador tucano, Beto Richa, porém há menos divergência interna. Em Curitiba, a sigla deve permanecer em seu apoio à reeleição de Luciano Ducci (PSB), aliado de Richa, contra a coligação em formação em torno do ex-deputado federal e ex-tucano Gustavo Fruet (PDT), que contaria com o PT. "Cada Estado é um caso", afirma o deputado federal Eduardo Sciarra, presidente do diretório paranaense do PSD.

Em capitais do Nordeste, o apoio de Gilberto Kassab a José Serra também não terá influência relevante sobre a estratégia do PSD. Aliado de primeira hora do PSB, que governa quatro Estados na região, o partido de Kassab deve seguir à risca as recomendações do governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), principal liderança política nordestina e que estará ao lado do PT na grande maioria dos palanques, apesar das ótimas relações que mantém com o tucanato.

O argumento predominante entre os representantes locais do PSD é de que a aliança Serra-Kassab é mais pessoal do que política. "Trata-se de uma afinidade entre duas pessoas e não entre dois partidos", afirmou o ex-deputado federal pelo DEM André de Paula, atual presidente do PSD em Pernambuco.

O partido no Estado estará alinhado com a Frente Popular, grupo de 16 legendas comandado por Campos e que inclui o PT. "Temos uma sintonia muito grande com Eduardo (Campos) e esse será nosso caminho", afirmou o dirigente.

O cenário é bem parecido no Ceará, onde a criação do PSD ajudou o governador Cid Gomes (PSB) a fazer o que foi chamado localmente de "lipoaspiração" no tucanato. De acordo com o presidente estadual do PSD, Almircy Pinto, a maior parte dos 40 prefeitos conquistados pela nova legenda veio do PSDB.

Funcionário do gabinete de Cid, Almircy afirmou que as alianças municipais serão fechadas em comum acordo com o governador na maioria dos casos. É pequena a possibilidade, portanto, de qualquer coligação com os tucanos cearenses. "Essa candidatura do Serra não muda nada. O Kassab sempre disse que era leal a ele. É um problema da política paulista, que é uma ilha nessa imensidão que é o Brasil", disse o presidente estadual do PSD.

Na Bahia, fora da zona de influência direta de Eduardo Campos, o PSD também não indica qualquer mudança de direção. O vice-presidente nacional do partido, Otto Alencar, é também vice-governador da Bahia, Estado governado pelo PT e onde o PSDB respira por aparelhos. Em Sergipe, o PSD está alinhado com o governador petista Marcelo Déda.

No único Estado do Nordeste governado pelos tucanos, Alagoas, o PSD é presidido pelo deputado federal João Lyra, adversário ferrenho do governador Teotônio Vilela Filho (PSDB). Sob o comando do parlamentar, a tendência é que o PSD marche ao lado do senador Renan Calheiros (PMDB), outro inimigo do governador. O PT, pouco representativo no Estado, deve seguir com este grupo.

Na Paraíba, o ex-tucano Rômulo Gouveia, governador em exercício e presidente regional do PSD, minimiza o efeito de uma decisão em São Paulo sobre as alianças estaduais. "As realidades são diferentes já no plano estadual e ainda mais no municipal", diz. Ele lembra que PT e PSDB fazem parte tanto da administração do governador Ricardo Coutinho quanto do prefeito de João Pessoa, Luciano Agra, ambos do PSB.

Nas demais capitais, o impacto da decisão de Kassab em São Paulo também deve esbarrar na conjuntura local. Até o presidente nacional do PSDB, deputado federal Sérgio Guerra (PE), tem poucas esperanças de que uma candidatura Serra reforce a posição dos tucanos nas disputas país a fora. "Não tem muito rebatimento. A candidatura ajuda a imagem do partido no sentido geral, mas não especificamente".

FONTE: VALOR ECONÔMICO

No Rio, PSD vira 'feudo' de evangélicos

Bancada na Assembleia Legislativa, de 13 integrantes, tem cinco titulares ligados a igrejas protestantes, além de uma missionária católica

Luciana Nunes Leal

RIO - O PSD pode até não ser de direita, esquerda ou centro, como já definiu o fundador e presidente do novo partido, Gilberto Kassab, mas, no Rio de Janeiro, começa a consolidar um perfil conservador com forte vínculo religioso. Dos 13 deputados estaduais titulares - a maior bancada da Assembleia Legislativa -, cinco são evangélicos, e uma, a atriz Myrian Rios (ex-PDT), é missionária católica.

Desde a semana passada, o partido tem um 14.º parlamentar, o suplente Hélcio Ângelo (ex-PSDB), também evangélico, que assumiu a vaga do deputado Comte Bittencourt (PPS).

Entre os deputados religiosos do PSD está Samuel Malafaia (ex-PR), irmão do pastor Silas Malafaia, da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, que se destacou na campanha eleitoral de 2010 pelos ataques à então candidata Dilma Rousseff, a quem atribuiu a defesa do aborto. Já Myrian Rios (ex-PDT) provocou a ira dos homossexuais, em 2011, ao declarar que não contrataria empregados gays em sua casa. Também participou da campanha "Todos contra o sexo anal".

Ingressaram ainda na nova legenda o deputado Fábio Silva (ex-PR), filho do empresário Francisco Silva, da Congregação Cristã do Brasil, dono da Melodia, uma das maiores rádios gospel do País, e Marcos Soares (ex-PDT), filho do pastor R. R. Soares, missionário da Igreja Internacional da Graça.

"Foi uma bênção, mas não tem a ver com religião e sim com o fato de que eu estava insatisfeito com a liderança do Garotinho. Encontramos ar novo no PSD", disse Samuel Malafaia, ao comentar o ingresso no novo partido. O parlamentar deixou o PR do ex-governador e deputado Anthony Garotinho, da Igreja Presbiteriana.

"Houve uma fase em que evangélicos votavam em evangélicos. Em 2006, eles seguraram os votos, acho que pelo envolvimento de alguns políticos evangélicos em escândalos, como o mensalão. Caí de 60 mil votos em 2002 para 35 mil em 2006 e não fui reeleito. Em 2010, com essa história de casamento gay, de lei da homofobia, acredito que os evangélicos reagiram e voltaram aos candidatos em quem confiavam para ir contra esta onda", disse Malafaia, terceiro mais votado no Estado, com 134,5 mil votos.

Segundo o deputado, o PSD está aberto a todas as correntes. "Um grupo no nosso partido vai defender os homossexuais. O PSD está disposto a conviver com ideias diferentes."

Para a deputada Graça Pereira, da Igreja Presbiteriana, que trocou o DEM pelo PSD, o que agregou os parlamentares no novo partido foi a insatisfação com as antigas legendas. "Não houve movimentação por conta de sermos religiosos", disse.

Mesmo após a migração de seis deputados evangélicos - entre titulares e suplentes - para o PSD, os dois políticos de maior influência religiosa no Estado estão em outros partidos. Garotinho tem o domínio do PR fluminense e o senador Marcelo Crivella é o mais influente do PRB, partido vinculado à Igreja Universal do Reino de Deus. O PR foi o partido que mais perdeu deputados estaduais para o PSD.

Na Assembleia, há pelo menos outros oito parlamentares evangélicos, espalhados por PMDB, PR, PRB e PMN. Além de Myrian Rios, outros dois deputados são líderes católicos, um do PMDB e outro do PSC.

Influência. Muitos deputados estaduais foram para o PSD pelas mãos do deputado federal Arolde de Oliveira, que está no oitavo mandato e mudou de partido depois de quase 30 anos nos antigos PDS e PFL e no DEM. Arolde, da Igreja Batista, é dono da gravadora de música gospel MK e da rádio evangélica 93 FM. O parlamentar diz que a composição da bancada do PSD reflete o perfil religioso da região metropolitana do Rio. "O PSD é reflexo da própria sociedade. Não é só o Estado do Rio, nós somos uma nação conservadora."

Dois episódios recentes reativaram a tensão entre evangélicos e o governo Dilma Rousseff. O ministro da Secretaria Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, católico fervoroso, teve de ir ao Congresso pedir desculpas por ter dito que o governo tinha de se preparar para enfrentar o poder de comunicação dos evangélicos. E a nova ministra da Secretaria de Política para as Mulheres, Eleonora Menicucci, defensora da descriminalização do aborto, viu-se obrigada a esclarecer, após a posse, que o tema "não está na pauta do governo".

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO